MSG MENSAGEM 112/2023
MENSAGEM Nº 112/2023
Belo Horizonte, 29 de dezembro de 2023.
Excelentíssimo Senhor Presidente da Assembleia Legislativa,
Vossas Excelências – Senhoras e Senhores Deputados,
Povo de Minas Gerais,
Com meus cordiais cumprimentos, comunico a Vossas Excelências – Senhor Presidente e Senhoras e Senhores Deputados – e ao Povo Mineiro que, nos termos do inciso II do art. 70 da Constituição do Estado, decidi opor veto parcial, por inconstitucionalidade, à Proposição de Lei Complementar nº 180, de 2023, que regulamenta o § 19 do art. 36 da Constituição do Estado, que dispõe sobre a imunidade tributária da contribuição previdenciária em razão de doença incapacitante, no âmbito do regime próprio de previdência social, e dá outras providências.
Ouvidas a Secretaria de Estado de Governo – Segov –, a Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão – Seplag –, a Polícia Militar do Estado de Minas Gerais – PMMG – e o Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais – Ipsemg –, sintetizo, a seguir, os motivos do veto.
O parágrafo único do art. 1º da Proposição
“Art. 1º – (…)
Parágrafo único – O disposto no caput aplica-se aos militares da reserva, aos militares reformados e aos pensionistas.”.
Motivos do Veto
De início, observo que a presente proposição, de minha autoria, objetivou operar a plenitude dos efeitos da imunidade tributária prevista no § 19 do art. 36 da Constituição do Estado, cuja aplicabilidade (mediata) se encontra condicionada à edição de lei complementar regulamentadora, uma vez que o referido dispositivo – conforme tese do Supremo Tribunal Federal fixada no Tema 317 – RE 630.137 – é norma constitucional de eficácia limitada, ou seja, necessita de norma infraconstitucional ulterior que lhe assegure a plena aplicabilidade.
O dispositivo ora vetado, oriundo de emenda parlamentar, pretende a concessão da imunidade tributária da contribuição previdenciária, em razão de doença incapacitante, “aos militares da reserva, aos militares reformados e aos pensionistas”, isto é, estende benefício concedido aos servidores civis – ainda que de forma limitada – aos militares do Estado.
Nesse sentido, independentemente de conceituação expressa no texto constitucional, é incontroversa a natureza do instituto previsto no § 19 do art. 36 da Constituição do Estado, qual seja, a de imunidade tributária. Sob essa perspectiva, traz-se à luz o escólio de Leandro Paulsen:
“O texto constitucional não refere expressamente o termo ‘imunidade’. Utiliza-se de outras expressões: veda a instituição de tributo, determina a gratuidade de determinados serviços que ensejariam a cobrança de taxa, fala de isenção, de não incidência etc. Mas, em todos esses casos, em se tratando de norma constitucional, impede a tributação, estabelecendo, pois, o que se convencionou denominar de imunidades. O próprio STF já reconheceu a natureza de imunidade a essas regras constitucionais de ‘não incidência’ e de ‘isenção’. É o caso do RE 212.637, que cuidou do art. 155, § 2º, X, a, ou seja, da imunidade ao ICMS das operações que destinem mercadorias ao exterior, e da ADI 2028, que tratou do art. 195, § 7º, acerca da imunidade às contribuições de seguridade social das entidades beneficentes de assistência social. No RE 636.941, restou esclarecido que, por ter conteúdo de regra de supressão de competência tributária, a isenção do art. 195, § 7º, da CF encerra verdadeira imunidade. É importante considerar que, embora haja a referência, no texto constitucional, à isenção e à não incidência, trata-se de imunidades inconfundíveis com as desonerações infraconstitucionais. Elevadas a normas constitucionais proibitivas de tributação, deixam de ser simples isenções ou não incidências, assumindo verdadeiro caráter de imunidade. Tecnicamente falando, a isenção é benefício fiscal que pressupõe a existência da competência tributária e seu exercício. Tendo sido instituído determinado tributo, surge a isenção como um modo de desonerar determinado contribuinte ou operação. A isenção tem como fonte a lei, tal qual a norma instituidora do tributo. A não incidência, por sua vez, é simples consequência do fato de determinada situação não se enquadrar na hipótese de incidência (também chamada regra matriz de incidência tributária). Por vezes, contudo, o legislador torna expressa a não incidência, modelando ou restringindo a própria norma de incidência. Por se tratar de normas de competência, ainda que negativas, as imunidades têm foro exclusivo na Constituição, são numerus clausus.” (PAULSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 107-108). (grifo nosso)
