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Participantes de audiência pedem revogação do novo ensino médio

Comunidade escolar e especialistas salientam que reforma implementada não considera realidade da educação pública brasileira e pode aumentar precarização.

11/05/2023 - 14:45
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A revogação do novo ensino médio, proposto pelo então presidente Michel Temer e aprovado pelo Congresso em 2017, foi amplamente defendida, nesta quinta-feira (11/5/23), em audiência pública da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

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Uma das participantes da reunião que pediu a revogação do ensino o mais rapidamente possível foi a estudante do 2º ano do ensino médio da Escola Estadual Padre Matias, em Belo Horizonte, Rebeca Ariadny Alves de Oliveira. Ela disse se sentir como uma cobaia desse novo modelo de ensino.

“Primeiro, passamos por um momento de crise econômica e de saúde com a pandemia, quando perdi dois anos de escola com o ensino a distância. Em seguida, veio esse novo modelo que foi criado por pessoas que não entendem de educação pública. Tenho crises de ansiedade, pois preciso ajudar meus pais financeiramente e a carga horária não permite isso”, relatou.

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Rebeca disse ainda que é difícil se deslocar para a escola, onde fica quase metade do dia acompanhando aulas sobre temas que, em sua opinião, não vão levá-la a lugar algum. Enquanto isso, segundo ela, disciplinas como física são ofertadas apenas uma vez por semana.

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Professora de biologia na escola em que Rebeca Oliveira estuda, Talita Araújo relatou que os professores não foram capacitados para lidar com o novo ensino médio e criticou a perda de espaço de disciplinas importantes. Na opinião dela, o novo ensino médio vem precarizar ainda mais a educação pública. O professor da rede estadual em Formiga Rodrigo Mello concordou com a colega.

Novo ensino não prepararia aluno

A ansiedade demonstrada pela estudante Rebeca Oliveira encontra respaldo no que explicou a professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Jaqueline Moll. Ela disse que a reforma do ensino médio apenas aprofundou problemas da educação.

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Para o professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) Daniel Cara, a reforma já foi legitimamente rejeitada pela comunidade escolar. “Agora, é preciso revogar a medida para formalizar esse fim”, disse. Ele foi categórico ao dizer que a reforma do ensino médio foi a primeira do País construída por pessoas que nunca lidaram com o cotidiano escolar.

Daniel Cara disse ainda que quem concebeu essas mudanças desconhece o fato de que no mínimo 2 mil municípios brasileiros têm apenas uma escola de ensino médio e que muitas estão sendo fechadas em todo o País, embora para implementar o novo ensino médio seja necessário criar ainda mais turmas.

Reforma seria inviável

Mestre em ciência política, doutor em ciências sociais e presidente do Instituto Cultiva, Rudá Ricci destacou que a reforma não é executável.

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Ele salientou que a medida foi anunciada com dois objetivos utópicos: gerar empregabilidade a partir de itinerários formativos e garantir liberdade de escolha ao aluno.

Em relação ao primeiro, ele salientou que a educação forma, mas não gera emprego, pois o que faz isso é o mercado. Já sobre o segundo, Rudá Ricci destacou que os itinerários formativos são sorteados ou impostos aos estudantes.

Governo relata implementação do modelo, que não convence deputados

A assessora da Subsecretaria de Desenvolvimento da Educação Básica da SEE, Iara Félix Pires Viana, destacou que, para adequar o Estado à norma federal, foi feito um trabalho conjunto, inclusive com escuta da comunidade escolar.

Já a diretora de Ensino Médio da Secretaria de Estado de Educação (SEE), Rosely Lima, contou que, em 2020, o governo começou a instituir as mudanças em 11 escolas-piloto. 

Ela acrescentou que, em Minas, o ensino médio prevê 3 mil horas de carga horária em três anos, sendo 1,8 mil horas para formação geral e básica e 1,2 mil horas dedicadas aos chamados itinerários formativos. Segundo Rosely, não foram suprimidos componentes curriculares.

Deputados apoiam revogação do novo ensino médio

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A deputada Beatriz Cerqueira (PT), presidenta da Comissão de Educação, relatou que a ALMG já realizou uma série de atividades em escolas e discussões sobre o novo ensino médio. Ela enfatizou que todos os apontamentos levaram  deputados da comissão a pedirem a revogação da iniciativa.

O deputado Professor Cleiton (PV) disse que o novo ensino médio acaba por precarizar o ensino público.

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Concordou com ele a deputada Lohanna (PV), que destacou, assim como o deputado Betão (PT), que os estudantes da rede privada não foram prejudicados com o novo ensino médio, uma vez que não perderam disciplinas e ganharam outros conteúdos.

A deputada Macaé Evaristo (PT) lembrou o contexto em que a reforma foi implementada, em conjunto com uma proposta de emenda à Constituição que congelava investimentos na educação. Ela acredita que as mudanças impostas estão relacionadas a um pensamento elitista que não admite as populações mais vulneráveis nas universidades.

Os cinco deputados foram os autores do requerimento para a realização da audiência.

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Novo ensino médio

Por meio do novo ensino médio, as disciplinas tradicionais passaram, desde 2022, a ser agrupadas em áreas do conhecimento (linguagens, matemática, ciências da natureza e ciências humanas).

A partir desse ano, cada estudante passou a poder montar seu próprio ensino médio, escolhendo as áreas (os chamados "itinerários formativos") nas quais se aprofundará.

Há, no novo modelo, um aumento progressivo da carga horária. Antes, no modelo anterior, eram, no mínimo, 2,4 mil horas no ensino médio inteiro.

Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia - debate sobre os impactos do Novo Ensino Médio
Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia - debate sobre os impactos do Novo Ensino Médio
“Quero fazer uma graduação, mas sinto que esse sonho está ficando cada vez mais distante.”
Rebeca Oliveira
Estudante do ensino médio
“Ela não forma o aluno para o mercado de trabalho e nem o leva à universidade.”
Jaqueline Moll
Professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
“Essa reforma já morreu porque as bases dela não se realizam.”
Rudá Ricci
Cientista político
“Essa reforma aumenta o abismo entre a educação pública e a educação privada.”
Professor Cleiton
Dep. Professor Cleiton
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