PEC PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO 36/2024
Proposta de Emenda à Constituição nº 36/2024
Acrescenta artigo ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição do Estado.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais aprova:
Art. 1º – Fica acrescentado ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição do Estado o seguinte art. 84-E:
“Art. 84-E – Ficam tombadas, para fins de conservação, a Serra de São José, localizada no Município de Tiradentes, e a Serra do Lenheiro, localizada no Município de São João del-Rei.”.
Art. 2º – Esta emenda à Constituição entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 27 de março de 2024.
Beatriz Cerqueira – Adriano Alvarenga – Alê Portela – Alencar da Silveira Jr. – Ana Paula Siqueira – Andréia de Jesus – Arnaldo Silva – Bella Gonçalves – Betão – Carlos Henrique – Celinho Sintrocel – Cristiano Silveira – Doorgal Andrada – Douglas Melo – Doutor Jean Freire – Doutor Wilson Batista – Elismar Prado – Enes Cândido – Fábio Avelar – Grego da Fundação – Ione Pinheiro – João Vítor Xavier – Leleco Pimentel – Leninha – Leonídio Bouças – Lohanna – Lucas Lasmar – Luizinho – Macaé Evaristo – Maria Clara Marra – Mário Henrique Caixa – Marli Ribeiro – Marquinho Lemos – Mauro Tramonte – Nayara Rocha – Professor Cleiton – Professor Wendel Mesquita – Rafael Martins – Ricardo Campos – Rodrigo Lopes – Sargento Rodrigues – Ulysses Gomes – Vitório Júnior.
Justificação: A Serra de São José está localizada na região do Campo das Vertentes entre os municípios de Tiradentes, São João del-Rei, Santa Cruz de Minas, Coronel Xavier Chaves e Prados.
Caracteriza-se por ser uma formação de quartzito, além dos vários blocos de pedra espalhados por todo o local. Com altitude máxima de aproximadamente 1.300 metros, é uma área rica em cachoeiras (na borda oeste) e responsável pela produção da água magnesiana e radioativa.
Os seus primeiros registros datam das últimas décadas do século XVII, quando os bandeirantes paulistas avistaram de longe um pico, de onde poderiam avaliar a região na qual queriam explorar ouro. Ao subirem, eles tiveram a visão de uma terra farta em pedras preciosas e bens minerais e decidiram se instalar na área. Foi aí que teve início a povoação de Santo Antônio do Rio das Mortes, atual Tiradentes, no Campo das Vertentes. Mais de 300 anos depois, o elevado que deu origem à cidade, hoje é conhecido por Serra de São José.
Trata-se de um patrimônio natural de valor inestimável para a população de toda a região, que recebe turistas de todas as partes do mundo. Sua beleza cênica, as águas cristalinas que ali se encontram, além de sua biodiversidade exuberante, são fontes de encantamento e um refúgio para a fauna e a flora da região. Além disso, a Serra de São José possui resquícios arqueológicos da “Capela de Nosso Senhor dos Passos” datados de 1.722, época da fundação do município.
No local são fortes os vínculos de lazer e de identidade de toda a população da região, tanto que a prefeitura municipal emitiu o Decreto nº 4.218/2023, que declara o terreno onde fica a Serra de São José como de utilidade pública, visando a criação de um Parque Municipal.
Por sua relevância paisagística, ambiental, cultural e arqueológica, a Serra de São José é tombada em nível municipal e, desde o ano de 1979, a pedido do Instituto Histórico e Geográfico de Tiradentes – IHGT –, tramita perante o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan –, processo de tombamento em nível federal, registro 01458.002213/2009, em fase de instrumentalização.
Vale ressaltar que a Serra de São José é protegida por diversas legislações, a saber: APE – Área de Proteção Estadual, Decreto Nº 21.308, de 19/5/1981; APA – Área de Proteção Ambiental São José, Decreto Nº 30.934, de 16/2/1990; RVS – Refúgio Estadual de Vida Silvestre Libélulas da Serra de São José, Decreto Nº 43.908, de 5/11/2004; Mosaico de UCs da Serra de São José – Decreto Nº 44.518, de 16/5/2007; Reserva da Biosfera – Fase 4 Unesco – declarada em 3/10/1994.
Entretanto, não bastasse todo esse aparato legal, existe um forte interesse de mineradoras na região. Recentemente, a Justiça suspendeu por 30 dias o leilão de um terreno de aproximadamente 10 hectares dentro de uma Área de Preservação Ambiental – APA –, onde fica inserida a Serra de São José, repleto de cachoeiras, represas e animais silvestres. O pregão, que estava marcado para acontecer no dia 22 de maio de 2023, e é consequência da execução de uma multa.
Diante disso, a população da região está mobilizada para que a Serra de São José não seja descaracterizada. Para tanto, várias instituições culturais e movimentos sociais da região vem promovendo manifestações, encontros e discussões, visando a criar uma corrente efetiva de proteção a esse patrimônio histórico e natural de Minas Gerais, ameaçado pela mineração e pela especulação imobiliária.
