PL PROJETO DE LEI 2311/2008

PARECER PARA O 1º TURNO DO PROJETO DE LEI Nº 2.311/2008

Comissão de Constituição e Justiça Relatório De autoria do Deputado Célio Moreira, o projeto de lei em epígrafe altera dispositivos da Lei no 15.025, de 19/1/2004, que dispõe sobre consignação em folha de pagamento de servidor público ativo, inativo e pensionista do Estado e dá outras providências. Publicado no “Diário do Legislativo” de 25/4/2008, foi o projeto distribuído às Comissões de Constituição e Justiça e de Administração Pública. Cabe a esta Comissão analisar a matéria quanto aos aspectos de sua juridicidade, constitucionalidade e legalidade, nos termos do art. 102, III, “a”, combinado com o art. 188 do Regimento Interno. Fundamentação A proposição em epígrafe pretende alterar a Lei no 15.025, de 2004, que dispõe sobre consignação em folha de pagamento de servidor público ativo, inativo e pensionista do Estado e dá outras providências. Cumpre, inicialmente, esclarecer que a consignação em folha de pagamento, possibilidade atualmente estabelecida no Estado para os servidores públicos, nos termos da Lei no 15.025, figura também na Lei Federal no 10.820, de 17/12/2003, para os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT – e para os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social. Da mesma forma, no Decreto no 6.368, de 2008, que regulamenta o art. 45 da Lei Federal no 8.112, de 11/12/90, que dispõe sobre as consignações em folha de pagamento dos servidores públicos civis, dos aposentados e dos pensionistas da administração direta, autárquica e fundacional do Poder Executivo da União. Os empréstimos consignados fazem parte da estratégia de ampliação do acesso da população ao crédito em condições mais favoráveis em termos de taxas de juros e prazos, contribuindo para a redução dos níveis de “spread” bancário bem como para a melhora do perfil de endividamento das famílias. O desenvolvimento dessa modalidade de crédito, anteriormente restrita a algumas instituições financeiras e à clientela de servidores públicos, foi viabilizado pela Lei Federal no 10.820, de 2003, que estabeleceu arcabouço jurídico para amparar a realização dessas operações, estendendo seu alcance aos trabalhadores regidos pela CLT assim como aos aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS. Embora também cuide da consignação compulsória em folha de pagamento, a Lei no 15.025 visa a regular a consignação facultativa, que, nos termos do § 2o de seu art. 1o, “é o desconto incidente sobre a remuneração, provento ou pensão efetuado com autorização formal do consignado”. Trata-se, pois, de situação na qual o servidor atesta que uma parte de sua remuneração será legalmente descontada pela fonte pagadora e destinada ao pagamento de operações de crédito pessoais. Feitas essas considerações, passamos à análise da proposição. Em primeiro lugar, pretende-se alterar o § 1o do art. 3o da Lei no 15.025, de modo que a soma das consignações facultativas e compulsórias em folha de pagamento do servidor ou pensionista, atualmente limitada a 70% de sua remuneração ou provento, deduzidas as vantagens variáveis, não exceda 50%. Esclarecemos, de início, que o limite para consignação em folha de pagamento foi matéria amplamente debatida quando da tramitação do Projeto de Lei no 126/2003, que resultou na edição da Lei no 15.025. Com relação aos aspectos sobre os quais deve esta Comissão se manifestar, não vislumbramos impedimento a tal alteração. Contudo, ressaltamos a necessidade de análise criteriosa, que estabeleça uma margem consignável que preserve o caráter alimentar de que se reveste a remuneração do servidor público. Dessa forma, o limite consignável deverá ser avaliado pela comissão de mérito, no momento oportuno, de modo que tal valor não comprometa o atendimento das necessidades essenciais do servidor e de sua família, de forma a permitir-lhes a satisfação dos gastos com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte, entre outros. Com efeito, o Estado não pode dispensar tratamento inconseqüente a essa questão, de modo que o valor que resulte da subtração da margem consignável se revele insuficiente para o satisfatório atendimento das necessidades vitais do servidor e de sua família. Acrescente-se, ainda, que, se, por um lado, não se pode permitir o comprometimento total dos rendimentos/proventos do consignado, por outro lado também não é possível propor uma porcentagem muito limitada, o que transformaria a consignação em algo figurativo. Propõe, também, o projeto que seja revogado o § 3o do art. 3o da Lei no 15.025, que determina que cada um dos Poderes, o Ministério Público e o Tribunal de Contas poderão estabelecer, em regulamento, limite superior ao estabelecido na lei para consignações facultativas de seus servidores em favor de órgão, entidade ou fundo públicos. Remetemos também à comissão de mérito a análise da conveniência da supressão desse dispositivo. Ademais, pretende o projeto alterar o art. 6o da Lei no 15.025, de forma que a consignação facultativa seja passível de ser cancelada a pedido formal do consignado, independentemente da aquiescência do consignatário. Esclareça-se que, de acordo com o texto atual, a consignação facultativa pode ser cancelada a pedido formal do consignado, sendo que as relativas a empréstimo ou a venda de produtos somente poderão ser canceladas pelo servidor ou pensionista com a aquiescência do consignatário, mediante pedido formal, e as demais, mediante comunicação prévia. Nesse aspecto, vale destacar que os tribunais, após admitirem, em reiteradas ocasiões, o cancelamento do desconto em folha a pedido do devedor, que antes o autorizou – alegando, principalmente, a natureza alimentar e a impenhorabilidade do salário –, passaram a negar tal possibilidade, sustentando a legalidade do desconto e o descabimento da alteração unilateral do contrato válido. Essa posição foi balizada pela 2a Seção do