PL PROJETO DE LEI 835/2011
Projeto de Lei nº 835/2011
(Ex-Projeto de Lei nº 1.105/2007)
Cria o Programa Mineiro Solidário de Incentivo à Produção e Consumo de Biodiesel - SOLDIESEL - e dá outras providências.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º - Fica criado, no âmbito do Estado de Minas Gerais, o Programa Mineiro Solidário de Incentivo à Produção e Consumo de Biodiesel - SOLDIESEL.
Art. 2º - Compete ao Poder Executivo, na administração e na gerência do programa:
I - identificar e delimitar áreas propícias e adequadas ao plantio de oleaginosas voltadas à produção de biodiesel, zelando pela qualidade do produto, em conformidade com as exigências tecnológicas e ambientais estabelecidas pela legislação;
II - identificar, no âmbito do programa, as áreas aptas a projetos de assentamento rural e incentivar nelas a prática de produção de oleaginosas destinadas ao biodiesel de maneira sustentável;
III - registrar e fiscalizar as unidades de plantio e produção, respeitadas as atribuições legais da ANP e da lei do petróleo, fomentando a criação de estruturas produtivas cooperativadas e solidárias;
IV - incentivar a comercialização e exportação de óleos transesterificados, ou destinados à transesterificação, incluindo os créditos de carbono, favorecendo o desenvolvimento técnico e econômico dos produtores;
V - desenvolver e apoiar pesquisas e experimentos que visem à melhoria da qualidade e da quantidade das fontes de óleo destinadas ao biodiesel, bem como dos métodos de sua produção;
VI - apoiar pesquisas destinadas ao aproveitamento de subprodutos do processo de produção de biodiesel, principalmente a glicerina e a torta resultante do esmagamento de grãos;
VII - estimular e apoiar a reciclagem de matérias graxas de origens animal e vegetal na produção de biodiesel;
VIII - desenvolver ações que propiciem a criação ou a ampliação do mercado de consumidores finais de biodiesel, notadamente nos setores públicos estadual e municipal, de mineração, transporte de passageiros e cargas, e junto aos demais setores envolvidos com o agronegócio;
IX - criar mecanismos legais e fiscais para o uso de patrimônio fundiário público em projetos de educação profissional de jovens, bem como de reeducação da população prisional, vinculados à produção do biodiesel e dos seus subprodutos;
X - celebrar convênios com entidades de direito público ou privado, observado o disposto no art. 62, XXV, da Constituição do Estado, visando a fortalecer e disseminar o uso do biodiesel e os subprodutos a ele associados.
Art. 3º - O somatório das áreas destinadas ao plantio de oleaginosas para a produção de biodiesel será classificado como Área de Proteção Ambiental II, em conformidade com a alínea "c", item III, do Anexo IV da Lei nº 13.803, de 27 de dezembro de 2000.
§ 1º - O Fator de Conservação para Categoria de Manejo de Unidade de Conservação a ser aplicado na área a que se refere este artigo será de 1,0.
§ 2º - A apuração da área plantada e da destinação do que foi produzido será realizada pela EMATER ao final do ano agrícola.
Art. 4º - As ações governamentais relativas à implementação do Programa Mineiro Solidário de Incentivo à Produção e Consumo de Biodiesel - SOLDIESEL - contarão com a participação de representantes dos produtores, dos consumidores finais e de pesquisadores das áreas de que trata o art. 2º desta lei.
Parágrafo único - O Governo do Estado implantará um Comitê Gestor do Programa Mineiro Solidário de Incentivo à Produção e Consumo de Biodiesel - SOLDIESEL – com a participação necessária de representantes das Secretarias de Estado de Desenvolvimento Social e Esportes - SEDESE -, de Desenvolvimento Econômico - SEDE -, de Ciência e Tecnologia - SECT -, da Agricultura - SEAG -, do Meio Ambiente - SEMAD -, do Planejamento e Gestão - SEPLAG -, e outras áreas governamentais pertinentes, além de representantes dos setores produtivo e empresarial e de consumidores.