Cumpre trazer, ainda, o entendimento, corroborado pelo Ministro Alexandre de Moraes, no julgamento proferido no RE 630.137, de que a imunidade tributária em questão é subjetiva, condicionada e parcial. Sob essa percepção, diz-se ser subjetiva porque tem como parâmetro o beneficiário da aposentadoria ou pensão por morte, ou seja, trata-se de imunidade ex ratione personae. É condicionada, porque é atribuída somente aos beneficiários (servidores aposentados e pensionistas) que sejam portadores de doença incapacitante, na forma da lei. Por último, é parcial, pois é limitada somente ao valor do dobro do teto do Regime Geral de Previdência Social, podendo haver tributação sobre o valor excedente. Nessa linha argumentativa, o Ministro expôs, ainda, que, sendo essa benesse, nos termos citados, caracterizada como imunidade tributária, o dispositivo constitucional não comporta juízo de interpretação extensiva.
A partir da compreensão da vedação de se interpretar ampliativamente a classificação dos servidores públicos beneficiados pela imunidade tributária, pondero, ainda, o locus do dispositivo a ser regulamentado por meio da presente proposição, isto é, o seu lugar na organização dos dispositivos constitucionais, por meio de seus elementos sistematizadores. Observa-se:
Seção V
Dos Servidores Públicos
(…)
Subseção II
Dos Servidores Públicos Civis
(…)
Art. 36 – Aos servidores titulares de cargos de provimento efetivo do Estado, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime próprio de previdência social, nos termos deste artigo, de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do Estado, dos servidores ativos e aposentados e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, que será gerido por instituição previdenciária de natureza pública e instituída por lei.
(…)
§ 19 – Quando o beneficiário, na forma da lei, for portador de doença incapacitante, a contribuição prevista no § 18 deste artigo incidirá apenas sobre as parcelas de proventos de aposentadoria e de pensão que superem o dobro do limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201 da Constituição da República. (grifo nosso)
Nesse sentido, ainda que se desconsidere a topologia do art. 36 e de seu § 19 e a opção do Constituinte de utilizar-se de arcabouço conceitual jurídico-administrativo próprio de servidores civis, e que se faça um esforço hermenêutico para extrair do texto um sentido amplo para que comporte os militares do Estado e seu sistema de proteção social, observa-se que o art. 39 estabelece de forma objetiva, em seu § 11, quais parágrafos do art. 36 aplicam-se, de fato, aos militares. In verbis:
Seção VI
Dos Militares do Estado
Art. 39 – São militares do Estado os integrantes da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros Militar, que serão regidos por estatuto próprio estabelecido em lei complementar.
(…)
§ 11 – Aplica-se ao militar o disposto nos §§ 1º, 3º, 4º e 5º do art. 24, nos §§ 1º, 2º, 3º, 4º, 5º e 6º do art. 31 e nos §§ 9º, 24 e 25 do art. 36 desta Constituição e nos incisos VIII, XII, XVII, XVIII e XIX do art. 7º da Constituição da República. (grifo nosso)
Em outras palavras, o constituinte é claro ao estabelecer de forma expressa quais parágrafos do art. 36 são aplicáveis aos militares do Estado, não havendo margem – por dedução lógica e pelo princípio da legalidade estrita ao qual está jungido o administrador público – para extensão da concessão da imunidade tributária de que trata o § 19 do art. 36 da Constituição do Estado a esta categoria.
O veto a esse dispositivo tem, portanto, fundamento na sua inconstitucionalidade.
