PL PROJETO DE LEI 647/2023
Projeto de Lei nº 647/2023
Institui a Política de enfrentamento ao assédio sexual e outras violências praticadas contra mulheres no âmbito das Instituições de Ensino Superior no Estado de Minas Gerais.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica instituída a Política de enfrentamento ao assédio sexual e outras violências praticadas contra mulheres no âmbito das Instituições de Ensino Superior no Estado de Minas Gerais.
Art. 2º – Esta Lei se aplica às seguintes Instituições:
I – Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG);
II – Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES);
III – Escola de Governo Professor Paulo Neves de Carvalho (EG/FJP);
IV – Escola do Legislativo de Minas Gerais (ALMG);
V – Escola de Saúde Pública do Estado de Minas de Gerais (ESP/MG);
VI – Academia de Polícia Civil de Minas Gerais (ACADEPOL);
VII – Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (EJEF/TJMG);
VIII – Escola Institucional do Ministério Público de Minas Gerais (CEAF/MPMG);
IX – Escola de Contas e Capacitação Professor Pedro Aleixo (TCE/MG);
X – Academia de Bombeiros Militar de Minas Gerais (ABM/MG);
XI – Academia de Polícia Militar de Minas Gerais (APM/MG);
XII – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG);
XIII – Escola Superior da Defensoria Pública (Esdep-MG);
XIV – Fundação Ezequiel Dias (FED);
XV – outras Instituições Científicas, Tecnológicas e de Inovação (ICT), integrantes da administração pública direta ou indireta vinculadas ao Governo de Minas Gerais ou pessoa jurídica de direito privado que inclua em sua missão institucional ou em seu objetivo social ou estatutário atividades de ensino superior, pesquisa ou extensão e que tenham sede em Minas Gerais.
Art. 3º – Como âmbito de incidência desta norma compreende-se não somente os espaços físicos e geográficos das instituições elencadas no artigo 2º, mas também os lugares externos em que se realizam atividades de ensino, pesquisa, extensão, esporte, cultura, representação estudantil, tais como moradia universitária, restaurantes universitários, hospitais universitários, dentre outros.
Art. 4º – Esta Lei tem o intuito de proteger professoras, servidoras técnicas administrativas, trabalhadoras eventuais, trabalhadoras terceirizadas, estudantes, profissionais regidas pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) e todas as pessoas que compõe a comunidade acadêmica.
Art. 5º – São condutas abrangidas por esta Lei:
I – violência sexual: qualquer conduta que constranja a mulher a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual ou atos libidinosos não desejados, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força, seja por meio verbal, por redes sociais, de maneira virtual, escrito ou gestual;
II – assédio sexual: conduta que pode ocorrer dentro ou fora da instituição e é utilizada para obter vantagem ou favorecimento sexual mediante constrangimento, sem voluntário consentimento da vítima e pode se configurar como:
a) assédio sexual vertical:
1) descendente – de cima para baixo;
2) ascendente – de baixo para cima;
b) assédio sexual horizontal – na mesma hierarquia;
c) misto – horizontal e vertical;
III – assédio moral: conduta praticada no sentido de causar danos à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica das mulheres, seja por meio de atos, palavras ou gestos que causem dano emocional e diminuição da autoestima, prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento da mulher, ou vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões;
IV – violência física: qualquer conduta que ofenda a integridade ou saúde corporal da mulher;
V – violência patrimonial: qualquer conduta que configure a retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
VI – desqualificação intelectual: condutas que visam desmerecer competências, habilidades e atributos das mulheres;
VII – apropriação intelectual: quando há apropriação do trabalho intelectual de mulheres sem o devido reconhecimento de autoria e remuneração;
VIII – discriminação social praticada contra mulheres, além de racismo contra pessoas negras e indígenas, xenofobia, gordofobia, lesbofobia, bifobia e transfobia.
IX – violência política: entende-se como violência política a violência física, psicológica, econômica, simbólica ou sexual contra a mulher, com o intuito de impedir ou restringir o acesso e exercício de funções públicas e/ou induzi-la a tomar decisões contrárias à sua vontade na esfera pública.
X – qualquer outra ação, não exemplificada acima, que gere dano físico, psicológico, sexual, patrimonial, moral, intelectual e que tenha por motivação principal o gênero.
