PL PROJETO DE LEI 2309/2020

Parecer para O 2º TURNO do Projeto de Lei Nº 2.309/2020

(Nova redação, nos termos do § 1º do art. 138 do Regimento Interno)

Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher

Relatório

De autoria das deputadas Andréia de Jesus, Leninha, Beatriz Cerqueira e Ana Paula Siqueira, o Projeto de Lei nº 2.309/2020 cria o Programa de Enfrentamento ao Assédio e Violência Política Contra a Mulher, no âmbito do Estado.

Aprovado no 1º turno na forma do Substitutivo nº 1, retorna agora o projeto a esta comissão para receber parecer para o 2º turno, nos termos do art. 102, XXII, combinado com o art. 189, do Regimento Interno.

Durante a discussão do parecer, em reunião realizada no dia 31/8/2023, foi acatada sugestão de emenda do deputado Bruno Engler, dando ensejo à apresentação de novo parecer, nos termos do §1º do art. 138 do Regimento Interno.

Segue, anexa, a redação do vencido, que é parte deste parecer.

Fundamentação

O Projeto de Lei nº 2.309/2020 objetiva criar, na esfera estadual, um programa para prevenir e enfrentar o assédio e a violência política contra a mulher, visando alcançar atos individuais ou coletivos que possam ser assim identificados ou caracterizados e buscando atender as mulheres em sua diversidade, de modo a assegurar o pleno exercício de seus direitos, consoante o disposto na Constituição Federal (inciso I do art. 5º) e nos tratados e instrumentos internacionais de direitos humanos das mulheres, entre eles a Comissão sobre o Estatuto das Mulheres da ONU. Para tanto, dispõe detalhadamente sobre aspectos como os objetivos do referido programa, algumas definições centrais para a aplicação e interpretação de seu teor, o alcance da obrigatoriedade de sua observância, as possibilidades de denúncia.

Na tramitação da matéria no 1º turno, a Comissão de Constituição e Justiça ressaltou que o debate acerca do tema violência política contra a mulher tem ganhado relevo tanto no âmbito nacional quanto no internacional, especialmente devido ao número crescente de casos registrados. Segundo a comissão, esse tipo de violência deriva da relação entre a violência política em geral e a especifidade de condutas ou omissões estruturadas a partir de padrões sociais discriminatórios contra a mulher. Pode manifestar-se de forma direta ou por terceiros e visa anular, depreciar ou obstaculizar o exercício dos direitos políticos das mulheres pelo simples fato de serem mulheres, também considerando aspectos da interseccionalidade. A comissão mencionou a Lei Federal nº 11.340, de 7/8/2006 – Lei Maria da Penha – e também a Lei Federal nº 14.192, de 4/8/2021, a qual estabelece normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher e modifica outras normas para estabelecer que a violência política contra a mulher constitui crime. Segundo a comissão, ambas as normas, assim como a proposição aqui em análise, amparam-se no princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres, em consonância com o prescrito pela Constituição Federal, e inexiste vedação constitucional para que o Estado trate da matéria mediante lei. Todavia, a comissão verificou existir vício quanto à elaboração e execução de programa, atribuições do Poder Executivo. Assim, apresentou o Substitutivo nº 1, com vistas a instituir uma política de combate à violência política contra a mulher no Estado, texto em consonância com as orientações da Cartilha sobre Violência Política de Gênero, elaborada pelo Observatório Nacional da Violência Política contra a Mulher e publicada com apoio do Tribunal Superior Eleitoral.

Esta Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher corroborou as ponderações trazidas pelo parecer da comissão precedente, bem como endossou os argumentos contidos na justificação apresentada pelas autoras do projeto em tela. Ressaltou que as mulheres devem ser consideradas em toda a sua diversidade (cor, raça, etnia, religiosidade, classe social, orientação sexual) e a premência de assegurar às mulheres todos os direitos e a plena igualdade em relação aos homens. Afirmou que a sub-representação das mulheres no exercício de mandatos eletivos é reflexo da existência da violência política na prática. Diante da complexidade da matéria, entendeu ser pertinente amplificar o conceito desse tipo de violência para além do direito da mulher de votar e de ser votada e adotar uma abordagem interseccional, sem desviar a atenção de circunstâncias específicas, como a violência perpetrada por meio virtual. Por fim, avaliou tratar-se de proposição valiosa e merecedora de aprovação, e considerou que o Substitutivo nº 1, da Comissão de Constituição e Justiça mostrava-se apropriado, por ter efetuado adequações pertinentes inclusive quanto ao mérito, mantendo o cerne da proposição original e adotando perspectiva ampliada sobre os direitos políticos.

