Estudo evidencia danos à saúde de atingidos por rompimento de barragem
Pesquisa da Fiocruz foi apresentada em audiência pública da Comissão de Meio Ambiente da ALMG nesta terça-feira (29).
29/04/2025 - 12:38 - Atualizado em 29/04/2025 - 15:51Problemas respiratórios e de saúde mental ainda afligem a população atingida pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, mesmo mais de seis anos após a tragédia. A informação faz parte de uma pesquisa da Fiocruz Minas, que está sendo apresentada em audiência pública da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta terça-feira (29/4/25).
Chamado Programa de Ações Integradas em Saúde de Brumadinho, a pesquisa vem sendo realizada desde 2021 e é financiada pelo Ministério da Saúde e desenvolvida em duas frentes: uma focada na população acima de 12 anos (Saúde Brumadinho) e outra voltada para crianças de 0 a 6 anos de idade (Projeto Bruminha).
A reunião é fruto de solicitação da deputada Bella Gonçalves (Psol). Ela lembra que essa é a terceira audiência pública a tratar da saúde das pessoas atingidas. Anteriormente, o tema já havia sido debatido pelas comissões de Saúde e de Direitos Humanos na ALMG.
Além da Fiocruz e de parlamentares participaram do debate representantes do poder público, da população atingida e das assessorias técnicas que acompanham as comunidades da Bacia do Rio Paraopeba impactadas pelo desastre.
Problemas respiratórios em crianças
Carmen Ildes Rodrigues Fróes Asmus, professora titular do Instituto de Estudos de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenadora do projeto Bruminha da Fiocruz Minas, apresentou os dados da pesquisa realizada para investigar os impactos à saúde e desenvolvimento infantil, o projeto Bruminha.
Os resultados mostram uma diminuição no risco de atraso na aprendizagem, se comparados o ano de início da pesquisa (42,5% em 2021), no último ano (28, 3% em 2023), indicando uma melhora no desenvolvimento psicomotor.
Em relação ao peso e altura, houve um aumento no percentual de crianças que apresentaram Índice de Massa Corporal (IMC) normal: 76% em 2021 e 90,8% em 2023.
Contudo, constatou-se um aumento dos relatos de alterações respiratórias ao longo dos anos. Em 2021, foi detectado um risco 3 vezes maior de alergias respiratórias nas localidades expostas à poeira de resíduos de mineração.
No que se refere à exposição de resíduos de metais, houve aumento do percentual total de crianças que apresentaram concentrações de arsênio na urina acima dos valores de referência: de 42% em 2021 para 57% em 2023. Na comunidade do Tejuco, a concentração chega a 72%.
A pesquisadora alerta, no entanto, que os resultados indicam uma situação de exposição, não de intoxicação das crianças. Também não se observou associação entre a exposição a metais e a ocorrência de alterações no crescimento e desenvolvimento neuromotor e cognitivo na população estudada.
Atingidos demandam protocolo específico
Logo no início da audiência pública, representantes das comunidades atingidas relataram as dificuldades no acesso e tratamento dos danos à saúde através do Sistema Único de Saúde (SUS).
“O SUS não está preparado para nos atender”, lamentou Michelle Rocha, moradora da comunidade de Monte Calvário, em Betim (Metropolitana de BH). Ela relata que são muitos os casos de falta de diagnóstico ou diagnósticos errados.
Integrantes de assessorias técnicas independentes também apontaram a falta de assistência à saúde nas comunidades, principalmente no aspecto mental. Conforme o professor do Instituto Guaicuy, Marcus Vinícius Polignano, é necessário que as pessoas atingidas participem do comitê para definir em conjunto as medidas de reparação.
Segundo a coordenadora do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), Marta de Freitas, de 2002 a 2019, oito barragens foram rompidas em Minas Gerais. Ela lamentou a morte imediata de moradores, empregados e terceirizados, mas questionou quantas pessoas adoeceram e faleceram posteriormente em decorrência do abalo na saúde física e mental.
Exemplificou que a contaminação da atividade minerária causa dermatose, infertilidade, problemas respiratórios, demência e câncer. “A lama atingiu cursos de água e lençóis freáticos e nós precisamos de critérios para avaliar esse impacto”, defendeu.
De acordo com Abdalah Nacif, da comunidade de Beira Córrego, em Fortuna de Minas (Central), criou-se um grupo de trabalho para elaborar um protocolo de saúde específico para atendimento das pessoas atingidas. A demanda é resultado de conferências livres de saúde construídas pelas próprias comunidades e foi posteriormente apresentada na 17ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 2023.
Robson de Oliveira, morador do distrito de Piedade de Paraopeba, em Brumadinho (Central), questionou que a garantia do direito à saúde esteja sendo discutida a partir do acordo judicial de reparação, assinado pela Vale, Governo de Minas e instituições de justiça em 2021.
Atenção à saúde primária e produção de estudos são foco do Poder Público
Segundo o promotor Leonardo Maia, o acordo firmado não abrange todas as questões de saúde. Por isso, estão sendo incluídas ao processo as perícias judiciais realizadas pela equipe da UFMG. Em resposta, a deputada Bella anunciou que vai requerer ao Tribunal de Justiça a apresentação desse estudo.
A secretária de Saúde de Brumadinho, Cinthya Mara Pedrosa, admitiu que, embora tivesse sido instalado um hospital após a tragédia, o local permaneceu ocioso por falta de cuidado da gestão anterior. Explicou que agora, além de debater com os moradores as demandas, o foco do mandato, que começou em janeiro deste ano, vai ser a atenção primária e busca de apoio para manter as instalações tecnológicas.
O assessor-chefe de Relações Institucionais, Luiz Fernando Miranda, citou edital de pesquisa, protocolo e plano, como ações da Secretaria Estadual. Já o subsecretário de Vigilância em Saúde, Eduardo Prosdocimi, explicou as etapas do relatório técnico que está sendo produzido. Mencionou ações de capacitações e de monitoramento do ar, de água e de desastres.


Quadro de saúde mental preocupante entre adultos
Para o projeto Saúde Brumadinho, foi entrevistada uma média de 2.500 pessoas. A apresentação dos dados ficou a cargo de Sérgio William Viana Peixoto, pesquisador da Fiocruz Minas e coordenador da pesquisa.
Em relação à saúde mental, a pesquisa constatou um índice de 18,1% de pessoas adultas diagnosticadas com depressão, diante de uma média nacional de 10,2%.
Cerca de 28,2% dos adultos apresentam sintomas depressivos mesmo que não tenham sido diagnosticados. Nas comunidades de Tejuco (mais próxima do local de rompimento da barragem) e Parque da Cachoeira, o índice atinge mais de 40%.
Entre todos os adolescentes entrevistados, a média é de 17,6% e só no Tejuco o índice chega aos 44,5%.
A ocorrência de asma entre os adultos atingiu um índice de 10,8% em 2024, sendo a média nacional de 5,3%. Os adolescentes apresentam uma taxa de 13,2%.
Quanto à presença de metais pesados no organismo, houve uma redução acentuada em relação ao ano de 2021, principalmente de manganésio e chumbo, mas, em 2023, 21,9% da população pesquisada ainda apresentava níveis de arsênio acima dos valores de referência.
A procura pela população por consultas médicas aumentou no período da pesquisa, de 38,6% em 2021 para 58,3% entre os adultos, e de 21,7% para 66,8% entre adolescentes.
