PL PROJETO DE LEI 1570/2023
Projeto de Lei nº 1.570/2023
Proíbe a prática da constelação familiar no âmbito dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário do Estado de Minas Gerais e dá outras providências.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica proibida a prática da Constelação Familiar nos órgãos e entidades da administração pública direta e indireta do Poder Executivo, nos Poderes Legislativo e Judiciário do Estado de Minas Gerais.
Parágrafo único – Para efeitos desta lei, considera-se Constelação Familiar como uma técnica terapêutica não aprovada pelo Conselho Federal de Psicologia que reivindica um pensamento sistêmico, que supostamente observa e analisa dinâmicas ocultas de possíveis conflitos psíquicos e relacionais do sistema familiar ou organizacional mediante uma visão mística e transgeracional, utilizando-se da representação simbólica dos envolvidos.
Art. 2º – Quando aplicada de forma abusiva, de forma a expor as vítimas e causar ou reviver os traumas vivenciados, a prática será considerada mais gravosa e sujeita à indenização pessoal com responsabilidade objetiva do Estado sujeito a direito de regresso.
Art. 3º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 16 de outubro de 2023.
Beatriz Cerqueira, presidenta da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia (PT).
Justificação: A Constelação familiar é um método de terapia alternativa, idealizada pelo alemão Bert Hellinger para solução de conflitos e cura de traumas por meio de técnicas do psicodrama, que parte da concepção de que cada ente familiar deve manter uma posição determinada para que as relações sejam harmoniosas. Essa teoria fundamenta-se em três leis: pertencimento, hierarquia e equilíbrio. Nas sessões, que podem ser realizadas individual ou coletivamente, são recriadas cenas que visam estimular o “perdão” aos ancestrais do paciente, mesmo em situações que envolvem violência ou abuso sexual.
No início deste ano, o Conselho Federal Psicologia emitiu um nota (em anexo) destacando incongruências éticas na prática em consultórios, que também é utilizada pelo Judiciário para solução de conflitos em Varas da Família há mais de uma década.
Um trecho da nota diz que: “entre as incompatibilidades está o reconhecimento enquanto fundamento teórico da constelação familiar do uso de violência como o mecanismo para restabelecimento da hierarquia violada, inclusive atribuindo a meninas e mulheres a responsabilidade pela violência sofrida”.
De certa forma, isso denota para a constelação familiar, que se houve uma agressão, a vítima foi responsável porque o núcleo familiar estava em desarmonia.
Recentemente, uma carta foi enviada ao Ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, pelo Instituto Questão de Ciência, presidido pela bióloga Natalia Pasternak, por conselheiros do Conselho Federal de Psicologia e por pesquisadores na área do Direito.
Eles argumentam que a constelação familiar é uma prática sem respaldo técnico ou científico, tem alto potencial de violação de direitos humanos e “apresenta conceitos inaceitáveis sobre temas como incesto e abuso sexual”. Por isso, segundo os signatários da carta, exige “atenção e providências”.
Tendo em vista as violações de direitos humanos acarretadas pela prática, Silvio Almeida encaminhou ao Conselho Nacional de Direitos Humanos – CNDH – órgão colegiado que reúne 11 representantes do poder público e 11 da sociedade civil – um pedido da comunidade científica e acadêmica para debater eventuais abusos na prática da “constelação familiar” como psicoterapia.
Mateus França, mestre em Direito e que estuda o uso das constelações no campo jurídico brasileiro, em entrevista para o portal G1, argumenta que se trata de uma prática subjetiva e determinista sobre os papéis assumidos no contexto familiar, trazendo consigo um forte teor sexista sobre a função que mulheres e homens desempenham, o que caminha na contramão de vários avanços que a sociedade já conquistou até aqui. Outro ponto destacado pelo especialista, é que inexiste um padrão de aplicação da constelação familiar na mediação dos conflitos no âmbito do judiciário e que o papel do magistrado quando ocorre essa prática não é bem definido, tais aspectos configuram graves problemas de aplicabilidade de tal prática, no contexto do direito de família.
Considerando os diversos relatos de pessoas, sobretudo, mulheres, que se sentiram violadas e revitimizadas pela abordagem da constelação familiar na solução de conflitos familiares no judiciário, bem como a ausência de comprovação científica sobre a eficácia e a aplicação da técnica em questão, o presente projeto de lei visa proibi-la no âmbito dos órgãos públicos dos Poderes do Executivo, Legislativo e Judiciário no Estado de Minas Gerais.
Pela importância da matéria aludida, conto com o apoio dos meus nobres pares para a aprovação deste projeto de lei.
Referências:
https://www.tjmg.jus.br/portal-tjmg/noticias/tjmg-regulamenta-uso-das-constelacoes-sistemicas-nos-cejuscs.htm, acessado em 05/10/2023;
Portaria TJMG n° 3.923, disponível em: https://www.tjmg.jus.br/data/files/C9/12/0F/23/44F68710F6FAB6875ECB08A8/PORTARIA%20N%203923-2021%203%20Vice-Presidencia.pdf, acessado em 05/10/2023;
https://g1.globo.com/podcast/o-assunto/noticia/2023/10/04/bonecos-papeis-de-genero-e-hierarquia-o-que-e-a-constelacao-familiar-e-como-ela-virou-instrumento-controverso-no-judiciario.ghtml, acessado em 05/10/2023.
– Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça e de Administração Pública para parecer, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, do Regimento Interno.