DEPUTADA BEATRIZ CERQUEIRA (PT)
Discurso
Legislatura 19ª legislatura, 4ª seção legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 25/11/2022
Página 4, Coluna 1
Assunto COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO (CPI). MEIO AMBIENTE. MINERAÇÃO.
Indexação
68ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 19ª LEGISLATURA, EM 23/11/2022
Palavras da deputada Beatriz Cerqueira
A deputada Beatriz Cerqueira – Presidente, mais uma vez, boa tarde. Boa tarde a toda a imprensa que acompanha os trabalhos da Assembleia Legislativa, aos servidores da Casa, à população em geral que nos acompanha.
Presidente, hoje fomos matéria: “A Polícia Federal investiga autorizações do governo de Minas Gerais para mineração na Serra do Curral”. Minas Gerais está no noticiário em razão de uma atuação vergonhosa que está em investigação. É só isso que eu quero falar, presidente.
Começo fazendo a leitura de um comunicado assinado por sete entidades. Isso precisa ser lido no Plenário desta Casa, e precisa o seu conteúdo ser debatido nas comissões de mérito desta Casa. O comunicado é assinado por: Associação Mineira de Defesa do Ambiente, Associação para Gestão Socioambiental do Triângulo Mineiro, Associação Pró-Pouso Alegre, Fundação Relictos de Apoio ao Parque do Rio Doce, Instituto Guaicuy – SOS Rio das Velhas, EPA, Movimento Verde de Paracatu – Mover. Essas sete entidades publicaram o seguinte comunicado aos membros do Conselho Estadual de Política Ambiental – Copam – e do Conselho Estadual de Recursos Hídricos e à Secretaria Estadual de Meio Ambiente – Semad.
(– Lê:) “Considerando que: o Copam e o Conselho Estadual de Recursos Hídricos deixaram, há bastante tempo, de ser fóruns de discussão e proposição de políticas ambientais e de recursos hídricos para o Estado, tornando-se cada vez mais apenas palco de ‘legitimação’ de decisões autocráticas por parte do Executivo; tem-se tornado cada vez mais clara e crescente a política do governo de exclusão deliberada da sociedade civil e violação do seu direito constitucional de participação na gestão do uso dos recursos naturais, o governo Zema, de forma unilateral, sem discussão com a sociedade, revoga, modifica e cria normas ambientais à revelia da sociedade e até do Copam; importantes avanços para a proteção da biodiversidade conquistados no âmbito do Copam e do Conselho de Recursos Hídricos, como, por exemplo, implementação da cobrança de compensação ambiental prevista na lei federal, foram desmantelados nos últimos anos; não houve avanço significativo na implementação de ferramentas que possam avaliar impactos cumulativos e sinérgicos de empreendimentos de forma geral, como expansão urbana, mineração, hidrelétricas e agropecuária; a legislação continua sendo interpretada de forma a fragmentar o licenciamento ambiental, e frequentemente são pautados processos favoráveis à concessão de licenças a projetos que preveem grandes desmatamentos, entre outros impactos, e que são instruídos com estudos insuficientes, ignorando muitas vezes pesquisas da comunidade científica e publicações importantes, presença de comunidades tradicionais, denúncias das comunidades e até dados técnicos publicados pelo próprio governo; até hoje não foi regulamentada e implementada a cobrança de caução para o licenciamento de barragem de rejeitos, conforme preconiza a Lei Estadual nº 23.291, de 2019, e foram concedidas licenças com essa exigência como condicionante, o que é vedado expressamente no dispositivo legal; outorgas de concessão de uso da água a empreendimentos de grande porte e potencial poluidor são concedidas desconsiderando-se a crise climática e princípios de precaução e prevenção; por seis anos consecutivos, Minas Gerais é campeã de desmatamento do bioma mata atlântica e foi um dos estados que mais desmatou o cerrado nos últimos anos, e o governo não demonstra interesse em discutir e implantar políticas públicas que sejam capazes de reverter esse quadro através de política de Estado prevendo ‘desmatamento zero’ envolvendo outras secretarias e, ao mesmo tempo, assume internacionalmente metas de redução de emissão de carbono e desmatamento sem consequências práticas; mesmo havendo propostas