PL PROJETO DE LEI 1106/2015
PROJETO DE LEI Nº 1.106/2015
Concede anistia aos servidores do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais que participaram de greve ou movimentos reivindicatórios realizados pelo sindicato de sua categoria, ocorridos em 17 de novembro de 2011 e de 23 de novembro a 14 de dezembro de 2011.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º - Fica concedida anistia aos servidores do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais que se ausentaram do serviço pela adesão à greve ou aos movimentos reivindicatórios realizados pelo sindicato de sua categoria em 17 de novembro de 2011 e de 23 de novembro a 14 de dezembro de 2011.
§ 1º - Em até trinta dias após a publicação desta lei, o servidor beneficiado que sofreu corte remuneratório deverá ter restituída a remuneração descontada, com os reflexos financeiros retroativos correspondentes.
§ 2º - Fica assegurado o cômputo do período indicado neste artigo como tempo de serviço e de contribuição, para todos os efeitos, inclusive para fins de promoções e aposentadoria.
Art. 2º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 16 de abril de 2015.
Rogério Correia
Justificação: O constituinte de 1988 assegura ao servidor público o direito à organização em sindicatos e à realização de greve.
O artigo 37, VI, da Constituição da República, assegura aos servidores o direito à livre associação sindical. No mesmo passo, o seu inciso VII prevê que “o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica”.
Não tendo ainda sido editada tal lei, o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento dos Mandados de Injunção nº 670, 708 e 712, definiu que, até que o Congresso Nacional edite a lei específica de que trata o artigo 37, VII da Constituição da República, aplicar-se-á, no que couber, a Lei nº 7.783, de 1989 - Lei Geral de Greve.
A decisão emanada pelo Supremo Tribunal Federal constitui um importante avanço no sentido de assegurar aos servidores públicos o pleno exercício do direito de greve.
Entretanto, os termos da Lei nº 7.783, de 1989, são insuficientes no que toca à garantia aos servidores públicos de que não terão os dias de greve marcados como faltas e que, por consequência, não serão prejudicados futuramente em questões como aposentadoria, progressão funcional e não realização de descontos de sua remuneração.
A Lei Geral de Greve determina em seu artigo 6º, § 2º, que “é vedado às empresas adotar meios para constranger o empregado ao comparecimento ao trabalho, bem como capazes de frustrar a divulgação do movimento”.
O que se vê atualmente é que os servidores públicos encontram-se numa situação de desigualdade de armas com relação à administração, pois, parte dos órgãos públicos opta pelo desconto remuneratório automático dos servidores por suposta identidade com a falta injustificada, equivalência vedada pelo Supremo Tribunal Federal.
É certo que o temor de que serão descontados os dias parados, ou que serão lançadas faltas injustificadas na ficha funcional do servidor, com as consequências negativas daí advindas, acaba por desestimulá-lo a aderir ao movimento, mesmo que assim deseje.
Sendo o direito à greve um direito fundamental social constitucionalmente assegurado, é certo que as questões que surjam relativamente aos limites de seu exercício devem ser resolvidas segundo a ótica da interpretação dos princípios constitucionais.
Também é certo que, em se tratando de interpretação e aplicação de normas que versem sobre direitos fundamentais, há que se homenagear o princípio da máxima eficácia e máxima efetividade, segundo o qual deve se rechaçar qualquer interpretação ou disposição legal que vise limitar, diminuir ou restringir a aplicação e a efetividade de tais direitos.
Tal regra é imperativo extraído do próprio Texto Constitucional, como bem assevera Gisela Maria Bester:
“Conforme velhas lições deixadas por Francisco Campos, ‘uma cláusula constitucional não é uma caixinha de segredos, de que os prestidigitadores extraem os mais heterogêneos objetos.’ Nesse sentido, embora exista uma abertura interpretativa muito grande no que diz respeito ao Texto Constitucional brasileiro de 1988, notadamente pelo número de princípios que trouxe - muitos novos - e por cláusulas de abertura constitucional facilmente identificáveis, há que haver uma postura de fidelidade constitucional por parte de todos aqueles que por ela têm reconhecidos não só direitos mas também recebido deveres fundamentais. Dentre seus destinatários, assomam com especial destaque aqueles que prioritariamente possuem o dever de guardar e respeitar a Constituição: os três Poderes por ela constituídos, que juram solenemente cumpri-la e defendê-la (conforme teor do pouco lembrado art. 1º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias).