Art. 5º - O Poder Executivo regulamentará esta lei no prazo de noventa dias a contar da data de sua publicação.
Art. 6º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, observado o disposto no art. 161, I, da Constituição do Estado.
Sala das Reuniões, 29 de março de 2011.
Carlos Pimenta
Justificação:
O MARCO LEGAL
A Medida Provisória n° 214, de 13/9/2004, ao propor alterações na Lei nº 9.478, de 1997, define o biodiesel como um combustível para motores a combustão interna com ignição por compressão, renovável e biodegradável, derivado de óleos vegetais ou de gorduras animais, que pode substituir parcial ou totalmente o óleo diesel de origem fóssil. Essa mesma medida provisória atribui à Agencia Nacional de Petróleo - ANP - a responsabilidade de regular e autorizar as atividades relacionadas com a produção, a estocagem, a distribuição e a revenda de biodiesel, fiscalizando-as diretamente ou mediante convênios com outros órgãos da União, dos Estados, do Distrito Federal ou de municípios. Além dessas modificações, a Medida Provisória nº 214/2004 alterou a Lei nº 9.847, de 1999, considerando o abastecimento nacional de combustíveis como de utilidade pública, e incorporou as seguintes atividades: produção, importação, exportação, armazenagem, estocagem, distribuição, revenda e comercialização de biodiesel.
O disposto nas Leis nºs 9.478, de 1997, e 9.847, de 1999, bem como outras resoluções da Agência Nacional de Petróleo - ANP -, que se vêm sucedendo, desde 2003, estabelecem um marco legal, ainda que incompleto e sujeito a futuras alterações, no tocante às complexas questões envolvendo a produção, a distribuição e o consumo do biodiesel e seus derivados (como no caso dos créditos de carbono). Os dispositivos legais exarados em nível federal não impedem que os entes federados possam estabelecer normas complementares que venham fortalecer ou subsidiar o sucesso no uso dos biocombustíveis. Este é o caso da Lei nº 13.803, de 27/12/2000, que estabelece normas para distribuição do ICMS. O estímulo à produção de biodiesel nos municípios mineiros será recompensado por uma maior ponderação do fator de conservação para categoria de manejo de unidade de conservação.
A VISÃO ESTRATÉGICA DO GOVERNO ESTADUAL
Nas orientações para o quadriênio 2003-2006, o Governo mineiro formulou a visão de futuro que nos anima: tornar Minas Gerais o melhor Estado para se viver; mas esse patamar somente será alcançado a partir de uma "grande aliança para o desenvolvimento de Minas, congregando esforços dos poderes públicos estadual e municipal, do setor privado e dos setores organizados da sociedade mineira". Isso implicará a colaboração de toda a sociedade e da própria administração pública, num elevado sentimento de auto-estima e de confiança, configurando o caminho estratégico a ser trilhado. Uma das opções assumidas pelo Governo de Minas Gerais, em sintonia com a concepção mais geral da administração do Estado, a qual vai pautar todas as propostas aqui indicadas, é a de "promover o desenvolvimento econômico e social em bases sustentáveis", vale dizer gerando e distribuindo benefícios sem comprometer a perenidade das fontes de riqueza.
Reconhecendo que as políticas públicas haverão de considerar, na sua implantação, a geração de emprego e renda, a inclusão social e a sustentabilidade das atividades produtivas, o Governo mineiro acrescenta a exigência dos desafios gestados do surgimento de uma nova sociedade, derivada dos avanços técnicos e científicos, ou seja, a sociedade do conhecimento. De fato, a sociedade contemporânea está alicerçada em três pilares tecnológicos: o energético, o microeletrônico e o biotecnológico, considerados "portadores de futuro", nos quais se deve investir para haver diversificação das fontes de riqueza social. Os avanços sucessivos e incontroláveis na dinâmica dessas três dimensões delineiam as possibilidades (que os diferentes grupos sociais têm), de serem considerados incluídos ou co-partícipes de determinada onda civilizatória. As conseqüências imediatas da inserção diferencial no ciclo das revoluções tecnológicas e científicas (definidoras daqueles pilares) estão no estabelecimento de vanguardas e retaguardas produtivas que coexistem e se articulam em complexos padrões de relacionamento, criando entre si relações de autonomia ou heteronomia, com implicações no grau de acesso ao bem-estar social e à prosperidade coletiva.
