PL PROJETO DE LEI 2477/2021
Projeto de Lei nº 2.477/2021
Dispõe sobre a cadeia produtiva das abelhas nativas sem ferrão e dos produtos e serviços oriundos da prática da meliponicultura no território do Estado de Minas Gerais.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – A guarda, a criação, o manejo, o uso, o transporte, o resgate e o comércio de colônias de abelhas nativas sem ferrão, bem como dos produtos e serviços oriundos da prática da meliponicultura, no âmbito estadual, obedecerão ao disposto nesta Lei.
§ 1º – Ficam asseguradas as atividades de criação, produção, comercialização, capacitação e educação ambiental, que envolvam colônias de abelhas nativas sem ferrão tanto na zona urbana, como na zona rural de cada município.
§ 2º – Por sua relevância ambiental e importância socioeconômica e cultural, a meliponicultura passa a ser considerada atividade de utilidade pública e patrimônio imaterial do Estado de Minas Gerais.
Art. 2º – Para os fins desta Lei, entende-se por:
I – Abelhas nativas sem ferrão – ANSF: insetos sociais da Ordem Hymenoptera, Família Apidae, Tribo Meliponini, compreendendo centenas de espécies, que possuem hábito social e possuem ferrão atrofiado, sendo polinizadores por excelência de espécies vegetais nativas e cultivadas, conhecidas popularmente por abelhas sem ferrão, abelhas da terra, abelhas indígenas, abelhas nativas ou abelhas brasileiras;
II – Abelhas nativas sem ferrão silvestres: espécimes da Tribo Meliponini, que tenham seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro em ambientes naturais ou antropizados, sem estar, contudo, sob cuidados humanos;
III – Abelhas nativas sem ferrão de perfil zootécnico: espécies de abelhas nativas sem ferrão que apresentam características biológicas, que permitem sua exploração zootécnica para a produção comercial de produtos e prestação de serviços de polinização;
IV – Abelhas nativas sem ferrão introduzidas: espécies de abelhas nativas sem ferrão que sem registro de ocorrência natural nos limites geográficos do Estado de Minas Gerais e que foram nele introduzidas por ação antrópica;
V – Abelhas nativas não eusociais: insetos conhecidas popularmente por abelhas Solitárias, da Ordem Hymenoptera, Família Apoidea, compreendendo centenas de espécies, podem ser subdivididas em Tipos de abelhas quanto à classificação social:
a) subsocial;
b) eusociais primitivas;
c) semissociais ou comunais;
VI – quasissocial;
a) eparassocial (agregações).
VII – Abelhas nativas sem ferrão domesticadas – espécies de abelhas nativas sem ferrão, de ocorrência natural ou introduzidas, manejadas tecnicamente para permitir divisão racional de colônias preexistentes, mantidas em meliponários, sob cuidado contínuo de meliponicultor cadastrado na forma desta Lei;
VIII – Espécime de ANSF: indivíduo vivo de uma espécie de abelha nativa sem ferrão, em qualquer fase de seu desenvolvimento;
IX – Ninho de ANSF: Estrutura ou abrigo que as abelhas nativas sem ferrão - ANSF constroem para si e para os seus ovos e crias, podendo ser construído em diferentes locais, característico de cada espécie;
X – Colmeia: estrutura física que abriga a colônia de abelhas nativas sem ferrão;
XI – Colônia: ninho formado pelo conjunto de abelhas, de ambos os sexos e castas com a presença de uma ou mais rainhas, que convivem entre si;
XII – Produtos das Abelhas nativas sem ferrão: mel, pólen (samborá/samora), própolis, geoprópolis, discos de cria, princesas (rainhas não fecundadas), cera, cerume e quaisquer partes da colônia;
XIII – Discos de cria: parte estrutural de uma colônia onde estão contidas as crias das abelhas em seus diferentes estágios de desenvolvimento, dispostas em favos horizontais ou cachos de cria;
XIV – Manejo: conjunto de técnicas de manipulação das colônias das abelhas nativas sem ferrão, que permitam sua criação racional, o desenvolvimento e multiplicação de colônias, a produção de seus produtos e seu uso na prestação de serviços de polinização;
