PL PROJETO DE LEI 3384/2021
Projeto de Lei nº 3.384/2021
Institui a obrigatoriedade da assistência do profissional farmacêutico nas empresas que exercem atividade de transporte de produtos farmacêuticos e farmoquímicos, sujeitos à vigilância sanitária no Estado de Minas Gerais.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – As empresas que exercem atividade de transporte de produtos farmacêuticos e farmoquímicos sujeitos a controle da Vigilância Sanitária, seja por meio terrestre, ferroviário ou aéreo, ficam obrigadas a dispor de assistência profissional competente (farmacêutico), como responsável técnico, para cumprimento das exigências sanitárias previstas pelo Ministério da Saúde e pela Secretaria de Estado da Saúde de Minas Gerais.
§ 1º – O profissional farmacêutico deverá estar regularmente inscrito no Conselho Regional de Farmácia de Minas Gerais (CRF/MG).
§ 2º – A obrigatoriedade da assistência do profissional que refere o “caput” deste artigo se estende a todas as empresas que possuem matriz e às filiais presentes no Estado de Minas Gerais.
Art. 2º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 3 de dezembro de 2021.
Ana Paula Siqueira (Rede)
Justificação: O segmento de empresas transportadoras de medicamentos e insumos farmacêuticos submetidas à fiscalização da Vigilância Sanitária está diretamente relacionado à qualidade final dos produtos para a saúde que chegam a população. Tais empresas são consideradas corresponsáveis nas etapas de produção, distribuição, armazenamento, transporte e dispensação, o que caracteriza uma função da assistência farmacêutica, atuação exercida privativamente pelo profissional farmacêutico, sendo este o único com formação técnica que o qualifica para garantir o cumprimento das Boas Práticas, previstas em regulamentações sanitárias federais e estaduais.
Várias normas sanitárias, federais e estaduais, regulam o tema e indicam a necessidade da assistência técnica de profissional qualificado e legalmente habilitado para assegurar a qualidade no transporte de produtos farmacêuticos e farmoquímicos. Contudo, a ausência de uma lei que cite diretamente a obrigatoriedade do profissional farmacêutico, especialmente nas transportadoras de medicamentos, gera precedentes para desassistência em diversos estabelecimentos.
O Conselho Regional de Farmácia de Minas Gerais possui atualmente 299 empresas registradas como Transportadoras de Medicamento, Correlatos e Materiais Biológicos, destas, 47 não dispõem de farmacêutico habilitado para o exercício da responsabilidade técnica. A falta de assistência farmacêutica nos estabelecimentos pode gerar sérios prejuízos para a população, uma vez que coloca em risco toda a cadeia logística dos medicamentos, ficando estes sujeitos a riscos de extravio, contaminação, alterações na integridade física, química e biológica, além da perda de eficácia.
O Decreto nº 8.077, de 14 de agosto de 2013, regulamenta as condições para o funcionamento de empresas sujeitas ao licenciamento sanitário, o registro, controle e monitoramento no âmbito da vigilância sanitária, dos produtos de que trata a Lei nº 6.360, de 23 de setembro de 1976, normatiza:
“Art. 2º – O exercício de atividades relacionadas aos produtos referidos no art. 1º da Lei nº 6.360, de 1976, dependerá de autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa – e de licenciamento dos estabelecimentos pelo órgão competente de saúde dos Estados, Distrito Federal ou Municípios, observados os requisitos técnicos definidos em regulamento desses órgãos.
Art. 3º – Para o licenciamento de estabelecimentos que exerçam atividades de que trata este Decreto pelas autoridades dos Estados, Distrito Federal ou Municípios, o estabelecimento deverá:
I – possuir autorização emitida pela Anvisa de que trata o caput do art. 2º;
II – comprovar capacidade técnica e operacional, e a disponibilidade de instalações, equipamentos e aparelhagem imprescindíveis e em condições adequadas à finalidade a que se propõe;
III – dispor de meios para a garantia da qualidade dos produtos e das atividades exercidas pelo estabelecimento, nos termos da regulamentação específica;
IV – dispor de recursos humanos capacitados ao exercício das atividades;
V – dispor de meios capazes de prevenir, eliminar ou reduzir riscos ambientais decorrentes das atividades exercidas pelo estabelecimento que tenham efeitos nocivos à saúde.
Art. 5º – Os estabelecimentos que exerçam atividades previstas neste Decreto ficam obrigados a manter responsável técnico legalmente habilitado.
Art. 6º –Os órgãos e entidades públicas que exerçam atividades abrangidas pela Lei nº 6.360, de 1976, não dependem de licença para funcionamento, ficando, porém, sujeitos às exigências quanto a instalações, equipamentos e aparelhagem adequados e à assistência e responsabilidade técnicas.
