PL PROJETO DE LEI 1246/2019

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 1.246/2019

Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher

Relatório

De autoria do deputado Mauro Tramonte, o projeto de lei em epígrafe “institui a campanha permanente de combate ao assédio e à violência contra mulheres nos eventos culturais e esportivos realizados no Estado e dá outras providências”, tendo sido distribuído às Comissões de Constituição e Justiça, de Defesa dos Direitos da Mulher e de Desenvolvimento Econômico.

Em análise preliminar, a Comissão de Constituição e Justiça concluiu pela constitucionalidade, legalidade e juridicidade da proposição na forma do Substitutivo nº 1, que apresentou.

Durante a tramitação, por apresentarem objetos semelhantes, foram anexados à proposição os Projetos de Lei nºs 1.549/2020, 3.552/2022 e 274, 485 e 1.426/2023, em conformidade com o § 2º do art. 173 do Regimento Interno.

Cabe agora a esta comissão emitir parecer quanto ao mérito do projeto, nos termos do art. 188, combinado com o art. 102, XXII, do instrumento regimental.

Fundamentação

A proposição em apreço visa instituir uma campanha permanente de combate ao assédio e à violência contra mulheres nos eventos culturais e esportivos realizados no Estado. Para tanto, prevê como ações da campanha, a entrega de folhetos informativos e anúncios no sistema de som do evento; a divulgação de vídeos ou a reprodução de áudio durante parte dos intervalos dos eventos; a divulgação dos telefones dos órgãos públicos responsáveis pelo atendimento às mulheres vítimas de assédio e violência; e a destinação de local especializado para recebimento das denúncias no próprio evento. O projeto define os objetivos da campanha, como tornar esses eventos mais seguros para elas, além de conscientizar e mobilizar a população no combate aos crimes contra a mulher. Ainda segundo o art. 5º da proposição, as câmeras de videomonitoramento de segurança dos eventos deverão ser imediatamente disponibilizadas sempre que solicitadas pelas autoridades competentes para a identificação dos infratores e efetivação das denúncias. Já o art. 6º prevê que aos responsáveis pela realização dos eventos será aplicada multa correspondente a 1% da arrecadação, caso não sejam realizadas as ações previstas. Por fim, a proposta dispõe sobre a atribuição do Executivo relativamente à regulamentação e fiscalização do cumprimento da lei.

Ao examinar a matéria, a Comissão de Constituição e Justiça assinalou que o tema se ajusta à competência legislativa do estado-membro, nos termos do art. 24, IX, da Constituição da República, que confere ao estado federado a possibilidade de legislar concorrentemente com a União sobre educação, cultura e desporto. Destacou, porém, que a elaboração e a execução de campanha, plano ou programa administrativo são atividades inseridas no rol de atribuições do Poder Executivo, que detém a competência constitucional para realizar as ações de governo. Considerou, assim, que a proposta versa também sobre matéria de cunho essencialmente administrativo, o que a faz incorrer em vício de inconstitucionalidade em virtude da invasão do Legislativo em seara reservada ao Executivo. Ao final, apresentou o Substitutivo nº 1, visando afastar tais inadequações e tratar a matéria por meio de alteração na Lei nº 22.256, de 2016, que institui a política de atendimento à mulher vítima de violência no Estado, com a inclusão nessa norma da medida prevista na proposição.

Em sua justificação, o autor do projeto citou reportagens em que foram publicados relatos de violências sofridas por mulheres em eventos esportivos e culturais, tendo ressaltado que a ocorrência de casos dessa natureza tem sido frequente no decorrer dos últimos anos. Cumpre-nos anotar, conforme publicação realizada no site “Dibradoras”1, a relevância do assunto:

“Ser mulher no Brasil significa conviver com o medo constante de sofrer violência sexual de todo tipo, a qualquer hora e em praticamente todo lugar. Esse receio está fortemente presente na rotina de torcedoras que cultivam a paixão pelo futebol e querem fazer valer o direito de acompanhar o clube do coração de perto nos estádios, um espaço ainda majoritariamente masculino e que está longe de oferecer as estruturas e os tratamentos básicos necessários para que elas se sintam seguras.

(…)

Casos de assédio ocorrem nos estádios espalhados por todo o país. E essa não é uma responsabilidade exclusiva dos gestores das arenas. Se a violência contra a mulher faz parte de um comportamento enraizado na cultura masculina e, com muita força, no futebol, é preciso que clubes, federações e associações empenhem esforços e investimentos em medidas que coíbam de fato o assédio nesses ambientes. É um problema social que pode ser melhor tratado por todos.”.

Em que pese as circunstâncias da misoginia e do machismo atravessarem historicamente a sociedade e, em consequência, praticamente todos os ambientes, as mulheres têm cada vez mais reivindicado a real ocupação de espaços, em igualdade de condições em relação aos homens e livres de qualquer tipo de assédio ou importunação, principalmente de caráter sexual, a que continuam absurdamente expostas. Essa demanda das mulheres, aliás, precisa ser evidenciada, afastando-se de vez o silenciamento ou a invisibilidade dessas questões no rol das discussões sociais e na agenda pública.

Não por outra razão, iniciativas legislativas sobre o tema vêm permeando o cenário nacional, a exemplo de projetos em tramitação na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Somente a título de exemplo podem ser citados o Projeto de Lei nº 549/2019, que “altera a Lei nº 10.671, de 15 de maio de 2003 (Estatuto de Defesa do Torcedor), para ampliar a proteção às torcedoras contra atos de violência em ambientes de prática esportiva”2, e o Projeto de Lei nº 4.842/2023, que “altera a Lei nº 14.448, de 9 de setembro de 2022, para instituir campanha permanente de conscientização em arenas esportivas e respectivas transmissões dos eventos para a prevenção e o enfrentamento da violência contra a mulher”3.