XV – Multiplicação – manejo de colônias que permite o aumento quantitativo de colônias por meio de divisões racionais, compartilhamento de discos de cria e administração de reforço alimentar energético, proteico e de materiais para construção das estruturas internas de reprodução e armazenamento de mel e pólen;
XVI – Mínima Perturbação da Colônia – orientação primordial do manejo das colônias de abelhas nativas sem ferrão, com o emprego de métodos, ferramentas e acessórios que minimizem a necessidade de abertura das caixas racionais e quaisquer outras intervenções capazes de causar estresse às abelhas;
XVII – Meliponário: local destinado à criação técnica de abelhas nativas sem ferrão, onde as colônias estão instaladas, alojadas em colmeias especialmente preparadas para o manejo e manutenção dessas espécies;
XVIII – Meliponicultor: produtor de abelhas nativas sem ferrão, que faz uso de técnicas de manejo racional para a manutenção, conservação e multiplicação de colônias de abelha nativas sem ferrão;
XIX – Meliponicultura: exercício da atividade de criação técnica de abelhas nativas sem ferrão – ANSF, domesticadas e mantidas sob manejo controlado;
XX – Meliponicultura migratória: prática de deslocamento temporário de colônias de ANSF para exploração de diferentes floradas;
XXI – Serviços de polinização: utilização de colônias de ANSF para a polinização dirigida de culturas agrícolas;
XXII – Recipiente-isca: recipiente colocado no ambiente para atrair e alojar, temporariamente, enxames de abelhas nativas sem ferrão oriundos da natureza ou de meliponários racionais;
XXIII – Resgate: ato de salvamento de colônias de abelhas nativas silvestres coletadas em casos de supressão vegetal de empreendimentos sujeitos ao licenciamento ambiental autorizada pelo órgão competente ou de colônias que estejam em situação de risco iminente, alojadas em cavidades naturais ou artificiais, no ambiente urbano ou rural;
XXIV – Nidificação: Comportamento de formação de ninhos.
Art. 3º – Para a criação técnica de colônias de ANSF deverá ser considerada preferencialmente a escolha por espécies de ocorrência natural nas áreas ou regiões onde a meliponicultura será desenvolvida.
§ 1º – A possibilidade da criação de espécies de ANSF fora de sua área de ocorrência natural é permitida, se possuir potencial zootécnico e adaptabilidade aos biomas do Estado.
§ 2º – Presume-se o potencial zootécnico:
I – quando a espécie já for criada em outros Estados da Federação, que não sejam historicamente os de sua ocorrência natural;
II – quando o Estado de Minas Gerais possuir biomas idênticos ou semelhantes àqueles de ocorrência da espécie de interesse zootécnico e esta for espécie domesticada pela prática de meliponicultura racional nos biomas afins ou idênticos, dos Estados de ocorrência original;
III – quando a espécie já tiver sido introduzida no Estado, na data de vigência desta Lei e estiver submetida a manejo racional com êxito.
Art. 4º – Os meliponários serão classificados como:
I – Meliponário científico, educativo e não comercial: aquele que tem por finalidade o desenvolvimento de ensino, pesquisa e educação ambiental ou a contribuição individual à preservação das ANSF, podendo ser de titularidade de entes públicos ou pessoas físicas e jurídicas privadas.
II – Meliponário comercial: empreendimento que tem por finalidade a criação, multiplicação e comercialização de colônias, espécimes, discos de crias e outros produtos e subprodutos das colônias, inclusive serviços ecossistêmicos como o uso de colônias em serviços de polinização de cultivos agrícolas ou recuperação ambiental.
Art. 5º – O meliponicultor titular de meliponário comercial deverá se registrar, como pessoa física ou jurídica, no Instituto Mineiro de Agropecuária – IMA, o qual providenciará o registro dos meliponicultores e de seus meliponários, a partir de cadastro único e simplificado, contendo as seguintes informações:
I – Identificação de pessoa: física (RG ou CPF) ou jurídica (CNPJ);
II – Localização do meliponário: endereço com coordenadas geográficas;
III – Descrição do meliponário: número de colônias por espécie;
IV – Finalidade da atividade: meliponário científico, educativo e não comercial ou comercial.
