PL PROJETO DE LEI 2719/2024
Projeto de Lei nº 2.719/2024
Institui a Política Estadual de Redução de Agrotóxicos.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Capítulo I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 1º – Esta lei institui a Política Estadual de Redução de Agrotóxicos, com o objetivo de implementar ações que contribuam para a redução progressiva do uso de agrotóxicos na produção agrícola, pecuária, extrativista e nas práticas de manejo dos recursos naturais, com ampliação da oferta de insumos de origens biológicas e naturais, contribuindo para a promoção da saúde e sustentabilidade ambiental, com a produção de alimentos saudáveis.
Art. 2º – São objetivos da Política Estadual de Redução de Agrotóxicos:
I – reduzir, gradual e continuamente, a disponibilidade, o acesso e o uso de agrotóxicos, ampliando a disponibilidade e uso de produtos de origem biológica sem perigo e risco para a saúde e meio ambiente;
II – promover a avaliação, o controle, a fiscalização e o monitoramento de resíduos de agrotóxicos;
III – utilizar medidas econômicas, financeiras e fiscais para desestimular a utilização de agrotóxicos, com ênfase nos produtos de maior risco e perigo toxicológico e ecotoxicológico e estimular os sistemas de produção orgânico e de base agroecológica;
IV – ampliar e fortalecer o desenvolvimento, a produção, a comercialização e o uso de produtos fitossanitários, principalmente os apropriados para o uso na produção orgânica e da base agroecológica;
V – estimular o desenvolvimento e a implementação de práticas e técnicas de manejo sustentável e agroecológico, visando a prevenção e controle de problemas fitossanitários, que permitam a redução da dependência de insumos externos, em especial atenção, aos agrotóxicos;
VI – promover a criação de zonas de uso restrito de agrotóxicos e de zonas livres da existência e influência de agrotóxicos e transgênicos a fim de possibilitar a transição agroecológica;
VII – garantir o acesso à informação, à participação e ao controle social no que tange aos riscos e impactos dos agrotóxicos na saúde e no meio ambiente, incluindo dados de monitoramento de resíduos de agrotóxicos e a promoção da produção orgânica e de base agroecológica; qualificar a ação de profissionais, agricultores, consumidores e sociedade civil organizada em geral para atuarem frente aos impactos dos agrotóxicos no meio ambiente e na saúde pública, na redução gradual do uso dos agrotóxicos na promoção da agricultura de base agroecológica e orgânica.
Art. 3º – São instrumentos da política:
I – diagnósticos sobre o uso de agrotóxicos e seus impactos no meio ambiente e na saúde pública;
II – planos de ação articulados entre os órgãos públicos estaduais afetos ao tema;
III – políticas públicas que estimulem a redução gradual e contínua no uso de agrotóxicos e promovam a conversão de sistemas de produção dependentes de químicos para sistemas sustentáveis, ou seja, produção orgânica e de base agroecológica;
IV – campanhas educativas sobre as consequências do uso de agrotóxicos e a necessária reconversão dos sistemas de produção para modos de produção orgânica e de base agroecológica;
V – as compras governamentais de gêneros alimentícios agroecológicos ou orgânicos;
VI – a certificação;
VII – as medidas fiscais, tributárias, sanitárias e ambientais diferenciadas que favoreçam a produção agroecológica, orgânica e em transição agroecológica;
VIII – os convênios, as parcerias e os termos de cooperação com entidades públicas e privadas;
IX – os Fundos Estaduais, o crédito rural, as linhas de financiamento e os subsídios;
X – o cooperativismo, o associativismo e a economia solidária;
XI – a educação e a capacitação técnica;
XII – o pagamento por serviços ambientais;
XIII – o monitoramento de resíduos de agrotóxicos em água humanos e demais compartimentos ambientais;
XIV – mecanismos de controle da transição agroecológica, da produção orgânica e de base agroecológica;
XV – sistemas de monitoramento e avaliação da produção orgânica e de base agroecológica.
Art. 4º – A Política se estruturará em eixos de atuação que deverão nortear as iniciativas contidas na Política.