O extraordinário grau de desigualdade social observado entre nós, brasileiros, permitindo que ilhas de riqueza sobrevivam envoltas por um verdadeiro mar de pobreza, apresenta ao poder público o desafio de romper essa estrutura autoperpetuante. A resposta clássica do assistencialismo compensatório já demonstrou sua ineficácia em situações e países com o perfil do nosso País. Cabe imaginar alternativas que não se reduzam a minorar os efeitos perversos do atual estilo de desenvolvimento, construindo saídas que aproximem nossas vanguardas produtivas das imensas retaguardas que hoje sobrevivem num padrão próximo ao da África sub-sahariana. A expressão quantitativa desse fenômeno se encontra nos índices de desenvolvimento humano - IDH - encontrados em diferentes regiões, levando Minas Gerais a ocupar o 11º lugar no ranking brasileiro, posição incompatível com o peso político, econômico e social do Estado no conjunto da federação. Entre os 853 municípios mineiros observa-se, também, um hiato entre aqueles com maior grau de IDH e os com menor grau, numa reprodução regional do padrão encontrado no País (Cf. IDH do Brasil e dos municípios mineiros).
Os compromissos mundialmente acertados para promover o desenvolvimento com justiça social respondem, também, à necessidade histórica de erradicar os diferenciais que mantêm o povo brasileiro vivenciando, há séculos, o quadro negativo baseado em questões de classe, de gênero e de etnia. Promover ações que contribuam para a erradicação da pobreza e da desigualdade beneficiará, principalmente, milhões de trabalhadores de todos os tipos, além de mulheres e de afro-descendentes situados nos mais baixos patamares da escala social. O fortalecimento efetivo desses herdeiros da secular injustiça que marca a história brasileira será alcançado não com medidas assistencialistas ou compensatórias, mas com instrumentos integradores e solidários.
A criação de um nicho solidário auto-sustentável, no caso mineiro, aponta para o setor da energia como um caminho a ser explorado, por paradoxal que possa parecer tal empreitada, pela associação costumeira do fator energético com a idéia de grandes empreendimentos. Energia remete, quase sempre, a imagens de mega-estruturas de hidroeletricidade, de petróleo, de carvão mineral, de combustível nuclear etc.; um reino de gigantes onde não se imagina haver lugar para a participação dos pequenos. Mas os avanços organizacionais observados em todo o mundo sinalizam para o enorme potencial de estruturas em rede, acarretando um modelo institucional em tudo superior ao clássico arranjo taylorista. Combinando cooperação com inovação, agrupamentos de pequenas empresas - flexíveis e competentes - conseguem alcançar, na atualidade, resultados empresariais de alto significado social, deixando para os arquivos da história a suposição de que um único destino estaria reservado às organizações produtivas. De fato, hoje há expansão, não necessariamente "para cima" mas, sim, "para os lados", projetando um crescimento horizontal com muito maior força que a mera dilatação de pesadas estruturas verticalizadas. Mais significativa, ainda, é a possibilidade de articular setores tecnologicamente atrasados com outros operando na ponta do conhecimento, permitindo uma interação dinâmica que resulte numa solidária integração de coetâneos, porém não contemporâneos.
O Plano de Governo para o período 2003/2006 já apontava a necessidade de atuação mais efetiva de Minas Gerais no campo da energia renovável, postulando, entre outras coisas, a constituição de uma Comissão para "definir políticas e sua implementação, visando aumentar a produção e o uso da biomassa e da energia solar, com a conseqüente oportunidade de criação de novos empregos nas localidades e nas regiões". Em observância a essas diretrizes programáticas, pretende-se criar uma rede de produção de éster graxo, ou biodiesel, alavancando a economia mineira de forma sustentável, pela mobilização dos recursos da ciência e da tecnologia já dominados, para o favorecimento das regiões mais pobres e dos grupos mais excluídos. Isso se dará quer através de ações que favoreçam a implantação de agro-indústrias energéticas, quer através de medidas que possibilitem a reciclagem de resíduos industriais ou domésticos para produção de combustível.