§ 1º – Após o registro no sistema será emitida autorização automática para a prática da meliponicultura, cabendo ao Estado a fiscalização das informações fornecidas e da prática da atividade:
I – O Cartão de Meliponicultor Mineiro terá sua forma definida em regulamento e consistirá em um cartão de identificação do meliponicultor, pessoal e intransferível.
II – A apresentação do Cartão de Meliponicultor Mineiro permite o exercício de todos os direitos referentes à operação e manejo do meliponário, bem como os demais direitos garantidos por esta Lei.
§ 2º – É dispensada a autorização ambiental para a prática da meliponicultura.
§ 3º – Para fins de acompanhamento do desenvolvimento da atividade produtiva, uma base de dados estadual sobre a prática da Meliponicultura será constituída pelo Instituto Mineiro de Agropecuária – IMA, com base nos dados fornecidos pelos meliponicultores e pelos pesquisadores das instituições de ensino, pesquisa e extensão do Estado, atualizada anualmente.
§ 4º – As colônias de ANSF introduzidas serão regularizadas no ato do preenchimento do cadastro do meliponicultor, sendo permitida sua criação zootécnica para fins de produção de produtos das ANSF e para prestação de serviços de polinização, não estando comprovado impacto ambiental às espécies de ocorrência geográfica natural.
§ 5º – O meliponicultor é considerado produtor rural, independentemente de a localização do meliponário ser em zona rural ou zona urbana.
§ 6º – Excetuam-se do disposto no parágrafo anterior os estabelecimentos de ensino, pesquisa e extensão, em relação ao seu corpo técnico, ainda que a instituição mantenha um ou mais meliponários no Estado.
Art. 6º – O cadastro dos titulares de meliponários científicos, educativos e não comerciais de ANSF será executado pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de Minas Gerais.
§ 1º – O Estado de Minas Gerais fomentará a pesquisa científica aplicada aos polinizadores naturais, com ênfase em seu manejo sustentável e integrado à agricultura e à recuperação ambiental.
§ 2º – No caso de financiamento público de pesquisas com ANSF, com recursos do Estado, terão prioridade os projetos de pesquisadores de instituições que, em contrapartida, ofertem cursos de capacitação aos servidores do Instituto Mineiro de Agropecuária – IMA.
Art. 7º – A formação dos plantéis dos meliponários será realizado mediante:
I – utilização de recipiente-isca;
II – aquisição, permuta ou a doação de colônias;
III – multiplicação de colônias matrizes;
IV – resgate de colônias;
V – depósito pelo órgão ambiental competente.
§ 1º – É dispensada a solicitação de autorização para a instalação de recipientes-isca, ressalvadas:
I – em caso de propriedades privadas, a autorização expressa do proprietário.
II – em caso de áreas de preservação ambiental, sob a tutela do Estado de Minas Gerais, a autorização do seu órgão gestor.
§ 2º – Os recipientes-isca com colônias alojadas, devem ser utilizados apenas para:
I – a formação do plantel;
II – a preservação da variabilidade genética do plantel, como recurso de prevenção contra a endogamia.
§ 3º – Dados referentes à quantidade de colônias obtidas pelo emprego de recipientes-isca, suas espécies e localização com coordenadas geográficas devem ser inseridos no cadastro do meliponicultor.
§ 4º – Empreendimentos sujeitos ao licenciamento ambiental com supressão vegetal ou a formação de lagos artificiais, devem obrigatoriamente promover a identificação e o resgate das colônias de abelhas nativas sem ferrão e de quaisquer polinizadores, com a participação de técnicos habilitados ou meliponicultores cadastrados no órgão competente do Estado.
§ 5º – Quando colônias de ANSF estiverem sob risco iminente de conservação, tanto na zona rural como na urbana, fica facultado o resgate emergencial aos meliponicultores cadastrados, devendo estes registrar a informação em seu cadastro.
§ 6º – São deveres do meliponicultor:
I – resgatar colônias de ANSF em caso de constatação de queimadas, quando sua colaboração for solicitada pelo Corpo de Bombeiros do Estado de Minas Gerais;
II – promover a máxima variabilidade genética mantendo, sempre que possível, 44 (quarenta e quatro) colônias por espécie no meliponário, dispensando-se o meliponicultor desse dever se a espécie tiver ocorrência natural no local do meliponário;
III – fornecer alimentação de reforço para as colônias nos períodos de estiagem, de pluviosidade excessiva ou quaisquer épocas em que falte pasto meliponícola no entorno do meliponário;
IV – plantar pasto meliponícola, preferencialmente com espécies nativas do Estado de Minas Gerais e, em sua propriedade, preservar a vegetação natural e adotar boas práticas de agricultura orgânica;
V – participar, no mínimo uma vez por ano, de eventos de capacitação técnica.
