PROJETO DE LEI Nº 306/2019

Cria o Monumento Natural da Serrinha, localizado na Serra da Moeda, no Município de Brumadinho.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:

Art. 1º – Fica criado o Monumento Natural da Serrinha, localizado na Serra da Moeda, no Município de Brumadinho, Unidade de Conservação de Proteção Integral, nos termos do art. 225, § 1º, III, da Constituição da República, conforme coordenadas da poligonal constante no Anexo I desta lei.

Art. 2º – O Monumento Natural da Serrinha deverá ser gerenciado pelo órgão estadual ambiental, nos termos da legislação aplicável, e sua instituição será precedida de estudos técnicos e de consulta pública que permitam identificar a localização, a dimensão e os limites mais adequados para a unidade, observando-se as delimitações gerais estabelecidas no Anexo I desta lei.

Parágrafo único – Enquanto perdurarem os estudos técnicos e a consulta pública não será permitida a utilização direta dos recursos naturais da Serrinha, na Serra da Moeda, em Brumadinho.

Art. 3º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Sala das Reuniões, 1º de fevereiro de 2019

Beatriz Cerqueira

Deputada Estadual (PT)

Justificação: Considerando o art. 225, § 1º, III, da Constituição da República de 1988, cumulado com os arts. 8º, IV, e 12 da Lei nº 9.985, de 2000, que estabelecem que a preservação da biodiversidade em seu habitat natural é fundamental para o meio ambiente ecologicamente equilibrado; a grande beleza cênica da Serrinha, localizada na Serra da Moeda, Município de Brumadinho, e a diversidade de nascentes, espécies da flora endêmicas e da fauna ameaçadas de extinção; a riqueza histórica, cultural, arqueológica e a biodiversidade na região; que a região da Serrinha é um dos principais espaços para lazer, entretenimento e turismo dos habitantes da capital mineira, região onde está instalada uma série de condomínios horizontais, fatores que impulsionam o crescimento da economia de maneira ecológica e responsável; e considerando que a economia da região depende da efetiva preservação da Serrinha, apresentamos para apreciação desta Casa esta proposição.

A Serra da Moeda, capilaridade da Serra do Espinhaço (Reserva da Biosfera), possui uma extensão que abrange oito municípios mineiros, a saber: Brumadinho, Moeda, Belo Vale, Jeceaba, Congonhas, Itabirito, Rio Acima e Nova Lima. À sua margem leste se encontram em sequência os Municípios de Nova Lima, Itabirito e Ouro Preto. Já a oeste estão os Municípios de Brumadinho, Moeda e Belo Vale, onde alcança seu ponto mais elevado. As variações altitudinais estão entre 700 e 2.000 metros acima do nível do mar, e está situada na região das nascentes dos Rios das Velhas (a leste) e Paraopeba (a oeste), ambos afluentes do Rio São Francisco.

Ocupa uma região estratégica em relação aos recursos hídricos da Região Metropolitana de Belo Horizonte. As nascentes de água oriundas da Serra da Moeda, apenas no Município de Brumadinho são responsáveis por 1/4 do abastecimento de água de Belo Horizonte. Sua excelente qualidade físico-química a torna favorável ao consumo humano e diminui os gastos com seu tratamento.

Segundo o Mapa de Biomas do Brasil, encontra-se inserida nos limites do bioma da mata atlântica com o bioma do cerrado, chamadas zonas de transição, abrigando uma grande parcela da fauna e flora vulnerável e ameaçada do Brasil, segundo a lista de animais ameaçados do Ibama.

É uma região geologicamente importante do pré-cambriano brasileiro, que ocupa aproximadamente 7 mil quilômetros quadrados, muito cobiçados pelos seus minerais, principalmente ferro, ouro e manganês. As áreas de canga (afloramentos de minério de ferro), que ocupam grande parte da Serra da Moeda, são microambientes raros que abrigam uma grande diversidade de espécies da fauna e flora endêmicas da região. Portanto, sem esse ecossistema característico, elas serão extintas.

