PL PROJETO DE LEI 3413/2025
Projeto de Lei nº 3.413/2025
Institui o Código de Defesa da Mulher e dá outras providências.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Título I
DA PROTEÇÃO E DOS DIREITOS DA MULHER
Capítulo I
DOS PRINCÍPIOS QUE REGEM ESTE CÓDIGO
Art. 1º – Os princípios que regem este Código norteiam-se pela dignidade da pessoa humana e devem ser reconhecidos pela sociedade civil e pelo Estado:
I – a mulher nasce livre e permanece igual ao homem em direitos e obrigações;
II – as distinções sociais só podem ser fundamentadas no interesse comum;
III – reconhece-se a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade e à segurança da mulher;
IV – toda mulher tem direito de construir livremente sua carreira profissional, e toda mulher tem o amplo e irrestrito direito de planejar livremente a constituição de sua família;
V – é dever do Estado e da família impedir a continuidade da cultura perversa de objetificação da mulher;
VI – o primeiro objetivo de toda associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis da mulher e do homem e, portanto, o Estado tem o dever de proteger a integridade física e psicológica das mulheres, pois ele existe para servir ao povo que o criou.
Capítulo II
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 2º – Este Código estabelece normas de proteção à mulher, garantia de seus direitos e medidas de enfrentamento de toda forma de violência perpetrada contra as mulheres.
Parágrafo único – Toda mulher tem direito à vida, à liberdade, à autonomia de vontade, à liberdade de expressão, à escolha de sua profissão, à igualdade de oportunidade e à igualdade de salário no mercado de trabalho, à escolha de cuidar livremente de sua família, a exercer sua fé, e qualquer ação contrária ao exercício dos direitos ora reconhecidos deve ser rigorosamente coibida.
Art. 3º – Para o disposto neste Código, toda ação perpetrada por pessoa física ou jurídica que afronte quaisquer dos direitos a que se refere o art. 2º, parágrafo único, é objeto de advertência, censura, multa e outras cominações previstas na legislação vigente.
Art. 4º – Após regular decisão da Mesa Diretora da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, considerar-se-á o Poder Legislativo como sujeito ativo no enfrentamento da violência contra as mulheres.
Parágrafo único – Cumprido o disposto no caput, a realizará, periodicamente, seminários, comissões gerais, palestras e outras atividades direcionadas à conscientização social de que a vida, a liberdade e a segurança das mulheres constituem-se pilares de uma sociedade saudável.
Capítulo III
DA POLÍTICA estadual DE PROTEÇÃO E DOS DIREITOS DA MULHER
Art. 5º – A política estadual de proteção e a garantia de pleno exercício dos direitos da mulher têm por objetivo resguardar a integridade física e psicológica das mulheres, bem como assegurar que todas possam exercer livremente seus direitos.
§ 1º – A obrigatoriedade de resguardo da integridade física e psicológica das mulheres, bem como a necessidade de implementação de políticas públicas direcionadas à garantia de que seus direitos sejam exercidos em sua plenitude, decorrem, entre outros fatores:
I – do reconhecimento de sua atual exposição em razão da equivocada cultura de objetificação de seu corpo;
II – do reconhecimento de que, biologicamente, a mulher não possui a mesma força física que o homem e, portanto, o Estado tem o dever de criar mecanismos de proteção específicos, eficazes e eficientes.
§ 2º – As medidas adotadas pelo poder público para o atendimento do disposto no caput compreendem:
I – a implementação de políticas públicas asseguradoras dos direitos mencionados no art. 2º, parágrafo único;
II – a implementação contínua de ações direcionadas à desconstrução da cultura de objetificação feminina;
III – realização periódica de atividades escolares que resgatem a importância da mulher para a sociedade;
IV – ações punitivas e restritivas de direitos para os autores de crimes ou infrações penais perpetradas contra as mulheres, conforme disposto no Capítulo II do Título III;
V – a implementação de campanhas educativas permanentes contra o assédio, o preconceito de gênero e os atos discriminatórios ou violentos contra as mulheres, inclusive no trânsito, mediante participação de múltiplos atores sociais e institucionais, sob coordenação do órgão do Poder Executivo incumbido de articular as políticas públicas para as mulheres.