técnicas sobre criação de corredores ecológicos no Estado, o Estado não as implementa, o que aponta favorecimento ao setor produtivo; o atual governo praticamente não criou novas unidades de conservação de proteção integral, estando o Estado muito abaixo do recomendado em termos de percentual de território pela Convenção sobre Diversidade Biológica; não temos política de proteção da biodiversidade, água e clima, através da proteção legal de ambientes naturais de suma importância que restam no Estado, muitos deles provavelmente situados em terras devolutas que deveriam ser apropriadas pelo poder público, a gestão das unidades de conservação existentes parece caminhar com celeridade para uma visão mercadológica e nem mesmo suas zonas de amortecimento são protegidas contra atividades econômicas ilegais, como expansão urbana, e a discriminação fundiária dos mesmos não avançou; após 10 anos da promulgação do Código Florestal, os benefícios esperados com o Cadastro Ambiental Rural e o Programa de Regularização Ambiental em Minas inexistem apesar das promessas tanto do ex-secretário Germano Vieira quanto da atual, Marília Mello, de revogação do § 8º do art. 21 do Decreto Estadual nº 46.953/2016, que proibiu as ONGs eleitas para as câmaras temáticas e plenário do Copam de nomear o mesmo conselheiro que as representavam no mandato anterior, isso não foi feito. A proibição recai somente sobre as ONGs, pois na representação do setor empresarial e do governo não há restrição;
no Conselho Estadual de Recursos Hídricos e suas câmaras técnicas, conforme o novo regimento interno, parágrafo único do art. 11, o governo de Minas, a partir de lista tríplice enviada pelas entidades da sociedade civil eleitas, é quem definirá os indicados para a titularidade e suplências, impedindo aos representantes da sociedade civil o exercício de seu pleno direito constitucional de independência. O artigo citado ainda fere o princípio da isonomia, pois usuários de recursos hídricos, como a Cemig, a Copasa, a Faemg, o Ibram e a Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa, não foram submetidos à mesma regra;
o governo autocraticamente extinguiu o Cadastro Estadual de Entidades Ambientalistas, criado em 2006, proibindo a livre escolha das ONGs de seus representantes no Copam e no conselho de recursos hídricos. A extinção foi comunicada às mesmas, e a Semad se recusou a discutir o assunto. Ambos os atos foram autoritários, sem qualquer discussão prévia com a sociedade civil.
As entidades signatárias deste documento comunicam formalmente decisão de renúncia coletiva do plenário do Copam, do Conselho Estadual de Recursos Hídricos e de suas câmaras técnicas, manifestam preocupação com as implicações para Minas Gerais das situações acima relacionadas e declaram total convicção da premente e urgente necessidade de um governo realmente democrático que respeite os direitos da sociedade civil, discuta e implemente políticas que possam compatibilizar as atividades econômicas necessárias ao bem-estar humano, com a proteção dos bens materiais e imateriais da sociedade e do meio ambiente, respeitando a fauna, a flora, os rios e as paisagens. Estaremos prontos para voltar a dialogar através dos conselhos com o poder público e a iniciativa privada quando o governo exercer de fato o princípio acima enunciado, respeitando os princípios constitucionais da isonomia, cidadania, moralidade, pluralismo político e impessoalidade, e sobretudo a capacidade de dialogar e compreender que a sociedade é mais diversa do que os setores corporativistas. Belo Horizonte, 17/11/2022.”
Assinam a Associação Mineira de Defesa do Meio Ambiente, a Associação para Gestão Socioambiental do Triângulo Mineiro, a Associação Pró-Pouso Alegre, a EPA, a Fundação Relictos de Apoio ao Parque do Rio Doce, o Instituto Guaicuy – SOS Rio das Velhas, o Movimento Verde de Paracatu.
A situação é gravíssima em Minas Gerais. Nós vivemos hoje um completo aparelhamento das estruturas do Estado a serviço dos grandes empreendimentos minerários, a serviço do poder econômico desses empreendimentos, independente da destruição e da devastação irreparáveis que esses empreendimentos minerários estão causando.