Art. 6º – São princípios da Política de enfrentamento ao assédio sexual e outras violências praticadas contra mulheres no âmbito das Instituições de Ensino Superior no Estado de Minas Gerais:
I – primazia dos direitos humanos e reconhecimento da violência contra as mulheres como violação a esses direitos;
II – a responsabilidade das Instituições de Ensino Superior no Estado de Minas Gerais no enfrentamento às formas de violência estabelecidas nesta Lei;
III – o empoderamento e o respeito ao protagonismo das mulheres, através de informações e acesso aos seus direitos;
IV – o dever das Instituições de Ensino Superior no Estado de Minas Gerais de assegurar o pleno acesso das mulheres ao ensino superior, assim como seu pleno desenvolvimento como pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho;
V – a formação permanente quanto às questões de violências de gênero no âmbito das instituições de ensino superior no Estado de Minas Gerais;
VI – atenção integral às mulheres vítimas de violências praticadas no espaço das Instituições de Ensino Superior no Estado de Minas Gerais;
VII – tratamento humanizado e não revitimizador, caracterizado pela vedação que a vítima dê o depoimento sobre o acontecido várias vezes, que sejam feitas perguntas ofensivas ou vexatórias a ela, ou seja, dispensado tratamento sem oferecer apoio adequado, além de ser defeso atendimento que questione as condições em que aconteceram os fatos denunciados.
Art. 7º – São objetivos da Política de enfrentamento ao assédio sexual e outras violências praticadas contra mulheres no âmbito das Instituições de Ensino Superior no Estado de Minas Gerais:
I – prevenir e enfrentar a prática de assédio sexual e outras violências praticadas contra mulheres no âmbito das Instituições de Ensino Superior no Estado de Minas Gerais;
II – capacitar os agentes públicos e privados vinculados às Instituições de Ensino Superior no Estado de Minas Gerais para o desenvolvimento e a implementação de ações destinadas à discussão, à prevenção, à orientação e à solução do problema nos órgãos e entidades abrangidos por esta Lei;
III – implementar e disseminar campanhas educativas sobre as condutas e os comportamentos que caracterizam o assédio sexual e outras formas de violência no ambiente acadêmico, com vistas à informação e à conscientização, de modo a possibilitar a identificação da ocorrência de condutas ilícitas e a rápida adoção de medidas para a sua solução;
IV – dar publicidade a dados de pesquisas que busquem monitorar as formas de violências contra a mulher em ambiente acadêmico, permitindo assim maior transparência no enfrentamento aos assédios.
Art. 8º – São ações e procedimentos da política que trata essa Lei:
I – a denúncia de violência deve ser formalizada somente pela parte ofendida junto às Ouvidorias, às Comissões de Ética, ou outro órgão correlato que terão o prazo de 30 (trinta) dias para análise do caso, prorrogáveis por mais 30 (trinta) dias, mediante pedido à autoridade responsável pela sindicância ou processo administrativo.
II – as denúncias devem ser formalizadas por escrito, sendo assegurado o sigilo de identidade, desde que solicitado, sendo que os fatos devem ser informados de maneira circunstanciada e com indicação de eventuais elementos probatórios;
III – as Instituições de Ensino Superior no Estado de Minas Gerais procederão ao encaminhamento de denúncias ao órgãos competentes, tais como Ministério Público, Delegacias de Polícia, Conselho Tutelar, Defensoria Pública e outros após a apuração e julgamento em torno da materialidade e autoria dos fatos denunciados;
IV – as Ouvidorias, as Comissões de Ética, ou outro órgão correlato enviarão à Procuradoria da Mulher da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) relatório anual sobre o tratamento de denúncias ocorridas nas Instituições de Ensino Superior no Estado de Minas Gerais e Instituições Científicas, Tecnológicas e de Inovação (ICT).
Art. 9º – Caso haja necessidade de medidas emergenciais para proteção da denunciante, tais como desvinculação de orientação acadêmica, suspensão de aulas ministradas pelo sujeito ativo da violência, dentre outros casos, a autoridade competente poderá proceder ao afastamento imediato do (a) acusado (a) de sua unidade/órgão em caráter cautelar ou, a depender do caso, de maneira definitiva.