Título II
DOS DIREITOS EM ESPÉCIE
Capítulo I
DAS INTERVENÇÕES ESTATAIS
Seção I
Do Direito à Cidadania e à Participação Social
Art. 6º – A cidadania da mulher, direito fundamental da República nos termos do art. 1º, II, da Constituição Federal, pressupõe o reconhecimento incontestável de que seus direitos são invioláveis e de que sua participação ativa nas atividades políticas desenvolvidas em âmbito municipal, estadual e nacional revela-se expressão plena de sua relevância para o Estado brasileiro.
Art. 7º – A cidadania da mulher também se manifesta por meio da garantia de seus direitos políticos, assegurando sua ampla participação nas decisões políticas do Estado e no exercício de mandatos eletivos, nos termos da Lei 24.466/2023, que institui o Programa de Enfrentamento ao Assédio e Violência Política contra a Mulher e reafirma-se a importância da mulher na esfera econômica, sem prejuízo do disposto na legislação federal sobre o tema tratado nesta Seção.
Seção II
Do Direito à Segurança
Art. 8º – A segurança da mulher é um direito inatacável e, portanto, o Estado deve atuar com celeridade, eficiência e eficácia, para assegurar tanto a defesa dos direitos reconhecidos neste Código quanto o cumprimento das ações preventivas e reparadoras estabelecidas pelo ordenamento jurídico vigente.
Art. 9º – O atendimento à mulher vítima de violência é prestado conjuntamente pelas áreas de segurança, de assistência judiciária e de assistência à saúde e serviço social, em conformidade com a Lei Federal nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 – Lei Maria da Penha.
§ 1º – O atendimento de que trata o caput é prestado de forma ininterrupta e compreende, entre outros, os serviços realizados pelas seguintes áreas:
I – delegacia policial especializada;
II – medicina legal;
III – atenção médica de urgência e emergência;
IV – assistência judiciária;
V – assistência social.
§ 2º – A integração da rede de atendimento descrita nos incisos do § 1º visa, além da implementação de políticas públicas protetivas da mulher, assegurar sua autonomia de vontade e resguardar os demais direitos previstos na legislação vigente.
§ 3º – Assegura-se à mulher com deficiência ou doença rara vítima de violência atendimento especializado de acordo com suas necessidades.
Art. 10 – O Serviço de Atendimento à Mulher vítima de violência nas Delegacias Especializadas devem funcionar nos temos da Lei Federal nº 14.541, de 3 de abril de 2023.
Art. 11 – O Formulário Nacional de Avaliação de Risco, de que trata a Resolução Conjunta nº 5, de 3 de março de 2020, do Conselho Nacional de Justiça – CNJ e do Conselho Nacional do Ministério Público – CNMP –, deverá ser utilizado para o atendimento da mulher vítima de violência.
Art. 12 – Os espaços de acolhimento e atendimento psicológico e social, bem como aqueles destinados à orientação e encaminhamento jurídico, incluem os centros especializados de atendimento à mulher – Ceams –, os núcleos de atendimento às famílias e aos autores de violência doméstica – Nafavds –, os núcleos pró-vítima e os centros de referência especializada em assistência social – Creas.
Parágrafo único – Todo o Estado de Minas Gerais deve disponibilizar os locais de atendimento a que se refere o caput, os quais devem contar com dotação orçamentária adequada para que o trabalho desenvolvido seja de excelência em todas as suas etapas.
Art. 13 – É assegurado à mulher vítima de violência doméstica e familiar, após encerrado o período de abrigamento em equipamento público de que trata o art. 35, II, da Lei Federal nº 11.340, de 2006, o acompanhamento e a assistência por unidade pública de referência em assistência social.
Art. 14 – Ficam obrigados a divulgar o serviço de Disque Denúncia de Violência contra a Mulher, os seguintes locais:
I – hotéis, pensões, motéis, pousadas e outros estabelecimentos que prestem serviços de hospedagem;
II – bares, restaurantes, lanchonetes e similares;
III – casas noturnas de qualquer natureza;
IV – clubes sociais e associações recreativas ou desportivas que promovam eventos com entrada paga;
V – agências de viagens e locais de transportes de qualquer natureza;
VI – salões de beleza, academias de dança e de ginástica e outros com atividades correlatas;
VII – postos de serviço de autoatendimento e postos de combustíveis;
VIII – condomínios residenciais;
IX – prédios ocupados por órgãos públicos em Minas Gerais.