Faço a leitura, no Plenário da Assembleia, desta carta das entidades manifestando o meu apoio, o meu apreço a essas entidades. Eu realizei, na Comissão de Administração Pública, audiência que discutiu decretos relacionados ao conselho de recursos hídricos. A situação é grave. As normas editadas recentemente pelo governo Zema são normas autoritárias que desrespeitam a sociedade civil no seu legítimo direito de participação nos conselhos. Eu apresentei à comissão temática da Casa, a Comissão de Meio Ambiente, requerimento para realização de audiência pública com a convocação da secretária de Meio Ambiente. Eu não quero o presidente da Fiemg. Já vou logo avisando. O pedido aqui é para que a secretária de Estado de Meio Ambiente esteja presente em audiência e todas essas entidades sejam convidadas a falar, a ter o direto de voz. Que nós possamos cobrar do governo do Estado.
Eu só não apresento neste momento, presidente, um requerimento de pedido de uma comissão parlamentar de inquérito, uma CPI, porque nós estamos no final desta legislatura, mas quero deixar, de público, que o farei no início da próxima legislatura. Naquela bolsa vermelha que está ali, no Plenário, e que me acompanha em várias atividades, eu tenho dezenas de documentos mostrando como a direção política hoje da Semad está a serviço dos grandes empreendimentos minerários. Não importam as consequências. Eu tenho comprovação de que quem tem feito estudos para proposições, decretos e novo ordenamento legal sobre meio ambiente em Minas Gerais é a Fiemg. É isso mesmo, gente! Quem tem feito estudos indicando alterações na legislação ambiental, no Estado de Minas Gerais, no último período, é a Fiemg. Quero apresentar esses documentos para a correta investigação numa comissão parlamentar de inquérito. Não é um debate de opinião. Trata-se de um aparelhamento inaceitável e de possíveis crimes que estão sendo cometidos no âmbito da secretaria hoje dirigida pelo governo Zema.
Para finalizar, não sei se todos tiveram acesso: “Polícia Federal indicia mineradoras e diretor da ANM por irregularidades na Serra do Curral. A Serra do Curral, tombada pelo patrimônio municipal de Belo Horizonte, é alvo de atividades minerárias. Extração, pesquisa e lavra ilegal estão entre os crimes. A Polícia Federal indiciou a Gute, a Fleurs Global, um diretor da Agência Nacional de Mineração, além de uma transportadora, por fraudes na concessão do termo de ajustamento de conduta para operações minerárias na Serra do Curral, na Região Metropolitana de Belo Horizonte”. O termo de ajustamento de conduta... Vou continuar: “De acordo com o relatório da Polícia Federal, ao qual o g1” – eu estou compartilhando uma matéria do g1 Minas – “teve acesso com exclusividade, as investigações tiveram início após uma fiscalização da Polícia Militar de Meio Ambiente, que flagrou ‘motoristas de caminhão na região de Belo Horizonte, divisa com Sabará, fazendo o carregamento de minério de ferro e terra, de forma aparentemente legal’”.
Quando nós estivemos, em atividade da Comissão de Administração Pública, fazendo uma visita técnica à mineradora Gute, constatamos e denunciamos aquilo que os moradores também já diziam: caminhões circulam – 30, 40 caminhões – principalmente pelas madrugadas, fazendo um transporte legal; e a mineração que era irregular... O governo Zema, que deveria ter protegido a Serra do Curral, fez um termo de ajuste de conduta para tornar legal a ilegalidade praticada pela mineradora Gute. É um escândalo! É uma situação assustadora, vergonhosa e que merece a correta investigação. Acho que é isso que nós, do Parlamento, devemos ao povo mineiro.
Essas são as considerações, presidente. Eu aguardo a votação de requerimento de minha autoria na Comissão de Meio Ambiente, que dorme lá, inclusive, desde maio de 2022 – todos os requerimentos de enfrentamento ao poder político e predatório das mineradoras e da Fiemg. Obrigada, presidente.