PL PROJETO DE LEI 3773/2022
Projeto de Lei nº 3.773/2022
Concede a isenção de taxas e emolumentos de tradução juramentada pública para migrantes, refugiados, apátridas e retornados definidos na forma desta Lei, domiciliados no Estado de Minas Gerais.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica concedida a isenção de taxas e emolumentos de tradução juramentada pública para migrantes, refugiados, apátridas e retornados definidos na forma desta Lei, domiciliados no Estado de Minas Gerais.
§ 1º – Para os fins desta Lei considera-se, independentemente do seu status migratório e documental:
I – Imigrante: pessoa nacional de outro país ou apátrida que trabalha ou reside e se estabelece temporária ou definitivamente no Brasil;
II – Refugiado: todo indivíduo que devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país; não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior; devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país;
III – Apátrida: pessoa que não seja considerada como nacional por nenhum Estado, segundo a sua legislação;
IV – Retornado: são pessoas que após terem vivido no exterior retornam ao seu país de origem; e
V – Emigrante: brasileiro que se estabelece temporária ou definitivamente no exterior;
§ 2º – As traduções juramentadas a que se refere o caput deste artigo são aquelas realizadas por Tradutor Público e/ou Intérprete Comercial habilitado no idioma estrangeiro a que se destina a tradução em Português, nomeado e matriculado na Junta Comercial do estado de Minas Gerais, após aprovação em concurso público.
Art. 2º – As despesas decorrentes da execução da presente Lei correrão por conta das dotações orçamentárias consignadas ao Fundo de Erradicação da Miséria – FEM, criado pela Lei Estadual, criado pela Lei Estadual 19.990, de 29 de dezembro de 2011, ou outra fonte definida pelo Poder Executivo, suplementadas se necessário.
Parágrafo único – O Poder Executivo Estadual poderá no uso de suas atribuições estabelecer parceria com Organizações da Sociedade Civil (OSC) notadamente atuante com migrantes, refugiados, apátridas e retornados do Estado de Minas Gerais para favorecer o acesso a este serviço.
Art. 3º – Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 30 de maio de 2022.
Leninha, líder da Bancada Feminina, vice-líder do Bloco Democracia e Luta e vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos (PT).
Justificação: O presente projeto de lei concede isenção do pagamento de taxas e emolumentos, para fins de tradução juramentada, aos refugiados domiciliados no estado, com o objetivo de garantir a implementação de direitos humanos aos refugiados, facilitando o reconhecimento de diplomas e documentos deste grupo, ampliando assim sua integração.
O Estado brasileiro é signatário de Tratados Internacionais que visam a efetivação e proteção internacional dos Direitos Humanos, entre eles a Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951 e a Declaração de Cartagena de 1984. Estas legislações preconizam que os Estados implementem políticas públicas de acolhimento e integração social dos refugiados.
O art. 22 do Estatuto dos Refugiados prevê que é dever do Brasil dar "aos refugiados um tratamento tão favorável quanto possível, e em todo caso não menos favorável do que o que é dado aos estrangeiros em geral, nas mesmas circunstâncias, quanto aos graus de ensino além do primário e notadamente no que concerne ao acesso aos estudos, ao reconhecimento de certificados de estudos, de diplomas e títulos universitários estrangeiros, à isenção de direitos e taxas e à concessão de bolsas de estudo".
A Lei Federal nº 9.474, de 22 de julho de 1997 e a Lei Federal nº 13.445, de 24 de maio de 2017, vedam a prática de tratamento discriminatório de qualquer natureza contra a população migrante e/ou refugiada. Nestes dispositivos legais estão previstos como princípios a facilitação e integração local do refugiado quanto ao acesso à educação, sendo expresso que “o reconhecimento de certificados e diplomas, os requisitos para a obtenção da condição de residente e o ingresso em instituições acadêmicas de todos os níveis deverão ser facilitados, levando-se em consideração a situação desfavorável vivenciada pelos refugiados”.
Segundo depoimento do coordenador da Cáritas, uma das principais dificuldades que os refugiados encontram para revalidar seus diplomas e documentos é o alto custo da tradução juramentada. Sendo esse um problema relevante para integração dos refugiados no nosso estado e no nosso país. Razão pela qual os tratados de proteção internacional de Direitos Humanos do qual o Brasil é signatário não são efetivamente cumpridos.
O Serviço Jesuíta a Migrantes e Refugiados (SJMR BH), instituição da Companhia de Jesus, que busca servir, acompanhar e defender migrantes, solicitantes de refúgio e pessoas refugiadas, promovendo e protegendo sua dignidade e direitos, acompanhando seu processo de inclusão e autonomia e incidindo na sociedade e no poder público, para que reconheçam a riqueza da diversidade humana. Em âmbito nacional, a organização trabalha, com centros de atendimento em Belo Horizonte/MG, Boa Vista/RR, Brasília/DF, Manaus/AM, Porto Alegre/RS e com presença e alguns serviços em Salvador/BA e Florianópolis/SC.
Em Belo Horizonte o SJMR atende migrantes e refugiados de diversas nacionalidades que chegam em situação de vulnerabilidade extrema nos aspectos jurídicos, sociais, econômicos de saúde e laborais. Assim, visando auxiliar na defesa e na garantia dos direitos destas pessoas, o SJMR em Belo Horizonte tem atuado em parceria com outras instituições, tanto no setor público como privado, procurando estabelecer, de forma contínua, uma rede de apoios que viabilize a continuidade da prestação de serviços de maneira gratuita, a fim de assegurar ao público destinatário o maior acesso possível a tais serviços e a políticas públicas que lhes assegurem sua dignidade, autonomia e inclusão.
