MSG MENSAGEM 58/2019
MENSAGEM Nº 58/2019
Belo Horizonte, 20 de dezembro de 2019.
Excelentíssimo Senhor Presidente da Assembleia Legislativa,
Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do inciso II do art. 70 da Constituição do Estado, decidi opor veto parcial, por contrariedade ao interesse público, à Proposição de Lei nº 24.439, de 2019, que autoriza o Poder Executivo a realizar a compensação de dívidas vencidas com crédito tributário, nas hipóteses e nos termos que especifica, e dá outras providências.
Ouvidas a Advocacia-Geral do Estado, a Secretaria de Estado de Governo, a Secretaria de Estado de Fazenda e as demais secretarias e órgãos afetos às matérias objeto desta mensagem, assim se manifestaram quanto aos dispositivos a seguir relacionados:
Veto ao inciso IV do art. 1º
“Art. 1º – (...)
IV – veículos automotores, classificados no capítulo 87 da Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados – TIPI.”.
Motivos do veto
Inicialmente, compete relatar que o então Projeto de lei nº 1.015, de 2019, foi aprovado em 1º turno de votação com as emendas nº 1, 2 e 3. Em seguida, o Projeto retornou à Comissão de Administração Pública para receber parecer para o 2º turno. Naquela oportunidade, foi aprovada a redação na forma do Substitutivo nº 1 ao vencido no 1º turno, em que se destaca o acréscimo do inciso IV ao art. 1º, o qual perdura na Proposição de Lei nº 24.439.
Em síntese, o referido inciso adiciona o segmento de veículos automotores entre os setores econômicos beneficiados pela compensação tributária especificada no Projeto originário. No entanto, deve-se ressaltar que o segmento automotivo não era contemplado no Projeto encaminhado pelo Poder Executivo e só foi inserido em momento particular do processo legislativo, sem considerar a mensuração ou estimativa do impacto financeiro decorrente da sua inclusão.
Diante da grave crise fiscal e da possibilidade de ampliação do prejuízo financeiro ao Estado pela inexistência de estudo técnico sobre a matéria, cabe ao Poder Executivo a adoção de medida prudencial a justificar a oposição do veto ao inciso IV do art. 1º por contrariedade ao interesse público.
Veto ao § 7º do art. 2º
“Art. 2º – (...)
§ 7º – Na hipótese de que trata o § 6º, o cessionário da dívida também terá direito à compensação prevista no § 1º.”.
Motivos do veto
O teor do referido dispositivo deixa dúvidas acerca da exata remissão normativa. A dúvida acerca da remissão e a divergência entre os dispositivos correlacionados podem causar insegurança jurídica quanto à interpretação e aplicação da norma, além de prejuízos financeiros à Administração Pública. Nesse sentido, o veto é uma medida de cautela gerencial do Poder Executivo.
Ressalto que, apesar do veto, a essência da Proposição está mantida.
O veto a este dispositivo tem, portanto, fundamento nas diretrizes da técnica legislativa e na sua contrariedade ao interesse público.
Veto ao art. 8º
“Art. 8º – Fica o Poder Executivo autorizado a permitir a transferência de créditos acumulados do ICMS dos fornecedores a que se refere o art. 1º, detentores de crédito acumulado existente em conta gráfica até 30 de abril de 2019, para contribuintes do imposto localizados no Estado.
Parágrafo único – O disposto no caput somente se aplica se o detentor e o destinatário do crédito acumulado não tiverem pendências relativas às obrigações acessórias ou possuírem débito relativo a tributo de competência do Estado, exceto em se tratando de crédito tributário com exigibilidade suspensa ou crédito tributário inscrito em dívida ativa, com a cobrança ajuizada e com as garantias legais.”.
Motivos do veto
O art. 8º da proposição também contraria o interesse público. O conteúdo do dispositivo desvirtua o escopo do projeto originário, de autoria do Governador, e cria uma indesejável sistemática de livre transferência de créditos acumulados pelos contribuintes dos setores de energia elétrica, serviços de telecomunicação, combustíveis e veículos automotores. Esses segmentos possuem créditos acumulados de R$2 bilhões que poderiam ser transferidos a quaisquer contribuintes localizados em Minas Gerais, de variados setores econômicos, para dedução do imposto a pagar por esses contribuintes, à revelia das atuais regras e condições para tal transferência, o que potencialmente significa um impacto negativo na arrecadação corrente do ICMS, na ordem de R$2 bilhões no fluxo de caixa do Estado.
Nesse momento de crise fiscal aguda, um prejuízo dessa magnitude seria inconsequente frente aos gastos que o Estado terá que arcar com a prestação de serviços públicos essenciais em 2020, além de comprometer ainda mais o pagamento dos servidores.