Levada a proposição à apreciação pelo Plenário, foi apresentada a Emenda nº 1, que visava suprimir o art. 3º do Substitutivo no 1, dispositivo que relaciona ações de violência política contra a mulher. A emenda veio a esta comissão para receber parecer, nos termos do art. 188, § 2º, do Regimento Interno, e foi rejeitada. Assim, o texto aprovado no Plenário foi o Substitutivo nº 1, da Comissão de Constituição e Justiça, sem alterações.

Neste 2º turno, mantemos o nosso entendimento de que a matéria é revestida de inegável importância e merece apoio. Reafirmamos, assim, a nossa avaliação anteriormente exarada. Consideramos essencial, para a caracterização da violência política contra a mulher, a descrição de alguns atos lamentavelmente habituais, porque naturalizados em decorrência da falta de equidade entre homens e mulheres, questão estrutural e estruturante na sociedade brasileira, que se manifesta em todos os aspectos da vida, pública e privada. Esse nosso posicionamento reflete, em alguma medida, o teor da Lei Modelo Interamericana para Prevenir, Sancionar e Erradicar a Violência contra as Mulheres na Vida Política, divulgada pela Comissão Interamericana de Mulheres da Organização dos Estados Americanos – OEA – em 2017¹, em particular o seu artigo 6. Originada a partir da observação da necessidade de fortalecer a capacidade dos Estados de dar respostas a esse tipo específico de violência, em cumprimento à Convenção de Belém do Pará², o objetivo da referida lei é erradicar a violência que impede as mulheres de exercerem, em igualdade de condições e livres de discriminação, seus direitos políticos, reconhecidos nas constituições dos 35 países americanos signatários da Convenção e membros da OEA como direitos fundamentais³. Reforçamos, dessa forma, a necessidade de nomear e descrever os atos que podem caracterizar a violência política contra a mulher, principalmente tendo em vista que esse fenômeno tem aumentado4.

Portanto, ao procedermos a esse novo exame da matéria, julgamos que a proposição sob comento deve avançar nesta Casa, sobretudo por estar alinhada com o fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana bem como com a igualdade prevista no art. 5º da Constituição Federal, especificamente em seu caput e inciso I. Essas considerações evidenciam que o Projeto de Lei nº 2.309/2020 é iniciativa relevante e pertinente, inexistindo, pois, óbices à sua aprovação também no 2º turno, na forma do Substitutivo nº 1 ao vencido, que incorpora propostas para o aprimoramento da matéria, entre as quais sugestão de emenda que altera a redação do inciso III do art. 4º do vencido.

Conclusão

Em vista do aduzido, somos pela aprovação do Projeto de Lei nº 2.309/2020, no 2º turno, na forma do Substitutivo nº 1, a seguir apresentado, ao vencido no 1º turno.

SUBSTITUTIVO Nº 1

Institui a política de enfrentamento à violência política contra a mulher no Estado.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:

Art. 1º – Fica instituída no Estado a política de enfrentamento à violência política contra a mulher.

Parágrafo único – Para fins do disposto nesta lei, considera-se violência política contra a mulher qualquer ação ou omissão, individual ou coletiva, com a finalidade de impedir ou restringir o exercício de direito político pelas mulheres.

Art. 2º – São diretrizes da política de que trata esta lei:

I – compreensão de direito político de forma ampla e não restrita ao processo eleitoral ou ao exercício de mandato eletivo, abrangendo também a participação em partidos e associações, a participação em manifestações políticas e atividades de militância, entre outros;

II – interseccionalidade na concepção e na implementação das ações voltadas para o enfrentamento à violência política contra a mulher, considerando-se a violência política contra a mulher em sua relação com aspectos relativos a cor, raça, etnia, religiosidade, classe social e orientação sexual.