§ 1º – Os locais especificados nos incisos do caput devem afixar, em área de maior circulação de pessoas, placas com o seguinte teor: “Violência contra a mulher – disque 180: esse número presta acolhida qualificada às mulheres em situação de risco”.
§ 2º – Os responsáveis pelos locais de que tratam os incisos do caput devem, ainda, contatar o número 190 sempre que testemunharem agressões físicas ou psicológicas perpetradas contra mulheres.
Art. 15 – As empresas de transporte público e privado de passageiros em atividade no Estado de Minas Gerais devem adotar medidas para prevenir e combater a violência contra a mulher.
Seção III
Do Direito à Saúde
Art. 16 – A saúde, direito de todos e dever do Estado, integra o conjunto de prioridades estabelecido neste Código.
Art. 17 – É direito de toda mulher estar acompanhada quando necessitar dos serviços de consultas e exames prestados nos estabelecimentos públicos e privados de saúde do Estado de Minas Gerais.
Art. 18 – O poder público do Estado de Minas Gerais executará as ações necessárias à efetiva implementação e divulgação da política de dignidade e saúde menstrual, nos termos da Lei Estadual nº 25.075 de 20 de dezembro de 2024.
Art. 19 – Integra este Código de Defesa da Mulher os direitos das servidoras civis do Poder Executivo e das militares do Estado relativos à maternidade, nos termos da Lei Estadual nº24.995 de 26 de novembro de 2024.
Seção IV
Do Direito à Educação
Art. 20 – A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, é promovida e incentivada com a colaboração da sociedade civil, visando ao pleno desenvolvimento da mulher.
Art. 21 – As políticas públicas direcionadas à qualificação educacional e profissional das mulheres, prioritariamente aquelas em situação de violência ou vulnerabilidade social, compreendem ações efetivas do Estado e contam com a colaboração das organizações da sociedade civil de interesse público – Oscip – e com a efetiva participação das associações e instituições do terceiro setor.
Art. 22 – Assegura-se às mulheres vítimas de violência física ou psicológica prioridade de inscrição nos cursos de qualificação profissional ofertados pela administração pública do Estado de Minas Gerais, nos termos da Lei Estadual nº 24.216 de 14 de julho de 2022.
Seção V
Do Direito à Moradia
Art. 23 – Para o disposto neste Código de Defesa da Mulher, reconhece-se a moradia como direito humano universal e imprescindível à inclusão social.
Seção VI
Do Direito ao Trabalho
Art. 24 – O Estado e a sociedade civil reconhecem a ampla e irrestrita liberdade da mulher para escolher sua profissão e exercê-la em sua plenitude.
§ 1º – É dever do Estado proteger o mercado de trabalho da mulher, mediante a criação de incentivos específicos conforme disposto no art. 7º, XX, da Constituição Federal.
§ 2º – O Estado deve implementar ações e programas que fortaleçam a atividade econômica de Minas Gerais e assegurem a igualdade de salários entre homens e mulheres, desde que ambos exerçam idênticas atribuições e mesma jornada de trabalho.
Art. 25 – O banco de empregos para mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, criado pela Lei nº 22.256, de 26 de julho de 2016, integra este Código de Defesa para todos os efeitos legais.
Capítulo II
DAS MEDIDAS PROTETIVAS
Art. 26 – Superada a fase judicial necessária à adoção de medidas protetivas de urgência, a ofendida é imediatamente encaminhada para o atendimento de que trata o art. 10, sem prejuízo de aplicabilidade das demais disposições fixadas pela Lei Federal nº 11.340, de 2006.
Art. 27 – Todas as medidas protetivas estabelecidas pelo art. 22 da Lei Federal nº 11.340, de 2006, são recepcionadas por este Código.
Capítulo III
DOS ATORES RESPONSÁVEIS PELA EFETIVIDADE DOS DIREITOS RECONHECIDOS POR ESTE CÓDIGO
Art. 28 – Compete ao poder público, à família e à sociedade civil desconstruir a perversa cultura de objetificação da mulher.