Parágrafo único – São eixos da Política Estadual:
I – normatização e regulação de agrotóxicos;
II – controle, avaliação e responsabilização da cadeia produtiva para restringir o uso de agrotóxicos;
III – medidas econômicas, financeiras e fiscais para a redução do uso de agrotóxicos;
IV – desenvolvimento de alternativas ao uso de agrotóxicos;
V – informação, participação e controle social;
VI – formação e capacitação de produtores, profissionais, consumidores e de entidades da sociedade civil.
Art. 5º – Poderão constituir fontes de financiamento da Política Estadual de Redução de Agrotóxicos – Peara:
I – recursos do Tesouro do Estado de Minas Gerais;
II – recurso oriundos de outros entes da Federação;
III – recursos de fundações, empresas públicas e privadas, instituições financeiras, organismos multilaterais e organizações não governamentais;
IV – recursos de fundos estaduais;
V – recursos de empresas e instituições financeiras, organismos multilaterais e organizações não governamentais;
VI – recursos oriundos de operações de crédito;
VII – recursos provenientes de infrações ambientais.
Capítulo II
DO REGISTRO, DO CONTROLE, DO MONITORAMENTO E DAS RESPONSABILIZAÇÕES DAS MEDIDAS ECONÔMICAS E ALTERNATIVAS
Seção I
Do Registro, Controle, Monitoramento e da Responsabilização
Art. 6º – As ações dos órgãos públicos estaduais de saúde, agricultura, trabalho, indústria e comércio e meio ambiente sobre a fiscalização da importação, da produção, da comercialização e do uso dos agrotóxicos poderão ser realizadas de forma integrada.
Art. 7º – O Poder Executivo poderá implementar as seguintes iniciativas visando aprimorar o controle, o monitoramento e a responsabilização, no que tange à produção, comercialização e uso dos agrotóxicos:
I – elaboração de um plano estadual de fiscalização integrado que contemple as competências legais de cada órgão envolvido;
II – harmonização dos instrumentos de fiscalização utilizados pelos órgãos estaduais;
III – atualizar periodicamente, os registros de agrotóxicos em uso, reavaliando sua necessidade e as adequações às legislações ambientais e de saúde públicas vigentes;
IV – implementar um sistema de avaliação ampliado composto por um banco de dados sobre o monitoramento da eficiência agronômica, efeitos adversos, dados de intoxicação e referências técnicas sobre o ingrediente ativo em processo de reavaliação;
V – adotar mecanismos ágeis de reavaliação de ingredientes ativos de agrotóxicos que passam a ser restritos ou proibidos em outros países, por conta de efeitos de saúde humana ou meio ambiente, deflagrando imediatamente medidas para o seu uso e comercialização;
VI – regulamentar os critérios e condições para a revalidação de registros, cancelamentos de registros e proibição de registros, inclusive de produtos não comercializados;
VII – criação de mecanismo de obrigatoriedade de elaboração e divulgação de informações sistematizadas sobre conformidade de produtos, segurança das plantas industriais e segurança dos trabalhadores e do meio ambiente, por meio de relatório anual de fiscalização de indústrias de agrotóxicos;
VIII – implantação de sistema informatizado integrado para controle e consolidação das informações das receitas agronômicas emitidas e de comercialização de agrotóxicos;
IX – implantação de sistema de rastreabilidade da produção e da distribuição de agrotóxicos;
X – implantação de sistema de vigilância em saúde pública para populações expostas a agrotóxicos, fortalecendo a integração da vigilância sanitária, epidemiológica e de saúde do trabalhador e ambiental;
XI – ampliação da cobertura de monitoramento dos resíduos de agrotóxicos nos produtos de origem agropecuária, da diversidade de ingredientes ativos, dos tipos de produtos agropecuários, do número de amostras e de regiões, considerando a rastreabilidade das amostras para ações fiscais e corretivas;
XII – revisão das normas sobre a pulverização aérea de agrotóxicos, ampliando os mecanismos de controle e considerando o graus de risco toxicológico dos produtos utilizados, definindo medidas para a redução gradual e contínua desse modo de aplicação;
XIII – proibir o uso de agrotóxicos, sob qualquer tipo de mecanismo ou técnica de aplicação, nas proximidades de moradias, escolas, recursos hídricos, áreas ambientalmente protegidas e áreas de produção agrícola orgânica ou agroecológica;
XIV – monitorar a eficiência agronômica e efeitos adversos dos agrotóxicos em utilização;
XV – revisar as penalidades referentes à inadequação quanto ao uso, produção, comercialização, transporte, armazenamento e descarte de agrotóxicos e suas embalagens;
XVI – implementar medidas de gestão de estoques de agrotóxicos obsoletos, impróprios e ilegais que incluam medidas para sua eliminação;
XVII – estruturar redes de laboratórios públicos ou conveniados que atendam às necessidades analíticas de problemas relacionados à contaminação ou intoxicação por agrotóxicos que possam afetar trabalhadores, populações tradicionais, alimentos, águas subterrâneas, da chuva, de rios e lagos, do ar e do solo;
XVIII – proibir a comercialização e uso de agrotóxicos com toxicidade igual ou superior a produto correlato já registrado.
