PL PROJETO DE LEI 1026/2023
Projeto de Lei nº 1.026/2023
Dispõe sobre o reconhecimento dos direitos do Rio São Francisco – Opará – no limite do Estado de Minas Gerais e seu enquadramento como ente especialmente protegido e dá outras providências.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Ficam reconhecidos os direitos intrínsecos do Rio São Francisco e sujeito de direitos, e de todos os outros corpos d'água e seres vivos que nele existam naturalmente ou com quem ele se inter-relaciona, incluindo os seres humanos, na medida em que são inter-relacionados num sistema interconectado, integrado e interdependente no âmbito do Estado de Minas Gerais.
Art. 2º – Dentre os direitos do Rio São Francisco e outros entes relacionados exemplificadamente no artigo 1º, ficam reconhecidos os direitos de:
I – manter seu fluxo natural e em quantidade suficiente para garantir a saúde do ecossistema;
II – nutrir e ser nutrido pela mata ciliar e as Florestas do entorno e pela biodiversidade endêmica;
III – existir com suas condições físico-químicas adequadas ao seu equilíbrio ecológico;
IV – inter-relacionar-se com os seres humanos por meio da identificação biocultural, de suas práticas espirituais, tradicionais, de lazer, da pesca artesanal, agroecológica, cultural e do Turismo de Base Comunitária.
Art. 3º – O Rio São Francisco e os seres inter-relacionados devem ser protegidos e manifestarem seus requerimentos e vozes por guardiões legais, que servirão como sua representação pública, atuando como conselheiros do Poder Público e da comunidade no exercício destes direitos.
Art. 4º – O Poder executivo regulamentará esta lei para criar o Comitê Guardião de tutela dos interesses do Rio São Francisco, que atuará como guardião dos direitos estabelecidos nesta lei, participando de todos os processos decisórios públicos ou privados que eventualmente versar sobre o Velho Chico.
§ 1º – Comitê Guardião deverá ser eleito a partir de indicação comprovada dos membros das comunidades tradicionais e indígenas que vivem à beira do Rio São Francisco, sendo obrigatória a participação das seguintes representações:
I – uma representação da comunidade indígena Tuxá;
II – duas representações das Comunidades Tradicionais Pesqueiras da Região do Alto São Francisco;
III – uma representação da organização Velho Chico Vive;
IV – duas representações de comunidades quilombolas da Região do Alto São Francisco;
V – uma representação do Comitê de Bacia do Rio São Francisco;
VI – uma representação da população vazanteira da Região do Alto São Francisco;
VII – uma representação do Conselho Pastoral dos Pescadores.
§ 2º – O Comitê Guardião deverá, ao menos a cada 12 (doze) meses, preparar com a contribuição do Poder Público, um relatório escrito conciso para informar a comunidade sobre a saúde e estado do Rio e planejamento das ações estratégicas de efetivação dos direitos reconhecidos nesta lei.
§ 3º – O relatório deverá ser publicado e discutido com a participação dos membros do Poder Executivo e Legislativo, que realizará ao menos 2 (duas) audiências públicas, extraindo-se as recomendações.
Art. 5º – O Poder Executivo regulamentará esta Lei no prazo de 90 (noventa) dias, contados da data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 28 de junho de 2023.
Leninha, 1ª-vice-presidente (PT).
Justificação: O Rio São Francisco, o mais importante dos rios para o Estado e um dos mais importantes do Brasil e da América do Sul, é fundamental para o Cerrado, Caatinga, área de transição e, sobretudo, para a população de Minas Gerais. É a principal fonte de segurança alimentar dos Povos Indígenas, Ribeirinhos, Quilombolas, Vazanteiros, Gerazeiros, que vivem às suas margens. Igualmente fonte de segurança hídrica e alimentar de outros seres da natureza e comunidades humanas por sua condição de interdependência a estes seres inter-relacionados por todo seu curso.
Conhecido inicialmente e nomeado pelos indígenas como Opará, que significa rio-mar, o Velho Chico, é também núcleo de memórias e tempo de farturas de peixes e da vida movimentada no cais.
Do significado inicial “rio-mar” dado pela população indígena, talvez, na atualidade, essa alcunha não corresponda mais, pois, para navegá-lo encontram-se enormes dificuldades por ter se tornado estreito e assoreado. As suas vazantes já não são tão produtivas o que diminui a produção de alimentos para sua população ribeirinha.
Diante do processo cumulativo de degradação que vive o rio e suas bacias hidrográficas, a revitalização só se dará se as populações ribeirinhas de forma organizada e mobilizada forem efetivamente protagonistas para a mudança desta realidade e por normas legais que garanta a sua existência.
Mais recentemente foi consolidado o direito do rio, de “manter seu fluxo natural”, “nutrir e ser nutrido”, “existir com suas condições físico-químicas adequadas ao seu equilíbrio ecológico” e se relacionar com seres humanos desde que “de suas práticas espirituais, de lazer, da pesca artesanal, agroecológica e cultural”.
A Câmara Municipal de Guajará-Mirim (RO) definiu o Laje na primeira lei no Brasil que reconhece os direitos legais de um rio. A proposta foi de autoria do vereador Francisco Oro Waram (PSB), liderança da aldeia Waram, que fica na região do Rio Lage. Trata-se de um rio amazônico chamado pelos indígenas de Komi-Memen e que desemboca no Madeira, que por sua vez alimenta o Amazonas.
Em defesa desse direito fundamental que comunga com os preceitos contidos na nossa Constituição Federal e Constituição Estadual é que apresentamos o presente projeto de lei, para o qual pedimos o apoio dos/as nobres pares.
– Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça e de Meio Ambiente para parecer, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, do Regimento Interno.