Executivo contesta pesquisa que aponta falta de políticas para egressos do sistema prisional
Para governo, dados da Política de Prevenção à Criminalidade não foram considerados. Coordenador da Plataforma Justa, que fez levantamento, disse que gasto com a repressão é maior que com a prevenção.
31/10/2023 - 15:50 - Atualizado em 06/11/2023 - 13:38Servidores do Governo de Minas contestaram pesquisa apresentada pela Plataforma Justa durante reunião da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta terça-feira (31/10/23).
O advogado e coordenador de advocacy da Plataforma Justa, Felippe Angeli, fez a apresentação dos dados da pesquisa nacional focados em Minas Gerais: “Funil de Investimento da Segurança Pública e Prisional do Brasil”. O levantamento fez uma análise dos orçamentos direcionados às polícias, aos sistemas penitenciários e às políticas para egressos em oito estados do País durante o ano de 2021.
Os dados mostram como os enormes impactos financeiros do crescimento prisional, sobretudo em função da Lei de Drogas, não são acompanhados de investimentos para garantir direitos para quem deixa a prisão, depois de cumprida a pena.
Durante sua apresentação, o especialista observou que 40% da população carcerária brasileira são presos provisórios, uma inversão do que determina a Constituição Federal e o Direito Penal no País. Ele também destacou o forte marcador social e racial, já que os encarcerados são principalmente jovens negros e pobres.
Conforme constatado pela pesquisa, em 2021 Minas Gerais foi o segundo estado brasileiro com o maior investimento na segurança pública, com quase R$ 111 bilhões. Desse total, R$ 6,7 bilhões foram direcionados para as polícias, R$ 2 bilhões para o sistema penitenciário e nenhum valor desse recurso foi destinado a políticas para egressos no Estado.
“Não há programas orçamentários dedicados a egressos no Estado. Proporcionalmente, a diferença entre o que é gasto com a polícia, com o sistema prisional e com os egressos é muito grande. Não é que não há políticas direcionadas aos egressos. Há pelo menos três programas mencionados no Plano Plurianual mineiro. Mas não há menção específica no programa orçamentário a políticas para egressos”, disse.
Retificação da pesquisa foi pedida
A coordenadora de Políticas Penais de Prevenção Social à Criminalidade da Subsecretaria de Prevenção Social à Criminalidade da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública, Fabiana Dias dos Santos da Silva, afirmou que em janeiro de 2023 havia pedido a retificação da pesquisa, tendo em vista que desde 2002 existe em Minas a Política de Prevenção à Criminalidade.
“Foi triste ler que o trabalho que executamos não existe. Composta por seis programas, essa política traz muitos desafios. O programa de atendimento ao egresso do sistema prisional começou a ser executado em 2002. E temos documentação que comprova que o Programa de Inclusão Social de Egressos do Sistema Prisional (PrEsp) tem dedicados a ele R$ 5 milhões, exclusivamente. O governo federal nos destinou R$ 3 milhões para isso e vocês nos colocam num lugar difícil com essa pesquisa”, pontuou.
A coordenadora ressaltou que existe uma equipe capacitada em cada município com mais de 200 mil habitantes apta a atender os egressos, que recebe quem sai e que prepara os pré-egressos dentro das unidades prisionais, para dar suporte e oferecer cesta básica e vale social.
“Buscamos aprimorar a Rede de Atenção ao Egresso (Raesp). Queremos que a próxima edição da pesquisa do Justa leve em consideração esse trabalho que temos”, afirmou.
Subsecretário da Subsecretaria de Gestão Administrativa, Logística e Tecnologia da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública, Tiago Maduro de Azevedo chamou a pesquisa de contraditória e se colocou à disposição para disponibilizar mais dados do governo sobre os investimentos em políticas para egressos.
“Hoje temos mais de 17 mil pessoas presas. Investimos em iniciativas educacionais dentro das prisões, o que também é uma forma de investir em quem vai sair futuramente. Em 2022, foram R$ 39 milhões previstos na Lei Orçamentária Anual (LOA), com crescimento nos últimos quatro anos de 47%”, disse.
O subsecretário da Subsecretaria de Direitos Humanos da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social, Duílio Silva Campos, pediu que a próxima edição da pesquisa do Justa não “tenha nenhum viés” e ressaltou que o governo tem ciência dos desafios de ressocialização dos presos.
Felippe Angeli afirmou que não é uma questão de viés, mas sim de números. “Acho que falta transparência nos dados que Minas divulga sobre seu orçamento. É fato que o gasto com a repressão é maior que com a prevenção. Vocês me desculpem, mas R$ 5 milhões dentro do orçamento mineiro é zero, não é para desfazer do trabalho de ninguém, é a lógica do sistema, de privilegiar a política de encarceramento”, rebateu.
Violação de direitos
Vice-presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos (Conedh), Fernando Gonzaga Jayme denunciou que o Estado ignora as poucas denúncias formuladas de violação de direitos humanos, já que existe uma sistemática violência estrutural a familiares ou detentos não têm condições sequer de formalizar denúncias.
A presidenta da Comissão de Direitos Humanos e autora do requerimento para a realização da reunião, deputada Andréia de Jesus (PT), frisou que a pesquisa evidencia o alto gasto com as políticas de repressão e o valor inferior destinado à prevenção.
“Estudo o encarceramento há anos e sei que este não é um problema exclusivo do Executivo. O Judiciário também tem sua participação e o problema é amplo. Mas essa pesquisa nos ajuda a compreender melhor a distribuição do financiamento e como isso impacta nas demais políticas. É grande a distância entre o investido em repressão e em prevenção", pontuou.