Participantes citaram casos recentes de apreensões de queijos artesanais em boas condições de consumo
João Carlos Leite disse que as leis remetem a regulamento de inspeção de 1952

Produtores de queijo artesanal cobram mudança na legislação

Projeto de lei em tramitação é esperança para acabar com entraves à comercialização do tradicional produto mineiro.

30/11/2017 - 19:28 - Atualizado em 01/12/2017 - 11:21

Uma legislação que contemple a segurança sanitária e o direito dos produtores de comercializar seu queijo artesanal, feito de modo tradicional. Esse é o objetivo traçado pelo deputado Agostinho Patrus Filho (PV) como relator do Projeto de Lei (PL) 4.631/17, do governador Fernando Pimentel, que trata da produção e comercialização de queijos artesanais. A proposição foi debatida em audiência pública da Comissão de Desenvolvimento Econômico da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta quinta-feira (30/11/17).

“Não é possível que um produto símbolo do Estado seja considerado clandestino”, afirmou o parlamentar, referindo-se a ocorrências neste ano envolvendo o queijo artesanal. Uma foi a fiscalização federal de produtores de São Roque de Minas, na Serra da Canastra, que tiveram apreendidos e jogados fora 13 mil queijos por falta de certificação de origem, gerando um prejuízo de R$ 120 mil.

Em setembro, no festival Rock in Rio, realizado no Rio de Janeiro (RJ), outros 160 kg de alimentos foram descartados, sob alegação de que não tinham selo da Vigilância Sanitária. Também em setembro, na Itália, em evento com queijeiros de 11 países, a produtora mineira Marli Leite, com premiação de queijo na França, teve sua produção recolhida por fiscais, sob alegação de que o produto era clandestino.

Nesse sentido, o deputado Agostinho Patrus Filho (PV) defendeu que o PL 4.631/17 contemple a regulação do consumo de queijos apreendidos que estejam em boas condições, para evitar o desperdício. Outra medida aventada é a criação de uma câmara técnica do queijo na Secretaria de Estado de Agricultura. Ele garantiu que as sugestões serão acrescentadas ao substitutivo preparado por ele.

Produtores defendem mudanças na legislação federal

Representantes de regiões produtoras de queijo artesanal também reivindicaram alteração da legislação federal. João Carlos Leite, da Associação dos Produtores de Queijo Canastra de São Roque de Minas, explicou que as leis ainda remetem ao regulamento de inspeção de produtos de origem animal de 1952. A norma previa uma maturação do queijo cru de oito dias, o que foi aumentado em 1963 para dez dias e, em 1996, para 60 dias.

Além disso, afirmou ele, vários requisitos da última norma praticamente inviabilizam a produção. “O produtor de queijo é tratado como bandido porque não cumpre a lei”, reclamou João Carlos Leite.

“Não se pode usar o álibi da segurança alimentar para inviabilizar a produção do queijo de leite cru”, continuou. Na avaliação dele, a normatização, que busca a segurança sanitária, atende a interesses da indústria de laticínios, que fabrica o queijo pasteurizado. “No modelo de produção industrial, o poder econômico fica na mão do empresário; com o queijo artesanal, esse poder está na mão do produtor”, defendeu.

Além disso, a alegação de preocupação sanitária, na opinião do produtor, também cai por terra quando se observa que os queijeiros já aplicam regras que garantem a qualidade do produto: boas práticas na produção, uso de água potável e animais livres de zoonoses.

João Carlos entende que, enquanto a inspeção for subordinada ao Ministério da Agricultura, o pequeno produtor será prejudicado. “O queijo pasteurizado perde microorganismos importantes e, por isso, está muito mais sujeito à salmonela. Isso não acontece com o queijo cru porque ele tem os microorganismos em equilíbrio”, afirmou. Esse aspecto técnico, de acordo com ele, não é observado pela fiscalização.

Reinaldo Antônio de Lima, da Associação dos Produtores de Queijo de Araxá, reclamou que os fiscais exigem o cumprimento de padrões sem dar qualquer orientação. “Aprendi que, para ter queijo de qualidade, o principal é a qualidade do leite. Por isso, faço teste de acidez todo dia. Mas a maioria dos produtores, que não têm esse conhecimento, também não recebe nenhuma orientação”, criticou.

Comitiva - Eduardo Avelar, do Projeto Territórios Gastronômicos, lembrou a comitiva que foi a Brasília (DF) reivindicar uma nova legislação para o queijo, que teria como base a Lei 20.549, aprovada na ALMG em novembro de 2012 e que dispõe sobre a produção e a comercialização dos queijos artesanais de Minas.

Conforme expôs Eduardo, a Câmara dos Deputados e o Poder Executivo os receberam, mas até agora, nada de concreto foi feito. “É preciso unificar a legislação, e para já. Não podemos discutir mais dez anos!”, insistiu.

MG é maior produtor de leite e queijo

Dirceu Alves Ferreira, gerente técnico da Emater-MG, trouxe dados da pecuária mineira: 22,5 milhões de rebanho bovino, sendo 7,5 milhões de vacas produzindo 9,7 bilhões de litros de leite por ano (maior produção do Brasil), tendo à frente 350 mil pecuaristas. Quanto ao setor de queijo, ele disse que 276 queijarias têm certificado do Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA). “Todo o trabalho é feito para qualificar o produtor. Mas tem que haver o esforço de mudança na legislação federal”, concluiu.

O presidente da comissão, deputado Roberto Andrade (PSB), destacou a importância da gastronomia para o turismo. Nesse sentido, disse que os mineiros devem ser bairristas, divulgando o queijo, a cachaça e outros produtos locais.

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