Cigarros apreendidos em presídio de Neves têm destinação incerta
Episódio envolve suspeita da origem dos maços e gerou controvérsia em audiência da Comissão de Segurança Pública nesta quarta (12).
12/06/2024 - 15:50Passados 18 dias, cigarros apreendidos no Presídio Inspetor José Martinho Drumond, em Ribeirão das Neves (Região Metropolitana de Belo Horizonte), sob suspeita de origem duvidosa, teriam retornado à unidade e estariam trancados, mas ainda com destino incerto.
Esse é o cenário que resume os relatos feitos na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), durante audiência que discutiu o caso nesta quarta-feira (12/6/24), na Comissão de Segurança Pública. A reunião foi pedida pelo deputado Sargento Rodrigues (PL), que preside o colegiado e, ao final da reunião, criticou o fato de o material ainda estar no presídio.
“Há um lapso temporal, a unidade não pode guardar esse material sem providências todo esse tempo", concluiu ele após questionar a ação de gestores do presídio e cobrar uma destinação correta dos cigarros.
A apreensão do material foi solicitada à Polícia Militar, em 25 de maio, pelo policial penal Alexandre Magno Soares, que suspeitou de sua origem. O caso envolve 10 mil cigarros, divididos em 57 pacotes, que teriam sido enviados por familiares, pelos Correios, a 31 detentos.
Policial penal justifica pedido de apreensão
Alexandre Magno Soares expôs em detalhes o ocorrido no dia, desde quando chegou ao trabalho na unidade, às 7 horas, até quase meia-noite. Em resumo, diante da suspeita acerca da origem dos cigarros, ele relatou idas e vindas dele às salas do diretor-geral do presídio, Daniel Costa Sousa, e do diretor de segurança, Gideão Alves Lima.
Segundo ele, seu objetivo era que fosse feito um relatório acerca dos cigarros. Contudo, grande parte do material já estaria retida na chamada sala de censura, onde as encomendas são inspecionadas, e o pouco que ele teria em seu poder, conforme a gestão da unidade, não seria suficiente para comprovar a materialidade e gerar o relatório.
Ainda conforme relatos do policial penal, os dois gestores, em vários momentos em separado, não teriam autorizado a retirada de mais produtos para fundamentar o caso, alegando não terem essa competência por questões de subordinação. Diante do fato, ele acionou a Polícia Militar e houve a apreensão.
Inicialmente o material foi para a Delegacia de Plantão na Cidade Administrativa, a qual teria recomendado que o volume deveria ser destinado à delegacia de origem, em Neves, o que teria sido feito dias depois. Esta, contudo, teria devolvido o material apreendido para a unidade prisional.
Conforme explicou o policial penal, há casos em que os presos se valem de cigarros de origem duvidosa para usar drogas sintéticas diluídas no fumo, como as que foram recentemente apreendidas em operação realizada em unidades prisionais na Grande BH.
Gestores se defendem e dizem aguardar instância superior
Em resposta a questionamentos do deputado, o diretor de segurança da unidade disse que os cigarros em questão permanecem trancados e sem distribuição. Gideão Lima alegou não ter autonomia para decidir sobre o que fazer, pois está subordinado ao diretor-geral.
Este, por sua vez, disse que não tem agora, após a apreensão pela PM, competência para decidir o que fazer com os cigarros, e que caberia a outra esfera dar encaminhamento, possivelmente o militar que lavrou a ocorrência e retirou o material da unidade, conforme cogitou.
Ele argumentou que a unidade tem área de custódia e que não era necessário a PM ter sido acionada no caso. Disse ainda que a direção não vai compactuar com o crime, mas que, por ora, na atual conjuntura, não haveria suspeita de descaminho nem de contrabando dos cigarros.
De qualquer forma, disse que vai aguardar as instâncias superiores decidirem o que fazer. Na sua avaliação, o policial penal teve uma "ação impetuosa" e teria causado "rebuliço", porque a categoria não teria conseguido o reajuste salarial desejado.
A alusão a uma possível insatisfação salarial foi criticada pelo presidente do Sindicato dos Policiais Penais do Estado das Minas Gerais, Jean Carlos Otoni Rocha, dizendo que o sindicato está lutando também pelos diretores e por melhorias nas unidades prisionais. Alexandre Magno Soares é da diretoria do sindicato e retornou recentemente ao trabalho aguardando a renovação de sua liberação do trabalho para a atividade sindical.
Caso caberia à Polícia Federal, diz Sejusp
Por sua vez, o diretor de Segurança Interna da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), Paulo Henrique Damasceno, disse que, em caso de suspeita da origem do cigarro, o caminho é sua apreensão e encaminhamento à Polícia Federal, à qual caberia o processo de inquérito.
Isso em volume que supere mil maços, dentro do princípio da insignificância, conforme ponderou. Outro caminho por ele apontado em situações do tipo é a unidade checar se o cigarro em questão está na listagem de alerta que a Anvisa traz em seu site, caso em que não deve nem ser recebido.
Proibição do consumo no sistema prisional gera debate
A discussão acabou extrapolando para questões legais e de saúde envolvendo maior rigor contra o consumo do cigarro em unidades prisionais e, mais uma vez, houve divergência.
Para o diretor de Segurança Interna da Sejusp, o norte da questão tem que ser uma campanha contra o fumo no sistema prisional, por ser o tabagismo uma doença e questão da saúde. Ele disse que o Estado já atua nessa direção e que o tabagismo já foi extinto em 78 das 172 unidades prisionais.
Para Paulo Henrique Damasceno, esse é um processo de desmame que tem que ser feito de forma gradual e responsável no sistema prisional, de forma integrada à área da saúde, mesmo havendo leis proibitivas.
Já o representante do sindicato dos policiais penais abordou a saúde, mas defendeu a proibição do consumo no sistema prisional, tendo o deputado Sargento Rodrigues anunciado que pedirá providências ao titular da Sejusp, secretário Rogério Greco, para o cumprimento da legislação que já proíbe o consumo de cigarro em repartições públicas, aí se enquadrando as unidades prisionais, conforme frisou.
Sargento Rodrigues disse que, de qualquer forma, apresentará um projeto de lei mudando a legislação para deixar expressa na norma a proibição no sistema prisional.