Seção II
Das Medidas Alternativas
Art. 8º – O Poder Executivo poderá adotar as seguintes medidas de fortalecimento de pesquisa, da produção, da comercialização e do uso de produtos de menor risco à saúde e ao meio ambiente, em especial atenção aos produtos fitossanitários e aqueles destinados à produção de base orgânica e agroecológica:
I – estabelecer rotinas para o desenvolvimento de especificações de referência para produtos fitossanitários, destinados aos sistemas de produção orgânica e agroecológica;
II – apoiar o desenvolvimento de pesquisa voltada à disponibilização de tecnologias de baixo perigo toxicológico e ecotoxicológico;
III – promover, ampliar e consolidar processos e experiências de uso e do desenvolvimento do conhecimento associado, relativo aos produtos de baixo risco toxicológico, ou de base orgânica, agroecológica e de controle biológico;
IV – promover a criação de zonas de uso restrito de agrotóxicos e de zonas livres da existência e influência de agrotóxicos e transgênicos.
Seção III
Da Participação e Controle Social
Art. 9º – Poderá o Poder Executivo adotar as medidas previstas neste artigo, visando garantir o acesso à informação, à participação e o controle social, para a redução do uso dos agrotóxicos e o desenvolvimento de tecnologias sustentáveis, de base orgânica e agroecológica:
I – aprimorar os mecanismos de informação à população, com linguagem adequada para os diversos públicos utilizando meios de comunicação audiovisual, incluindo as redes sociais;
II – garantir aos consumidores o direito à informação sobre a presença de Organismos Geneticamente Modificados – OGM – nos alimentos;
III – divulgar as informações relativas aos estudos e testes sobre os agrotóxicos e Organismos Geneticamente Modificados – OGM –, que tenham avaliações e reavaliações, tornando transparentes os processos decisórios sobre a concessão de registros.
Seção IV
Da Formação e Capacitação
Art. 10 – Poderá o Poder Executivo implementar as iniciativas previstas neste artigo, promovendo a qualificação de extensionistas rurais, profissionais da saúde e do meio ambiente, agricultores, consumidores, estudantes e entidades da sociedade civil, em temas afetos a esta Lei, na promoção da agricultura sem agrotóxicos e na redução gradual e constante no uso dos agrotóxicos.
I – apoiar as iniciativas desenvolvidas no campo da educação formal e não formal, para sensibilizar, capacitar, qualificar e divulgar os conhecimentos quanto aos riscos e impactos dos agrotóxicos na agricultura, na pecuária, na produção extrativista e nas práticas de manejo dos recursos naturais;
II – elaborar materiais didáticos que sensibilizem, capacitem, qualifiquem e atualizem conhecimentos quanto aos riscos e impactos dos agrotóxicos;
III – intensificar a qualificação dos extensionistas e agentes de assistência técnica com foco nas formas de agricultura de base ecológica e orgânica, buscando os sistemas sustentáveis de produção e a redução gradual e continua do uso dos agrotóxicos;
IV – promover a formação de profissionais quanto aos riscos ambientais e para a saúde humana do uso de agrotóxicos nas atividades da agricultura, da pecuária, da produção extrativista e das práticas de manejo dos recursos naturais;
V – intensificar as ações de formação e de informação dos consumidores quanto aos riscos do consumo de alimentos contaminados por agrotóxicos, da contaminação do meio ambiente e dos riscos à saúde;
VI – promover e intensificar ações de conscientização dos trabalhadores assalariados e temporários, populações expostas e grupos vulneráveis quanto ao uso dos agrotóxicos e seus efeitos na saúde pública e no meio ambiente.
