PL PROJETO DE LEI 203/2023
Projeto de Lei nº 203/2023
Dispõe sobre o Programa Cozinha Solidária no Estado de Minas Gerais.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica instituído o Programa Cozinha Solidária, que dispõe sobre a distribuição de alimentos preparados para consumo à população em situação de vulnerabilidade e risco social, contemplando a população em situação de rua, sendo referência para ações que combatam à fome e má nutrição, promoção do direito à alimentação adequada e de atividades culturais, educativas, e de promoção da garantia de direitos sociais e saúde, entre outras iniciativas, voltadas para a população do Estado de Minas Gerais.
Art. 2º – São objetivos do Programa Cozinha Solidária:
I – a promoção e garantia do direito à alimentação em conformidade com a Política Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável – Pesans;
II – a disponibilização de espaços sanitariamente adequados para a alimentação;
III – a regularidade no acesso à alimentação com qualidade e em quantidade suficiente;
IV – a redução da fome e da insegurança nutricional;
V – a construção de práticas alimentares promotoras de saúde, ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis;
VI – o atendimento à população em situação de vulnerabilidade e risco social, contemplando a população em situação de rua;
VII – a disseminação de conceitos de educação alimentar e nutricional, aproveitamento integral dos alimentos e aplicação de normas sanitárias para manipulação de alimentos;
VIII – a construção de atividades culturais, educativas e de promoção da garantia de direitos sociais e saúde, entre outras iniciativas, voltadas para a população;
IX – a redução da vulnerabilidade social no campo através da integração da agricultura familiar no fornecimento de alimentos;
X – a organização e estruturação de sistemas locais de abastecimento alimentar, compreendendo da produção ao consumo.
Art. 3º – O Programa Cozinha Solidária tem como finalidade fornecer alimentação gratuita, diariamente, prioritariamente à população em situação de vulnerabilidade e risco social, incluindo a população em situação de rua, visando a promoção de políticas de segurança alimentar e nutricional, de assistência social, efetivação de direitos sociais, dignidade humana, resgate social e melhoria da qualidade de vida.
Art. 4º – O Programa Cozinha Solidária compreende dentre seus instrumentos as Cozinhas Solidárias: entidades jurídicas de direito privado sem fins lucrativos, grupos ou coletivos sem constituição jurídica que desenvolvam e articulem atividades de combate à insegurança alimentar e nutricional em suas comunidades.
§ 1º – As Cozinhas Solidárias constituem elos entre a sociedade e o Estado, com o objetivo de distribuir alimentos preparados para consumo à população em situação de vulnerabilidade e risco social, contemplando a população em situação de rua, sendo referência para ações que combatam à fome e má nutrição das comunidades locais.
§ 2º – As Cozinhas Solidárias poderão estabelecer parceria e intercâmbio com instituições, entidades da sociedade civil e movimentos locais dentro das áreas de cultura, educação, direito à cidade, cidadania e agricultura.
§ 3º – Para recebimento de recursos públicos, as Cozinhas Solidárias serão selecionadas por edital público aprovado pelo Conselho de Segurança Alimentar de Minas Gerais – CONSEA/MG - de maneira a articular áreas do governo estadual e entidades da sociedade civil para a implementação de ações voltadas para o combate à miséria e à fome, no âmbito do Estado de Minas Gerais.
Art. 5º – Para atender a finalidade do Programa Cozinha Solidária, o Poder Público Estadual disponibilizará, conforme demanda, estruturas físicas de equipamentos públicos e/ou de equipamentos privados, por meio de locação, parcerias, contratos, convênios ou outros ajustes.
§ 1º – O Programa Cozinha Solidária poderá apoiar e incentivar cozinhas comunitárias e coletivas já atuantes em comunidades.
§ 2º – Poderão ser disponibilizados equipamentos para processamento e beneficiamento de alimentos, armazenagem e transporte.