O parágrafo único do art. 4º da Proposição
“Art. 4º – (…)
Parágrafo único – Caso a concessão da imunidade tributária de que trata o caput tenha sido suspensa por ato administrativo fundamentado na ausência de lei regulamentar específica para o disposto no § 19 do art. 36 da Constituição do Estado, o beneficiário receberá, com correção monetária desde o recolhimento, a restituição dos respectivos valores de contribuição previdenciária recolhidos em decorrência da suspensão do benefício.”.
Motivos do Veto
O parágrafo único do art. 4º da proposição, oriundo de emenda parlamentar, estabelece que o beneficiário receberá, com correção monetária desde o recolhimento, a restituição dos respectivos valores de contribuição previdenciária recolhidos em decorrência da suspensão do ato administrativo fundamentado na ausência de lei regulamentar.
Todavia, tratando-se de suspensão oriunda de ato administrativo regular, fundado na ausência de lei regulamentar, a suspensão ocorreu de forma juridicamente idônea, não ensejando, assim, o direito à restituição dos valores recolhidos, tampouco a incidência de correção monetária.
Sob essa perspectiva, reitero a tese do STF fixada no Tema 317 – RE 630.137 – no sentido de que a aplicabilidade (mediata) da plenitude dos efeitos da imunidade tributária prevista no § 19 do art. 36 da Constituição do Estado se encontra condicionada à edição de lei complementar regulamentadora. Nesse sentido, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais já denegou segurança, reafirmando a referida tese em âmbito estadual:
MANDADO DE SEGURANÇA – SERVIDORA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS – APOSENTADORIA POR INVALIDEZ PERMANENTE COM PROVENTOS INTEGRAIS EM RAZÃO DE DOENÇA INCAPACITANTE – ART. 36, § 19, CEMG – DIREITO LÍQUIDO E CERTO À IMUNIDADE PREVIDENCIÁRIA PARCIAL – AUSÊNCIA – RE Nº. 630.137 – NORMA DE EFICÁCIA LIMITADA – AUSÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL ESPECÍFICA – SEGURANÇA DENEGADA. 1. A ilegalidade ou a inconstitucionalidade do ato impugnado constitui pressuposto essencial para que se conceda a segurança na espécie, admitindo-se o mandamus em hipóteses excepcionais, ou seja, quando se mostrar a via apta a proteger um determinado direito líquido, certo e exigível, não amparado de modo eficiente por recurso ou correição, impondo-se a comprovação da irreparabilidade objetiva do dano. 2. Embora tenha sido revogado o § 21 do art. 40 da CR/88 que previa a imunidade previdenciária parcial no âmbito federal, o e. STF julgou o RE nº. 630.137 com repercussão geral reconhecida e fixou a seguinte tese jurídica: “O art. 40, § 21, da Constituição Federal, enquanto esteve em vigor, era norma de eficácia limitada e seus efeitos estavam condicionados à edição de lei complementar federal ou lei regulamentar específica dos entes federados no âmbito dos respectivos regimes próprios de previdência social.” 3. Diferentemente, no âmbito estadual mineiro, ainda vigora a norma que prevê a imunidade previdenciária parcial para os aposentados e pensionistas portadores de doença incapacitante (§ 19 do art. 36 da CEMG), contudo, na linha do entendimento do e. STF – RE nº 630.137, trata-se de norma de eficácia limitada, portanto, seus efeitos estão condicionados à edição de lei complementar específica, por se tratar de limitação constitucional ao poder de tributar (art. 146, II, da CR/88), o que até o momento inexiste. 4. Denegar a segurança.” (TJMG – Mandado de Segurança 1.0000.22.115292-9/000, Relator(a): Des.(a) Teresa Cristina da Cunha Peixoto, ÓRGÃO ESPECIAL, julgamento em 1º/9/2022, publicação da Súmula em 2/9/2022).
Ademais, cumpre trazer à tona que a determinação de pagamento de valores legalmente suspensos, juntamente com a incidência de correção monetária a ser aplicada, acarreta impacto financeiro ao erário. Sobre o tema, é clara a previsão do art. 113 do ADCT da Constituição da República, que exige um estudo de estimativa do impacto financeiro nos casos que tratem de alteração de despesas ou renúncia de receita, o que não ocorreu no caso em tela.
O veto a esse dispositivo tem, portanto, fundamento na sua inconstitucionalidade.