Art. 15 – A ação de vigilância sanitária implicará a fiscalização de todos produtos de que trata este Decreto, inclusive os isentos de registro, os estabelecimentos de fabricação, distribuição, armazenamento e venda, e os veículos destinados ao transporte dos produtos, para garantir o cumprimento das boas práticas e das exigências da legislação vigente.
§ 1º – As empresas titulares de registro, fabricantes ou importadoras, têm a responsabilidade de garantir e zelar pela manutenção da qualidade, segurança e eficácia dos produtos até o consumidor final, para evitar riscos e efeitos adversos à saúde.
§ 2º – A responsabilidade solidária de zelar pela qualidade, segurança e eficácia dos produtos e pelo consumo racional inclui os demais agentes que atuam desde a produção até o consumo." (Brasil, 2013, grifo nosso).
Mesmo na ausente citação direta do farmacêutico no referido Decreto, este é o único profissional tecnicamente qualificado e habilitado pela formação para o cumprimento dos requisitos capazes de assegurar as condições de segurança físico-química e microbiológica em toda cadeia de produção e distribuição dos produtos farmacêuticos e farmoquímicos, garantindo que estes cheguem à população com a preservação de seus aspectos de pureza, segurança e eficácia.
Todas as empresas envolvidas na cadeia de transporte possuem responsabilidade solidária na garantia da integridade, segurança e qualidade dos produtos farmacêuticos ou insumos expedidos. Nesse sentido, conforme previsto no Art. 2º do Decreto nº 8.077/2013, cabe aos estados e municípios expedir regulamentos técnicos específicos que possam garantir a qualidade dos processos nas empresas sujeitas ao licenciamento sanitário operantes em sua jurisdição, incluindo, dessa forma, filiais de empresas cujas sedes estejam situadas em outros entes federativos.
Haja vista a determinação expressa no Art. 5º do Decreto nº 8.077/2013 quanto à manutenção de responsável técnico legalmente habilitado, é importante que as regulamentações complementares expedidas pelos estados e municípios deem previsão da necessidade da assistência do profissional farmacêutico em todas as unidades, públicas ou privadas, que executam a produção, distribuição, transporte ou venda de medicamentos e insumos farmoquímicos.
A Lei nº 3.820 de 1960 que cria o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Farmácia determina como atribuição dos Conselhos Regionais o registro dos profissionais e do Conselho Federal expedir resoluções, definindo ou modificando atribuições ou competências, conforme a necessidade.
Dessa forma, o Conselho Federal de Farmácia (CFF), deliberou, por meio da Resolução nº 433 de 2005, a atuação do farmacêutico em empresas de transporte terrestre, aéreo, ferroviário ou fluvial, de produtos farmacêuticos, farmoquímicos e produtos para saúde, determinando entre as responsabilidades do profissional “zelar pelo cumprimento da legislação sanitária e demais legislações correlatas, orientando quanto às adequações necessárias para o cumprimento das normas” e “definir no manual de Boas Práticas de Transporte de Medicamentos procedimentos específicos para esse tipo de transporte”. Adicionalmente, em 2019, o CFF expediu nova resolução (Resolução nº 679 de 21 de novembro de 2019) que:
“Dispõe sobre as atribuições do farmacêutico nas operações logísticas de importação/exportação, distribuição, fracionamento, armazenagem, courier, transporte nos modais terrestre, aéreo ou fluvial, e demais agentes da cadeia logística de medicamentos e insumos farmacêuticos, substâncias sujeitas a controle especial e outros produtos para a saúde, cosméticos, produtos de higiene pessoal, perfumes, saneantes, alimentos com propriedades funcionais ou finalidades especiais e produtos biológicos.”