Entendo essa fidelidade constitucional como o exercício da interpretação dos preceitos constitucionais da forma mais adequada possível, e uma interpretação adequada das normas constitucionais que tratam de direitos fundamentais, no contexto da Constituição de 1988 tem necessariamente que se pautar pelos deveres impostos ao intérprete pelos §§1º e 2º do seu art. 5º, respectivamente: máxima eficácia e efetividade das normas definidoras de direitos fundamentais pela obrigatoriedade de sua aplicabilidade imediata e abertura constitucional para o reconhecimento de novos direitos fundamentais.”¹
Nesse sentido, o direito de greve do servidor público não pode sofrer limitações outras que não as já expressas na Constituição, quais sejam, a necessidade de atendimento das necessidades urgentes da população e a vedação à greve abusiva.
Tais limitações só devem se dar, obviamente, na medida em que sejam indispensáveis para assegurar os ditames constitucionais supracitados. Também é óbvio que, entre as várias limitações e ferramentas jurídicas disponíveis, deve-se escolher aquelas menos limitadoras.
De igual forma, não se pode cogitar de uma limitação que acabe por impedir ou esvaziar o exercício do direito fundamental de greve por parte dos servidores públicos.
O desconto de dias parados ou o lançamento de faltas são medidas que oneram individualmente cada um dos servidores que decidirem pela adesão ao movimento, constrangendo os trabalhadores em franca violação não só ao Texto Constitucional, mas também até mesmo ao art. 6º, § 2º, da Lei nº 7.783, de 1989.
Ainda conforme a Lei nº 869, de 1952 – Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado de Minas Gerais – , em seu art. 205, somente pode ocorrer a incidência de descontos na remuneração dos servidores quando há previsão legal, hipótese que não contempla a ausência por adesão à greve.
Além disso, por analogia, a vedação ao desconto remuneratório automático também deriva do art. 45 da Lei Federal nº 8112, de 1990, salvo por imposição legal ou mandado judicial, o que agrava a punição sofrida pelos servidores do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais pelo legítimo exercício de direito constitucional.
No estado atual de coisas, é sempre e exclusivamente administrativa a determinação de descontar a remuneração, não havendo por parte dos servidores uma forma de impedir tal decisão administrativa.
Assim, gera-se uma situação de enfrentamento e conflito de interesses entre os servidores públicos e as entidades de classe destinadas a proteger seus interesses, o que certamente fere de morte o exercício de tal direito que, muito embora seja de caráter individual, tem sua eficácia e efetividade anuladas quando não é exercido coletivamente e com adesão sólida de toda a categoria.
Assim, deve ser rechaçada toda e qualquer atitude da administração pública que acabe por desestimular o servidor a aderir a movimento paredista mediante o risco de represálias ou consequências no campo individual.
Atualmente, vários outros mecanismos podem ser adotados pela administração com o fim de assegurar que os serviços públicos essenciais sejam prestados em tempo de greve, garantindo que haja a compensação do trabalho não realizado nos dias parados.
Ato contínuo, o desconto dos dias parados e o lançamento de faltas não são convenientes nem mesmo à administração, vez que a esta, bem assim à própria sociedade, interessa, em última análise, que o servidor público trabalhe e desempenhe suas funções.
Sem dúvida que a imediata opção pelo desconto dos dias parados sem sequer dar ao servidor a possibilidade de compensá-los configura restrição injustificável ao direito constitucional à greve, violando o já citado princípio constitucional da máxima efetividade dos direitos fundamentais, além dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Isso porque, partindo-se da conclusão óbvia de que servidores se sentirão coagidos a não aderir ao movimento ante a iminência, ou mesmo certeza, dos descontos dos dias parados e registro de faltas injustificadas configuram limitação ao direito de greve do servidor público.
Conquanto a limitação de um direito constitucionalmente assegurado só possa se dar na medida em que seja necessária para a harmonização de tal direito com outro dispositivo constitucional, eventual prerrogativa da administração de optar primeiramente pelo corte de ponto se revela absolutamente inútil no sentido de harmonizar o direito de greve dos servidores com o direito da população de ter assegurados os serviços públicos essenciais e as suas necessidades inadiáveis.
Do ponto de vista da preservação do erário, a compensação ou a reposição de horas também não configuram prejuízo, eis que inevitavelmente haverá nas duas hipóteses a contraprestação do serviço frente ao pagamento da remuneração.
Sem a greve, em uma relação de trabalho que aguarde apenas o reconhecimento espontâneo do Estado, o quadro remuneratório e de carreira desgastam-se gradativamente, prejudicando também o interesse público na prestação de serviço de qualidade, realizado por profissionais credenciados e comprometidos com o cidadão/usuário.
¹ BESTER, Gisela Maria. Dezesseis anos de Constituição Federal, STF e interpretação retrospectiva: Prejuízos aos Direitos Fundamentais pela falta de vontade de constituição. In ROCHA, Fernando Luiz Ximenes e MORAES, Filomeno (coord). Direito Constitucional Contemporâneo - Estudos em homenagem ao professor Paulo Bonavides. Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 335-336.
- Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça, de Administração Pública e de Fiscalização Financeira para parecer, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, do Regimento Interno.