PL PROJETO DE LEI 2568/2021
Projeto de Lei nº 2.568/2021
Institui a Política de Conscientização e Enfrentamento ao Assédio e a Violência Sexual no Estado de Minas Gerais.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica instituída a Política de Conscientização e Enfrentamento ao Assédio e a Violência Sexual no Estado de Minas Gerais.
Parágrafo único – São condutas abarcadas por esta Lei:
I – a violência sexual – entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual ou atos libidinosos não desejados, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força, consubstanciadas nas seguintes condutas já tipificadas:
a) estupro – constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso, de acordo com o art. 213 do Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940);
b) violação sexual mediante fraude – ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima, de acordo com o art. 215 do Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940);
c) assédio sexual – constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função, de acordo com o art. 216-A do Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940);
II – estupro de vulnerável – ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de catorze anos, e acordo com o art. 217-A do Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940);
a) corrupção de menores – Induzir alguém menor de catorze anos a satisfazer a lascívia de outrem, de acordo com o art. 218 do Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940);
b) satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente – praticar, na presença de alguém menor de catorze anos, ou induzi-lo a presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem. de acordo com o art. 218-A do Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940);
c) importunação ofensiva ao pudor – Importunar alguém, em lugar público ou acessível ao público, de modo ofensivo ao pudor de acordo com o art. 61 da Lei de Contravenções Penais (Decreto-lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941);
d) importunação sexual – praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro, de acordo com o art. 215-A do Código Penal. (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940);
III – demais casos previstos na legislação específica.
Art. 2º – São princípios da Política de Conscientização e Enfrentamento ao Assédio e a Violência Sexual no Estado de Minas Gerais:
I – o enfrentamento a todas as formas de violência contra a mulher;
II – a responsabilidade do poder público estadual no enfrentamento ao assédio e à violência sexual;
III – o empoderamento das mulheres, através de informações e acesso aos seus direitos;
IV – a garantia dos direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido de resguardá-las de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão;
V – o dever do estado de assegurar às mulheres as condições para o exercício efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária;
VI – a formação permanente quanto às questões de gênero e de raça ou etnia;
VII – a promoção de programas educacionais que disseminem valores éticos de irrestrito respeito à dignidade da pessoa com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia.
Art. 3º – São objetivos da política de que trata esta lei:
I – enfrentar o assédio e a violência sexual nos equipamentos e espaços públicos, inclusive escolas, parques e praças, serviço de transporte por aplicativo, e transportes coletivos, no Estado de Minas Gerais;
II – divulgar informações sobre o assédio e a violência sexual;
III – disponibilizar os telefones de órgãos públicos responsáveis pelo acolhimento e atendimento das mulheres;
IV – incentivar a denúncia das condutas tipificadas.
Art. 4º – São ações da política de que trata esta lei:
I – promoção de campanhas educativas e não discriminatórias de enfrentamento ao assédio e a violência sexual;
II – criação de cartilhas na perspectiva de gênero, raça e idade com explicações sobre o assédio e a violência sexual;
III – promover campanhas para implementação de câmeras e iluminação nos equipamentos públicos;
IV – fortalecer equipamentos remotos, veículos de denúncia online e o ambulatório de Violência Sexual (VS);
V – a formação permanente dos servidores e prestadores de serviço sobre o assédio e a violência sexual;
VI – empoderar a mulher para que esta denuncie o ocorrido, caso deseje;
VII – divulgação das políticas públicas voltadas para o atendimento às vítimas de assédio e a violência sexual.
Art. 5º – O Poder Executivo usará as paradas, estações e as áreas internas e externas dos ônibus intermunicipais e das composições dos trens para campanhas educativas permanentes de enfrentamento ao assédio e à violência sexual.
§ 1º – Serão priorizadas as estações e paradas que apresentem grande circulação de pessoas para fins desta Lei.
§ 2º – Poderá a publicidade ser feita através do método de envelopamento, respeitadas outras opções aplicáveis.
§ 3º – Entende-se envelopamento como a técnica que consiste na aplicação de adesivos ou similares na totalidade da carroceria de veículo, visando caracterizá-lo de alguma forma.