O BIODIESEL E SEUS SUBPRODUTOS
Na produção do biodiesel não são gerados resíduos sólidos, e os líquidos resultantes são biodegradáveis, não causando lesões ambientais. São subprodutos para o biodiesel obtido de óleos virgens: o farelo, ou torta, de valor excepcional para ração animal e como adubo (a torta de mamona, por exemplo, combate os nematóides do solo), e a glicerina vegetal, da qual derivam insumos para produção de acrilatos, fármacos, cosméticos, polímeros, tintas, explosivos, aditivos, alimentos e outros intermediários como álcool butílico, ácidos etc. Agregue-se a esses subprodutos os Certificados de Redução de Emissão de Dióxido de Carbono, com vistas ao Fundo Protótipo de Carbono - PCF -, pela redução das emissões de gases poluentes, além dos créditos de "seqüestro de carbono", através do Fundo Bio de Carbono - CBF, administrados pelo Banco Mundial.
O biodiesel reciclado compreende outra linha de atuação do Programa Mineiro Solidário de Incentivo à Produção e Consumo de Biodiesel - SOLDIESEL -, complementar e não conflitante com aquela fundada no agronegócio. Pretende aproximar os setores populares, principalmente os localizados nos grandes centros urbanos de Minas Gerais (e que já estejam envolvidos com projetos de reciclagem ou de reaproveitamento de resíduos), da tecnologia de produção do éster graxo a partir de óleos de fritura descartados. Se na produção de biodiesel a partir do óleo virgem (mamona, pinhão manso, girassol etc.) o conceito fundante é o do agronegócio (onde os princípios organizadores são mobilização e cooperação), no caso da produção do éster a partir de óleos de fritura usados a lógica prevalecente é da reciclagem, e os princípios estruturadores passam a ser os de mobilização e de solidariedade.
OS IMPACTOS SOCIAIS NA PRODUÇÃO DO BIODIESEL
O desenvolvimento social de Minas Gerais pautado no incremento de nossa poupança interna, ao dinamizar nossa economia, permite que os padrões de prosperidade sejam alargados, com reflexos positivos no IDH estadual. A estratégia adotada, de promover o desenvolvimento local por meio da substituição de importação de um insumo essencial para as atividades econômicas - o diesel -, fortalecerá a vida produtiva ao estimular a criação de inúmeras atividades industriais, como moendas, alambiques, caldeiras, torres de destilação etc., além da ampliação do consumo popular, gerando bem-estar coletivo em todo o Estado. Não se pode esquecer, ainda, que esse programa possibilitará a absorção de trabalhadores menos qualificados no campo e na cidade, reduzindo a pressão sobre o mercado de trabalho do contingente excessivo de trabalhadores de baixa qualificação e viabilizando uma maior expansão dos salários desses trabalhadores no mercado. Tal política gerará mecanismos virtuosos de distribuição de renda, propiciando verdadeiro desenvolvimento em Minas Gerais, sem perda da competitividade e da produtividade da economia, além de se constituir numa nova matriz de articulação dos setores mais dinâmicos com aqueles excluídos historicamente dos benefícios do crescimento econômico.
Deve ser considerada ainda a situação de áreas receptoras de grandes investimentos na construção pesada (empreendimentos mineradores, hidrelétricas etc.), que atraem significativo número de pessoas em busca de alguma oportunidade para neles trabalharem, e que se vêem diante do desafio de posterior integração, após findadas as obras. O Programa de Biodiesel mineiro poderá ser a saída estratégica para o realocamento desses trabalhadores, sazonais ou não, mostrando um caminho para o day after, ou seja, propondo uma rota para integrar produtivamente a força de trabalho e outras energias sociais que ficarem disponíveis após o término de investimentos em grandes empreendimentos ligados à construção pesada.
