PL PROJETO DE LEI 4125/2017
Projeto de Lei nº 4.125/2017
Institui medidas para o enfrentamento da obesidade infantil.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Esta lei tem por finalidade instituir medidas para o enfrentamento da obesidade infantil no Estado, com foco na saúde pública, na educação e na proteção da criança e do adolescente.
Art. 2º – Ficam instituídas as seguintes medidas voltadas para os fins desta lei:
I – introdução do tema “obesidade” no currículo da rede estadual de ensino fundamental e médio;
II – proibição da disposição de alimentos altamente calóricos, especialmente os alimentos ultraprocessados, tais como, chocolates, doces, balas e salgadinhos, nas partes inferiores de prateleiras, displays, tabuleiros e utensílios assemelhados, nos pontos de venda, inclusive nos locais próximos ao caixa, como meio de atração ao alcance das crianças;
III – afixação de letreiros, com destaque, nos locais de venda de doces e alimentos ultraprocessados, com a expressão: “açúcar e alimentos ultraprocessados são prejudiciais à saúde”.
Art. 3º – A introdução do tema “obesidade”, no currículo da rede estadual de ensino fundamental e médio, deverá atender os seguintes requisitos, que serão objeto de regulamentação própria:
I – capacitação de professores da rede escolar para o ensino e a aplicação de informações concernente à temática do enfrentamento da obesidade infanto-juvenil;
II – atenção permanente, nas escolas, voltada à segurança alimentar e ao enfrentamento da obesidade em crianças e adolescentes.
§ 1º – Os alunos receberão informações sobre os assuntos referentes ao objeto desta lei por meio de material didático apropriado.
§ 2º – As informações sobre o enfrentamento da obesidade infantil serão dirigidas, aos alunos do ensino fundamental e médio, aos professores e aos funcionários responsáveis pela elaboração das merendas, nas escolas, de maneira integrada, para se implantar e estender, no ambiente escolar, uma cultura alimentar voltada para a diminuição gradativa do problema, com a definição de metas, de acordo com a regulamentação desta lei.
§ 3º – Os professores e os funcionários deverão ser treinados previamente para as atividades relacionadas ao assunto de que trata esta lei.
§ 4º – Os alunos do Ensino Fundamental e do Ensino Médio receberão lições de combate à obesidade, de modo amplo, por meio de aulas próprias, atividades práticas, vídeos e palestras, no período das aulas, abrangendo variados aspectos do mesmo tema, difusão de princípios e de prevenção do problema.
Art. 4º – O Poder Executivo regulamentará esta lei.
Art. 5º – As despesas resultantes da execução desta lei correrão à conta das dotações orçamentárias próprias consignadas no orçamento vigente, que poderão ser suplementadas se necessário.
Art. 6º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 29 de março de 2017.
Deputado Missionário Marcio Santiago – PR
Justificação: Dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em parceria com o Ministério da Saúde apontam que uma em cada três crianças de cinco a nove anos está acima do peso recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Entre os meninos, 16,6% são obesos, enquanto as meninas somam 11,8%.
Comparada com pesquisas anteriores, o excesso de peso entre as crianças mais do que triplicou desde 1974: passou de 9,7% para 33,5% atualmente. A obesidade entre os meninos era de apenas 2,9% do total e nas meninas, o índice era de apenas 1,8%.Uma em cada três crianças sofre com a doença no Brasil e projeções da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que até 2025 o número de crianças com sobrepeso e obesidade pode chegar a 75 milhões, caso nada seja feito.
O aumento da prevalência de excesso de peso e da obesidade no Brasil vem sendo intenso nos últimos anos. Pesquisa nacional revelou que 49% da população adulta, em 2008, (POF2008/2009) apresentavam sobrepeso, sendo que 14,8% apresentavam obesidade (16,9% mulheres e 12,4% dos homens). Em 2003, a porcentagem de excesso de peso era 42%. Pesquisa nacional mais recente, com dados coletados em 2013 mostrou que o excesso de peso já atinge 56,9% da população adulta, isto é, 82 milhões de brasileiros (Pesquisa Nacional de Saúde, 2015).