Art. 29 – As ações direcionadas à proteção da mulher, à desconstrução da cultura de objetificação feminina e à garantia de que seus direitos serão respeitados constituem obrigação do Estado e de toda a sociedade civil e contam com a participação efetiva dos seguintes atores:
I – dos órgãos da administração pública direta, indireta, fundacional e autárquica do Estado de Minas Gerais;
II – da Assembleia Legislativa de Minas Gerais;
III – da rede educacional pública e privada do Estado de Minas Gerais;
IV – dos veículos de comunicação;
Art. 30 – O ensino sobre noções básicas da Lei Federal nº 11.340, de 2006, passa a figurar como conteúdo transversal do currículo escolar da rede pública de ensino do Estado de Minas Gerais, nos termos da Lei Estadual nº 22.256, de 26 de julho de 2016.
Título III
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS
Capítulo I
DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E DA VULNERABILIDADE
Art. 31 – Considera-se, para o disposto neste Código:
I – violência doméstica: as condutas descritas no art. 7º e incisos da Lei Federal nº 11.340, de 2006;
II – vulnerabilidade social: a comprovação de 1 ou mais das seguintes condições:
a) insegurança de renda decorrente de precária inserção no mercado de trabalho ou situação perene de desemprego;
b) baixo grau de escolarização ou falta de formação técnica;
c) falta de moradia ou necessidade de abrigo fora do lar;
d) dependência econômica do companheiro autor de violência, ou de terceiros;
e) residência recente no Estado de Minas Gerais em razão da necessidade de desvincular-se de violência doméstica ou familiar em outra unidade da Federação;
f) falta de acesso às estruturas de oportunidade oferecidas pelo mercado, pelo Estado ou pela sociedade civil que importe em carência de um conjunto de atributos necessários à dignidade da mulher.
Art. 32 – As circunstâncias estabelecidas no art. 46, II, não esgotam as hipóteses de comprovação de vulnerabilidade social.
Capítulo II
DAS PENAS
Art. 33 – À violência física ou psicológica praticada contra a mulher aplica-se o disposto na legislação federal e, em especial, na Lei Federal nº 11.340, de 2006.
Parágrafo único – Comprovada a participação dolosa de pessoa jurídica na violação de direitos garantidos por lei à mulher, além das medidas previstas na legislação federal, pode ser aplicada a medida de proibição temporária de recebimento de apoio e patrocínios públicos.
Art. 34 – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 35 – Revogam-se as disposições em contrário.
Sala das Reuniões, 26 de fevereiro de 2025.
Leninha (PT), 1ª-vice-presidente.
Justificação: O presente projeto de lei possui como objetivo principal fortalecer as medidas de proteção e os direitos das mulheres no Estado de Minas Gerais. A violência contra a mulher, em seus vários tipos, segue sendo uma triste realidade em nosso Estado, de modo que se torna cada vez mais necessário a urgência de políticas públicas eficazes para combater essa realidade.
É fundamental não apenas fortalecer todas as medidas de combate à violência contra a mulher, mas também garantir mecanismos eficazes para que elas possam reconstruir suas vidas e se reinserir plenamente na sociedade. O acolhimento, o suporte psicológico, o acesso a oportunidades de emprego e moradia segura são passos essenciais para que as vítimas rompam o ciclo da violência e conquistem autonomia.
No entanto, mesmo diante de tantas iniciativas e avanços legislativos, a violência contra a mulher ainda é uma realidade alarmante, afetando milhares de vidas todos os dias. Precisamos continuar lutando para proteger as mulheres, garantir que a rede de apoio funcione de forma efetiva e assegurar que nenhuma vítima fique desamparada ao buscar justiça e reconstrução.
O enfrentamento à violência de gênero deve ser permanente e ampliado, para que, um dia, possamos viver em uma sociedade verdadeiramente segura e igualitária para todas as mulheres.
Este projeto objetiva trazer um acervo de informações e medidas de fortalecimento das políticas públicas que já existem para garantir que todas as mulheres mineiras conheçam seus direitos e possam exercê-los plenamente, contribuindo para uma sociedade mais justa e igualitária.
Por essas razões, contamos com o apoio dos(as) nobres pares para a aprovação do nosso projeto de lei.
– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pelo deputado Doutor Jean Freire. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 5.252/2018, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.