Os impactos regionais nos vales do Mucuri e do Jequitinhonha e no Norte de Minas
Há poucas estratégias possíveis de gerar processos de crescimento econômico sustentável e virtuoso em regiões áridas ou semi-áridas, como é o caso das regiões dos vales do Mucuri e Jequitinhonha e o Norte de Minas. A menos que se descubra a maneira de explorar algum valioso recurso lá existente, as condições de sobrevivência humana em tais regiões se tornam ingratas e cruéis. A simples escassez ou intermitência severa de chuvas faz inútil até mesmo terrenos férteis que, a longo prazo, caminham para a desertificação. A conseqüência é a demanda por ações minoradoras do sofrimento e da miséria. Pela premência de resultados, conjugada com a complexidade do problema, a imposição e a regra têm sido o estabelecimento de intervenções assistencialistas, que contornam provisória e eventualmente os dramas imediatos, sem se constituírem em verdadeira solução para os interessados.
Nesta proposta, o biodiesel é instrumentalizado para ser resposta adequada, eficaz, eficiente e efetiva para o desenvolvimento de regiões com as dos vales do Mucuri e Jequitinhonha e o Norte de Minas. Nelas, o biodiesel é contemplado como instrumento para se tornar base econômica das microrregiões e dos municípios onde o programa vier a ser implementado. O elemento propiciador e inspirador, no caso, é a possibilidade de sucesso da cultura de oleaginosas, como a mamona e o pinhão manso, como insumos favoráveis para a produção de combustível vegetal e outros subprodutos, além da viabilidade de tais culturas nessas áreas historicamente desfavorecidas. A própria estrutura fundiária da região semi-árida mineira, onde 90% das propriedades possuem menos de 100 hectares, já sinaliza para o potencial dessas culturas, em tudo vocacionadas para a pequena propriedade e a agricultura familiar.
Regiões destinadas a assentamentos rurais e a projetos de reforma agrária podem ser dinamizadas com a construção de pequenas usinas de produção de biodiesel, levando os assentados atuais e futuros a terem uma fonte segura de renda, sem prejuízo de outras atividades agrícolas destinadas à produção de alimentos.
OS IMPACTOS AMBIENTAIS
Por ser produzido a partir de fontes renováveis e ser biodegradável, o biodiesel é essencialmente um combustível de caráter ecológico comprovado em testes técnico-ambientais em vários países, como Alemanha, Áustria, Austrália, Estados Unidos, Argentina, Nicarágua, Índia, Mali e outros, e por grupos de pesquisa instalados no Brasil em diferentes Estados (Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul etc.). Lugar de destaque neste conhecimento já acumulado fica reservado ao CETEC, vinculado à Secretaria de Ciência e Tecnologia, que não só já mapeou, no início dos anos 80 do século passado, as possibilidades de aproveitamento de inúmeras oleaginosas em Minas Gerais para produção de biodiesel, como estudou detalhadamente sua cinética, num memorável trabalho reconhecido em toda a comunidade científica pelo seu pioneirismo.
A natureza do biodiesel (ecológico, sustentável e democratizador do bem-estar), faz dele uma commodity pública (onde os benefícios coletivos são preponderantes), em contraposição às commodities privadas (típicas de bens de consumo individualizados). Nas grandes cidades e nas regiões metropolitanas existentes em Minas Gerais, onde o consumo do petrodiesel é parte importante do custo de moradia e do trabalho, o uso do biodiesel poderá ser estimulado nos grandes transportadores de passageiros e de cargas, acarretando melhorias em termos de qualidade de vida coletiva (com a redução da poluição ambiental e seus desdobramentos na saúde da população), além da socialização dos benefícios econômicos, atingindo não só os trabalhadores como o setor empresarial em geral. Transportes coletivos mais baratos e mais limpos geram resultados positivos para o poder público, para os empregadores e para os trabalhadores em seu conjunto. O programa de biodiesel, portanto, configuraria uma verdadeira política de transmissão de produtividade aos rendimentos das famílias trabalhadoras ao contribuir para a redução dos preços dos bens de consumo popular.