Concomitantemente, o dispositivo em análise poderia incentivar outros contribuintes que possuem créditos acumulados – de diversos setores econômicos que não os indicados no art. 1º – a pleitearem judicialmente a aplicação isonômica do novo critério de livre transferência de créditos acumulados. Esse fator resultaria em grande instabilidade financeira pela perda sem controle da arrecadação do ICMS, conforme nota técnica da Secretaria de Estado da Fazenda.
Sobre o tema do tratamento desigual a contribuintes que se encontram em situação fático-jurídica semelhante, assim decidiu o Supremo Tribunal Federal:
"EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI ESTADUAL 356/97, ARTIGOS 1º E 2º. TRATAMENTO FISCAL DIFERENCIADO AO TRANSPORTE ESCOLAR VINCULADO À COOPERATIVA DO MUNICÍPIO. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA IGUALDADE E ISONOMIA. CONTROLE ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE. POSSIBILIDADE. CANCELAMENTO DE MULTA E ISENÇÃO DO PAGAMENTO DO IPVA. MATÉRIA AFETA À COMPETÊNCIA DOS ESTADOS E À DO DISTRITO FEDERAL. TRATAMENTO DESIGUAL A CONTRIBUINTES QUE SE ENCONTRAM NA MESMA ATIVIDADE ECONÔMICA. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Norma de efeitos concretos. Impossibilidade de conhecimento da ação direta de inconstitucionalidade. Alegação improcedente. O fato de serem determináveis os destinatários da lei não significa, necessariamente, que se opera individualização suficiente para tê-la por norma de efeitos concretos. Preliminar rejeitada. 2. Lei Estadual 356/97. Cancelamento de multa e isenção do pagamento do IPVA. Matéria afeta à competência dos Estados e à do Distrito Federal. Benefício fiscal concedido exclusivamente àqueles filiados à Cooperativa de Transportes Escolares do Município de Macapá. Inconstitucionalidade. A Constituição Federal outorga aos Estados e ao Distrito Federal a competência para instituir o Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores e para conceder isenção, mas, ao mesmo tempo, proíbe o tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem na mesma situação econômica. Observância aos princípios da igualdade, da isonomia e da liberdade de associação. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente. (STF, ADI n.º 1655, Relator Ministro Maurício Corrêa, mar/2004)."
Nesses termos, o veto ao dispositivo se fundamenta na sua contrariedade ao interesse público.
Veto ao § 1º do art. 9º
“Art. 9º – (...)
§ 1º – Os imóveis objeto da negociação foram avaliados nos termos dos arts. 10 e 12 do Decreto nº 46.467, de 28 de março de 2014, e serão considerados, para fins de transferência de domínio, os valores relacionados no Anexo I desta lei.”.
Motivos do veto
O § 1º do art. 9º da Proposição, ao determinar que serão considerados para fins de transferência de domínio os valores relacionados no Anexo I, se mostra ineficaz para fins de avaliação e de economicidade da negociação dos imóveis na integralização de capital da Companhia de Habitação do Estado de Minas Gerais – Cohab.
Ressalta-se que a Lei Federal nº 4.717, de 29 de junho de 1965, que regula a ação popular, prescreve que é nula a alienação de bens móveis e imóveis de propriedade da Administração se o preço de venda for inferior ao de mercado, na época da operação (art. 4º, inc. V, alínea c); também se o preço de compra for superior ao de mercado (art. 4º, inc. V, alínea b). Nesse caso, qualquer cidadão terá legitimidade para propor ação popular pleiteando a anulação da transferência, posto que lesiva ao patrimônio público, sem prejuízo da responsabilidade criminal, administrativa e civil do agente que lhe vier a dar causa, em concreto.
No mesmo sentido, o ato de permitir ou facilitar a alienação, permuta ou locação de bem público por preço inferior ao de mercado é classificado como ato de improbidade administrativa pela Lei Federal nº 8.429, de 2 de junho de 1992 (art. 10, inc. IV); também se o preço for superior ao de mercado (art. 10, inc. V). O agente responsável pela prática do ato fica sujeito às sanções previstas no art. 12, inc. II, do mesmo diploma legal.
Pela gravidade das penalidades previstas em ambas as leis, percebe-se a importância da avaliação prévia como condicionante do ato de transferência do domínio e, no caso em apreço, como procedimento para viabilizar a integralização de capital da Cohab.
Observa-se, porém, que o veto não compromete a integridade da norma a que se refere, uma vez que os valores dos imóveis que constam do Anexo I passam a ser apenas indicativos, já que os bens imobiliários terão que ser previamente avaliados pelo preço de mercado quando de sua efetiva alienação.
Portanto, o veto a esse dispositivo se impõe e tem por fundamento a sua contrariedade ao interesse público.
Em conclusão, são esses, Senhor Presidente, os motivos de contrariedade ao interesse público que me levam a vetar os dispositivos da proposição acima mencionados, os quais submeto à elevada apreciação das Senhoras e Senhores Membros da Assembleia Legislativa.
Romeu Zema Neto, Governador do Estado.