PL PROJETO DE LEI 2309/2020
Projeto de Lei nº 2.309/2020
Cria o Programa de Enfrentamento ao Assédio e Violência Política Contra a Mulher, no âmbito do Estado de Minas Gerais.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica criado o Programa de Enfrentamento ao assédio e violência política contra a mulher, no âmbito do Estado de Minas Gerais, visando a prevenção e o enfrentamento aos atos individuais ou coletivos de assédio e qualquer outra forma de violência política contra mulheres, consideradas em sua diversidade, para assegurar o pleno exercício dos seus direitos, conforme dispõe o Art. 5º, Inciso I, da Constituição Federal e os tratados e instrumentos internacionais de direitos humanos das mulheres, entre eles a Comissão sobre o Estatuto das Mulheres da Organização das Nações Unidas.
Art. 2º – São objetivos do Programa:
I – eliminar atos, comportamentos e manifestações individuais ou coletivas de violência política e perseguição, que, direta ou indiretamente, afetam as mulheres no exercício de atividade parlamentar e de funções públicas;
II – assegurar integralmente o exercício dos direitos políticos das mulheres filiadas a partido político, candidatas, eleitas ou nomeadas, independente de sua raça, sexualidade e religiosidade;
III – desenvolver e implementar políticas e estratégias públicas para a erradicação de todas as formas de assédio e violência política contra as mulheres.
Art. 3º – Os dispositivos desta lei passam a ser obrigatórios em todas as instâncias da esfera política e dos entes públicos no âmbito estadual, tendo como foco a proteção das mulheres em sua diversidade, considerando aspectos relacionados à raça, classe, sexualidade e religiosidade.
Art. 4º – São deveres a serem observados e cumpridos:
I – garantir às mulheres o pleno exercício dos seus direitos políticos de participar como eleitoras e parlamentares, gerando condições, oportunidades e recursos que contribuam para igualdade entre homens e mulheres, considerando o pertencimento racial, sexualidade e religiosidade, aplicando-se a paridade e alternância na representação política em todos os órgãos e instituições;
II – prevenir e punir qualquer forma de violência política contra as mulheres em todas as suas expressões, considerando aspectos relacionados à raça, classe, sexualidade e religiosidade;
III – vedar e punir qualquer forma de discriminação de gênero, considerando aspectos relacionados à raça, classe, sexualidade e religiosidade, entendida como distinção, exclusão, desvalorização, recusa ou restrição, inclusive as realizadas por meio das redes sociais, que tenha a finalidade ou resultado de anular ou prejudicar o reconhecimento, gozo e exercício dos direitos políticos das mulheres na vida pública;
IV – fortalecer os instrumentos democráticos participativos, representativos e comunitários, através dos próprios mecanismos da sociedade civil organizada para alcançar os objetivos desta lei.
Art. 5º – Para efeitos de aplicação e interpretação desta Lei, serão adotadas as seguintes definições:
I – assédio político: ato ou o conjunto de atos de pressão, perseguição ou ameaças, cometidos por uma pessoa ou grupo de pessoas, diretamente ou através de terceiros, contra a mulher ou seus familiares, com o propósito de reduzir, suspender, impedir ou restringir as funções inerentes ao seu cargo, para induzi-la ou forçá-la a realizar, contra a sua vontade, determinada ação ou incorrer em omissão, no desempenho de suas funções ou no exercício dos seus direitos;
II – violência política: ações, condutas ou agressões físicas, verbais, psicológicas e sexuais cometidas por uma pessoa ou grupo de pessoas, diretamente ou através de terceiros, contra a mulher ou seus familiares, com o propósito de reduzir, suspender, impedir ou restringir as funções inerentes ao seu cargo, para induzi-la ou forçá-la a realizar, contra a sua vontade, determinada ação ou incorrer em omissão, no desempenho de suas funções ou no exercício dos seus direitos.
Art. 6º – Serão considerados atos de assédio ou violência política contra as mulheres candidatas, eleitas, ou nomeadas no exercício da função pública, aqueles que:
I – imponham, por estereótipos de gênero, intereseccionados ou não com raça, sexualidade e religiosidade, a realização de atividades e tarefas não relacionadas com as funções e competências do seu cargo;
II – atribuam responsabilidades que tenham como resultado a limitação do exercício da função parlamentar;
III – proporcionem informações falsas, incorretas ou imprecisas, que conduzam ao exercício inadequado de suas funções políticas;
IV – impeçam, por qualquer meio, que as mulheres eleitas, titulares ou suplentes, durante sessões ordinárias ou extraordinárias, ou qualquer outra atividade que envolva a tomada de decisões, exerçam o direito de falar e votar em igualdade e condições com os homens;
V – forneçam, ao Tribunal Regional Eleitoral, informações falsas ou incompletas acerca da identidade de gênero ou raça da candidata;
VI – impeçam ou restrinjam a reintegração de mulheres ao seu cargo, após o gozo de licença justificada;
VII – restrinjam o uso da palavra em sessões ou reuniões de comissões, solenidades e outras instâncias inerentes ao exercício político/públicos previstos nos regulamentos estabelecidos;
VIII – imponham sanções injustificadas, impedindo ou restringindo o exercício dos direitos políticos;
IX – apliquem sanções pecuniárias, descontos arbitrários e ilegais ou retenção de salários;
X – discriminem, por razões que se relacionem à cor/raça, idade, sexualidade, nível de escolaridade, deficiência, origem, idioma, religião, ideologia, filiação política ou filosófica, identidade de gênero, estado civil, cultura, condição econômica, social ou de saúde, profissão ou ocupação, aparência física, vestimenta, apelido, ou qualquer outra, que tenha como objetivo ou resultado anular ou prejudicar o reconhecimento, gozo ou exercício em condições de igualdade de direitos humanos e liberdades fundamentais legalmente reconhecidas;
XI – discriminem a mulher por estar em estado de gravidez ou de adoção, parto ou , puerpério, ou período de adaptação do filho adotado, impedindo ou negando o exercício do seu mandato e o gozo dos seus direitos sociais reconhecidos por lei;
XII – divulguem ou revelem informações pessoais e privadas de mulheres, com o objetivo de ofender a sua dignidade e/ou, contra a sua vontade, obter a renúncia ou licença do cargo exercido ou postulado;
XIII – pressionem ou induzam as mulheres eleitas ou nomeadas a renunciarem ao cargo exercido;
XIV – obriguem as mulheres eleitas ou nomeadas, mediante o uso de força ou intimidação, a assinar documentos ou endossar decisões contrárias à sua vontade e ao interesse público.