Art. 10 – Nos termos da Lei 869/1952, a conclusão sobre a responsabilidade do sujeito que praticou ato de violência contra a mulher poderá implicar as seguintes sanções:
I – Repreensão;
II – Multa;
III – Suspensão;
IV – Destituição de função;
V – Demissão;
VI – Demissão a bem do serviço público.
§ 1º – A aplicação das penas disciplinares não se sujeita à sequência estabelecida neste artigo, mas é autônoma, segundo cada caso e consideradas a natureza e a gravidade da infração e os danos que dela provierem para o serviço público.
§ 2º – As sanções previstas neste artigo aplicam-se, no que couber, para responsabilização do sujeito que praticou ato de violência contra a mulher nas Instituições privadas, sem prejuízo da aplicação de outras sanções previstas na legislação correlata.
Art. 11 – As Instituições de Ensino Superior no Estado de Minas Gerais oferecerão à comunidade acadêmica e à pessoa que sofreu a violência apoio psicológico e orientações jurídicas apropriadas em situações de violências contra a mulher no ambiente acadêmico.
Art. 12 – As Instituições incentivarão abordagens de práticas restaurativas para a resolução de conflitos e para tal objetivo serão disponibilizados recursos que se direcionam para o acolhimento, suporte e acompanhamento das situações de violência/assédio.
Art. 13 – Será considerado, em todo o processo, a subjetividade da mulher, a sua escuta aberta e ativa, a valorização de suas opiniões, com intervenções focadas na reparação de danos, no atendimento às necessidades da vítima e na responsabilização do ofensor.
Art. 14 – Cabe ao Poder Executivo regulamentar a presente lei.
Art. 15 – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 2 de maio de 2023.
Bella Gonçalves
Justificação: O ambiente das Instituições de Ensino Superior no Estado de Minas Gerais tem por objetivo promover o Ensino, a Pesquisa e a Extensão de maneira a contribuir para a formação de cidadãos comprometidos para a melhoria e a transformação da sociedade. Ocorre que nesse percurso as mulheres vivem diversas situações de insegurança e violências de gênero sendo expostas a comportamentos machistas que a impedem de usufruir plenamente o direito à educação superior de qualidade e levando-as, em muitos casos, ao abandono dos espaços de formação superior.
As violências são múltiplas no âmbito das instituições de ensino superior, desde as mais diretas até outras mais sutis e simbólicas, arraigadas no cotidiano acadêmico e que devem diuturnamente serem combatidas. A sensação de insegurança e a violência são alarmantes no âmbito do ensino superior e se colocam como impeditivos importantes para o sucesso nos projetos e carreiras acadêmicas e profissionais de várias mulheres.
A pesquisa “Violência contra a mulher no ambiente universitário”, feita pelo Instituto Avon e pelo instituto de pesquisas Data Popular, que ouviu 1,8 mil estudantes de graduação e pós-graduação em universidades de todo o Brasil, demonstrou que 67% das alunas de universidades brasileiras já sofreram algum tipo de violência no ambiente universitário. Outra pesquisa desenvolvida em 2020 pela Doutoranda em Administração pelo Programa de Pós-Graduação da Escola de Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGA/EA/UFRGS), Bianca Spode Beltrame, com 44 instituições federais de ensino superior brasileiras, apontou que 70% das instituições não possuem nenhuma medida de combate ao assédio e também não desenvolve programas de prevenção aos casos.
Assim, o ambiente de formação superior espelham o que acontece na sociedade como um todo – a violência contra a mulher é algo enraizado, com frequentes casos de estupros, assédio sexual, coerção, agressões e desvalorização da capacidade intelectual das estudantes.
Diante desse cenário, é fundamental que se estabeleça uma Política de enfrentamento de condutas de assédio sexual e outras violências praticadas contra mulheres no âmbito das Instituições de Ensino Superior no Estado de Minas Gerais como forma de proteção, acolhimento, tratamento e encaminhamento de forma que o espaço acadêmico seja um espaço seguro para as mulheres. Por essas razões, contamos com o apoio das deputadas e deputados para o aperfeiçoamento e a aprovação de nosso projeto de lei.
– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pela deputada Leninha. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 2.568/2021, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.