É importante salientar que o CFF é o único órgão de classe que regulamentou as atribuições e responsabilidades do profissional no setor de transporte de medicamentos, estando estas condizentes e alinhadas às necessidades de assistência técnica previstas nas regulamentações sanitárias específicas. Entre outras atribuições especificadas na Resolução do CFF nº 679/2019, cabe ao farmacêutico:
“I – Cumprir e fazer cumprir as legislações sanitárias relacionadas às atividades logísticas dos produtos e insumos farmacêuticos mencionados nesta resolução e, das atividades realizadas pelos referidos estabelecimentos, seguindo as normas vigentes;
II – Implantar ou implementar o Sistema de Gestão da Qualidade (SGQ) e as Boas Práticas de Armazenagem e/ou Distribuição nos referidos estabelecimentos, com o fim de minimizar os riscos à qualidade dos produtos e insumos farmacêuticos mencionados nesta resolução e seus possíveis impactos oriundos da(s) etapa(s) da movimentação logística;
III – Indicar as adequações técnicas e/ou de infraestrutura do estabelecimento necessárias para o cumprimento do Sistema de Gestão da Qualidade (SGQ) e das Boas Práticas de Armazenagem e/ou Distribuição;
Art. 4º V – Treinar e/ou desenvolver sistema de treinamento para todos os envolvidos nas operações relacionadas ao recebimento, armazenagem, embarque e expedição dos produtos e insumos farmacêuticos, de modo a atender os protocolos e instruções de qualificação térmica;
Art. 5° – São atribuições do farmacêutico na logística de transporte nos modais terrestre, aéreo ou fluvial e de empresas courier de medicamentos:
I – Elaborar procedimentos, instruções ou rotinas para transportar somente produtos registrados, notificados e cadastrados na Anvisa e de empresas autorizadas pelo órgão sanitário competente";
Como importante instrumento para execução da Lei nº 6.360/1976, a Portaria nº 1.052 de 29 de dezembro de 1998, da Secretaria de Vigilância Sanitária (SVS) do Ministério da Saúde aprova a relação de documentos necessários para habilitar a empresa a exercer a atividade de transporte de produtos farmacêuticos e farmoquímicos, sujeitos à vigilância sanitária. Dentre outras exigências, a Portaria especifica a necessidade da “comprovação de assistência profissional competente (farmacêutico) para verificação e controles necessários”.
Sobre o tema ainda é importante observar a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) n° 16 de 1º de abril de 2014, que dispõe sobre os critérios para peticionamento de Autorização de Funcionamento (AFE) e Autorização Especial (AE) de empresas, incluindo as transportadores e exportadores de medicamentos e insumos farmacêuticos, a exigência do registro de responsabilidade técnica de profissional legalmente habilitado e qualificado para a atividade.
“Art. 28... I – informações gerais:
e) comprovação do registro de responsabilidade técnica realizada pelo profissional legalmente habilitado junto ao respectivo conselho de classe;
II – requisitos técnicos:
b) existência de recursos humanos qualificados e devidamente capacitados ao desempenho das atividades da empresa ou estabelecimento, incluindo, no caso de importadora de medicamentos, a garantia da qualidade dos medicamentos, a investigação de desvio de qualidade e demais atividades de suporte";
A Anvisa publicou recentemente a RDC nº 430, de 8 de outubro de 2020, que dispõe sobre as Boas Práticas de Distribuição, Armazenagem e de Transporte de Medicamentos. A norma estabeleceu obrigações e controles mais rígidos em toda cadeia de distribuição, armazenagem ou transporte de medicamentos, especialmente quanto aos requisitos de controle, monitoramento e recolhimento, o que evidencia a importância da assistência do profissional farmacêutico tecnicamente qualificado e habilitado.
Por último, vale destacar a Resolução nº 5.815 de 18 de julho de 2017, da Secretaria de Estado da Saúde de Minas Gerais (SES/MG), que estabelece os requisitos mínimos para o cumprimento das Boas Práticas de fracionamento, armazenamento, distribuição e transporte de produtos sob controle sanitário e seus insumos, exceto alimentos, no âmbito do Estado. Tal norma, indica como obrigatória a presença, durante todo o horário de funcionamento, do profissional responsável técnico nos estabelecimentos de transporte de medicamentos e insumos farmacêuticos.
O transporte de cargas consideradas “especiais” ou “perigosas” no Brasil, como no caso dos medicamentos, ainda carece de maior atenção e adequações. Infelizmente, apesar da ausência de dados estatísticos, não é incomum o desvio de cargas, comércio ilegal de produtos controlados, ausência do cumprimento de condições higiênicosanitárias, transporte em veículos irregulares, exposição de produtos termolábeis a altas temperaturas, adulteração e contaminação. A assistência do profissional farmacêutico é essencial para que as empresas do segmento cumpram as diretrizes de Boas Práticas para o transporte de produtos farmacêuticos e farmoquímicos, sujeitando-os ao monitoramento, controle e fiscalização dos órgãos sanitários competentes.
Diante do exposto, cabe solidariamente ao Poder Legislativo do Estado de Minas Gerais balizar o tema e instituir como obrigatória a assistência farmacêutica em todas as empresas que exercem atividade de transporte de produtos farmacêuticos e farmoquímicos, garantindo que estes cheguem a população se forma íntegra e segura.
– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pelos deputados Fred Costa e Noraldino Júnior. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 87/2015, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.