PL PROJETO DE LEI 1945/2020
Projeto de Lei nº 1.945/2020
Dispõe sobre a atenção à saúde ocupacional dos profissionais de enfermagem.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica autorizado o Poder Executivo a obrigar todos os estabelecimentos ou serviços públicos e privados de saúde, localizados no território do Estado de Minas Gerais, a dispensar, aos profissionais de enfermagem que lhes prestam serviços, as mesmas medidas protetivas aplicadas às demais categorias profissionais, as estabelecidas na legislação aplicável à espécie, em especial a Norma Regulamentadora 32 – NR 32, bem como as previstas na presente Lei e seu Anexo Único.
Parágrafo único – Caberá ao Gestor da unidade, em conjunto com o responsável Técnico da Enfermagem, tomar formalmente as providências necessárias à garantia da manutenção da saúde dos trabalhadores de enfermagem, em todos os seus aspectos, de maneira que o disposto no caput seja plenamente observado.
Art. 2º – As Comissões de Ética de Enfermagem, onde houver, ficam incumbidas de assessorar os gestores e gerentes em questões, envolvendo a saúde ocupacional do profissional de enfermagem.
Art. 3º – O gestor deverá designar profissional enfermeiro, com especialização em Saúde Ocupacional, como responsável pelo acompanhamento da saúde ocupacional dos demais profissionais de enfermagem da instituição, respeitadas as atribuições e as peculiaridades de cada instância.
Art. 4º – Nas atividades que envolvam riscos ocupacionais como os referidos no Anexo Único, os profissionais de enfermagem deverão, sempre, ter acesso à proteção coletiva e, em caráter complementar, a equipamentos de proteção individual.
Art. 5º – As medidas elencadas no Anexo Único desta Lei deverão ser tomadas sem prejuízo de outras normativas de âmbito federal, estadual ou municipal, que venham, efetivamente, proteger a saúde ocupacional dos profissionais de enfermagem.
Art. 6º – Os estabelecimentos ou serviços de saúde, públicos e privados, deverão providenciar a realização de exame médico periódico adequado para cada risco ocupacional específico, com o objetivo de prevenir ou diagnosticar precocemente agravos à saúde dos profissionais de enfermagem que labutem para os mesmos.
§ 1º – Tal obrigatoriedade não exclui a necessidade de consentimento para execução de tais exames, sendo que, em caso de recusa, o profissional de enfermagem deverá assinar um termo de responsabilidade que permanecerá arquivado na instituição.
§ 2º – Relativamente aos exames de monitorização biológica de que trata o item 3 do Anexo Único desta Lei, não há a necessidade de que sejam realizados em mais do que um dos vínculos de trabalho do profissional de enfermagem, desde que os riscos sejam os mesmos.
Art. 7º – Os estabelecimentos e serviços de saúde, por meio dos responsáveis definidos nos Artigos 1º, 2º e 3º, ficam obrigados a informar, aos profissionais de enfermagem, os riscos ocupacionais existentes nas suas atividades, os resultados dos exames médicos e complementares aos quais estes forem submetidos e os resultados das avaliações ambientais realizadas nos locais de trabalho.
Art. 8º – Ficam proibidos plantões superiores a 24 (vinte e quatro) horas ininterruptas.
Art. 9º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 12 de maio de 2020.
Fábio Avelar de Oliveira, Vice-Líder do Bloco Sou Minas Gerais (Avante).
Justificação: Referido Projeto de Lei dispõe sobre a atenção à saúde ocupacional dos profissionais de enfermagem, tratando-se assim tal matéria acerca do meio ambiente do trabalho, que está englobado no conceito de meio ambiente, conforme disposto no artigo 200, VIII, da Carta Magna. A matéria acerca do meio ambiente é de competência legislativa concorrente entre a União e os Estados (art.24, inciso VI, da Constituição Federal). Logo, não havendo lei federal sobre o tema, a lei estadual regulará a matéria no âmbito do Estado de Minas Gerais;
Visa propiciar ambiente específico, amplo, arejado, provido de mobiliário adequado e com área útil compatível com a quantidade de profissionais de enfermagem que lhe prestam serviços, dotado ainda de conforto térmico e acústico, adequado para o repouso dos referidos profissionais em suas pausas e intervalos intrajornadas, de acordo com a NR 32 – (Segurança e Saúde no Trabalho em Serviços de Saúde), especificamente seu item 32.10.16.
