Sobrevivência da Lagoa da Petrobras segue ameaçada
Assoreamento e aguapés dominam 70% do antigo espelho d´água; Comissão de Meio Ambiente cobra ações mais efetivas de empresa e do poder público.
15/04/2024 - 18:16Uma solução definitiva para a situação de agonia da chamada Lagoa da Petrobras, situada na divisa de Sarzedo com Ibirité e Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), parece ainda distante. Esta foi a constatação de membros da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), em visita ao local nesta segunda-feira (15/4/24).
A lagoa foi criada quando da instalação da Refinaria Gabriel Passos (Regap), da Petrobras, em 1968, em Betim, com o objetivo de garantir o fornecimento de água para o funcionamento das instalações industriais. Desde o início, a beleza do local ganhou fama e atraiu moradores e turistas. Atualmente, ao contrário, o estado é de abandono, devido à falta de planejamento urbano e de ações do poder público e da própria empresa, ao longo das últimas décadas.
Conforme aponta a deputada Ione Pinheiro (União Brasil), vice-presidenta da Comissão e autora do requerimento da visita, cerca de 70% do espelho d´água original está comprometido. Uma “tragédia ambiental”, nas palavras do prefeito de Sarzedo, Marcelo Pinheiro do Amaral, que acompanhou a visita.
Onde a lagoa não está completamente seca e já tomada pela vegetação, na qual pastam bois e cavalos, a água é coberta por aguapés, de proliferação desenfreada. Trata-se de uma vegetação flutuante, que se aproveita justamente da matéria orgânica do esgoto sem tratamento jogado ali por moradores e empresas instaladas no entorno da lagoa.
A programação da visita dedicou especial atenção à área do vertedouro, em terreno pertencente à Petrobras, onde duas escavadeiras trabalhavam ininterruptamente na retirada de aguapés, formando uma pilha enorme, próxima ao Bairro Masterville, em Ibirité.
Apesar dessa ação e de algumas contenções flutuantes instaladas em alguns pontos, pela dimensão da superfície comprometida, deduz-se que a missão é mesmo inglória.
O cenário encontrado foi ainda mais desolador na Avenida Rio de Janeiro, no Bairro Canaã, em Ibirité, na qual foi constatada a descaracterização completa do espelho d´água, com esgoto sendo despejado diretamente no que antes era um bonito cenário.
Curiosamente, no deslocamento entre um ponto e outro da visita, a comitiva passou ao lado de uma das mais modernas estações de tratamento de esgoto do País, que, de acordo com Ione Pinheiro, está subutilizada. Apenas 50% do esgoto da região seria tratado atualmente pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa).
Além da situação de abandono da Lagoa da Petrobras, a parlamentar também alerta para a precarização da qualidade de vida dos moradores do entorno. Preocupam sobretudo a proliferação de insetos transmissores de doenças e o mau cheiro, em especial da amônia produzida nos processos industriais da refinaria e de outras empresas do mesmo ramo instaladas na região.
A contaminação da água por outros poluentes, como metais pesados, também pode afetar a saúde de moradores. Muitos se alimentam dos peixes pescados na lagoa ou dos animais que pastam nos trechos já secos. “Nossa luta é pelo meio ambiente, mas também pela saúde dessas pessoas”, definiu.
Ione Pinheiro ainda lembrou um estudo antigo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) apontando que, ainda mais grave do que a contaminação provocada pelo esgoto doméstico, é aquela proveniente de uma estação de tratamento dos resíduos industriais da própria Petrobras.
População de Sarzedo seria a mais prejudicada
Situado, em sua maioria, num nível inferior ao da lagoa, o Município de Sarzedo, segundo o prefeito Marcelo Amaral, é o mais prejudicado pela situação. No próximo dia 17 de maio, a prefeitura local vai inaugurar um parque ecológico na região central, que, há algumas décadas, era um dos principais pontos turísticos da RMBH. Mas a principal atração é uma cachoeira cujas águas estão completamente poluídas.
“Sarzedo não tem nenhum esgoto jogado na lagoa, nós não permitimos isso. Nós ainda lutamos por algum resultado, mas nosso temor é a despoluição não terminar nunca”, lamentou o prefeito. Ele ainda reclamou da suposta postura passiva das autoridades municipais de Betim e Ibirité, que ignorariam o problema.
Além dele e de outras lideranças e autoridades de Sarzedo, participaram da visita representantes do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), da Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam) e da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), além de executivos da Petrobras, entre eles o gerente-geral da Regap, Edmilson Ferreira dos Santos, que não quis dar entrevista.
O diretor de gestão regional da Feam, Vitor Reis Salum Tavares, classificou a situação de recuperação da lagoa como “muito complexa”. Segundo ele, são feitas medições trimestrais da poluição, tanto atmosférica quanto das águas, para verificar a efetividade do tratamento dos afluentes e, a cada irregularidade, é registrada uma nova autuação e exigido um plano de ação do responsável.
Sobre a pouca efetividade dessas medidas, ele alega que o auto de infração é apenas o primeiro ato de um processo administrativo, sendo preciso garantir ampla defesa ao empreendimento. Um levantamento de quantos autos já foram lavrados e o estágio atual deles deverá ser encaminhado à ALMG, por solicitação da Comissão de Meio Ambiente.
A visita realizada nessa segunda (15) foi um desdobramento de outras discussões promovidas pelo Poder Legislativo estadual sobre esse tema, em especial uma audiência realizada em Ibirité, em novembro de 2023, na qual a Petrobras anunciou o Projeto AquaSence, agora denominado AquaSmart, em parceria com a Copasa e conduzido pela UFMG e pela Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg).
Conforme anunciado na ocasião, o projeto seria iniciado em março deste ano, com a formalização do termo de compromisso com as universidades. Serão utilizados drones para identificar o estágio de crescimento dos aguapés e facilitar sua remoção de forma mais eficiente, entre outras ações.
Informalmente, os executivos da Regap presentes à visita informaram que ainda estão sendo feitos os acertos finais para lançamento oficial do projeto. Na audiência realizada em novembro, os representantes da Petrobras prometeram limpar espelho d'água da lagoa até 2025, enquanto a Copasa assumiu o compromisso de concluir esgotamento sanitário e abastecimento de água no mesmo prazo.