O art. 7º da Proposição
“Art. 7º – Fica acrescentado ao art. 85 da Lei Complementar nº 64, de 25 de março de 2002, o seguinte § 12:
“Art. 85 – (…)
§ 12 – Os servidores contratados nos termos da Lei nº 23.750, de 23 de dezembro de 2020, e convocados nos termos da Lei nº 7.109, de 13 de outubro de 1977, que perderam a condição de segurados em razão de aposentadoria pelo Regime Geral de Previdência Social, bem como seus dependentes, poderão continuar com o direito à assistência a que se refere o caput mediante opção formal, cuja regulamentação será feita Poder Executivo estadual.”.
Motivos do Veto
A proposta prevista no art. 7º da proposição de lei estabelece aos servidores contratados nos termos da Lei nº 23.750, de 23 de dezembro de 2020, e convocados nos termos da Lei nº 7.109, de 13 de outubro de 1977, bem como seus dependentes, a condição de segurados, mediante opção formal, cuja regulamentação será feita pelo Poder Executivo Estadual.
Todavia, o § 13 do art. 40 da Constituição da República estabelece que o Regime Próprio de Previdência dos Servidores Públicos é destinado unicamente aos servidores detentores de cargo efetivo.
Art. 40 – O regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargos efetivos terá caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente federativo, de servidores ativos, de aposentados e de pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial.
(…)
§ 13 – Aplica-se ao agente público ocupante, exclusivamente, de cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração, de outro cargo temporário, inclusive mandato eletivo, ou de emprego público, o Regime Geral de Previdência Social.
Dessa forma, entendo que a Lei Complementar nº 64, de 2002, se encontra em conformidade com o § 13 do art. 40 da Constituição da República, uma vez que estabelece em seu art. 3º os segurados do Regime Próprio de Previdência Social, dentre os quais, por impeditivo constitucional, não abarcados os servidores sujeitos ao regime da contratação temporária.
É o entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal, no sentido de que:
EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Administrativo. Servidores públicos detentores da estabilidade excepcional do art. 19 do ADCT. Inclusão no regime próprio de previdência social. Impossibilidade. Precedentes. 1. Os servidores abrangidos pela estabilidade excepcional prevista no art. 19 do ADCT não se equiparam aos servidores efetivos, os quais foram aprovados em concurso público. Aqueles possuem somente o direito de permanecer no serviço público nos cargos em que foram admitidos, não tendo direito aos benefícios privativos dos servidores efetivos. 2. Conforme consta do art. 40 da Constituição Federal, com a redação dada pela EC nº 42/2003, pertencem ao regime próprio de previdência social tão somente os servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, incluídas suas autarquias e fundações. 3. Agravo regimental não provido. 4. Majoração da verba honorária em valor equivalente a 10% (dez por cento) do total daquela já fixada (art. 85, §§ 2º, 3º e 11, do CPC), observada a eventual concessão do benefício da gratuidade da justiça. (ARE 1069876 AgR, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 27-10-2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-257 DIVULG 10-11-2017 PUBLIC 13-11-2017). (grifo nosso)
Nessa linha, o caput do art. 85 da Lei Complementar nº 64, de 2002, limita a prestação da assistência à saúde, social e complementar aos segurados do Regime Próprio de Previdência Social.
O Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais já manifestou pela impossibilidade de o servidor temporário ingressar no Regime Próprio de Previdência, tendo em vista a vedação constitucional estabelecida pelo § 13 do art. 40.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL/REEXAME NECESSÁRIO – AÇÃO DE CONCESSÃO DE APOSENTADORIA COMPULSÓRIA – ESTADO DE MINAS GERAIS – SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL DESIGNADO – PROFESSORA – IMPLEMENTO DOS REQUISITOS PARA APOSENTADORIA COMPULSÓRIA – ANTES DA ENTRADA EM VIGOR DO ARTIGO 79 DA LEI COMPLEMENTAR Nº 64/2002.