A ORGANIZAÇÃO DAS ESTRUTURAS PRODUTIVAS
O novo quadro desejado para Minas Gerais é aquele onde pequenos produtores, organizados em sistema coletivo de produção (quer como associação, quer como cooperativa, quer como "empresa de participação comunitária"), participem, direta ou indiretamente, de todas as fases do processo produtivo que se pretende implementar. Assim, conjuntos de famílias ou de produtores independentes podem, por exemplo, trabalhar fornecendo não só os insumos para uma planta industrial de biodiesel mas, também, serem co-proprietários do negócio, auferindo parte dos benefícios resultantes do empreendimento como um todo. A democratização da propriedade e da prosperidade acarretará um ambiente social mais justo, diminuindo simultaneamente a pobreza e a desigualdade. Preferencialmente, essas pequenas unidades produtoras de biodiesel, operando articuladamente com diferentes setores empresariais e governamentais, darão substância a um tipo de parceria pública e privada, de natureza descentralizada, com foco no desenvolvimento social e, não somente, nos aspectos meramente econômicos de se buscar o máximo de acumulação em favor de poucos. Os resultados do agronegócio brasileiro, aliás, mostram o quanto é possível haver grandes ganhos financeiros sem sua correlata democratização. O quadro que perseguimos é coerente com recomendações recentes do Banco Mundial, indicando que o crescimento econômico não acaba, necessariamente, com a pobreza e a desigualdade.
A cadeia lógica dos empreendimentos que se pretende fomentar pode ser assim representada:
PROGRAMA MINEIRO DE BIODIESEL Agronegócio + (Reciclagem) |
Produtores de (mamona, pinhão manso, algodão, girassol, etc.) |
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ÓLEO VIRGEM |
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TORTA (Adubo, aves, bovinos, suínos) |
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Bares, Hotéis, Restaurantes e Famílias |
ÓLEO DE FRITURA USADO |
ÉSTER GRAXO (Biodiesel) (motores, máquinas, ônibus, barcos, caminhões) |
GLICERINA (Cosméticos, fármacos, polímeros, aditivos, etc.) |
CRÉDITOS DE CARBONO |
Essas vinculações configuram um poderoso elemento estruturador do programa pretendido, na medida em que deverá contemplar ações que garantam a viabilidade e a sustentabilidade econômica das atividades produtivas que promoverá. Assim, não cuidará apenas da promoção da produção agrícola dos insumos (óleo e álcool, principalmente) e seu processamento primário. Englobará, também, a garantia de colocação do produto, os processos de logística e comercialização bem como as atividades de pesquisa e assistência técnica nos aspectos tecnológicos, produtivos e mercadológicos. Mais do que uma intervenção dinamizadora, o que se espera como resultado deste programa é uma intervenção estruturadora de ordem econômica e social, gerando efeitos inovadores e estratégicos para toda a sociedade mineira.
Outro componente na produção do éster graxo - o álcool anidro - que entra na composição do biodiesel na proporção de aproximadamente 12%, sinaliza também para o fortalecimento e ampliação da indústria alcooleira. No caso brasileiro, as nossas condições indicam a necessária opção pelo etanol, em detrimento do metanol, pela comprovada capacidade do País de produzir álcool a partir de cana-de-açúcar em grande escala, de maneira descentralizada, característica, aliás, de programas de produção de energia a partir da biomassa. A associação de pequenas unidades produtoras de biodiesel com suas correspondentes unidades de produção de etanol possibilitaria democratizar o agronegócio em escala nunca alcançada no Brasil.
O desenvolvimento social em Minas Gerais será tão mais expressivo se o enorme potencial produtivo do biodiesel for associado ao pequeno produtor, organizado em estruturas solidárias, de maneira a generalizar mais os benefícios da parceria com o poder público. Apesar de não haver obstáculos tecnológicos (nem gerenciais), para a formação de grandes ou médios centros de produção de biodiesel, pretende-se que em Minas Gerais a prioridade seja, inicialmente, a de trabalhar com micro unidades (com potencial produtivo de até um milhão de litros anuais) e pequenas unidades (com potencial de produção entre um e cinco milhões de litros anuais). Essa opção estaria em consonância não só com a múltipla e complexa realidade mineira como, também, com o propósito maior do Governo mineiro: fazer Minas crescer, com justiça social e investindo no homem.
