Pronunciamentos

DEPUTADO HELY TARQÜÍNIO (PSDB)

Discurso

Comenta a proposta de emenda à Constituição, de sua autoria, que extingue a exigência de licença prévia para processar Deputados acusados da prática de crimes comuns e o projeto de resolução, de autoria da Mesa da Assembéia, que estabelece procedimentos disciplinares relativos à etica e ao Decoro Parlamentar.
Reunião 418ª reunião ORDINÁRIA
Legislatura 14ª legislatura, 4ª seção legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 10/12/2002
Página 24, Coluna 3
Assunto DEPUTADO ESTADUAL. (ALMG).
Proposições citadas PEC 86 de 2002
PRE 1802 de 2001

418ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 14ª LEGISLATURA, EM 4/12/2002 Palavras do Deputado Hely Tarquínio O Deputado Hely Tarqüínio* - Sr. Presidente, Srs. Deputados, galeria, volto à tribuna para fazer considerações sobre a Corregedoria da Assembléia e a ética parlamentar. (- Lê:) Coincide o término da atual legislatura com a tramitação, no Plenário desta Casa, de duas proposições de extraordinário interesse, as quais, pessoalmente reputamos como avanço significativo no processo de integração deste Parlamento com a sociedade que aqui representamos. Em primeiro lugar, temos a Proposta de Emenda à Constituição nº 86/2002, de nossa autoria, que extingue a exigência de licença prévia para processar Deputados acusados da prática de crimes comuns. Paralelamente, temos o Projeto de Resolução nº 1.802/2001, que cria a Comissão de Ética e Decoro Parlamentar, que, insistentemente, por nossa sugestão, a Mesa Diretora elaborou. São duas proposições aparentemente dissociadas, mas que guardam entre si profunda identidade, já que tratamos, na primeira, de eliminar aquela imunidade que não se justifica por ser um privilégio; e na segunda, de cultivar aquele decoro parlamentar tão decantado e tão necessário, mas que é freqüentemente considerado mera circunstância externa e não um valor sedimentado de foro íntimo. Há exatamente um ano, ocupamos esta tribuna para conclamar os colegas Deputados a refletirem sobre ambas as questões. Na ocasião, saudávamos com entusiasmo a iniciativa do Deputado Aécio Neves, Presidente da Câmara, ao pugnar pelo fim da imunidade parlamentar no âmbito federal. Lembrávamos, então, que a medida era corajosa, como são todas as medidas que atingem prerrogativas. Lembrávamos, também, que atendia aos mais legítimos interesses populares, já que o parlamentar é um cidadão como os outros, e que dele, mais que dos outros, deve-se exigir resposta integral por seus atos. Ora, pois foi sob inspiração da iniciativa da Câmara Alta que demos entrada nesta Casa da Proposta de Emenda à Constituição nº 86/2002. Entendíamos e entendemos que adequar à norma federal a legislação estadual era - mais que uma exigência constitucional – uma forma de redimir a Assembléia perante a sociedade mineira, numa época em que contra nós recrudesciam duros e nem sempre justos ataques. De fato, como se recorda, uma questão referente à modalidade operacional de subsídios transformou-se em acusação de improbidade. Mais do que nunca, enfatizávamos à época, cabia-nos não só ser honestos, mas também parecer honestos. Quanto à questão da ética parlamentar, nossa posição não era e não é diferente. Entendemos que a ética é quase inerente ao homem, e ele a adota ou a repele, porque é uma questão de princípios e não de regras. Orientar os parlamentares nesse processo continuado – que vai do berço ao túmulo, independentemente do mandato – será a função da Comissão de Ética e de Decoro Parlamentar, bem como da Ouvidoria Parlamentar. Devemos observar que vimos acompanhando a proposição com singular conhecimento de causa. Na condição de Corregedor da Assembléia – cargo a que fomos alçado por indicação e pelo consenso do apreço dos colegas Deputados - notamos que o Regimento Interno cria nítido espaço de decisão para o Presidente da Casa. É notoriamente presidencialista o nosso sistema, e o Corregedor deve conviver com isso para buscar a solução para o processo que se lhe apresenta. É por essa razão que o Corregedor aparentemente desconsidera a manifestação popular, ao procurar equacionamento que atenda