Capítulo III
DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 11 – Os objetivos e estruturas dos eixos temáticos da política deverão ser revisados por ocasião da implementação e atualização do Plano Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica – Pleapo.
Art. 12 – O Estado, em conjunto com os Municípios, poderá realizar o Inventário Estadual de Agrotóxicos, para subsidiar o mapeamento da existência de moléculas ultrapassadas e de agrotóxicos de alto poder de toxicidade, para subsidiar as medidas tratadas nesta Lei.
Art. 13 – Os órgãos públicos da administração pública estadual poderão desenvolver indicadores de resultados dos dispositivos previstos nesta Lei para aferir seus impactos e a evolução necessária para seus aprimoramentos.
Art. 14 – O Poder Executivo regulamentará a presente lei.
Art. 15 – Esta lei entra em vigor no prazo de 90 (noventa) dias a contar da data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 8 de agosto de 2024.
Lucas Lasmar (Rede), vice-líder do Bloco Democracia e Luta.
Justificação: O Brasil usa 10,9 kg de agrotóxicos para cada hectare de lavoura (10 mil m²). Já os EUA usam 2,85 kg/ha; a China, 1,9 kg/ha. Em 2021, foram usados no Brasil 3,31 kg de agrotóxicos por pessoa.
Anualmente são usados no mundo aproximadamente 2,5 milhões de toneladas de agrotóxicos. O consumo anual de agrotóxicos no Brasil tem sido superior a 300 mil toneladas de produtos comerciais. Expresso em quantidade de ingrediente ativo (i.a.), são consumidas anualmente cerca de 130 mil toneladas no país; representando um aumento no consumo de agrotóxicos de 700% nos últimos quarenta anos, enquanto a área agrícola aumentou 78% nesse período.
O consumo desses produtos difere nas várias regiões do país, nas quais se misturam atividades agrícolas intensivas e tradicionais, e nestas últimas não incorporaram o uso intensivo de produtos químicos. Os agrotóxicos têm sido mais usados nas regiões Sudeste (cerca de 38%), Sul (31%) e Centro-Oeste (23%). Na região Norte o consumo de agrotóxicos é, comparativamente, muito pequeno (pouco mais de 1%), enquanto na região Nordeste (aproximadamente 6%) uma grande quantidade concentra-se, principalmente, nas áreas de agricultura irrigada. O consumo de agrotóxicos na região Centro-Oeste aumentou nas décadas de 70 e 80 devido à ocupação dos Cerrados e continua crescendo pelo aumento da área plantada de soja e algodão naquela região. Os estados que mais se destacam quanto à utilização de agrotóxicos são São Paulo (25%), Paraná (16%), Minas Gerais (12%), Rio Grande do Sul (12%), Mato Grosso (9%), Goiás (8%) e Mato Grosso do Sul (5%).
Quanto ao consumo de agrotóxicos, por unidade de área cultivada, a média geral no Brasil passou de 0,8 kg i.a. ha-1, em 1970, para 7,0 kg i.a. ha-1, em 1998. Com relação à quantidade total de ingredientes ativos, as culturas agrícolas brasileiras nas quais mais se aplicam agrotóxicos são: soja, milho, citros, cana-de-açúcar. Com o atual crescimento das áreas com cultura de cana-de-açúcar, o consumo de agrotóxicos no Brasil vem se modificando rapidamente.
O uso de agrotóxico é um problema de saúde pública, que precisa ser enfrentado e que está afetando a vida das futuras gerações. Para cobrar uma redução do uso de agrotóxicos no Brasil, o Instituto Nacional do Câncer – Inca – lançou em abril passado um documento no qual compila dados alarmantes sobre os riscos dessas substâncias para a saúde, tanto para o agricultor, que está em contato direto com o produto, como para o consumidor.
Diante desse cenário, importante a instituição de normas a serem observadas no Estado de Minas Gerais, pelo que se solicita apoio dos deputados na tramitação e aprovação do presente projeto de lei.
– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pelo deputado Charles Santos. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 84/2019, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.