PL PROJETO DE LEI 1999/2024
Projeto de Lei nº 1.999/2024
Obriga os condomínios residenciais e comerciais localizados no Estado de Minas Gerais a comunicar os órgãos de segurança pública quando houver em seu interior a ocorrência ou indícios de ocorrência de violência doméstica e familiar contra mulheres, crianças, adolescentes ou idosos.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Estabelece que os condomínios residenciais e comerciais localizados no Estado de Minas Gerais, por meio de seus síndicos e/ou administradores devidamente constituídos, deverão encaminhar comunicação à Delegacia da Mulher da Polícia Civil responsável pelo município em que se encontram ou ao órgão de segurança pública regional especializado, quando houver em suas unidades condominiais ou nas áreas comuns aos condôminos, a ocorrência ou indícios de ocorrência de violência doméstica e familiar contra mulheres, crianças, adolescentes ou idosos.
Parágrafo único – A comunicação a que se refere o caput deste artigo deverá ser realizada de imediato, por ligação telefônica ou através de aplicativo móvel, nos casos de ocorrência em andamento, e por escrito, por via física ou digital, nas demais hipóteses, no prazo de até 24 (vinte e quatro) horas após a ciência do fato, contendo informações que possam contribuir para a identificação da possível vítima e do possível agressor.
Art. 2º – Os condomínios deverão afixar, nas áreas de uso comum, cartazes, placas ou comunicados divulgando o disposto na presente lei e incentivando os condôminos a notificarem o síndico e/ou o administrador quando tomarem conhecimento da ocorrência ou da existência de indícios da ocorrência de violência doméstica ou familiar no interior do condomínio.
Art. 3º – O descumprimento do disposto nesta lei poderá sujeitar o condomínio infrator, garantidos a ampla defesa e contraditório, às seguintes penalidades administrativas:
I – advertência, quando da primeira autuação da infração, e;
II – multa, a partir da segunda autuação.
Parágrafo único – A multa prevista no inciso II deste artigo será fixada entre 50 Ufemg (cinquenta vezes a Unidade Padrão Fiscal de Minas Gerais) e 100 Ufemg (cem vezes a Unidade Padrão Fiscal de Minas Gerais), a depender das circunstâncias da infração, podendo o valor arrecadado ser revertido em favor de fundos e programas de proteção aos direitos da mulher, criança, adolescente ou idoso.
Art. 4º – Esta lei entra em vigor trinta dias após a data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 7 de fevereiro de 2024.
Lucas Lasmar (Rede)
Justificação: A violência de gênero, não só enquanto ato físico, mas simbólico de desvalorização e subjugação social da mulher, é um fenômeno tão antigo quanto a própria humanidade. Embora se ouça falar de sociedades (lendárias ou não) que eram lideradas por mulheres, a ampla maioria das civilizações foi caracterizada por modelos de poder e liderança masculinos.
Na literatura feminista e mesmo na literatura das ciências sociais, esse fenômeno é definido nas inúmeras abordagens do conceito de patriarcado. Carole Patman (1988), por exemplo, apontou que o patriarcado é um sistema de poder parecido com o escravismo.
Isso porque no modelo social patriarcal não existe uma regulação pública sobre a esfera de vida privada, por isso, os desequilíbrios de poder no ambiente doméstico não são passíveis de normatização ou fiscalização pela esfera política. Isso permite que esse modelo seja inteiramente sujeito à vontade e ao arbítrio de quem possui o poderio econômico da esfera familiar, o senhor.
Exemplos de práticas do modelo patriarcal são a obrigatoriedade da mulher manter relações sexuais com seu marido a despeito da sua própria vontade, a “legítima defesa da honra masculina”, que por muito tempo foi legal e socialmente aceita.” (Disponível em: “Violência contra a mulher” em: https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/violencia-contra-a-mulher.htm).
Quando falamos em violência contra a mulher, pensamos apenas em agressões físicas. No entanto, os tipos de violência praticados contra mulheres não se resumem à agressão que resulta em lesão corporal. A Lei Maria da Penha, que cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, discrimina cinco formas de violência, entre outras. São eles:
I – a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;
II – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III – a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV – a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V – a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.
No que tange à violência contra os idosos, o Estatuto do Idoso, promulgado pela Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003, descreve a violência contra o idoso como qualquer ação ou omissão, praticada em local público ou privado, que lhe cause morte, dano ou sofrimento físico ou psicológico.