Art. 6º – As refeições distribuídas dentro das Cozinhas Solidárias devem levar em consideração o combate à insegurança alimentar e nutricional fornecendo uma base nutricional alta e respeitando a cultura alimentar regional.
Art. 7º – Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 2 de fevereiro de 2023.
Bella Gonçalves (PSOL)
Justificação: A fome é um produto das relações econômicas, políticas e sociais que produzem a desigualdade e a miséria. Segundo a Rede PENSSAN (Disponivel em: https://olheparaafome.com.br/ ), em 2022, registrou-se 33,1 milhões de pessoas sem ter o que comer, sendo que 15,9 milhões de pessoas utilizaram alguma estratégia socialmente inaceitável que lhe trouxe vergonha, tristeza ou constrangimento, para conseguir um prato de comida. Ao olhar para a fome, temos sempre que lembrar que cada número absoluto representa a vida de uma pessoa.
Em Minas Gerais por volta de 8,2% da população passa fome, configurando situação de grave insegurança alimentar. A porcentagem indica que mais de 1,7 milhão de pessoas em todo o Estado estão nessa situação, o que expressa séria violação do direito humano à alimentação. Ainda há 28,3% da população, quase 6 milhões de pessoas, que convivem com a preocupação da falta de alimentos em um futuro próximo e 3,4 milhões, 16% da população, não têm acesso a quantidades suficientes de comida.
São muitas as condições de desigualdade que penalizam vários segmentos da população de Minas Gerais. Merecem destaque as crianças que, em condição de carência alimentar, podem ter suas potencialidades e seu futuro comprometidos. A ausência de políticas públicas abrangentes de combate à insegurança alimentar deixa grande parte da sociedade mineira desprotegida diante dos efeitos da crise sanitária que agravou a crise econômica que a antecedeu. Insuficiência de renda, desemprego e subemprego, deficiências habitacionais, falta de acesso à educação e precárias condições de saúde estão diretamente interrelacionados com o agravamento da fome no Brasil.
As Cozinhas Solidárias serão equipamentos públicos voltados a atender de maneira imediata quem hoje passa fome em Minas Gerais. O Programa Cozinhas Solidárias visa entregar refeições gratuitas para quem passa fome garantindo o Direito Humano à Alimentação Adequada, previsto no artigo sexto da Constituição Federal. O Programa Cozinha Solidária tem três eixos fundamentais: 1) entrega de comida com alto valor nutricional gratuita para quem não tem o que comer; 2) geração de emprego e renda no campo e na cidade, sendo empregos formais, principalmente, voltados para mulheres negras que são a maioria entre as trabalhadoras de cozinhas coletivas e comunitárias; e 3) utilização de equipamentos públicos em áreas de vulnerabilidade social, além de entregarem refeições gratuitas para quem passa fome, promovem atividades culturais e educativas, apoio jurídico e uma série de outras iniciativas que dão capilaridade para avançar em direito à cidade nas regiões menos assistidas pelo Poder Público.
As Cozinhas Solidárias além de entregarem refeição de graça para quem passa fome, são intersecção entre a cozinha, as pessoas e o território e podem promover uma rede de aprendizagem que ressignifica a relação com a comida, por exemplo, desde o cuidado com a horta que alimenta e gera significados culturais, a partir das práticas de cultivo e preparação de alimentos e ainda, cria laços com seus usuários. A cozinha é tratada como espaço de ressignificação de cultura, produção, território, comida e as práticas de comensalidades no contexto do enfrentamento da fome e insegurança alimentar e nutricional. Além disso, são espaços de socialização onde se estabelece trocas e fortalecimento de relações de solidariedade e rede de apoio social, principalmente entre mulheres.
A construção e apresentação deste projeto é resultado do contato com experiências dos movimentos sociais que trabalham com políticas de combate à fome no Estado de Minas Gerais. Certa da importância e da conveniência do projeto de lei ora apresentado, conto com o apoio dos nobres pares para a sua aprovação.
– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pelo deputado Doutor Jean Freire. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 3.357/2021, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.