Governo teria feito manobra para adiar aproveitamento de adicional de desempenho
Dispositivo incluído na reforma administrativa deu prazo de um ano para Executivo cumprir Emenda à Constituição que trata do ADE.
16/05/2023 - 15:05Surpresas e críticas marcaram audiência da Comissão de Segurança Pública realizada nesta terça-feira (16/5/23) sobre o aproveitamento de adicionais de desempenho (ADEs) adquiridos por servidores estaduais em cargos anteriores. Isso para fins de cálculo da remuneração em novo cargo.
O direito ao aproveitamento do ADE está assegurado na Emenda à Constituição do Estado de nº 111, promulgada em junho do ano passado. Contudo, a comissão e entidades souberam na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) que o governo do Estado incluiu este ano, na reforma administrativa, dispositivo dando prazo de um ano para o Executivo regulamentar a matéria.
A notícia foi trazida pela representante da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag), Maria Aparecida Muniz Jorge. Questionada sobre a razão da demora do Executivo em cumprir o direito, uma vez que demais Poderes do Estado já estão praticando o aproveitamento do ADE, ela argumentou que a Lei 24.313, de 2023, deu ao Executivo o prazo de 12 meses para regulamentar a emenda, contados a partir de 29 de abril deste ano.
Ao verificar que a lei citada era a que tratava da nova organização administrativa do Estado, fruto de projeto de lei do governador (PL 358/23), o presidente da comissão, deputado Sargento Rodrigues (PL), taxou de vergonhosa o que viu como manobra do governo.
O dispositivo teria passado despercebido na fase final da tramitação na ALMG, tendo o parlamentar questionado como uma lei ordinária, como a da reforma administrativa, poderia dizer, como está em seu artigo 142, que uma lei complementar virá para regulamentar uma emenda constitucional.
“A história ficou pior. Uma lei ordinária não pode restringir um direito constitucional. Que o Executivo propusesse então uma nova emenda à constituição em contrário. Isso é vergonhoso. Em vez de cumprirem a norma, fizeram uma nova lei para dar mais tempo para cumprir o que já é lei”, ainda criticou o parlamentar.
Cobrança na justiça é cogitada
O advogado Fernando Calazans, do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de Minas Gerais, frisou que a Emenda à Constituição 111 tem aplicabilidade imediata, e que portanto não haveria necessidade de nenhuma outra norma para regulamentá-la, como informado pela Seplag.
Segundo ele, o Supremo Tribunal Federal (STF) já teve entendimento semelhante ao analisar outras normas interpretativas, como seria o caso da emenda em questão.
“Caberia ao Estado ter instituído o direito. A lei do ADE já garante a dotação orçamentária para o adicional há duas décadas”, destacou o advogado, para quem a questão orçamentária não pode ser impeditivo para o aproveitamento do adicional em caso de mudança de cargo.
Fernando Calazans ainda registrou que já há um precedente para que servidores do Executivo judicializem a questão, pois segundo ele um atual delegado de polícia acionou a Justiça para assegurar o aproveitamento do ADE conquistado anteriormente como policial militar.
“Continuaremos judicializando essas questões de descumprimento de direitos”, concluiu Aline Risi dos Santos, ao mencionar que sucessivos desrespeitos estariam sendo praticados pelo Governo do Estado.
Presidente da Associação dos Escrivães da Polícia Civil, ela disse que há mais de um ano ela mesma está sem receber seu ADE, o que foi apontado pelo presidente da comissão como uma tentativa do governo de sufocar as entidades que defendem os direitos da categoria.
Seplag não convence e discussão vai prosseguir
Apesar das críticas, a representante da Seplag disse que a secretaria não está deixando de reconhecer o direito ao aproveitamento do ADE, mas que apenas aguardou a conclusão de estudos da equipe técnica da pasta sobre a regulamentação da matéria.
Segundo Maria Aparecida Muniz Jorge, esses estudos da Seplag foram encaminhados à Advocacia Geral do Estado (AGE) e a secretaria está aguardando um parecer do órgão. “O Executivo ainda está dentro do prazo, e está tomando as providências necessárias para o devido encaminhamento", argumentou ela.
“Vamos ter que fazer uma nova audiência, pois não posso ter uma interpretação restritiva de uma emenda em vigor, sendo que o governo não tem uma ação questionando sua constitucionalidade”, rebateu Sargento Rodrigues, anunciando que fará encaminhamentos da comissão nesse sentido.