A obesidade é o principal fator de risco das doenças crônicas não transmissíveis, como doenças cardiovasculares, hipertensão e diabetes. No Brasil, essas doenças são responsáveis por 72% das mortes ocorridas na população em 2007. As doenças cardiovasculares constituem a principal causa de mortalidade, representando 34,2% das mortes no País.
A população brasileira sofreu enorme mudança nos hábitos alimentares, substituindo dietas tradicionais à base de frutas, legumes e vegetais por dietas com elevada densidade energética, ricas em açúcar e sódio, com aumento do consumo de gorduras, especialmente saturadas e trans, carboidratos refinados e alimentos de origem animal (WHO, 2003; PIERNAS & POPKIN, 2010; LEVY et al., 2012). Estudos populacionais mostraram aumento da participação dos produtos ultraprocessados na alimentação dos brasileiros nas últimas décadas e evidências indicam aumento mundial na produção e consumo desses alimentos em substituição às dietas tradicionais compostas pelos alimentos processados e ultraprocessados (Levy e cols., 2005; Monteiro e cols., 2010; Monteiro e cols., 2011; Levy e cols., 2012; Moubarac e cols., 2012; Stuckler e cols., 2012). Estudos populacionais conduzidos em diferentes países evidenciam a participação crescente na produção e consumo de produtos ultraprocessados.
Em 2014, o Ministério da Saúde lançou o Guia Alimentar para a População Brasileira, com o propósito de disseminar o conhecimento sobre os alimentos e seu processamento. A mensagem é simples, acessível a toda população brasileira, e constitui uma das estratégias para implementar a diretriz de promoção da alimentação adequada e saudável. Essa nova publicação visa à orientação para redução do consumo de alimentos processados e ultraprocessados, de acordo com a classificação proposta, ressaltando a gravidade do processamento industrial dos alimentos e seu impacto na saúde. O novo guia brasileiro é um marco internacional, pois adota a classificação dos alimentos como base para as diretrizes de saúde pública e nutrição para a população do país.
Recente revisão sistemática mostrou que os sistemas de classificação de alimentos que definem e distinguem diferentes tipos de processamento industrial de alimentos – como a classificação de alimentos proposta por Monteiro e cols.− podem auxiliar na compreensão de como se prevenir e controlar o excesso de peso, a obesidade e as doenças crônicas relacionadas, além de auxiliar na avaliação e monitoramento dos padrões alimentares da população (MOUBARAC et al., 2014b).
A propósito, apresenta-se a Classificação de alimentos de acordo com o grau de processamento:
Grupo 1 – Alimentos “in natura”, ou minimamente processados – incluem todos os alimentos na sua forma animal ou vegetal de origem. Os alimentos minimamente processados são aqueles que foram alterados, mas sem que nenhum ingrediente fosse adicionado. (frutas, verduras, legumes e cereais frescos ou congelados; leguminosas, raízes e tubérculos frescos, congelados ou secos; castanhas, nozes, amendoim sem sal; carnes, aves e peixes frescos ou congelados; leite e iogurte natural; ovos; café, chás).
Grupo 2 – Ingredientes culinários processados: são constituintes dos alimentos in natura. Os métodos de processamentos incluem: prensagem, moagem, refinação, pulverização, entre outros. (óleos vegetais, gorduras animais, açúcar, sal, farinhas, amido).
Grupo 3 – Alimentos processados: formados pela adição de substâncias (sal, açúcar ou óleo) a alimentos in natura. (verduras ou legumes preservados em água salgada; frutas em calda; peixe conservado em óleo; e queijos).