Art. 3º – Configura violência política contra a mulher, entre outros:

I – assediar, constranger, humilhar ou ameaçar, por qualquer meio, candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato eletivo, com a finalidade de impedir ou dificultar sua campanha eleitoral ou o desempenho de seu mandato eletivo;

II – perpetrar agressão contra a mulher ou contra seus familiares, com o propósito de impedir ou restringir sua atuação política ou o desempenho das funções inerentes a seu cargo ou de forçá-la a realizar, contra sua vontade, determinada ação ou incorrer em omissão no desempenho de suas funções ou no exercício de seus direitos políticos;

III – praticar difamação, calúnia ou injúria com base em estereótipos de gênero, com o propósito de minar a imagem pública da mulher ou prejudicar o exercício de seus direitos políticos;

IV – promover aproximações de natureza sexual ou contato sexual não consentido, atos de natureza sexual que causem constrangimento no ambiente em que a mulher desenvolve sua atividade política, com o propósito ou resultado de prejudicar sua atuação ou o exercício de seus direitos políticos;

V – ameaçar, intimidar ou incitar a violência contra a mulher ou contra seus familiares em razão de sua atuação política;

VI – discriminar a mulher no exercício de seus direitos políticos por estar grávida, no puerpério ou em licença maternidade.

Parágrafo único – Não configuram violência política contra a mulher a crítica, o debate e o posicionamento contrário a ideia ou proposição legislativa apresentada.

Art. 4º – São objetivos da política de que trata esta lei:

I – identificar, prevenir e combater ação ou omissão que configure violência política contra a mulher;

II – garantir o direito de participação política da mulher e combater a discriminação e a desigualdade de tratamento em virtude de gênero no acesso às instâncias de representação e no exercício de suas atividades políticas;

III – combater qualquer forma de discriminação contra a mulher que tenha por finalidade ou resultado impedir ou prejudicar o exercício de seus direitos políticos;

IV – desenvolver e implementar medidas que ampliem a participação das mulheres na política;

V – promover a divulgação de informações sobre as formas de identificar, denunciar e combater a violência política contra a mulher;

VI – fomentar a participação das mulheres na vida pública, em partidos, associações e organizações comunitárias;

VII – fomentar a formação política das mulheres;

VIII – promover mecanismos de acompanhamento das candidaturas femininas, com levantamento de dados sobre o número de candidatas, a destinação de recursos e o cumprimento da cota de candidaturas femininas, entre outros dados relevantes;

IX – fomentar a criação de canais de denúncia de atos de violência política contra a mulher;

X – promover ações que fomentem a paridade entre homens e mulheres em todos os órgãos e instituições públicos e nas instâncias decisórias de partidos políticos, associações e organizações políticas;

XI – instituir mecanismos de monitoramento e avaliação das ações de prevenção e enfrentamento à violência política contra a mulher, por meio de parcerias entre órgãos e entidades públicos e organizações privadas.

Art. 5º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Sala das Comissões, 30 de agosto de 2023.

Macaé Evaristo, presidenta e relatora – Ana Paula Siqueira – Bruno Engler – Gustavo Santana – Coronel Sandro.

Projeto de Lei Nº 2.309/2020

(Redação do Vencido)

Institui a política de enfrentamento à violência política contra a mulher no Estado.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:

Art. 1º – Fica instituída no Estado a política de enfrentamento à violência política contra a mulher.

Parágrafo único – Para fins do disposto nesta lei, considera-se violência política contra a mulher qualquer ação, comportamento ou omissão, individual ou coletivo, com a finalidade de impedir ou restringir o exercício de direito político pelas mulheres.

Art. 2º – São diretrizes da política de que trata esta lei:

I – compreensão de direito político de forma ampla e não restrita ao processo eleitoral ou ao exercício de mandato eletivo, abrangendo também a participação em partidos e associações, a participação em manifestações políticas e atividades de militância, entre outros;

II – interseccionalidade na concepção e na implementação das ações voltadas para o enfrentamento à violência política contra a mulher, considerando-se a violência política contra a mulher em sua relação com aspectos relativos a cor, raça, etnia, religiosidade, classe social e orientação sexual.

