Falta de apoio do governo e dos cartórios mineiros dificulta crédito fundiário
Em audiência, participantes abordam perspectivas e desafios para que programa federal deslanche no Estado.
11/03/2024 - 19:40 - Atualizado em 12/03/2024 - 10:11A falta de apoio do Governo do Estado ao Programa Nacional de Crédito Fundiário seria comprovada pela ausência de uma unidade técnica estadual (UTE) em Minas. Outro problema seria o descomprometimento dos cartórios com o programa, demonstrado pela cobrança junto aos assentados das taxas de registro, em desobediência a leis aprovadas na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Esses foram alguns dos pontos destacados em reunião da Comissão de Participação Popular, nesta segunda-feira (11/3/23), onde se discutiram os procedimentos para acesso e implementação do programa do governo federal em Minas. A iniciativa partiu do deputado Leleco Pimentel (PT), que criticou a ausência na audiência pública do superintendente do Banco do Brasil, banco oficial de fomento importante para a política de crédito rural.
Para Vilson Luiz da Silva, presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura de Minas Gerais (Fetaemg), Minas Gerais e Rio Grande do Sul sempre estiveram na vanguarda das políticas para o pequeno agricultor. Ele defendeu a implantação no Estado de uma UTE, órgão que apoiaria as políticas do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar: “A UTE é muito importante para nós; quando tinha essa unidade em Minas, todo mês, era aprovado um ‘calhamaço’ de projetos no Estado”, relembrou.
Criticando também a ausência do representante do BB na reunião, o sindicalista defendeu que essa instituição exerça seu papel como banco de fomento. Vilson Luiz reivindicou que o Crédito Fundiário, hoje de R$ 280 mil por família, passe para R$ 350 mil.
O deputado federal Padre João (PT-MG) concordou com o sindicalista e sugeriu a diferenciação do teto do crédito fundiário conforme a região do Estado. Após lamentar também a ausência do superintendente do BB, o parlamentar condenou a atuação de muitos cartórios do Estado que cobram dos pequenos agricultores taxas de registro e outras, em desacordo com legislação.
O deputado Ricardo Campos (PT) sugeriu que o governo federal aplique mais recursos no crédito fundiário e aumente o valor do teto. Propôs ainda que parte da verba do Fundo de Erradicação da Miséria (FEM), do Governo do Estado, seja aplicada nesse programa. E defendeu a redução da burocracia, para que o recurso chegue às mãos dos pequenos agricultores: “Falar que tem bilhões ofertados é fácil; quero ver é o banco abrir suas portas e fazer o programa sair do papel”, disse.
Da plateia, o engenheiro agrônomo Jeferson Joe propôs que os cartórios também sejam cobrados para que cumpram as leis de isenção de taxas para os assentados. O deputado Padre João sugeriu a realização de outra audiência na ALMG sobre esse tema.
Hebert Araújo, coordenador de Crédito Fundiário do MDA, disse que uma das demandas apontadas pelos agricultores familiares era que o programa contemplasse os jovens, de modo a estimulá-los a permanecerem no campo. Segundo ele, o Ministério promoveu a restruturação do programa, com linhas de crédito para atender a esse público, como a denominada Terra da Juventude. Os que aderem recebem um bônus se mantiverem seus pagamentos sempre em dia, entre outros benefícios. Há também uma linha de crédito voltada para a implantação de infraestrutura para internet rural.
Pesquisa mostra que crédito fundiário melhorou vida na zona rural
Segundo Shirley Abreu, diretora de Governança Fundiária do MDA, pesquisa do governo federal apontou que o crédito fundiário foi considerado o melhor programa para o meio rural. “Na enquete com mil famílias, ficou demonstrado que, em 14 anos, o orçamento das famílias melhorou em média 600%”, comemorou.
Ela explicou que o crédito fundiária está estruturado no tripé acesso a terra, projeto produtivo e assistência técnica. “É bem completo, o que faz com que tenha um índice de inadimplência muito baixo”, destacou a gestora, lembrando que, desde 2012, o programa não recebe recursos governamentais, pois os próprios pagamentos dos empréstimos o financiam.
Depois de detalhar as quatro linhas de crédito oferecidas no programa, Antônio Veríssimo, superintendente estadual do MDA em Minas Gerais, reivindicou o aumento de servidores para MDA em Minas Gerais, especialmente consultores. São menos de dez funcionários, sendo que a metade fica incumbida do crédito fundiário e a outra metade, voltada para as diversas outras ações do Ministério.
Banco do Nordeste
Já Wesley Maciel, superintendente do Norte de Minas e do Espírito Santo do Banco do Nordeste do Brasil, informou que, dos 853 municípios mineiros, 249 são atendidos pelo BNB. Após ouvir críticas sobre a morosidade do banco para conceder os empréstimos, respondeu que isso se devia à carência de pessoal. “Hoje, temos mais condições de apoiar o programa, atendendo a um maior número de proponentes. É obrigação nossa e estamos prontos para isso”, dispôs-se.
O deputado Leleco Pimentel comentou que, como apenas 249 municípios são atendidos pelo Banco do Nordeste em Minas, aumenta a responsabilidade do Banco do Brasil, uma vez que este atende a todo o Estado. Quanto às propostas encaminhadas ao BNB e ao Banco do Brasil, informou que será realizada uma consulta nominal sobre todas elas, de modo a reduzir a espera.
Egresso da agricultura familiar na produção do café, o deputado Professor Cleiton (PV) afirmou que essa atividade é a responsável pela mudança de vida de muitas famílias. E que o incremento dela só acontece quando há uma política governamental de crédito adequada.
A deputada Leninha (PT) avaliou que o governo Lula está tentando recuperar o tempo perdido. Defendeu que um programa para esse público deve atender a todas as pontas - acesso à terra, crédito rural e assistência técnica – de modo que gere renda para o agricultor.
Assentamento
Fernanda Estevão, integrante da Fetaemg e do Assentamento Padre Jésus, em Espera Feliz (Central), com mais de 200 famílias, deu seu depoimento em favor do crédito fundiário. “Com o financiamento, conseguimos produzir 2 mil sacas de café por ano”, declarou. Ela reivindicou melhoria da assistência técnica aos assentados, o que ajuda na diversificação da produção em cada propriedade, e consequentemente, promove a melhoria de renda do agricultor.
Como demanda, ela propôs que os técnicos contratados pelas Escolas Famílias Agrícolas possam assinar os laudos dos agricultores, o que atualmente é feito apenas por engenheiros agrônomos.
Ao final da audiência, diversos participantes ocuparam a tribuna reforçando queixas contra a burocracia nos processos e outros problemas rotineiros como carência de assistência técnica, deficiência no fornecimento de energia elétrica e melhoria nos serviços públicos de saúde e educação, para que as famílias se sintam estimuladas a se manter no campo.