Comissão Pró-Ferrovias realizou audiência para definir propostas que apresentará à ANTT sobre as prorrogações de concessões
Valmir Costa teme que audiências da ANTT apenas cumpram formalidades
Deputado João Leite defende a inclusão de projetos de valorização do sistema ferroviário no PPAG

Renovação antecipada de concessões é repudiada em comissão

Convidados de reunião consideram proposta da ANTT inadequada e devem se manifestar contrariamente frente ao órgão.

06/09/2018 - 15:29

Solicitar a interrupção do processo de renovação antecipada da concessão da Estrada de Ferro Vitória-Minas e de outras concessões ferroviárias de Minas Gerais. Esse deve ser o tom da participação de membros do poder público e da sociedade civil nas audiências públicas que serão realizadas pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para tratar dessa proposta.

Interessados em discutir o assunto se encontraram nesta quinta-feira (6/9/18), em reunião da Comissão Extraordinária Pró-Ferrovias Mineiras da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), para debater as propostas e reivindicações que serão defendidas diante da ANTT.

No centro das discussões está a possibilidade de o governo federal renovar, por mais 30 anos, concessões que ainda têm dez anos de vigência. Ou seja, na prática, as novas concessões seriam de 40 anos. A possibilidade de antecipação foi aberta pela Medida Provisória 752/16, que se transformou na Lei Federal 13.448, de 2017.

O assunto tem sido discutido pela Comissão Pró-Ferrovias. Há questionamentos no sentido de que as condicionantes para as concessões, como a correta prestação dos serviços, não têm sido seguidas e de que muitas das linhas estariam abandonadas. Assim, não faria sentido renovar os contratos.

A legislação vigente determina que a ANTT realize audiências públicas para ouvir a população antes de decidir sobre a renovação das concessões. Em Belo Horizonte, a audiência será na próxima segunda-feira (10), na própria ALMG. Outras audiências devem acontecer no interior do Estado.

Antecipação - A data da audiência na capital mineira foi considerada oportuna por Antônio Augusto de Farias, conselheiro da ONG Trem, uma vez que a primeira antecipação de concessão ferroviária foi aprovada, na última semana, pela ANTT.

Segundo o especialista, tal aprovação diz respeito a uma linha que atravessa os estados de São Paulo, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Ele sugeriu que a comissão da ALMG buscasse acesso ao documento elaborado pela agência para justificar tal aprovação e, assim, entender os argumentos mobilizados.

Um dos destaques feitos por Antônio Farias é de que a concessão já antecipada é de uma linha que tem sido usada apenas para transporte de cargas. Ele salientou que, na audiência a ser realizada na próxima segunda-feira, é preciso tomar cuidado com o argumento corrente de que não seria possível que transportes de cargas e passageiros dividissem as mesmas linhas.

“Isso é falso, no mundo inteiro há esse compartilhamento de linhas”, afirmou. Situações como linhas que atravessam locais de alta densidade urbana, como regiões metropolitanas, dificultariam, de acordo com Antônio, esse compartilhamento – mas essas são, ele ressaltou, exceções.

Ano eleitoral é considerado inadequado para discussão

Sobre a audiência marcada pela ANTT, uma das preocupações, apresentada pelo procurador mineiro Valmir Peixoto Costa, é de que essas reuniões sejam realizadas apenas para cumprir rituais formais, e não para efetivamente ouvir a população. Segundo o procurador, o material disponibilizado pelo órgão indica que o objetivo já está traçado e que as audiências serão utilizadas apenas para legitimar o processo.

Por isso, além de participar desses encontros, Valmir Costa afirmou que a procuradoria tem agido também em outros âmbitos, como a apresentação de Ação Direta de Inconstitucionalidade contra trechos da Lei 13.448, de 2017, que trata da renovação antecipada das concessões. Alguns dos dispositivos questionados alienam o patrimônio ferroviário em favor das empresas e reduzem o tempo de fiscalização dos contratos. A ação está em análise no Supremo Tribunal Federal (STF).

Os presentes também criticaram a velocidade com que a renovação antecipada das concessões tem sido encaminhada, o que dificulta a mobilização necessária para se tratar a questão com os cuidados necessários. Além disso, os convidados destacaram que o atual momento, marcado pela disputa eleitoral e pelo fim da gestão presidencial de Michel Temer, não é adequado para uma discussão desse vulto.

“É um período de renegociação sobre o projeto de país que vamos criar”, destacou o subsecretário de Projetos da Secretaria de Estado de Transportes e Obras Públicas, Marcos Túlio de Melo, que acredita que, nesse contexto, não se deve tomar decisões que vão reverberar por décadas.

Além da viabilidade da antecipação das concessões, o subsecretário, em coro com outros convidados, questionou a falta de determinação, nos documentos apresentados pela ANTT, de que os recursos que poderão ser gerados nesse processo sejam investidos em projetos ferroviários.

Audiências - Os documentos que dizem respeito às propostas de antecipação das concessões, bem como informações sobre os procedimentos que dizem respeito à participação da sociedade civil nos eventos da ANTT, estão disponíveis na página da agência. O período para o envio de contribuições foi iniciado no dia 9 de agosto e prossegue até o dia 24 de setembro. Além de Belo Horizonte, Ipatinga (Vale do Aço), Vitória (ES) e Brasília (DF) devem abrigar audiências públicas sobre o assunto.

Deputado quer inserir planejamento ferroviário no PPAG

O presidente da Comissão Pró-Ferrovias, deputado João Leite (PSDB), disse que, além de se preparar para participação nas audiências da ANTT, outras frentes de ação serão tomadas para a revitalização do sistema ferroviário mineiro.

Ele citou, por exemplo, a inclusão de projetos nesse sentido no Plano Plurianual de Ação Governamental (PPAG), que será enviado pelo governador Fernando Pimentel para análise da ALMG este semestre.

Outras questões que foram tratadas na reunião foram o transporte ferroviário de passageiros na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH) e a memória ferroviária estadual.

A necessidade de se criar um planejamento para a integração via modais que utilizem as ferrovias, e não apenas o transporte rodoviário na RMBH, foi destacada pela diretora-geral da Agência de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte, Flávia Mourão Parreira.

Ela ressaltou que uma das dificuldades está relacionada à governança, ou seja, à administração das linhas, que teria que envolver as esferas federal, estadual e municipais de governo.

O analista técnico da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) Adão Guimarães destacou que essa discussão sobre quem vai administrar as linhas tem atrasado a ampliação da rede metroviária da capital mineira. Ele lembrou que a proposta de regionalização dessas linhas está no centro da discussão.

Adão Silva ressaltou, ainda, que a CBTU faz a gestão da rede já existente levando em consideração não apenas questões econômicas, como empresas privadas fariam, mas também sociais, com tarifas reduzidas para atender à população.

Patrimônio - A superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em Minas Gerais, Célia Maria Corsino, também esteve presente e ressaltou a importância de se preservar a memória relacionada aos trens.

Segundo ela, o órgão já fez um levantamento das estações mineiras e uma das propostas é de que todas elas tenham placas que falem do pertencimento do prédio ao patrimonio ferroviário e suas respectivas histórias. Ela também afirmou que os recursos para a implantação de um Centro de Memória Ferroviária em Belo Horizonte já estão disponíveis.

Consulte o resultado da reunião.