As condições favoráveis para ocupação humana favoreceram a tribo dos Cataguases no Vale do Paraopeba e no entorno da Serra da Moeda, dos quais ainda são encontrados vários e importantes sítios arqueológicos distribuídos pelos diversos povoados da região.

Com a chegada dos portugueses em busca de ouro e pedras preciosas, foi empreendida a construção de estradas para o escoamento da produção mineral e viabilizar o acesso fácil para as vilas de Brumado (Brumadinho), Curral del-Rei (Belo Horizonte) e Ouro Preto, entre outras. Tais evidências ainda são facilmente encontradas no entorno da Serra. Para realizar o trabalho manual foram importados negros escravos, tornando a Fazenda dos Martins (Fazenda dos Escravos) o maior polo brasileiro para a distribuição de negros a serem levados para o sertão das Gerais e as Regiões Norte e Centro-Oeste.

Os negros foragidos se escondiam em alguns quilombos na região, onde boa parte da sua cultura foi preservada até os dias atuais, passada de geração em geração graças à determinação de seus ancestrais. Importante recordar que a região possui quatro comunidades quilombolas que foram reconhecidas pela Fundação Palmares. São elas: Sapé, Ribeirão, Marinhos e Rodrigues, localizadas em Brumadinho, na área de influência do trecho conhecido por Serrinha, na Serra da Moeda.

Existem encravadas na Serra várias cavernas de formação natural com importância bioespeleológica. Há também cavidades com valor arqueológico, onde mineiros do século XVI procuraram ouro e outros minerais valiosos.

O nome Serra da Moeda - antes Serra do Paraopeba - originou-se da criação de um forte para a cunhagem ilegal de moedas, por volta de 1720. Naquela época os mineiros tinham que pagar o quinto sobre o ouro retirado das minas. Foi, então, instalada uma casa clandestina de fundição de moedas, também chamada de Fábrica de Moedas Falsas, que faria o mesmo papel das casas oficiais, contudo a custo menor.

Assim, a Serra do Paraopeba passou a ser designada de Serra da Moeda em razão desse episódio. As ruínas da casa clandestina estão situadas em São Caetano de Moeda, Distrito de Moeda Velha, ao pé da Serrinha, e são visitadas periodicamente por inúmeros turistas ávidos em conhecer um pouco da história singular da Serra e de Minas.

Também na região da Serrinha está localizado o Distrito de Piedade do Paraopeba, em Brumadinho, que possui importantes exemplares do patrimônio histórico, como a Igreja Matriz de Nossa Senhora do Paraopeba, tombada por decreto municipal, e a Igreja de Nossa Senhora do Rosário, que somente abre nos dias da festa de Nossa Senhora do Rosário e na Semana Santa. Dela sai a procissão.

Existem indícios de que Piedade do Paraopeba é mais antiga que Ouro Preto, Mariana e Sabará e que foi o terceiro povoado a ser fundado pela expedição de Fernão Dias Paes. Tornou-se um local rico em destilarias, destacando-se a Destilaria Pedra do Cedro, fabricante das cachaças Segredo do Patriarca e Domina Suave, a primeira cachaça feminina do Brasil.

A Serra da Moeda foi também palco da Inconfidência Mineira, quando a Fazenda Bom Jardim (matriz da Fazenda dos Martins), que pertencia a um dos inconfidentes, foi destruída após sua prisão, pelas tropas imperiais e, em seguida, foi derramado sal grosso em seu solo, já que haviam alegado a existência de peste no local para justificar o ataque.

A região do Monumento Natural da Serrinha, trecho da Serra da Moeda, localizada a 30km de Belo Horizonte, no sentido Rio de Janeiro, é uma das principais atrações turísticas de Minas, proporcionando lazer e entretenimento aos habitantes da capital mineira. A sua exuberância salta aos olhos. Além da beleza natural e da biodiversidade, a região permite contato direto com a história dos mineiros, principalmente através das especificidades da cultura local. Na Serrinha também pode ser realizado o sonho de voar, pois ela tem uma das melhores rampas de voo livre do Brasil, conhecida como Topo do Mundo.