§ 4º – As campanhas publicitárias deverão ser veiculadas nas redes sociais das concessionárias dos serviços públicos de transporte do Estado de Minas Gerais.
§ 5º – Estende-se, o disposto neste artigo, a todos os meios de transporte público coletivo que venham a ser criados no Estado em data posterior a publicação da presente Lei.
Art. 6º – Para os efeitos desta Lei, as câmeras de videomonitoramento e o sistema GPS – Sistema de Posicionamento Global (Global Positioning System) dos meios de transporte público deverão ser utilizados para que as mulheres possam reconhecer os infratores e identificar o exato momento da violência sexual, devendo ser disponibilizados para a efetivação da denúncia das condutas junto aos órgãos de segurança do Estado.
Art. 7º – A concessionária dos serviços públicos de transporte promoverá cursos de capacitação dos motoristas, cobradores, bilheteiros, fiscais e demais trabalhadores envolvidos no cotidiano do transporte público do estado.
Parágrafo único – A formação prevista no caput observará as especificidades de cada transporte público, no sentido de acolher a vítima do fato e viabilizar a denúncia, informando seus direitos e respeitando a decisão da mulher.
Art. 8º – O Poder Executivo promoverá o treinamento e formação dos servidores estaduais e prestadores de serviço sobre o tema.
§ 1º – A formação permanente dos servidores e prestadores de serviço do estado observará, prioritariamente, o combate ao assédio moral e sexual no local de trabalho e o acolhimento das vítimas de assédio e a violência sexual.
§ 2º – A formação permanente dos servidores e prestadores de serviço do estado deverá observar os princípios previstos no art. 2º.
Art. 9º – O Poder Executivo produzirá cartilhas educativas sobre o assédio e a violência sexual no âmbito do serviço público, prioritariamente no que tange o assédio moral e sexual no ambiente de trabalho e no transporte público.
Parágrafo único – Para a confecção dos materiais previstos no caput serão observados os relatórios técnicos pertinentes a violência contra a mulher.
Art. 10 – O Poder Executivo fortalecerá as iniciativas que tratem do tema desta Lei que preconizam os princípios expostos no art. 2º.
Art. 11 – Fica o Poder Executivo autorizado a firmar convênios com as outras esferas do Poder Público a fim de garantir maior visibilidade à política de que trata esta lei.
Art. 12 – O Poder Executivo deverá estabelecer um Colegiado Gestor da política de que trata esta lei, priorizando a participação de mulheres.
Parágrafo único – A composição deste Colegiado Gestor será paritária e deverá contar com a participação de membros das Secretarias e do Poder Executivo, além de organizações da sociedade civil que atuam no enfrentamento à violência contra as mulheres e combate ao machismo e organizações que atuam no combate à violência e a exploração infantil e juvenil.
Art. 13 – Ficam as concessionárias autorizadas a criar mecanismos de denúncia e acolhimento das mulheres, jovens e crianças vítimas das condutas tipificadas no art. 1º desta Lei.
Parágrafo único – Em caso de descumprimento das disposições desta Lei, as concessionárias dos serviços públicos de transporte, estarão sujeitas a multas diárias estabelecidas pelo Órgão Regulador, concomitante a abertura de processo para cassação da concessão.
Art. 14 – O Poder Executivo veiculará em sua propaganda institucional na internet, televisão, rádio, jornais, revistas e outros meios de divulgação, campanhas educativas sobre a política de que trata esta lei.
Art. 15 – Cabe ao Poder Executivo regulamentar a presente lei.
Art. 16 – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 19 de março de 2021.
Leninha, vice-líder do Bloco Democracia e Luta (PT) – Ana Paula Siqueira, presidenta da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher (Rede) – Andréia de Jesus, presidenta da Comissão de Direitos Humanos (Psol) – Beatriz Cerqueira, presidenta da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia (PT).
Justificação: O presente Projeto de Lei visa garantir mais segurança às mulheres.
Todos os dias as mulheres são vítimas de violência em seu cotidiano, nos transportes públicos não é diferente. A desigualdade estrutural a que estão submetidas as mulheres reforça a banalização de condutas que violam e limitam o exercício dos direitos das mulheres. O direito de ir e vir é um dos grandes afetados no dia a dia das mulheres, principalmente nos transportes públicos de Minas Gerais.