Coaduna com o que dispõe a Portaria nº 2048, de 5 de novembro de 2002 do Ministério da Saúde que estabelece a obrigatoriedade de salas de descanso e vestiários para funcionários, e não apenas para médicos, nos Sistemas Estaduais de Urgência e Emergência;
No mesmo diapasão a Resolução Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a RDC nº 50 de 2002 (Regulamento Técnico para Plajejamento, Programação, Elaboração e Avaliação de Projetos Físicos de Estabelecimentos Assistenciais de Saúde), determina a obrigatoriedade de manter um quarto de plantão para funcionários e alunos, com dimensão de 5,0 m² (item 8.6.3);
A enfermagem é reconhecida pelo Conselho Nacional de Saúde e está regulamentada pela Lei 7498/1986. É consabido que trata-se de um trabalho essencial à vida humana e que está presente na totalidade das instituições que prestam assistência de saúde, sendo que, na rede hospitalar, está presente 24 horas todos os 365 dias do ano.
A enfermagem é uma profissão que precisa de condições especiais para uma prática segura, garantindo a segurança do paciente e do profissional. O hospital é um ambiente em que a enfermagem fica exposta a riscos biológicos e químicos, sofre forte carga emocional e física, atua em horários atípicos, com longas jornadas de trabalho, insuficiência de funcionários, carência de materiais e equipamentos, muitas vezes com baixos salários, sem autonomia e motivação.
O estudo de Fischer (2002), que teve como objeto de estudo as percepções de sono e alerta em profissionais de enfermagem, destaca que sobre os níveis de alerta do trabalhador ocorreu queda significante com o passar das horas durante o turno de trabalho noturno; neste ínterim, destaca-se que 'no decorrer do turno diurno não foram observadas diferenças significantes e as médias dos alertas permaneceram praticamente estáveis durante as 12 horas de trabalho' (fls. 251).
O estudo de Calegaro (2006), realizado com os profissionais de enfermagem das unidades de internação de um hospital universitário apontou que 57% dos acidentes de trabalho com materiais perfurantes e/ou cortantes aconteceram no turno da noite, durante plantões noturnos de 12 horas (fls. 252).
Borges e Fischer (2008) concluem que, pausas para repouso /sono durante as 12 horas do turno da noite, resultam em menos sonolência no trabalho e menos necessidade de sono de recuperação após o trabalho (fls. 252).
Nos intervalos para alimentação e repouso, os profissionais de enfermagem devem dispor de local apropriado, e reservado, para efetivamente descansar, o que não é impossível em locais públicos como refeitórios ou áreas de convivência ou mesmo no chão e macas desocupadas como soi ocorrer.
Deve-se ressaltar que com toda certeza, todos os profissionais, especialmente os da área da saúde, devem estar sempre descansados suficientemente para que possam desempenhar melhor o seu ofício, e, no caso da área de saúde, para que possam atender aos pacientes de forma pronta, rápida e eficiente, já que, uma única falha por excesso de trabalho, por parte desses profissionais, ou por falta de descanso, por menor que possa parecer, pode significar a morte de alguém, para o que não há qualquer conserto ou reparação justa.
Em todo território brasileiro, a enfermagem representa cerca de 1,8 milhão de profissionais. No Estado de Minas Gerais são cerca de 179 mil inscritos. Os profissionais da enfermagem somam mais de 60% da força dos trabalhadores de saúde no País.
No entanto, apesar do grande contingente numérico e da influência decisiva de seu trabalho na qualidade das ações de saúde, a enfermagem não dispõe, até hoje, de nenhuma proteção legal do seu trabalho. É uma das únicas profissões ligadas à saúde que ainda não tem um piso salarial ou regulamentação de carga horária.