Os empregos e a renda gerados na região têm origem principalmente em razão dos diversos condomínios horizontais, pela agricultura familiar ou pelo turismo, através dos hotéis, pousadas, restaurantes, do Museu Inhotim, etc., que serão fomentados pela instalação do monumento natural.

Eventual instalação de mina de minério de ferro na região impactará diretamente a dinâmica econômica da área. A título de exemplo, eventual mina na Serrinha gerará 300 postos de trabalho, enquanto um único condomínio horizontal da região proporciona quase 3.000 empregos diretos.

A relevância ambiental da área foi reconhecida pelos legisladores estaduais ao incluírem o Município de Brumadinho como área de proteção ambiental - APA -, pela Lei nº 13.960, de 2001.

Além disso, a Constituição da República, no art. 225, § 1º, III, determina que o poder público assegure a efetividade do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado através da definição, em todas as unidades da Federação, de espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, vedando qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justificaram sua proteção.

Para a efetividade da norma constitucional devem ser criadas unidades de conservação de proteção integral, pois somente nesse tipo de unidade há a efetiva preservação da biodiversidade local, uma vez que permite apenas o uso indireto de seus recursos naturais, conforme a Lei nº 9.985, de 2000, conhecida como Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação – Snuc.

Conforme a referida lei, em seu art. 22, as unidades de conservação podem ser criadas por ato do poder público. A Constituição da República também possibilitou a proteção integral do meio ambiente ao estabelecer, em primeiro lugar, o dever imposto ao poder público de atuar na defesa do meio ambiente. Em segundo, qualificou juridicamente o meio ambiente ao caracterizá-lo como bem de uso comum do povo (art. 225, caput), o que permite dizer que se trata de bem que pertence a toda a coletividade e não integra o patrimônio disponível do Estado. E, em terceiro lugar, temos que o Texto Constitucional reconheceu como direito fundamental o meio ambiente ecologicamente equilibrado, sujeito à aplicabilidade imediata possibilitada pelo art. 5º, § 1º da Constituição.

Assim, a Constituição impôs ao poder público e à coletividade o dever de defender o meio ambiente e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. O alcance do conceito de “poder público” é amplo e engloba os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, conforme previsão constitucional (art. 1º, parágrafo único c/c o art. 2º). Vale transcrever lição dos professores:

“Por poder público devem-se entender todos os Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) nas três esferas da Federação (União, Estados e Municípios), os quais são constitucionalmente incumbidos de, harmonicamente e no âmbito das respectivas competências constitucionais, atuar para concretizar os valores ambientais preconizados pelo Texto Maior (FURLAN; FRACALOSSI, 2010, p. 158-159).”

Feitas essas considerações, não se pode conceber que as decisões do Executivo e do Legislativo sejam tomadas em desconformidade com as preocupações preservacionistas da sociedade e da Constituição.

A Constituição do Estado de Minas Gerais também estabelece:

“Art. 214 – Todos têm direito a meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, e ao Estado e à coletividade é imposto o dever de defendê-lo e conservá-lo para as gerações presentes e futuras.

§ 1º – Para assegurar a efetividade do direito a que se refere este artigo, incumbe ao Estado, entre outras atribuições:

(...)

V – proteger a fauna e a flora, a fim de assegurar a diversidade das espécies e dos ecossistemas e a preservação do patrimônio genético, vedadas, na forma da lei, as práticas que provoquem a extinção das espécies ou submetam os animais a crueldade;

VI – definir mecanismos de proteção à fauna e à flora nativas e estabelecer, com base em monitoramento contínuo, a lista de espécies ameaçadas de extinção e que mereçam proteção especial;

VIII – criar parques, reservas, estações ecológicas e outras unidades de conservação, mantê-los sob especial proteção e dotá-los da infraestrutura indispensável às suas finalidades;

XI – preservar os recursos bioterapêuticos regionais.

(...)