§ 7º – São práticas vedadas:
I – a coleta, o transporte, a doação, a cessão, o empréstimo ou a permuta de ninhos naturais de abelhas nativas sem ferrão – ANSF, ressalvadas as hipóteses de resgate, nos termos desta Lei;
II – a derrubada de árvores, a incineração, o carvoejamento e as queimadas sem prévio resgate dos polinizadores naturais existentes na árvore, no abrigo ou na formação vegetal a ser afetada pela ação humana, independentemente de haver ou não licença ambiental;
III – a contratação de polinização artificial para cultivos que empreguem pesticidas sistêmicos, tais como piretroides e neonicotinoides.
Art. 8º – No manejo racional de espécies de abelhas nativas sem ferrão – ANSF o meliponicultor:
I – adquirirá insumos preferencialmente de fornecedores do Estado de Minas Gerais, tais como pólen apícola, bombons de pólen, cera pura de Apis mellifera, caixas racionais;
II – dará preferência:
a) à madeira oriunda de reflorestamentos sustentáveis do Estado de Minas Gerais para a construção de caixas racionais e as obras do meliponário;
b) aos insumos orgânicos e não-transgênicos, em qualquer circunstância;
c) às práticas que impliquem a Mínima Perturbação da Colônia, tais como o uso de alimentador externo, a divisão racional por módulos, a padronização de modelos de caixas racionais.
Art. 9º – Em projetos de restauração florestal, paisagismo urbano e de uso sustentável das espécies da flora nativa, será estimulado, pelos órgãos competentes, a utilização de espécies da flora nativa fornecedoras de recursos para as abelhas, tanto alimentares, como de proteção e nidificação.
§ 1º – São vedados o plantio e a manutenção de espécies da flora exótica em área urbana ou rural, que sejam tóxicas e que representem risco para as abelhas.
§ 2º – Nos projetos de paisagismo implantados em áreas do Estado de Minas Gerais, assim como na execução específica de plantio de mudas para reparação ambiental, dar-se-á preferência a espécies que constituam pasto meliponícola.
§ 3º – Cabe ao Instituto Mineiro de Agropecuária – IMA definir quais espécies vegetais serão enquadradas como fontes tóxicas para as abelhas e publicar listagem em até 180 (cento e oitenta) dias a contar da data de publicação dessa Lei.
§ 4º – Os espécimes já plantados deverão ser progressivamente substituídos por espécies da flora nativa que sejam benéficas às abelhas.
Art. 10 – Pela característica da meliponicultura como atividade prestadora de serviços ecossistêmicos, os meliponicultores poderão ser beneficiados com programas de pagamento por serviços ambientais-PSA, observada a legislação específica.
Art. 11 – A atividade de prestação de serviços de polinização deverá ser executada por meliponicultor devidamente registrado no Instituto Mineiro de Agropecuária – IMA, sendo vedadas a contratação e a entrada de polinizadores para polinização de cultivos no Estado de Minas Gerais, sem prévia comprovação de regularidade sanitária dos enxames perante o próprio IMA.
§ 1º – A meliponicultura migratória, que implique a entrada de colônias de abelhas nativas sem ferrão no território do Estado, para pura pastagem, é vedada nos termos desta Lei.
§ 2º – A entrada de colônias de abelhas da espécie Apis mellifera e suas respectivas subespécies, oriundas de outras unidades da Federação, para polinização de lavouras no Estado, somente poderá ocorrer se não houver prestador de serviços de polinização registrado como meliponicultor ou apicultor no Instituto Mineiro de Agropecuária – IMA capaz de suprir a demanda local.
Art. 12 – É permitido o transporte intermunicipal de colônias de ANSF ou partes delas.
§ 1º – É obrigatória a emissão da Guia de Trânsito Animal (GTA), acompanhada da Nota Fiscal Avulsa Eletrônica nas operações a título de venda.