Art. 7º – Será nulo o ato praticado por mulheres em decorrência de situação de violência, devendo ser instaurado procedimento administrativo para responsabilização do autor.
Art. 8º – O Poder Executivo instituirá mecanismos de concepção, implementação, monitoramento e avaliação das políticas, estratégias e meios de prevenção, cuidados contra o assédio e a violência política contra as mulheres, através de parcerias com órgãos estatais, órgãos de classe e outras instituições privadas.
Art. 9º – O Poder Executivo instituirá, no âmbito do Estado de Minas Gerais, ações internas de informação e conscientização sobre os princípios e conteúdos da presente lei.
Parágrafo único – Para os fins do disposto no caput, poderão ser firmados convênios com os demais entes da federação, órgãos de classe e outras instituições privadas.
Art. 10 – As denúncias de que trata esta lei poderão ser apresentadas pela vítima, pelos seus familiares, ou por qualquer pessoa física ou jurídica, verbalmente ou por escrito, perante as autoridades competentes, devendo ser observado, em todo momento, o desejo e anuência das mulheres denunciantes em todo processo.
Art. 11 – Os servidores públicos, que tenham conhecimento de atos de assédio ou violência política contra mulheres candidatas, eleitas ou nomeadas em função pública, deverão comunicar o fato às autoridades competentes, ficando preservada a identidade do denunciante.
Art. 12 – Em caso de ocorrência de ato de assédio ou violência política, conforme descrito no Art. 5º desta lei, a vítima poderá optar pela via administrativa e denunciar o caso perante à instituição a que pertencer (em) o (s) agressor (es) ou agressora (as), a fim de que seja instaurado processo e aplicadas sanções disciplinares ou administrativas correspondentes, de acordo com o procedimento estabelecido por lei.
Art. 13 – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 27 de novembro de 2020.
Andréia de Jesus (PSOL) – Leninha (PT) – Beatriz Cerqueira (PT) – Ana Paula Siqueira (REDE).
Justificação: O Programa de Enfrentamento ao Assédio e Violência Política contra a Mulher, ora proposto, tem por objetivo dispor sobre os mecanismos de prevenção, cuidados e responsabilização contra atos individuais ou coletivos de assédio e qualquer outra forma de violência política contra mulheres, consideradas em sua diversidade, assegurando-lhes o pleno exercício dos seus direitos, tendo como base a da Constituição Federal, e os tratados e instrumentos internacionais de direitos humanos das mulheres, entre eles a Comissão sobre o Estatuto das Mulheres da Organização das Nações Unidas (CSW/ONU).
O respeito a diversidade das mulheres implica reconhecer que as mulheres negras são cerca de 28% do total da população brasileira, ou seja, constituem o maior contingente populacional do país. Vivenciam a face mais perversa da intersecção entre as discriminações de raça, gênero e classe. De acordo com o Atlas da Violência 2019 (IPEA/FBSP), a cada duas horas, uma mulher é assassinada no Brasil. São cerca de 13 mulheres por dia. Entre 2007 e 2017, a taxa de homicídios contra mulheres no país subiu 30,7%. Nesse mesmo período, a taxa de homicídios contra mulheres negras cresceu 29,9% e entre não-negra cresceu 1,6%. Em números absolutos, a diferença é ainda mais brutal: entre não negras o número cresceu 1,7% e entre negras 60,5%. As mulheres negras constituíam 66% do total de mulheres vítimas de homicídio.
Na esfera pública não é diferente, são inúmeros os relatos de violência política sofridos pelas parlamentares negras. As mulheres negras têm menor acesso a recursos partidários e enfrentam maiores dificuldades do que as brancas para se elegerem. Soma-se a isto os efeitos da divisão sexual do trabalho, o que muito explica a baixa participação política das mulheres. O acúmulo das tarefas domésticas, somadas ao trabalho remunerado, ao investimento nos estudos e às tarefas da militância, torna praticamente impossível para as mulheres se dedicarem à política partidária, que é hoje o único canal para se chegar ao legislativo.
Os resultados das eleições revelaram a enorme força política das mulheres negras pelo Brasil afora, com o crescimento de 30% da bancada de mulheres negras nas últimas eleições. E, na continuidade dessa movimentação política de tão grande potência, saudamos neste 2020 as inúmeras candidaturas de mulheres negras, indígenas, representantes dos povos tradicionais quilombolas e de matriz africana.
O PL proposto é fundamental para assegurar o exercício dos direitos políticos das mulheres filiadas a partido político, candidatas, eleitas ou nomeadas, independente de sua raça, sexualidade e religiosidade.
– Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça e dos Direitos da Mulher para parecer, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, do Regimento Interno.