§ 7º – Os remanescentes da mata atlântica, as veredas, os campos rupestres, as cavernas, as paisagens notáveis e outras unidades de relevante interesse ecológico constituem patrimônio ambiental do Estado e sua utilização se fará, na forma da lei, em condições que assegurem sua conservação.”

A legislação municipal de Brumadinho também contempla necessidade de preservação quando, por meio de sua Lei Orgânica, estabelece:

“Art. 15 – É competência do Município, comum à União e ao Estado:

(...)

III – fomentar as atividades econômicas e estimular, particularmente, o melhor aproveitamento da terra.

IV – impedir a evasão, destruição e a descaracterização das obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico e cultural.

V – proporcionar meios de acesso à cultura, educação e à ciência.

VI – proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer uma de suas formas.

VII – preservar as florestas, a fauna e flora.

XI – registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seu território.

(...)

Art. 153 – Todo cidadão é um agente cultural e o poder público incentivará, por meio de política de ação cultural democraticamente elaborada, as diferentes manifestações culturais no Município.

Parágrafo único – O Município protegerá as manifestações das culturas populares e dos grupos étnicos participantes do processo civilizatório nacional e promoverá, em todos os níveis das escolas municipais, a educação sobre a história local e a dos povos indígenas e de origem africana.

Art. 154 – Constituem patrimônio cultural do Município os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, que contenham referência à identidade, à ação e à memória dos diferentes grupos formadores do povo brumadinhense, entre os quais se incluem:

I – as formas de expressão;

II – os modos de criar, fazer e viver;

III – as criações tecnológicas, cientificas e artísticas;

IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados a manifestações artísticas e culturais;

V – os sítios de valor histórico, paisagístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

(...)

Art. 157 – Todos os componentes dos ecossistemas devem ser preservados, mantidas as plenas condições de seus processos vitais, de forma a assegurar o meio ambiente harmônico necessário à saudável qualidade de vida, direito essencial e bem de uso comum dos cidadãos, impondo-se ao poder público e à coletividade sua defesa e manutenção.

§ 1º – Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público municipal, entre outras atribuições:

(...)

IV – preservar as florestas, a fauna e a flora, inclusive controlando a extração, captura, produção, comercialização, transporte e consumo de seus espécimes e subprodutos, vedadas as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade;

V – criar parques, reservas, estações ecológicas, e outras unidades de conservação, mantê-los sob especial proteção e dotá-los da infraestrutura indispensável às suas finalidades;

(...)

Art. 160 – Cabe ao poder público:

(...)

XIV – considerar como áreas a serem especialmente protegidas, observada a competência do Estado:

a) as nascentes e as faixas marginais das águas superficiais;

b) as áreas que abriguem exemplares raros, ameaçados de extinção ou insuficientemente conhecidos da flora e da fauna, bem como aqueles que sirvam de pouso, abrigo ou reprodução das espécies;

c) parques e praças do Município;

d) as áreas de mananciais.

Parágrafo único – Outras áreas de preservação permanentes e fonte alternativa de alimentos integrantes do Vale do Paraopeba deverão ser definidas pelo Município em lei complementar.”.

Não é demais lembrar ainda a Lei nº 993, de 1998, do Município de Brumadinho, que cria a unidade de conservação ambiental e ecológica na Serra da Moeda, vertente de Brumadinho:

“Art. 1º – Fica declarada Unidade de Conservação Ambiental e Ecológica a área na Serra da Moeda, vertente de Brumadinho, para proteção de duas nascentes do Córrego do Pau Branco, três do Córrego Carrapato (Serrinha), seis do Córrego Grota Grande (Mãe d’água), quatro do Córrego dos Maia (Palhano), duas do Córrego da Macaca (Campinho), três do Córrego do Campinho (Beira Serra) e três do Córrego de Samambaia (Nascente da Chácara).”

Por todo o exposto, justifica-se a instituição do Monumento Natural da Serrinha, nos termos do art. 8º, IV e XII, do Snuc, e demais normas citadas.

– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pela deputada Ana Paula Siqueira. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 121/2019, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.