Um destes serviços que tem demandado maiores esforços (e, consequentemente, dificuldades) para que os migrantes e refugiados possam pleitear plenamente seus direitos, afirma a entidade é a tradução juramentada dos seus documentos em razão do seu elevado custo, vez que já são muitas as dificuldades que enfrentam para conseguir emprego e adquirir condições para subsidiar uma vida digna, o que impede o custeio de emolumentos necessários à tradução juramentada, e, consequentemente, o acesso a direitos básicos, como educação e trabalho, entre outros, submetendo essas pessoas à marginalidade e à pobreza. Sem este serviço torna-se impossível, por exemplo, a revalidação do diploma dos cursos superiores obtidos em seus países de origem, o que lhes dificulta o acesso a direitos básicos garantidos pela Constituição Federal, como a educação, a liberdade e o trabalho.
Ademais, convém ressaltar que, além das garantias constitucionais de construção de uma sociedade livre, justa e solidária, com a redução das desigualdades sociais e que promova o bem de todos (CF, art. 3º), e de isonomia perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (CF, art. 5º), bem como os dos diversos direitos sociais como a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados (CF, art. 6º), o Brasil é signatário de diversos tratados internacionais que visam garantir os direitos fundamentais da pessoa humana. Esses e os demais direitos fundamentais balizam a aplicação das leis e a elaboração e execução das políticas públicas no Brasil, devendo possuir, portanto, máxima eficácia e aplicabilidade imediata (CF, art. 5º, § 1º).
Não bastassem esses fundamentos, a Lei Federal nº 13.445/2017 (Lei de Migração) estabelece pontos e diretrizes tais como: Art. 3º – A política migratória brasileira rege-se pelos seguintes princípios e diretrizes: I – universalidade, indivisibilidade e interdependência dos direitos humanos; II – repúdio e prevenção à xenofobia, ao racismo e a quaisquer formas de discriminação; III – não criminalização da migração; IV – não discriminação em razão dos critérios ou dos procedimentos pelos quais a pessoa foi admitida em território nacional; V – promoção de entrada regular e de regularização documental; VI – acolhida humanitária; VII – desenvolvimento econômico, turístico, social, cultural, esportivo, científico e tecnológico do Brasil; VIII – garantia do direito à reunião familiar; IX – igualdade de tratamento e de oportunidade ao migrante e a seus familiares; X – inclusão social, laboral e produtiva do migrante por meio de políticas públicas; XI – acesso igualitário e livre do migrante a serviços, programas e benefícios sociais, bens públicos, educação, assistência jurídica integral pública, trabalho, moradia, serviço bancário e seguridade social; XII – promoção e difusão de direitos, liberdades, garantias e obrigações do migrante; XIII – diálogo social na formulação, na execução e na avaliação de políticas migratórias e promoção da participação cidadã do migrante; XIV – fortalecimento da integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, mediante constituição de espaços de cidadania e de livre circulação de pessoas; XV – cooperação internacional com Estados de origem, de trânsito e de destino de movimentos migratórios, a fim de garantir efetiva proteção aos direitos humanos do migrante; XVI – integração e desenvolvimento das regiões de fronteira e articulação de políticas.
De acordo com os dados apresentados no relatório da análise sociodemográfica e laboral de refugiados residentes no Brasil, realizado pelas Cátedras Sérgio Vieira de Melo e o Alto Comissariado das Nações Unidas (UNHCR) realizado em 14 cidades brasileiras no ano 2019, os refugiados assistidos possuem uma qualificação escolar acima da média brasileira. Apenas 2,7% dos refugiados não haviam completado o Ensino Fundamental, enquanto a média brasileira para essa faixa é de 33,8%, desses refugiados, 84% concluíram ao menos o Ensino Médio, enquanto a média dos brasileiros é de 26,8%. Enquanto o número de refugiados que concluíram o ensino superior é de 34,4%, contra 15,7% dos brasileiros concluíram o mesmo nível de ensino.
Porém, observando os dados deste relatório, assusta o número de refugiados que conseguem revalidar seus diplomas aqui no Brasil, apenas 9,52% conseguem essa proeza. Mais de 90% dos refugiados que estão no Brasil, embora sejam bem qualificados, não conseguem comprovar seu grau de escolaridade. Sendo o alto custo da tradução juramentada um dos grandes problemas enfrentados pelos refugiados para revalidar seus diplomas.
Apesar do grande capital financeiro e linguístico dos refugiados que chegam ao Brasil estes não se transformam em capital econômico (emprego e renda). Isto é, apesar do alto grau de qualificação os refugiados não conseguem atuar nos setores ligados à sua formação acadêmica, sendo jogados para atividades muitas vezes precarizadas e que não suprem suas necessidades financeiras.
Sendo o reconhecimento do diploma a oportunidade que parte dos refugiados e migrantes têm de garantir sua autonomia financeira, mas também de contribuir positivamente para o desenvolvimento legal. E políticas públicas que contribuem para facilitar o reconhecimento dos diplomas e documentos dos refugiados, como é o objetivo deste projeto, também contribuem para garantia internacional de direitos humanos, facilitar a integração dos refugiados e o desenvolvimento local.
Pelas razões acima expostas conto com o apoio dos nobres pares desta Casa para aprovação do projeto de lei ora apresentado.
– Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça, de Direitos Humanos e de Fiscalização Financeira para parecer, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, do Regimento Interno.