A maioria dos profissionais estão sobrecarregados, trabalham com excesso de responsabilidades e sobrecarga causando stress, além de ser uma das maiores causas de depressão crônica entre profissionais da categoria e do abandono da carreira.
Defender local para descanso e condições adequadas da saúde ocupacional de trabalho para a Enfermagem é defender mais qualidade de vida para o trabalhador da saúde e, conseqüentemente, mais qualidade no atendimento direto a população. Estamos falando de Segurança do Paciente!
É dever do poder Legislativo e Executivo prover os meios de garantia de políticas públicas voltadas para a valorização da vida e da saúde dos trabalhadores.
Os trabalhadores de Enfermagem totalizam cerca de 60% do conjunto das profissões de saúde (RAIS/MTE, 2006) e sua participação nas diferentes áreas e ações de Saúde "é motivo suficiente para a valorização desta categoria e não para um tratamento discriminatório";
Dentre os profissionais de saúde, os trabalhadores de enfermagem são os que mais adoecem e as principais doenças são as LER/DORT e os transtornos psíquicos. O que tem forte relação com as más condições de trabalho.
A fadiga e a perda de percepção decorrente do desgaste físico e psicológico pode expor o usuário da saúde a erros de procedimentos e, também, a acidentes de trabalho e doenças ocupacionais nos trabalhadores de enfermagem;
O trabalho da enfermagem exige a presença nos 365 dias do ano e nas 24 horas do dia. Uma responsabilidade intransferível, portanto é necessário contar com trabalhadores qualificados e em prefeitas condições de labor físico e mental.
A sociedade precisa e depende da Enfermagem para o enfrentamento dos inúmeros problemas vivenciados na área da saúde. A enfermagem é imprescindível para a consolidação do SUS.
A responsabilidade da Enfermagem na assistência em saúde, requer conhecimentos científicos, valorização, condições de trabalho adequadas e uma prática orientada por ideais de justiça e direito a vida.
Por tais motivos, solicita-se aos pares apoio na aprovação do presente projeto de lei.
ANEXO ÚNICO
Quando da aplicabilidade e/ou da fiscalização das medidas obrigatórias a serem adotadas pelos estabelecimentos e serviços de saúde na proteção da saúde ocupacional dos profissionais de enfermagem, deverão ser observados:
1 – Em relação aos riscos laborais potencialmente presentes nos ambientes de trabalho dos estabelecimentos de saúde, abaixo transcritos, devem ser providenciadas as medidas de proteção pertinentes, sem prejuízo de outras que se fizerem necessárias:
A – RISCOS BIOLÓGICOS:
Nas atividades de pronto atendimento, prontos socorros, traumatologia, moléstias infectocontagiosas, cirurgia, análises clínicas, anatomia patológica, serviços de verificação de óbito e outros serviços com riscos de exposição a fluidos orgânicos potencialmente contaminados:
A.1 – MEDIDAS DE PROTEÇÃO:
A.1.1 – Os profissionais de enfermagem deverão ter acesso a dispositivos de proteção adequados, tais como: óculos de proteção, aventais impermeáveis, luvas, toucas e máscaras;
A.1.2 – imunização contra agentes biológicos, tais como: hepatite B, Gripe (Influenza) e demais doenças evitáveis por vacinação;
A.1.3 – em casos de acidentes do tipo perfurocortante com material potencialmente contaminado, hão de ser adotadas medidas de quimioprofilaxia de acordo com as recomendações do Ministério da Saúde, devendo seus fluxogramas de procedimentos ser devidamente registrados.
B – RISCOS FÍSICOS:
Nas atividades em que existe a presença de ruídos acima do limite de tolerância, radiações ionizantes (RX e radiação gama):
B.1 – MEDIDAS DE PROTEÇÃO:
B.1.1 – No caso de presença de radiações ionizantes: proteção coletiva, tais como: paredes e anteparos protetores plumbíferos. Como proteção individual: luvas, aventais, óculos e protetores de tireoide plumbíferos;
B.1.2 – fornecimento e controle adequado do dosímetro, em caso de exposição a radiações ionizantes;
B.1.3 – no caso de exposição a ruído acima do limite de tolerância biológico (LTB), fornecimento de protetores auriculares.
