Extinção da Fucam volta a ser combatida e tem parecer pela rejeição
Comissão se posicionou contrariamente a projeto do governador que trata da fundação, novamente defendida por comunidades em audiência nesta quinta (27).
27/04/2023 - 15:56O Projeto de Lei (PL) 359/23 do governador Romeu Zema (Novo), que transfere competências da Fundação Caio Martins (Fucam), recebeu parecer pela rejeição nesta quinta-feira (27/4/23), em reunião da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Com faixas dizendo que "educação não se extingue, se amplia!", alunos e ex-alunos da Fucam e vereadores do interior acompanharam a reunião, vindos de vários locais do Estado para audiência pública solicitada pelo deputado Leleco Pimentel (PT) e realizada na mesma reunião da comissão, na sequência da apreciação do parecer.
Contrários ao PL, eles denunciaram novamente que, embora o governo alegue que o PL 359/23 prevê a absorção das atividades e do patrimônio da fundação pelo Executivo, na prática haveria a extinção da fundação.
O mesmo entendimento teve a relatora do projeto, deputada Beartriz Cerqueira (PT), que preside a comissão. Segundo seu parecer contrário à aprovação do projeto, que tramita em 1º turno, o texto do governador não dá garantias de que as atividades educacionais da Fundação Caio Martins tenham continuidade, transfere cargos para outras estruturas e ainda não deixa claro o que ocorrerá com o patrimônio da fundação.
A parlamentar explicou que a apresentação de seu relatório antes da audiência foi necessária para que a matéria não seguisse tramitando sem o parecer da comissão, o que poderia vir a ocorrer por pressão do governo.
Como o prazo regimental de análise da comissão se encerraria nesta quinta (27), ela disse ter sido informada de que o governo pediria que o projeto seguisse para a Comissão de Administração Pública, a próxima que deve analisar a matéria.
Mobilização pela Fucam deve continuar
Fundada em 1948, a Fucam oferece a crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social educação básica e atividades de formação voltadas para a redução da pobreza no campo.
Relatos emocionados sobre esse papel da instituição voltaram a marcar a audiência desta quinta (24), quando estiveram representados os vários centros educacionais que a fundação tem por Minas Gerais, distribuídos por seis municípios: Esmeraldas (Região Metropolitana de Belo Horizonte), Riachinho (Noroeste de Minas), Buritizeiro, São Francisco, Januária e Juvenília, esses últimos na região Norte.
“É uma crueldade com a identidade de povoados, de vilas e de cidades inteiras esse projeto de lei", resumiu Luiz Fábio Palma, professor de Biologia da fundação, para quem a Fucam tem ainda importante contribuição a dar para que Minas Gerais tenha atuação relevante na preservação ambiental.
Géssica de Almeida, vereadora da Câmara de São Francisco, suplicou pela sensibilidade do governo para manter a fundação e Stela Aparecida de Abreu Santos, presidente da Associação dos Ex-alunos da Fucam, lembrou que há 50 dias comunidades atendidas pela Fucam se mobilizam em defesa da instituição.
“Fizemos promessas de não chorar mais, mas não estamos conseguindo cumprir" desabafou ela, que é analista Educacional na Superintendência Regional de Ensino de Januária.
"Sou fruto dessa escola Fucam, eu e nove irmãos", endossou em seu testemunho o hoje coordenador do Centro Educacional de Juvenília da fundação, Alaripe Durães.
Parlamentares como a deputada Leninha (PT) apoiaram a continuidade da mobilização contra o projeto. "Queremos é revitalização da Fucam e mais investimentos nela".
Parecer vê destino incerto do patrimônio
Entre outros, o parecer da relatora contra o PL 359/23 destaca que a Fucam tem hoje 16 imóveis.
Embora a Secretaria de Estado de Educação (SEE) tenha informado que não há previsão de alienação desse patrimônio, o relatório registra ter sido constatado que houve uma reunião entre a Secretaria de Estado de Governo (Segov), a direção da Fucam e o empresário José Salim Mattar Junior, na qual foram apresentados dados sobre os imóveis da fundação, incluindo sua localização e extensão. Salim Mattar é dono da Localiza, empresa com sede em Belo Horizonte.
Segundo a relatora, esse "fato suscitou espanto e questionamentos sobre qual seria a justificativa de um empresário, beneficiário de incentivos fiscais do governo e sem relação com a administração pública, participar de uma discussão dessa", o que para a deputada só traria incerteza quanto à destinação do patrimônio da fundação.
Para a relatora, o texto do governador sinaliza que a supressão de cargos e recursos da Fucam ocorrerá em benefício de outros órgãos e finalidades que nada se identificam com os serviços prestados pela fundação.
Isto porque o projeto prevê que bens móveis da Fucam sejam incorporados ao patrimônio da Secretaria de Estado de Educação e seus bens imóveis ao do Estado; e que os cargos e respectivos servidores do grupo de carreiras dos profissionais de educação básica sejam transferidos à SEE, com a extinção de diversos cargos de provimento em comissão e a criação de outros, na SEE e na Segov.
Falta clareza também sobre cursos
O parecer ainda frisa que o projeto diz que as competências educacionais, sociais e produtivas da Fucam serão “transferidas” para a SEE, mas que não estabelece medidas concretas que viabilizem essa incorporação.
A movimentação de pessoal prevista no texto, segundo a relatora, por si só não assegura que a SEE conseguirá desenvolver atividades fora de seu escopo e para as quais não tem estrutura, expertise ou afinidade.
Também não fica claro, diz a relatora, se objetivo é determinar a manutenção dos cursos e atividades atualmente desenvolvidos pela Fucam, cuja oferta poderá se extinguir após a conclusão dos respectivos ciclos, ou estabelecer a atribuição permanente da SEE de ofertar esses cursos.
Discussão
Na discussão do parecer, a deputada Macaé Evaristo (PT) se emocionou na defesa da Fucam dizendo que é preciso seguir lutando pela permanência da instituição para garantir o direito à educação, sobretudo no campo.
“Precisamos transformar essa angústia em luta”, endossou o deputado Leleco, para quem o governador estaria querendo fazer com o patrimônio da Fucam uma extensão de seus negócios.
Na avaliação do deputado Ricardo Campos (PT), o projeto que trata da Fucam significa “a extinção dos sonhos da população rural” e tira o direito à educação no campo.