a esta, mas que não vá contra a realidade do Legislativo presidencialista, porque esse é o regime. O Projeto de Resolução nº 1.802/2001, ao propor a extinção da Corregedoria, norteia-se pelo bom-senso e pelo pragmatismo. Tal como existe e tal como age, o Corregedor recomenda, mas nem sempre é ouvido. Não julga, porque não está investido da função de Juiz, mas pode parecer ao público que se abstém ou se omite na tarefa da correição. A grande verdade é que o Corregedor não corrige factualmente, ao contrário do que se deduz da denominação. Como poderão a esta altura ter percebido, nosso pronunciamento tem cunho reflexivo e deve soar como recapitulação honesta e necessária de nossa atuação nesta Casa nos últimos quatro anos. Fazendo um parêntese, elaboramos este pronunciamento exatamente para tirar as dúvidas, porque, muitas vezes, cobra-se do Corregedor o conceito de Corregedor. A função de Corregedor nesta Casa não é de Juiz, é de um auxiliar do Presidente, e este dirige um sistema presidencialista. O Corregedor é muito mais um conciliador, um ouvidor, um conselheiro que faz recomendação, instruído por orientação jurídica da Procuradoria da Casa, para tentar buscar o decoro, do que propriamente aquele indivíduo, como está aqui expresso nas palavras, “um Corregedor”. Não corrige, apenas recomenda. Quem decide é a Mesa e o Presidente. Por isso, nos vários episódios em que fomos solicitados, em que a imprensa cobrava sem conhecer o Regimento, em que muitos tinham opinião diversa da verdadeira finalidade do Corregedor, que é uma figura ultrapassada nas nossas Assembléias, assim como no Congresso Nacional, é que se mudou a função, é que se procurou o Código de Ética acoplado à queda da imunidade parlamentar. O Corregedor desaparece e cria-se uma figura tríplice - a Mesa, o Ouvidor, sendo que a Ouvidoria fará o papel real do Corregedor, e a Comissão de Ética, que cria o Conselho de Ética -, com o objetivo de cuidar do decoro parlamentar, ou seja, da imunidade material. O chamado decoro processual será cuidado diretamente pelo Tribunal de Justiça, não havendo mais necessidade da autorização desta Casa. Muitos podem dizer que o Código é auto-aplicável, porque determinado pela Constituição Federal. Mas há sempre o direito de defesa. Muitos juristas contestam essa afirmativa, dizendo que poderão procrastinar o processo se o advogado, um partido político ou uma comissão própria para esse assunto entrarem com um pedido de sustação no Tribunal de Justiça, alegando que isso não está estabelecido pela Constituição Estadual. Por isso, esses dois projetos - um em fase de redação final e o outro a ser votado em 2º turno - sanarão todas as mazelas relacionadas ao decoro e à imunidade. Sr. Presidente, Srs. Deputados, nosso pronunciamento tem cunho reflexivo e deve soar como recapitulação honesta e necessária de nossa atuação nesta Casa nos últimos quatro anos. Pretendemos continuar colaborando com a causa pública, no futuro próximo, razão por que esta não é ocasião para despedidas. Mas julgamos de bom alvitre lembrar a todos - e ao povo mineiro em particular - que a democracia ainda é incipiente no Brasil e que sua sedimentação é processo custoso e demorado. Não há como desenvolvê- lo sem enfrentar tais custos e tais demoras, e, nesse caso, a conciliação se impõe. Ocorre que conciliar, no âmbito político, tem uma fronteira tênue com a ação de ceder. Eis porque, em nosso trabalho como Corregedor, tivemos algumas de nossas tentativas de harmonizar confundidas com demonstrações de indiferença e leniência. Por todos esses motivos, consideramos grande avanço a implantação da Comissão de Ética e Decoro Parlamentar e da Ouvidoria Parlamentar. Esta última, aliás, deverá ouvir e encaminhar, enquanto a Corregedoria deveria idealmente corrigir e não o fazia. Quanto à ética e ao decoro, acreditamos ter discorrido o suficiente sobre sua relevância. E só podemos terminar estas palavras saudando a futura legislatura, em que parlamentares imunes a tudo que for contra a lei e o direito externarão comportamento decoroso e coerente, bem em linha com a tradição honesta, libertária e legalista da terra mineira. Muito obrigado.