Vale do Jequitinhonha requer mais políticas de enfrentamento à violência contra as mulheres
Situação da região, que tem os mais altos índices de feminicídio, foi analisada no último encontro regional do Sempre Vivas, em Diamantina.
25/03/2024 - 20:09Os assuntos de destaque no quarto e último encontro regional do Sempre Vivas, realizado na segunda-feira (25/3/24) em Diamantina (Região Central) foram a importância de fortalecer redes de apoio e interiorizar as políticas de prevenção e o enfrentamento à violência contra a mulher. Representantes de quase 20 cidades participaram da reunião.
No encontro foi analisada a situação da violência na mesorregião do Vale do Jequitinhonha, que apresenta os mais altos índices do Estado. De acordo com a coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Justiça de Combate à Violência Doméstica do Ministério Público, Patrícia Habkouk, no ano passado foram registradas 67 tentativas de feminicídio e 61 casos consumados na região.
Ainda segundo a promotora, dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, divulgados neste mês de março, indicam que todos os dias uma mulher de Minas sofre um atentado, mas 45% delas não denunciam.
Durante os debates, os participantes reforçaram a necessidade de se criarem Casas Abrigo e mais unidades de acolhimento.
No Vale do Jequitinhonha, que representa 14% do território do Estado, existem apenas quatro delegacias especializadas no atendimento às mulheres. Em Minas são 69 unidades, duas delas em Belo Horizonte e as demais para atender os 852 municípios do interior.
A cidade histórica de Diamantina, com 50 mil habitantes, é um dos 55 municípios do Vale, localizado na microrregião do Alto Jequitinhonha, formada por 28 municípios. Ali, os índices de violência contra mulher são os mais altos de toda a região, segundo levantamento do Ministério Público.
A titular da Delegacia de Atendimento à Mulher de Diamantina (Deam), Kiria Orlandi, informa que são requeridos, diariamente, três pedidos de medidas protetivas. Ela acredita que, pelas dificuldades que as vítimas enfrentam de acesso aos serviços de proteção, a demanda, certamente, é muito superior aos atendimentos. Para a delegada, as vítimas ainda apresentam fragilidades em relação à raça e ao gênero, somadas à vulnerabilidade social.
A pesquisa do Fórum aponta que, em 2023, o Brasil teve o maior número de feminicídios desde que o crime foi tipificado, há nove anos. Com 1.463 vítimas, o país registrou uma morte a cada seis horas.
Minas Gerais, conforme a pesquisa, surge na segunda colocação de mais casos, atrás apenas de São Paulo. De acordo com o relatório, 183 mulheres foram assassinadas no Estado. “Precisamos fortalecer as redes de atendimento para garantir o acesso das mulheres à proteção da Lei Maria da Penha”, sugeriu Patrícia Habkouk.
Maior demanda é pela ampliação da estrutura no interior do Estado
Na opinião da delegada das mulheres, assim como de outras participantes, para o enfrentamento da violência doméstica, o interior de Minas precisa contar com mais equipamentos públicos de apoio e acolhimento das vítimas. Ela cita a carência de fiscalização das medidas protetivas como um dos problemas graves.
A coordenadora da rede de enfrentamento da violência contra as mulheres do Alto Jequitinhonha, Helen Buttignol Perrella, reclama que o único equipamento de proteção da microrregião é a delegacia. “Não temos centros de referência e nem casas de acolhimento. É importante a interiorização das políticas públicas de prevenção à violência contra a mulher”, afirma.
Em seu entendimento, a vítima precisa de acompanhamento que vai além do que pode oferecer a delegacia. São necessárias equipes multidisciplinares, com psicólogas e assistentes sociais, por exemplo, para permitir que a mulher consiga se livrar do ciclo de violência.
Pensamento semelhante foi defendido pela coordenadora da Fórum de Enfrentamento à violência contra as mulheres do Baixo Jequitinhonha, Luziete Rodrigues Novais. “Para se ter acolhimento das vítimas de violência é necessário diálogo entre a sociedade civil e o poder público. Criar esse rede humanizada de atendimento, que ofereça todos os serviços disponíveis para essas mulheres”.
Ao avaliar os encontros regionais, a presidenta da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, deputada Ana Paula Siqueira (Rede), considerou que foi uma experiência valiosa para conhecer a realidade das diferentes regiões. “Interiorizar é a oportunidade de dar voz e vez ao cidadão e cidadã mineira que não têm condições de chegar na Assembleia”.
Ela disse ter constatado as disparidades entre os locais visitados e as dificuldades relatadas por todos, como a pouca assistência do Estado e falta de infraestrutura. Para a deputada, fica clara a necessidade de a Assembleia de Minas priorizar a fiscalização do enfrentamento da violência contra a mulher, promover o fomento das políticas públicas e dos investimentos para ajudar a salvar a vida das nossas mulheres.
Ana Paula Siqueira anunciou que a comissão vai realizar uma audiência pública em Belo Horizonte para apresentar o balanço dos encontros pelo interior.
O Sempre Vivas faz parte de uma iniciativa da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizada todos os anos, por meio da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, em parceria com órgãos ligados à pauta feminina. Nesta edição, foram realizados encontros, além de Belo Horizonte, em Divinópolis (Centro-Oeste), Poços de Caldas (Sul) e Teófilo Otoni (Jequitinhonha/Mucuri).