O cotidiano de assédio e abusos que estão submetidas as mulheres nesses espaços é de responsabilidade do Município, como agente garantidor dos direitos fundamentais dessa população. A partir dessa responsabilidade coletiva que este Projeto de lei visa discutir a violência contra as mulheres nestes espaços públicos, como ônibus, metrôs, trens, e os demais meios de transporte do estado.
O fiu-fiu, cantadas e “passadas de mão” são uma parte de um complexo sistema de violações que o Estado tem o papel de enfrentar. Desse modo, a afixação de placas e veiculação de campanhas educativas e de conscientização da sociedade são meios para que a discussão seja abraçada pela nossa sociedade e que a cidade se torne um espaço cada vez mais seguro para as mulheres.
A pesquisa realizada no ano de 2016 pela ONG Action Aid, demonstra a necessidade do debate da segurança das mulheres nos espaços públicos, ela mostra que 86% das mulheres brasileiras ouvidas há sofreram assédio em público em suas cidades. Os dados foram divulgados no lançamento do Dia Internacional de Cidades Seguras para as Mulheres, uma iniciativa da organização para chamar a atenção para os problemas de assédio e violência enfrentados pelas mulheres nas cidades de todo o mundo.
Em levantamento realizado pelo Datafolha, em 2015, 35% das mulheres afirmaram ter sofrido assédio no transporte público, sendo o local com maior percentual. O problema ainda é atual e o debate se faz necessário nesta Casa de Leis.
De acordo com a Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG – somente atrás de São Paulo, Minas Gerais é o segundo estado no número de denúncias de violência sexual contra crianças e adolescentes no país.
Outro alarme que ressoa cotidianamente é quanto ao número dessas ações violentas: a cada hora e vinte minutos uma criança ou adolescente tornou-se vítima de estupro de vulnerável, importunação, assédio e outros gêneros de violência sexual no Estado de Minas Gerais em 2020.
O assédio é tão comumente executado, que cerca de 5.835 menores de idade sofreram algum tipo de violação sexual apenas entre os meses de janeiro e outubro de 2020, com destaque para uma média de 19 crianças ou adolescentes violentados a cada dia, isto apenas em Minas Gerais.
Em nosso estado os números são aterrorizantes, em janeiro a setembro de 2019, foram registrados mais de 108 mil casos de violência doméstica e familiar contra a mulher em Minas Gerais. Em BH, a taxa de feminicídio subiu 200% no primeiro semestre do ano, em comparação a 2018, de acordo com registros da Polícia Civil do Estado.
Dados da Polícia Civil de Minas Gerais, dão conta que mais de 100 mil mulheres sofreram violência no Estado de Minas Gerais nos últimos meses.
No Brasil, segundo o Atlas da Violência 2020, realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), uma mulher é assassinada a cada duas horas. Em 2018 foram 4.519 vítimas, sendo que 68% delas eram negras. Entre 2008 e 2018, os homicídios de mulheres negras aumentaram 12,4%, sendo que o de não negras reduziram 11,7%.
O atlas da violência traz ainda outro indicativo: o local onde ocorre a agressão. Conforme pesquisa do Mapa da violência, a maior parte dos homicídios acontece nas ruas, o que justifica por si só o investimento em políticas de segurança para as mulheres, e outra parte menor nas residências, o que também demonstra a necessidade de campanhas constantes e divulgação dos canais de denúncias.
De fato os números relevantes da violência cometida contra grupos oprimidos só revela às ocorrências realizadas junto à Polícia Civil de Minas Gerais Importando assim dizer, que um mundo de subnotificações, justificadas por medos, incertezas, falta de informação e de políticas de acolhimento paira em nosso Estado.
Não resta dúvidas que o assédio e a violência contra as pessoas é um problema social e de saúde pública que atinge todas as etnias, religiões, escolaridade e classes sociais. Por ser uma violação de direitos humanos e liberdades fundamentais, é que o tratamento eficaz só é possível através de um conjunto normativo eficiente e uma política de estado que enfrente a violência sexual.
Por essas razões, contamos com o apoio dos(as) nobres pares para o aperfeiçoamento e a aprovação de nosso projeto de lei.
– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pela deputada Delegada Sheila. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 1.232/2019, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.