§ 2º – É dispensada a emissão da Guia de Trânsito Animal (GTA):
I – na permuta entre meliponicultores, sem propósito comercial.
II – nas doações entre meliponicultores e para entidades públicas integrantes da Administração Direta, Indireta e Fundacional do Estado de Minas Gerais;
III – em atividades formais de capacitação, educação ambiental e exposição;
IV – na prestação de serviços de polinização ou na meliponicultura migratória;
V – em qualquer situação, quando o transportador for o próprio meliponicultor, devidamente registrado no Instituto Mineiro de Agropecuária – IMA e o número de colônias transportadas for igual ou inferior a 20 (vinte) colônias.
§ 3º – As empresas de transporte e de logística poderão realizar o transporte das colônias destinadas à prestação de serviços de polinização e à meliponicultura migratória.
Art. 13 – As espécies de abelhas sem ferrão introduzidas de outros Estados serão regularizadas pela simples declaração do meliponicultor, no ato de cadastro perante o Instituto Mineiro de Agropecuária – IMA, de que trata o caput do art. 4º desta Lei.
§ 1º – Os produtos de multiplicações racionais de enxames de abelhas nativas sem ferrão introduzidas e regularizadas poderão ser objeto de comercialização e transporte, obedecidos aos critérios sanitários e de ordem tributária.
Art. 14 – A evolução do número de colônias no plantel do meliponicultor, por quaisquer métodos de manejo racional de uma colônia matriz, tais como a divisão simples, a formação de minicolônias e a produção artificial de rainhas, é considerada como índice de sucesso, prática recomendável e ferramenta de preservação.
Art. 15 – O Instituto Mineiro de Agropecuária – IMA publicará, anualmente, a lista das espécies com maior potencialidade zootécnica, mesmo que sejam de espécies de ANSF introduzidas, como guia de orientação para os meliponicultores do Estado.
Art. 16 – Esta lei entra em vigor na data da sua publicação.
Sala das Reuniões, 12 de fevereiro de 2021.
Antonio Carlos Arantes, 1º-vice-presidente (PSDB).
Justificação: O Estado de Minas Gerais, por ter uma grande diversidade de biomas em seu território, com variação de umidade, precipitação pluviométrica, altitude, luminosidade e de formações vegetais, indo desde remanescentes da Mata Atlântica até a área de Caatinga, passando pelo Cerrado e por campos rupestres, possui grande número de polinizadores naturais. Desses polinizadores dependem a sobrevivência das formações vegetais do Estado, mas também o sucesso da agricultura mineira.
Considerando a base histórica do Estado de Minas Gerais, vê-se que a segurança alimentar, no aspecto de produção de carne, leite e derivados e ovos no Estado de Minas Gerais, esta baseada em espécies que, com rigor extremado, foram espécies invasoras em um determinado momento. Porém, Minas Gerais provou que é possível conciliar preservação ambiental e segurança alimentar, agricultura sustentável e capaz de produção de alto valor agregado com o respeito à flora e fauna.
Nesse panorama, Minas Gerais pode e deve amparar a domesticação de espécies nativas de polinizadores, já ocorrentes em território nacional, como uma atividade que tem raízes profundas na história indígena e de populações tradicionais do Estado.
Embora todos os polinizadores naturais do Brasil mereçam proteção legal, alguns dos polinizadores naturais brasileiros são historicamente manejados como produtores de mel, de ceras, de pólen e, mais recentemente, de própolis de altíssimo valor farmacológico. E esses mesmos polinizadores são indispensáveis tanto para a produção agrícola, com ênfase para a fruticultura e a cafeicultura, como para a sobrevivência das formações vegetais naturais do Estado: sem polinização não há sementes, sendo isto realidade para a maioria das espécies vegetais brasileiras.
Do ponto de vista de manejo, destaca-se que a meliponicultura é a criação racional de abelhas sem ferrão (Meliponíneos), que não apresentam riscos, nem no ambiente rural, nem no ambiente urbano. Não picam, por não possuírem ferrão funcional. Algumas espécies são grandes produtoras de mel, de alto valor no mercado interno, como a Uruçu (Melipona scutellaris), a Boca-de-renda (Melipona seminigra) e a Bugia (Melipona mondury), cujo litro de mel pode exceder o valor de R$ 300,00 (trezentos reais) o litro, o que pode representar renda adicional para o homem do campo, os Geraizeiros do Norte de Minas, para os povos indígenas do Estado.