Já a Serra do Lenheiro, localizada a noroeste de São João del-Rei, é o único patrimônio natural tombado do município. Segundo os geólogos, ela é uma continuação da Serra de São José, em Tiradentes. Entre as duas fica o vale do Rio das Mortes. Com altitude máxima de 1.218 metros, ela é uma formação cuja origem remonta a 1,6 bilhão de anos. Caracteriza-se por ser uma formação de quartzito. Grandes blocos, chamados de Pontões, compõem o lugar, além dos vários blocos de pedra espalhados por todo o local.
Pinturas rupestres podem ser vistas na serra do Lenheiro. Há estudos que apontam que as pinturas foram feitas por tribos nômades a cerca de 6 a 9 mil anos atrás. Estima-se que estes grupos viviam em cavernas e provavelmente abrigavam-se na Serra para caçar, de onde tinham boa visão de caça e possíveis inimigos como outras tribos. Estas figuras servem de testemunho da passagem de grupos humanos na região em que hoje são encontradas. Servem, ainda, para explicar o complexo cultural dos grupos que as executaram e talvez a época da permanência destes grupos.
A Serra do Lenheiro é um personagem importante da história da cidade. No Ribeirão de São Francisco Xavier, que nasce na serra, foi encontrada a primeira pepita de ouro, em 1704, pelo paulista Lourenço da Costa, o que deu início à formação da vila no lugar onde hoje é o Centro Histórico. As lembranças do tempo de exploração ainda estão na serra e ilustram como era o processo de extração.
Mas a serra também abasteceu a cidade com outras riquezas desde que os primeiros bandeirantes paulistas se estabeleceram aqui há mais de 300 anos. A nascente de praticamente todos os córregos, riachos e ribeirões que atravessam São João del-Rei, incluindo o Córrego do Lenheiro, está localizada na serra. As igrejas e pontes que hoje tanta importância têm para a cultura da cidade foram construídas com pedras retiradas da Serra do Lenheiro, principalmente o quartzito, a pedra mais clara que está na estrutura das igrejas, como na Catedral Basília de Nossa Senhora do Pilar. A arnica e o rosmaninho que perfumam as igrejas nas festas do Senhor do Passos e na Semana Santa são mais um presente da serra para a cidade, até hoje colhidas na região.
O fornecimento de material para a vida na cidade acabou por dar nome à serra, que de Morro de São João passou a se chamar Serra do Lenheiro, no começo do século XIX. A lenha que abastecia os fogões e fornos da cidade antes da chegada do gás ou da luz elétrica vinha de lá. Os lenheiros ou lenhadores cortavam as árvores dessa vegetação, uma mistura de cerrado, campos rupestres e mata atlântica, que aos poucos foi se esgotando. Já em 1829, Robert Walsh, um historiador inglês, capelão da embaixada britânica no Rio, de passagem pela cidade, escreveu assim: “São João fica situada no sopé da Serra do Lenheiro, em cuja superfície escalvada, os lenhadores, que lhe deram o nome, não deixaram de pé um único arbusto.” (Trecho extraído de Visita à Colonial Cidade de São João del-Rei, de Antônio Gaio Sobrinho).
Com a vida moderna, a lenha passou a ser recurso de quem não tinha gás e conhecia bem as madeiras do Lenheiro. Francisco Nolasco, que já percorreu muito essa serra a pé, lembra que primeira que eles escolhiam era o Barbatimão, que tem a casca muito grossa, que se soltava fácil e era aproveitada para começar o fogo. Outra muito procurada era a Candeia, que era pesada de carregar, mas era muito boa de fogo e, por último o Óleo, uma madeira mais resistente, que era usada até para fazer carroceria de caminhão. Agora é proibido cortá-la.
Aos poucos, o gás e a energia elétrica foram dando sossego à mata e as árvores voltaram a crescer a ponto de formar corredores mais extensos, o que permitiu a ampliação da variedade da fauna e da flora, mas a Serra ainda não está livre das ameaças ambientais.
A intensidade do tráfego de motocicletas, as ocupações irregulares e o saneamento inadequado desgastam e poluem a serra. O Parque Ecológico criado em 1998, mesmo ano do tombamento, abrange 208 de um total de 5 mil hectares, mas ainda não está estruturado. Essa talvez possa ser uma resposta a um dos grandes desafios da cidade que é a fiscalização das leis que protegem seu patrimônio.
Como forma de reforçar a proteção desta paisagem, tombada por decreto, o Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural de São João del-Rei também tombou o monumento natural em 2022. Qualquer empreendimento, construção ou exploração da serra, precisa passar pela autorização do Conselho, que impede a mineração do local e qualquer outra iniciativa que possa prejudicar o ambiente.
A Assembleia Legislativa de Minas Gerais, por sua vez, pode participar desse esforço acatando esta proposição, que declara a Serra de São José e a Serra do Lenheiro como monumentos naturais de Minas Gerais e determina os seus tombamentos, incluindo-as na relação daquelas que se encontram legalmente protegidas e gozam de aparato especial para fins de conservação.
Por essas razões, conto com o apoio dos meus nobres pares para a aprovação desta proposição.
– Publicada, vai a proposta à Comissão de Justiça e à Comissão Especial para parecer, nos termos do art. 201 do Regimento Interno.