Superior Tribunal de Justiça, em 8/6/2005, no julgamento do Recurso Especial no 728.563-RS, no qual se decidiu que é legal o desconto em folha de pagamento de empréstimos concedidos por cooperativas de crédito e instituições financeiras. Da mesma forma, entendeu-se que é proibido ao devedor revogar, unilateralmente, cláusula de contrato de empréstimo em consignação. O Ministro Aldir Passarinho, relator da matéria, entendeu que as cláusulas contratuais que cuidam dos descontos em folha de pagamento não são abusivas. Segundo ele, “na verdade, a consignação em folha é da própria essência do contrato celebrado. É a ele inerente, porque não representa, apenas, uma mera forma de pagamento, mas a garantia do credor de que haverá o automático adimplemento obrigacional por parte do tomador do mútuo, permitindo a concessão de empréstimo com menor margem de risco, o que, concretamente, também favorece o financiado, seja por dispensar outras garantias, como aval, seja por proporcionar, exatamente pela mesma segurança da avença, uma redução substancial na taxa de juros e prazos mais longos, tornando significativamente menos oneroso o financiamento”. Afastou o Ministro, ademais, o argumento de que o desconto em folha seria penhora de renda, o que é vedado, nos termos do art. 649, IV, do Código de Processo Civil. Esclarece o relator que a penhora de renda é vedada “por não ter com ela anuído o devedor, que se vê, de inopino, com sua remuneração ceifada para satisfação de um crédito objeto de execução judicial. É algo que lhe é imposto por coação, sem preestabelecimento e previsão, portanto, de compatibilidade com o seu orçamento, daí a proibição legal para tanto”. Ressalta, ainda, o Ministro, analisando o recurso em questão, que não tem cabimento a pessoa obter financiamento a taxas mais favorecidas justamente porque optou por uma modalidade de consignação em folha de pagamento, o que a dispensou da apresentação de garantia suplementar, obtendo prazo mais elástico, com redução de cada parcela e, em seguida, sob alegação de expropriação abusiva, excluir a cláusula, o que denota o nítido propósito de inadimplir a obrigação. Concluindo-se pela exclusão da cláusula, o credor ficaria sem nenhuma garantia, porque não há avalista, depois de já ter emprestado a juros mais baixos e por prazo mais longo. Dessa forma, de acordo com o STJ, obtido o empréstimo ou financiamento e autorizado o desconto em folha, o servidor não pode mais cancelar ou revogar unilateralmente essa autorização, uma vez que se beneficiou das vantagens decorrentes dessa modalidade de crédito. Com base nessa jurisprudência, entendemos, portanto, que a proposta de alteração do art. 6o da Lei no 15.025 não pode prevalecer. Pretende a proposição, por fim, que, entre as hipóteses de descredenciamento ou de suspensão de credenciamento previstas no art. 7o da Lei no 15.025, seja incluído o não-reconhecimento do direito à liquidação antecipada do débito, total ou parcial, com a proporcional redução dos juros e demais acréscimos. No que toca ao pagamento antecipado do débito, cumpre destacar que tal direito decorre do § 2o do art. 52 da Lei Federal no 8.078, de 11/9/90, que contém o Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Este, ao disciplinar o fornecimento de produtos ou serviços que envolvem outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, determina expressamente que “é assegurado ao consumidor a liquidação antecipada do débito, total ou parcialmente, mediante redução proporcional dos juros e demais acréscimos”. Destacar a não-admissão dessa possibilidade entre as hipóteses de descredenciamento ou de suspensão de credenciamento previstas no art. 7o da Lei no 15.025, em consonância com o Código de Proteção e Defesa do Consumidor, reforça a proteção da remuneração do servidor, sendo, portanto, meritória. Dessa maneira, em face das razões expendidas, não encontramos impedimento à tramitação do projeto, com exceção da proposta de alteração do art. 6o, que não pode prosperar. Vislumbramos a possibilidade de aprimorar a proposição em referência, sobretudo no que toca à técnica legislativa, razão pela qual apresentamos, ao final deste parecer, o Substitutivo no 1. Conclusão Em face do exposto, concluímos pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade do Projeto de Lei no 2.311/2008 na forma do Substitutivo no 1, a seguir apresentado. SUBSTITUTIVO No 1 Altera a Lei no 15.025, de 19 de janeiro de 2004, que dispõe sobre consignação em folha de pagamento de servidor público ativo, inativo e pensionista do Estado e dá outras providências. A Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta: Art. 1o – O § 1o do art. 3o da Lei no 15.025, de 19 de janeiro de 2004, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 3o – (...) § 1o – Para efeito de desconto facultativo, a soma mensal de consignações facultativas e compulsórias em folha de pagamento de servidor ou pensionista não poderá exceder a 50% (cinqüenta por cento) de sua remuneração ou provento, deduzidas as vantagens variáveis.”. Art. 2o – O “caput” do art. 7o da Lei no 15.025, de 2004, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 7o – Poderá o Estado descredenciar ou suspender o credenciamento de entidade consignatária que não comprovar o atendimento das exigências desta lei, não admitir a possibilidade de liquidação antecipada do débito, total ou parcial, com a proporcional redução dos juros e demais acréscimos ou que comprovadamente praticar ato lesivo ao consignado, nos termos da legislação em vigor, observados o contraditório, a ampla defesa e o regulamento de cada Poder, do Ministério Público e do Tribunal de Contas.”. Art. 3o – Fica revogado o § 3o do art. 3o da Lei no 15.025, de 2004. Art. 4o – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação. Sala das Comissões, 3 de junho de 2008. Dalmo Ribeiro Silva, Presidente - Sebastião Costa, relator - Hely Tarqüínio - Sargento Rodrigues.