C – RISCOS QUÍMICOS:
Nas atividades em que existe a presença de gases anestésicos, vapores e poeiras tóxicos, tais como: centrais de esterilização, centro cirúrgico, preparo de quimioterapia, patologia clínica e medicina legal:
C.1 – MEDIDA DE PROTEÇÃO:
C 1.1 – Ventilação local exaustora, capelas com fluxo laminar e, na impossibilidade do controle eficaz dessa forma ou em caráter complementar, o uso de máscaras com filtros adequados.
D – RISCOS PSICOSSOCIAIS E AGENTES ERGONÔMICOS:
Nas atividades em que existam movimentos repetitivos e/ou posturas corporais inadequadas, grande demanda de atendimentos em condições penosas, altamente estressantes ou regimes de plantão de 12 e 24 horas:
D. 1 – MEDIDAS DE PROTEÇÃO:
D. 1.1 – Os profissionais de enfermagem deverão ter suas escalas diárias de trabalho elaboradas de forma que permitam pausas compensatórias em ambiente específico, amplo, arejado, provido de mobiliário adequado e com área útil compatível com a quantidade de profissionais diariamente em serviço, dotado ainda de conforto térmico e acústico adequado para repouso, alimentação, higiene pessoal e necessidades fisiológicas;
D. 1.2 – Os ambientes, tais como: centros cirúrgicos, prontos socorros e consultórios, deverão possuir um grau de iluminação, temperatura e acústica adequados às tarefas executadas.
D. 2 – MEDIDAS COMPLEMENTARES:
D. 2.1 – Serviços de pronto socorro geral e/ou psiquiátrico deverão contar com pessoal preparado e treinado para a adequada contenção de pacientes agitados e/ou agressivos;
D. 2.2 – Em locais de trabalho sabidamente violentos e que exponham a risco a integridade física dos profissionais de enfermagem no atendimento de pronto-socorro, deverá haver a manutenção de profissionais da área de segurança, pública ou privada.
2 – Estando a profissional de enfermagem em período de gestação, deverá ser garantida, à mesma, a não atuação em áreas de risco à saúde materno-fetal, e garantida a proteção efetiva nas atividades habituais.
3 – Relativamente ao que trata o artigo 6º da presente Lei, além da anamnese e exame físico, deverão ser realizados os seguintes exames complementares:
3.1 – hemograma completo, anual, para os profissionais de enfermagem que atuem em procedimentos cirúrgicos, radiodiagnósticos, radioterapêuticos e no preparo de quimioterapia;
3.2 – RX de tórax anual e PPD para aqueles expostos a BK;
3.3 – os profissionais de enfermagem do trabalho expostos aos ambientes de produção deverão ser submetidos aos exames complementares previstos no PCMSO da empresa onde atuem;
3.4 – para os profissionais de enfermagem expostos a agentes carcinogênicos e/ou teratogênicos, desde que existentes, exames de monitorização biológica específicos para os riscos envolvidos.
3.5 – DE FORMA COMPLEMENTAR:
3.5.1 – Que sejam disponibilizados, pelos estabelecimentos e serviços de saúde, exames complementares para detecção precoce de agravos à saúde, relacionados a gênero, idade e estilo de vida dos profissionais de enfermagem que lhe prestem serviço;
3.5.2 – Que sejam disponibilizados, pelos estabelecimentos e serviços de saúde, programas permanentes de prevenção e redução de riscos ocupacionais para os profissionais de enfermagem que lhe prestem serviço.
– Publicado, vai o projeto ao Colégio de Líderes para análise de caráter de urgência, nos termos do Acordo de Líderes acolhido pela Decisão da Mesa publicada no Diário do Legislativo do dia 21/3/2020.