1 – A rigor, levando-se em consideração o princípio tempus regit actum, que disciplina as questões relativas à aposentadoria, registre-se que, à época do pleito de concessão de aposentadoria compulsória, em 2001, sequer estava em vigor o artigo 79 da Lei Complementar nº 64/2002, o qual implementou a garantia a tal benefício a servidores não titulares de cargo efetivo, bem como pensão a seus dependentes.
2 – A Lei Complementar nº 64/2002 acabou por inovar no ordenamento jurídico ao conceder prerrogativa a servidor não efetivo em sentido oposto ao previsto no artigo 40 da CF, o qual restringe o regime próprio de previdência aos servidores efetivos.
3 – Em outras palavras, dada a impossibilidade de aplicação dessa lei complementar, mandatória a observância da legislação à época em vigor, qual seja: o artigo 40, § 13, da CF, que preconiza que ao servidor ocupante de cargo temporário, precário, aplica-se o regime geral da previdência social (RGPS).
(TJMG – Apelação Cível 1.0386.08.008036-2/004, Relator(a): Des.(a) Maria Inês Souza, 2ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 10/4/2023, publicação da súmula em 10/4/2023)
O veto a esse dispositivo tem, portanto, fundamento na sua inconstitucionalidade.
O art. 8º da Proposição
“Art. 8º – Para fins do disposto no art. 3º da Emenda à Constituição do Estado nº 110, de 4 de novembro de 2021, combinado com o art. 13 da Emenda à Constituição do Estado nº 39, de 2 de junho de 1999, ficam assegurados aos militares que participaram do movimento reivindicatório de junho de 1997:
I – a anistia das punições administrativas ou disciplinares dele decorrentes;
II – a retirada das suas fichas funcionais das anotações e dos registros das punições a que se refere o inciso I, sendo proibida qualquer referência a elas;
III – a contagem de tempo de serviço, a graduação e os demais direitos inerentes ao posto ou à graduação, concedidas as promoções relativas aos quadros a que pertenciam na ativa, com a transferência para a reserva remunerada, com proventos integrais.
Parágrafo único – O disposto neste artigo aplica-se aos militares anistiados que participaram do movimento reivindicatório de junho de 1997 agregados aos respectivos quadros.”.
Motivos do Veto
A proposta apresentada no art. 8º da proposição, oriunda de emenda parlamentar, busca assegurar aos militares que participaram do movimento reivindicatório de junho de 1997 (i) a anistia das punições administrativas ou disciplinares; (ii) a retirada das suas fichas funcionais das anotações e dos registros das punições; (iii) a contagem de tempo de serviço, a graduação e os demais direitos inerentes ao posto ou à graduação, concedidas as promoções relativas aos quadros a que pertenciam na ativa, com a transferência para a reserva remunerada, com proventos integrais.
Na oportunidade, observo que a proposta dispõe sobre regime jurídico e disciplinar de servidores militares, competência reservada ao Governador do Estado, conforme previsão do inciso XXVIII do art. 90 da Constituição do Estado:
Art. 90 – Compete privativamente ao Governador do Estado:
(…)
XXVIII – relevar, atenuar ou anular penalidades administrativas impostas a servidores civis e a militares do Estado, quando julgar conveniente.
Logo, a proposta apresentada pelo Poder Legislativo viola o princípio constitucional da reserva administrativa, o qual impede a ingerência normativa do Poder Legislativo em matérias de competência privativa do Governador do Estado.
Neste sentido, cumpre trazer à tona jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, inclusive tratada no informativo nº 33 do STF, que estabelece como inconstitucional a lei estadual de iniciativa parlamentar que disponha sobre a concessão de anistia a infrações administrativas praticadas por policiais civis, militares e bombeiros. Observa-se:
CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA. PROCESSO LEGISLATIVO. LEI 7.428/2012 DO ESTADO DE ALAGOAS. ANISTIA DE INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS A POLICIAIS CIVIS, POLICIAIS MILITARES E BOMBEIROS MILITARES PELA PARTICIPAÇÃO EM MOVIMENTOS REIVINDICATÓRIOS. INICIATIVA PARLAMENTAR. MATÉRIA RESERVADA À INICIATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. REGIME JURÍDICO E DISCIPLINAR DE SERVIDORES PÚBLICOS. RESERVA DE ADMINISTRAÇÃO. AÇÃO DIRETA JULGADA PROCEDENTE. 1. A Constituição Federal (art. 61, § 1º, II, c e e) reserva ao chefe do Poder Executivo a iniciativa de leis que tratem do regime jurídico de servidores desse Poder ou que modifiquem a competência e o funcionamento de órgãos administrativos, no que se enquadra a lei de iniciativa parlamentar que concede anistia a infrações administrativas praticadas por servidores civis e militares de órgãos de segurança pública. 2. Ação Direta julgada procedente. (STF – ADI: 4928 AL, Relator: MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 11/10/2021, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 2/2/2022).