Art. 3º – Configura violência política contra a mulher, entre outros:

I – assediar, constranger, humilhar ou ameaçar, por qualquer meio, candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato eletivo, com a finalidade de impedir ou dificultar sua campanha eleitoral ou o desempenho de seu mandato eletivo;

II – depreciar candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato eletivo por sua condição de mulher;

III – perpetrar agressões físicas, verbais ou psicológicas contra mulher ou contra seus familiares, com o propósito de impedir ou restringir sua atuação política ou o desempenho das funções inerentes a seu cargo ou de forçá-la a realizar, contra sua vontade, determinada ação ou incorrer em omissão no desempenho de suas funções ou no exercício de seus direitos políticos;

IV – praticar difamação, calúnia, injúria ou qualquer manifestação que rebaixe a mulher no desempenho de suas atividades políticas, com base em estereótipos de gênero, com o propósito de minar sua imagem pública ou prejudicar o exercício de seus direitos políticos;

V – promover aproximações de natureza sexual ou contato sexual não consentido, atos ou falas de natureza sexual que causem constrangimento no ambiente em que a mulher desenvolve sua atividade política, com o propósito ou resultado de prejudicar sua atuação ou o exercício de seus direitos políticos;

VI – ameaçar, intimidar ou incitar a violência contra a mulher ou contra seus familiares em razão de sua atuação política;

VII – discriminar a mulher no exercício de seus direitos políticos por estar grávida, no puerpério ou em licença maternidade;

VIII – realizar atos que prejudiquem a campanha eleitoral de candidata, impedindo que a competição eleitoral transcorra em condições de igualdade;

IX – impedir, por qualquer meio, mulheres eleitas de exercerem suas prerrogativas parlamentares em igualdade de condições com os homens ou procurar restringir o uso da palavra em conformidade com os regulamentos estabelecidos, em razão de sua condição de mulher;

X – impor à mulher, por estereótipo de gênero, interseccionado ou não com raça, cor, etnia, classe social, orientação sexual ou religiosidade, a realização de atividades e tarefas não relacionadas com as atribuições de seu cargo.

Art. 4º – São objetivos da política de que trata esta lei:

I – identificar, prevenir e combater ação, comportamento ou omissão que configure violência política contra a mulher;

II – garantir o direito de participação política da mulher e combater a discriminação e a desigualdade de tratamento em virtude de gênero no acesso às instâncias de representação e no exercício de suas atividades políticas;

III – combater qualquer forma de discriminação de gênero, considerando-se também aspectos relativos a raça, cor, etnia, classe social, orientação sexual e religiosidade, que tenha por finalidade ou resultado impedir ou prejudicar o exercício dos direitos políticos da mulher;

IV – desenvolver e implementar medidas que ampliem a participação das mulheres na política;

V – promover a divulgação de informações sobre as formas de identificar, denunciar e combater a violência política contra a mulher;

VI – fomentar a participação das mulheres na vida pública, em partidos, associações e organizações comunitárias;

VII – fomentar a formação política das mulheres;

VIII – promover mecanismos de acompanhamento das candidaturas femininas, com levantamento de dados sobre o número de candidatas, a destinação de recursos e o cumprimento da cota de candidaturas femininas, entre outros dados relevantes;

IX – fomentar a criação de canais de denúncia de atos de violência política contra a mulher;

X – promover ações que fomentem a paridade entre homens e mulheres em todos os órgãos e instituições públicos e nas instâncias decisórias de partidos políticos, associações e organizações políticas;

XI – instituir mecanismos de monitoramento e avaliação das ações de prevenção e enfrentamento à violência política contra a mulher, por meio de parcerias entre órgãos e entidades públicos e organizações privadas.

Art. 5º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

¹ Disponível em: <https://bit.ly/3lkPbfC>. Acesso em: 29 ago. 2023. Tradução nossa.

² A Convenção Interamericana para Prevenir, Sancionar e Erradicar a Violência contra a Mulher, conhecida como Convenção de Belém do Pará, foi o primeiro tratado internacional a consagrar o direito das mulheres a uma vida livre de violência, tanto no âmbito público quanto no privado. Fonte: <https://bit.ly/3lkPbfC>. Acesso em: 29 ago. 2023. Tradução nossa.

³ Idem, ibidem.

4 Disponível em.: <https://bit.ly/42lb8Mg>. Acesso em: 29 ago. 2023.