É fato atestado pela comunidade científica mundial que a Europa, o Canadá e os Estados Unidos da América estão sofrendo seriamente com a perda de seus polinizadores: até que essas Nações recuperem as populações de seus polinizadores, haverá incremento da demanda de alimentos e isto é uma lição e uma oportunidade que o Brasil e especificamente Minas Gerais não deve perder.
A rigor todo Meliponicultor deveria ser remunerado pelo ente público, pois presta um serviço ambiental inestimável, protegendo e multiplicando colônias de polinizadores.
A falta de regulamentação específica dos aspectos relacionados à criação de abelhas nativas sem ferrão vem criando dificuldades para o registro de meliponários comerciais e não comerciais junto aos órgãos ambientais, ocasionando, assim, injustiças, discriminações e situações que desestimulam a Meliponicultura em si.
Propõe-se aqui, nesta Lei, o reconhecimento do papel inestimável do Instituto Mineiro de Agropecuária, o IMA, na promoção do Estado de Minas Gerais e na garantia de um futuro sustentável. Esta Lei busca ser o marco regulatório da Meliponicultura no Estado de Minas Gerais, como atividade zootécnica, de manejo sustentável de espécies de abelhas sem ferrão, com vistas tanto à salvaguarda da produção agrícola do Estado, à preservação das formações vegetais do Estado, à recuperação de biomas degradados e à melhoria da renda do homem do campo.
Propõe-se que o incentivo seja para a expansão da atividade e que ela, a Meliponicultura, seja um ponto de partida para iniciativas públicas e privadas de conscientização e cooperação público-privada. Busca-se também atrair a pesquisa científica orientada e a capacitação de multiplicadores de conhecimento na estrutura do próprio IMA.
O perfil médio do Meliponicultor é variável, mas não é necessariamente um erudito. O homem do campo não tem, como regra, formação acadêmica. No entanto, o analfabetismo funcional não o impede de contribuir para a sociedade, para o progresso e para a preservação. Por esta razão, impor ao homem do campo, ao quilombola, ao indígena e aos membros de coletividades tradicionais do Cerrado a obediência forçada a uma barafunda de normas complexas e, muitas vezes, sem propósito é uma forma equivocada de dizer a eles: "não sois cidadãos". Por isto a proposta é de um cadastro simples, que por um lado dê ao Estado de Minas Gerais a condição de mapeamento geral e de organização de informações, mas que por outro lado dignifique o Meliponicultor e o coloque na condição de um colaborador da coisa pública.
Do ponto de vista tributário, é importante lembrar que todo serviço público é sustentado por tributos e que todos, na medida de sua capacidade contributiva, devem contribuir para esse sustento. Existe grande potencial econômico na comercialização de produtos da Meliponicultura e nos serviços de polinização que podem ser prestados. Existe mercado mundial para o mel das abelhas sem ferrão, nobre e pouco conhecido. E, em breve, senão hoje, haverá interesse em utilização de polinizadores brasileiros, quando os polinizadores das Nações autodenominadas civilizadas tiveram colapsado totalmente.
Nesse panorama incerto, as abelhas nativas sem ferrão podem agregar muito a Minas Gerais, quer em termos de aumento da produtividade das safras de café e de frutas em geral, quer para um valor adicional no mercado de fair trade: os cultivos mineiros serão ainda mais valorizados pelo respeito aos polinizadores naturais.
Por fim, propõe-se a criação do Dia do Meliponicultor, a ser comemorado no dia 9 de setembro, data de nascimento do Professor Warwick Estevam Kerr, geneticista, engenheiro agrônomo e entomologista brasileiro, por sua inestimável contribuição à ciência, à meliponicultura brasileira e ao Estado de Minas Gerais, que foi um profundo estudioso da meliponicultura racional e um dos maiores nomes da entomologia brasileira de todos os tempos.
Pelo exposto, diante da importância dessa atividade agropecuária, solicito apoio aos nobres colegas, no sentido da aprovação desta proposição.
– Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça, Agropecuária e de Meio Ambiente para parecer, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, do Regimento Interno.