Ademais, imperioso destacar que a matéria do Projeto de Lei nº 35, de 2023, que originou a proposição de lei em referência, visou regulamentar o § 19 do art. 36 da Constituição do Estado, que dispõe sobre a imunidade tributária da contribuição previdenciária em razão de doença incapacitante, no âmbito do regime próprio de previdência social.
Logo, observo, ainda, a existência de vício formal de iniciativa, uma vez que a emenda parlamentar não possui pertinência temática com o projeto originário, não podendo o Poder Legislativo propor matéria estranha daquela apresentada pelo Chefe do Poder Executivo.
Sobre o tema, apresento orientação do Supremo Tribunal Federal:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS. LEI ESTADUAL nº 13.644/2000, ARTIGO 51, §§ 1º E 2º. OFENSA AOS ARTIGOS 22, XXV, E 236 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. EMENDA PARLAMENTAR. PERTINÊNCIA TEMÁTICA. ACUMULAÇÃO DE ATIVIDADE CARTORIAL DE NOTAS E DE REGISTRO. INVASÃO DE COMPETÊNCIA. NORMA DE NATUREZA SECUNDÁRIA. CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE. EXAME. IMPOSSIBILIDADE. 1. A Constituição Federal veda ao Poder Legislativo apenas a prerrogativa da formalização de emendas a projeto originário de Tribunal de Justiça, se delas resultar aumento de despesa pública, observada ainda a pertinência temática, a harmonia e a simetria à proposta inicial. 2. Lei pertinente à organização judiciária do Estado e destinada a preencher as necessidades de pequenas comarcas, incapazes de suportar o ônus de mais de uma serventia extrajudicial. Norma editada segundo os limites da competência do Estado-membro. Legitimidade. 3. Acumulação de atribuições cartorárias de notas e de registro. Harmonia entre a lei estadual e a Lei Federal nº 8.935/94, que apenas excepcionalmente admite a possibilidade de acumulação de serviços. Norma de natureza secundária. Controle concentrado de constitucionalidade. Exame. Impossibilidade. Ação conhecida em parte e, nesta parte, julgada improcedente. (ADI 2350/GO, relator o Ministro Maurício Corrêa, DJ de 25/3/2004)
Outrossim, faz-se necessário esclarecer que o art. 13 da Emenda à Constituição do Estado nº 39, de 2 de junho de 1999, já concede aos militares que participaram do movimento reivindicatório de junho de 1997 a anistia das punições administrativas ou disciplinares, bem como a retirada das suas fichas funcionais das anotações e dos registros das punições:
Art. 13 – Ficam concedidas aos militares que participaram do movimento reivindicatório de junho de 1997:
I – a anistia das punições administrativas ou disciplinares dele decorrentes;
II – a retirada das suas fichas funcionais das anotações e dos registros das punições a que se refere o inciso I, sendo proibida qualquer referência a elas.
O veto a esse dispositivo tem, portanto, fundamento na sua inconstitucionalidade.
Em conclusão, Senhor Presidente e Senhoras e Senhores Deputados, esses são os motivos de inconstitucionalidade que me levam a vetar parcialmente a proposição acima.
Nesses termos, submeto os motivos de veto à apreciação e à deliberação da Assembleia Legislativa, conforme dispõe o § 5º do art. 70 da Constituição do Estado.
Na oportunidade, reitero meu apreço e consideração a Vossas Excelências – Senhor Presidente e Senhoras e Senhores Deputados – e ao Povo Mineiro.
Romeu Zema Neto, governador do Estado.