Grupo 4 – Alimentos ultraprocessados: formados a partir de ingredientes industriais, com pouco ou nenhum alimento in natura. São alimentos prontos ou quase prontos para consumo que imitam a aparência e qualidade sensorial dos alimentos. São duráveis, convenientes, hiperpalatáveis e rentáveis. (cereais matinais, misturas para bolo, barras de cereais; sopas e massas instantâneas; pães e produtos panificados, como bolos, doces e sobremesas; salgadinhos “de pacote”, biscoitos, sorvetes, chocolates; achocolatados e bebidas lácteas, refresco em pó, refrigerantes e outras bebidas adoçadas; carnes processadas como embutidos, nuggets; preparações prontas ou pré-prontas para consumo; margarinas) – adaptado de Pan American Health Organization. Ultra-processed food and drink products in Latin America: Trends, impact on obesity, policy implications, Washington, DC, PAHO, 2015.
A propósito, os alimentos ultraprocessados são produzidos de modo predominante ou unicamente a partir de ingredientes industriais, com pouco ou nenhum alimento integral em sua composição, com a proposta de serem produtos duráveis, acessíveis e convenientes, palatáveis, atraentes e rentáveis. São alimentos prontos ou quase prontos para serem consumidos por si só ou em combinação com outro produto ultraprocessado (por exemplo, biscoito recheado e refrigerante). Os componentes dos produtos ultraprocessados são, em grande maioria, aditivos como conservantes, estabilizantes, emulsionantes, solventes, agentes de ligação, adoçantes, além de realçadores sensoriais, de sabores e cores. O processamento inclui a hidrólise, a hidrogenação, a extrusão, a moldagem, a fritura e o cozimento prévios, além da adição de micronutrientes para fortificação do alimento.
Ademais, os alimentos ultraprocessados, pela sua composição, promovem o consumo excessivo e são caracterizados por apresentarem concentrações excessivas de açúcar, sal e gorduras, incluindo as saturadas e trans, e contêm pouca ou nenhuma fibra alimentar e água em sua composição (MONTEIRO et al., 2012; MOODIE et al., 2013). Um estudo realizado com escolares no Sul do Brasil mostrou que o consumo dos produtos ultraprocessados na alimentação das crianças foi associado a dietas ricas em energia, gorduras e sódio e menor teor de proteínas e fibras (BARCELOS et al., 2014). Estudo mostrou associação positiva entre a disponibilidade domiciliar de produtos ultraprocessados e obesidade ( CANELLA et al., 2014). Outro estudo no Município do Rio de Janeiro mostrou associação entre o consumo de produtos ultraprocessados e a síndrome metabólica (TAVARES et al., 2012). Recentemente, RAUBER et al. (2015), em estudo longitudinal com crianças de baixa condição socioeconômica no sul do País revelaram que o consumo de produtos ultraprocessados, na idade pré-escolar, é um preditor do aumento das concentrações de colesterol total e LDL-colesterol na idade escolar.
Com relação ao impacto social, o método mais efetivo para combater um problema de saúde pública como a obesidade e as doenças crônicas não transmissíveis, na população, é a promoção de práticas alimentares saudáveis. Mudar comportamentos que estão ligados fortemente à cultura de uma população requer estratégias massivas que alcancem vários âmbitos da comunidade. Para serem efetivas, devem ser objetivas e focadas num aspecto específico para que o impacto seja medido. Desta forma, a ideia de legislar sobre a disposição de alimentos ultraprocessados no Estado de Minas Gerais nas redes de supermercados e similares, foi inspirada na experiência do Departamento de Saúde de Nova York de legislar sobre o que os mercados disponibilizam para os clientes, em questão de porcentagem de alimentos saudáveis (http://www.nyc.gov/html/misc/html/2009/fresh.shtml).
Nessa conformidade, apresentamos este Projeto de lei, para o qual pedimos o voto favorável das senhoras e senhores membros desta Casa.
– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pelo deputado Gustavo Corrêa. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 2.282/2015, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.