Unidades de menor porte têm condições de atender a demandas localizadas (em empreendimentos, instituições ou serviços), exigindo uma logística de distribuição simplificada, desonerando assim os custos de produção. Não são poucos os pequenos municípios mineiros (entre os 853 existentes), que despendem grandes somas (para os padrões locais) na aquisição de óleo diesel para alimentar seus ônibus, caminhões, tratores e outras máquinas pesadas. Prefeituras de municípios empobrecidos e com obrigações intransferíveis (como o transporte de alunos de zona rural para escolas nucleadas) chegam a consumir mais de 20 mil litros por mês de óleo diesel em suas diferentes atividades. Consórcios entre grupos de três a quatro Prefeituras possibilitariam a elas a construção de unidades de produção de biodiesel para atendimento de suas demandas, envolvendo pequenos produtores distribuídos por suas comunidades. Com efeito, uma Prefeitura dessas continuaria a comprar seus 20 mil litros de óleo mensalmente, como sempre fez e fazia; a diferença é que o dinheiro permanecerá agora dentro do município, ativando a vida econômica local, diferentemente de quando os recursos estavam sendo enviados para fora da cidade.
Na mesma linha de raciocínio, pode-se imaginar a organização de unidades para o atendimento de demandas da indústria de construção pesada (em grandes obras, tipo barragens), de mineradoras, de transportadoras (de carga ou passageiros) e atividades do agronegócio (em parceria, por exemplo, com assentamentos de reforma agrária). Esse consumo institucional permitiria que o biodiesel utilizado fosse o B-100, ou seja, 100% puro. Essa alternativa dispensaria o processo de mistura com o petrodiesel (para se ter o B2, B5, B10 ou B20 ou outro mix qualquer), eliminando os ônus correspondentes. Poderia ser entendido quase como uma produção para auto-consumo, dispensando a intervenção das grandes estruturas usuais de intermediação e distribuição. Evidentemente, alguns setores empresariais poderão manter o propósito de produzir o biodiesel para posterior mistura em blendeds regularmente aceitos no mercado interno, ou para exportação, como mais uma unidade de seu conjunto de negócios. Entretanto, as exigências de responsabilidade social feitas às empresas colocam-nas como parceiras vocacionadas do desenvolvimento solidário e sustentável, abrindo espaço para a construção de estruturas de colaboração, onde as boas empresas exercem mais o papel de liderança que o de controle sobre o desenvolvimento local.
Veja-se o caso das atividades mineradoras que, em geral, recebem grandes questionamentos das comunidades nas áreas onde ocorrem. As empresas de mineração, principalmente as que operam a céu aberto, costumam ser responsabilizadas pela degradação ambiental, pela poluição das terras, das águas e do ar, sem falar no esgotamento de riquezas naturais não renováveis, e mais um amplo elenco de queixas e demandas. Entre essas, ressalte-se a questão da geração de trabalho e outras formas de emprego, que se acirram a cada agravamento da crise social do País. O apoio e a parceria na construção de unidades de biodiesel atenderia às necessidades de combustível dessas empresas e dinamizaria a economia local onde estivessem estabelecidas (ou em sua área de influência), gerando benefícios para todos, tangíveis para uns e intangíveis para outros (do tipo melhoria de imagem pública e obtenção de certificados ISO 14.001). Minério de ferro, por exemplo, poderia ser considerado como "minério verde", quando destinado a exportação, agregando valor pelo uso de insumo ecologicamente correto. Áreas degradadas poderiam ser reflorestadas com fontes de oleaginosas (do tipo pinhão manso, que é cultura permanente), num esforço conjunto envolvendo empresas, o poder público local e o estadual, entidades internacionais, sindicatos e outras associações populares e comunitárias.
- Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça, de Minas e Energia e de Fiscalização Financeira para parecer, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, do Regimento Interno.