Temos sublinhado o substancial aprimoramento da legislação aplicável ao enfrentamento da violência contra a mulher, principalmente a partir da edição da Lei Maria da Penha. Porém, do mesmo modo, é essencial assumirmos que, apesar da reconhecida produção normativa, persistem altos os índices de violência de gênero no Brasil. Tal cenário obriga instituições públicas e organizações privadas a repensarem sua responsabilidade e refinarem suas práticas para a prevenção e o combate das diferentes formas de violência contra a mulher, passando pelo ajustamento de ações específicas, desenhadas de maneira transversal e em múltiplas frentes.

É com essa perspectiva que ressaltamos o mérito do projeto. Compreendemos que a realização de campanhas sobre o assunto em eventos culturais e esportivos reveste-se em medida importante e que se somará a outros instrumentos de enfrentamento da violência contra a mulher no Estado.

Posto isso quanto ao projeto principal, cumpre também a esta comissão se manifestar acerca das proposições a ele anexadas, em cumprimento ao § 3º do art. 173 do Regimento Interno. Verificamos a existência de cinco propostas: o Projeto de Lei nº 1.549/2020, que “cria a campanha permanente contra o assédio e a violência sexual nos estádios”; o Projeto de Lei nº 3.552/2022, que “altera a Lei nº 15.457, de 12 de janeiro de 2005, que institui a Política Estadual de Desporto”; o Projeto de Lei nº 274/2023, que “cria o programa Tendas Violetas no âmbito do Estado de Minas Gerais”; o Projeto de Lei nº 485/2023, que “autoriza o Poder Público a criar a Base Móvel da Polícia Militar para atendimento exclusivo às mulheres vítimas de importunação ou delitos nos eventos de rodeio e assemelhados”; e o Projeto de Lei nº 1.426/2023, que “dispõe sobre a interrupção de partidas esportivas, profissionais ou amadoras, nos estádios, ginásios e arenas esportivas públicas ou privadas no âmbito do Estado de Minas Gerais, e dá outras providências”.

Sobre essas propostas, anotamos inicialmente a análise preliminar da Comissão de Constituição e Justiça. Em relação aos Projetos de Lei nºs 1.549/2020, 3.552/2022 e 274 e 485/2023, foi indicada a existência dos mesmos vícios de inconstitucionalidade apontados para a proposição principal. Já quanto ao Projeto de Lei nº 1.426/2023, foi assinalada a ocorrência de vício de inconstitucionalidade em razão do objetivo de regulação de matéria inerente a direito do trabalho, já que cria deveres e obrigações a empregados de empresas e organizações responsáveis pela realização de eventos esportivos no Estado. A matéria, assim, estaria reservada ao âmbito da competência legislativa privativa da União, por força do disposto no art. 22, I, da Constituição Federal. Já à estrita observação das propostas anexadas quanto ao mérito, temos que todas elas apresentam, de fato, aspectos materiais ou territoriais de incidência normativa senão bastante semelhantes, mais restritos, nos termos já suscitados pela comissão que nos precedeu. Nesse sentido, avaliamos que o arrazoado acima apresentado também se aplica a elas.

Pelo exposto, concordamos com o entendimento de aprovação da matéria por meio de alteração na Lei nº 22.256, de 2016, para nela expressar, como uma das ações a serem adotadas pelo poder público, a realização de campanhas em eventos culturais e esportivos direcionadas à conscientização, prevenção e enfrentamento da importunação sexual e de outras formas de violência contra a mulher.

Não obstante, verificamos a oportunidade de aperfeiçoar o conteúdo proposto pela Comissão de Constituição e Justiça tão somente para ampliar a hipótese de incidência da futura norma, de maneira que o texto passe a alcançar os eventos de lazer, os quais diferem dos culturais e esportivos e também devem ser foco das campanhas a serem implementadas. Assim, ratificando o mérito da proposição, apresentamos ao final a Emenda nº 1, que incide sobre o Substitutivo nº 1.

Conclusão

Em face do exposto, opinamos pela aprovação do Projeto de Lei nº 1.246/2019, no 1º turno, na forma do Substitutivo nº 1, da Comissão de Constituição e Justiça, com a Emenda nº 1, a seguir apresentada.

EMENDA Nº 1

Substitua-se, no inciso XIII do art. 4º da Lei nº 22.256, de 26 de julho de 2016, acrescentado pelo art. 1º do Substitutivo nº 1, a expressão “eventos culturais e esportivos” por “eventos culturais, esportivos e de lazer”.

Sala das Comissões,4 de junho de 2024.

Ana Paula Siqueira, presidenta – Andréia de Jesus, relatora – Alê Portela.

1Disponível em: <https://dibradoras.com.br/2023/04/28/assedi o-e-violencia-por-que-muitas-mulheres-ainda-se-afastam-do-futebol/#:~:text=O%20Mineir%C3%A3o%2C%20por%20exemplo%2C%20registrou,casos%20 desde%20junho%20de%202022>. Consulta em: 19 abr. 2024.

2Disponível em: <https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2233453>. Consulta em: 19 abr. 2024.

3Disponível em: <https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/160370>. Consulta em: 19 abr. 2024.