Existem 962 milhões de indivíduos com 60 anos ou mais no mundo, a expectativa é no mínimo duplicar em 2050 e triplicar em 2100, chegando a 3,1 bilhões de pessoas. Mesmo diante de tamanha ascensão na quantidade de idosos e no aumento da expectativa de vida, a sociedade ainda não está atenta a esses sujeitos e essa invisibilidade os expõe a uma violência oculta.
Um levantamento da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos aponta que houve um aumento de 38% nos casos de violência contra pessoas idosas no primeiro semestre de 2023 em relação ao mesmo período do ano passado. Foram mais de 65 mil denúncias e o crescimento foi registrado em todos os estados do Brasil e no Distrito Federal.
Com o envelhecimento, os indivíduos tornam-se mais vulneráveis, devido à dependência de outras pessoas para atividades básicas da vida diária, a um deficit cognitivo ou limitações naturais do próprio envelhecimento, que gera menor poder de defesa e facilita a ação de agressores.
Além da violência contra as mulheres e idosos não podemos nos esquecer da violência contra as crianças e adolescentes. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2022, entre os crimes não letais contra crianças e adolescentes de zero a 17 anos, foram registrados no Brasil, em 2021, 45.076 casos de estupro, 7.908 casos de abandono de incapaz, 19.136 de maus-tratos e 18.461 de lesões corporais em violência doméstica, entre outras violações de direitos. Já no que se refere a crimes letais, o registro contabiliza 2.555 crianças ou adolescentes vítimas fatais de violência. O levantamento “Maus-tratos entre crianças e adolescentes: perfil inédito das vítimas e circunstâncias desse crime no Brasil”, também produzido pelo Fórum, aponta ainda que 81% dos crimes dos maus-tratos ocorreram nas residências, percentual que pouco varia de acordo com a faixa etária da vítima. E, reforçando a necessidade de notificações mais aprofundadas, apenas 8% dos registros apresentam a informação sobre a relação entre agressor e vítima.
“Esses números nos mostram que ainda é grave a situação de violência com relação a crianças e adolescentes. São indícios de escaladas que podem contribuir para a violência se agravar, chegando até a uma violência letal. Essas situações de maus-tratos são situações que acontecem antes de chegar em uma na lesão corporal, e vai havendo uma crescente, então, se conseguimos agir diretamente já nesses casos menos graves, mais rápido, podemos impedir que essa criança, esse adolescente, vá sofrer uma violência mais grave. Em diversos casos, até de homicídio, a criança teve atendimento médico prévio em situações menos graves e aí a rede não foi acionada adequadamente ou, nem mesmo foi acionada, para proteger e evitar que essa criança ou adolescente sofresse casos mais graves”, explica a promotora de Justiça e integrante auxiliar da Comissão da Infância, Juventude e Educação, do Conselho Nacional do Ministério Público (Cije/CNMP), Mirella de Carvalho Bauzys Monteiro. (Disponível em https://portal.fiocruz.br/noticia/violencia-contra-criancas-e-adolescentes-pesquisadores-reforcam-importancia-da-notificacao#:~:text=De%20acordo%20com%20o%20Anu%C3%A1rio,19.136%20de%20maus%2Dtratos%20e).
A Lei nº 8.069/1990, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA –, impõe ao Estado e à sociedade obrigações e deveres com as crianças e adolescentes, assegurando-lhes “todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade”. Quando se fala em políticas públicas para crianças e adolescentes, é fundamental reforçar todos os direitos previstos no artigo 227 da Constituição, que na área da infância e juventude, vai envolver todas as ações do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente – SGDCA –, previstas no ECA. “E para o desenvolvimento dessa criança ou adolescente é imprescindível garantir todos os direitos”, frisa Mirella. O SGDCA foi implantado em 2006, com o objetivo de fortalecer a implementação do ECA e garantir uma proteção integral à infância e adolescência. De acordo com o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, o Sistema articula e integra vários atores sociais – de instâncias públicas governamentais e da sociedade civil – que atuam para garantir que os direitos humanos se concretizem na vida das crianças e adolescentes em todo o território brasileiro.
Em face do cenário exposto, torna-se imprescindível a aprovação do presente projeto, razão pela qual solicita-se apoio dos demais parlamentares para sua aprovação.
– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pelo deputado Charles Santos. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 344/2023, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.