PL PROJETO DE LEI 1905/2015
PROJETO DE LEI Nº 1.905/2015
Institui a Política Estadual sobre Pessoas Desaparecidas no Estado e dá outras providências.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica instituída a Política Estadual Sobre Pessoas Desaparecidas, que tem por finalidade auxiliar na prevenção de desaparecimentos, na localização de pessoas desaparecidas, e no acolhimento e assistência a essas pessoas e a seus familiares.
Parágrafo único – Para os efeitos desta lei, é considerada pessoa desaparecida aquela que, por circunstância anormal, tenha seu paradeiro considerado desconhecido, encontrando-se em lugar incerto e não sabido.
Art. 2º – A Política Estadual sobre Pessoas Desaparecidas tem como diretrizes:
I – o estabelecimento de ações permanentes e articuladas entre entes públicos e privados voltados à prevenção e ao diagnóstico do desaparecimento, da localização da pessoa desaparecida e do acolhimento e assistência à pessoa desaparecida e a seus familiares;
II – a implantação de medidas que reduzam as situações de desaparecimento de pessoas;
III – o estímulo ao desenvolvimento e a qualificação de programas e ações de educação, inteligência, desenvolvimento científico e tecnológico na elucidação das circunstâncias do desaparecimento, na busca e localização da pessoa desaparecida;
IV – a promoção de meios de acesso rápido da população a informações sobre prevenção ao desaparecimento, bem como sobre os casos em andamento e os instrumentos pelos quais a sociedade pode auxiliar na localização.
Art. 3º – A Política Estadual sobre Pessoas Desaparecidas orienta-se pelos seguintes objetivos:
I – dotar os órgãos públicos de segurança de meios adequados para o trabalho de investigação e de busca da pessoa desaparecida;
II – contribuir para a existência de uma cultura prevenção e busca da pessoa desaparecida;
III – qualificar e capacitar profissionais para o atendimento de pessoas desaparecidas e de seus familiares;
IV – desenvolver campanhas com o objetivo de orientar a população sobre cuidados necessários para a prevenção da ocorrência de desaparecimento de pessoas, bem como sobre os mecanismos pelos quais a sociedade pode auxiliar na elucidação do caso;
V – instituir o Comitê Estadual sobre Pessoas Desaparecidas, com participação da sociedade civil e dos Poderes do Estado, da União e dos municípios no intuito de planejar, executar e monitorar ações e programas em consonância com as diretrizes desta lei.
Art. 4º – São instrumentos da política estadual de que trata esta lei:
I – plano estadual, aqui definido como o conjunto de elementos de informação, diagnóstico, definição de objetivos, metas e instrumentos de execução e avaliação que consubstanciam, organizam e integram o planejamento e as ações da Política Estadual sobre Pessoas Desaparecidas;
II – comitê estadual, aqui definido como o conjunto de agentes institucionais que, no âmbito de suas respectivas competências, agem de modo permanente e articulado para o cumprimento dos princípios e objetivos desta política pública;
III – o Cadastro Único de Pessoas Desaparecidas no Estado de Minas Gerais, com o objetivo de implementar e dar suporte à política de que trata esta lei, que será composto de:
a) um banco de informações públicas, de livre acesso por meio da rede mundial de computadores, contendo fotos e características físicas das pessoas desaparecidas, local e data do desaparecimento, número atualizado de pessoas não localizadas discriminadas por gênero e faixa etária, estatística anual com o número de ocorrências de desaparecimentos e de ocorrências de localização discriminados por gênero, faixa etária, motivações e tipificação do crime, quando este for apurado, e municípios onde os casos foram registrados;
b) um banco de informações de caráter sigiloso para uso dos órgãos de segurança pública, contendo, além das informações previstas no banco de informações públicas, dados complementares que auxiliem no processo de investigação e elucidação dos casos, entre os quais informações genéticas e não genéticas das pessoas desaparecidas ou não identificadas e de seus familiares, inclusive informações do código genético contidas no ácido desoxirribonucleico – DNA – e o mapeamento geográfico do Estado com estatísticas sociais, econômicas, etárias, atividade criminal, ocorrências de desaparecimento e de localização dos municípios e regiões do Estado;
IV – instrumento automático de emissão de alerta sobre o desaparecimento para todas as unidades policiais, órgãos de segurança pública, rodoviárias, aeroportos, portos, polícia rodoviária, companhias de transporte intermunicipais, interestaduais e internacionais, postos de fronteira, hospitais e rede de atenção à saúde, órgãos de imprensa locais, regionais e estaduais, entre outros;
V – instituição, a partir dos órgãos de segurança pública, de delegacias ou serviços especializados em desaparecimento de pessoas, cuja finalidade será priorizar o trabalho de inteligência e investigação das ocorrências e manter atualizado o Cadastro Único de Pessoas Desaparecidas.
Parágrafo único – O cadastro referido no inciso I deste artigo deverá ser integrado à Rede de Integração Nacional de Informações de Segurança Pública, Justiça e Fiscalização – Infoseg –, instituído pelo Decreto Federal nº 6.138, de 28 de junho de 2007, e, quando for o caso, ao Cadastro Nacional de Crianças e Adolescentes Desaparecidos, instituído pela Lei Federal 12.127, de 17 de dezembro de 2009.
Art. 5º – No momento do registro da ocorrência de desaparecimento, a unidade policial responsável por seu acolhimento deverá imediatamente adotar as providências necessárias para a comunicação às demais autoridades competentes, bem como realizar a inclusão dos dados no Cadastro Único de Pessoas Desaparecidas.
§ 1º – No caso do desaparecimento de crianças, adolescentes e pessoas com deficiência física, mental ou sensorial, além das providências previstas no caput deste artigo, a investigação e a busca deverão ser iniciadas imediatamente após o registro da ocorrência, em conformidade com a Lei Federal 11.259, de 30 de dezembro de 2005.
§ 2º – Iniciadas a busca da pessoa desaparecida e a investigação, estas serão interrompidas somente após a ocorrência da localização da pessoa, devendo o poder público envidar todos os esforços até a solução do caso, podendo inclusive responsabilizar autoridades e agentes públicos em caso de omissão e desídia.
§ 3º – Corpos ou restos mortais encontrados não serão sepultados como indigentes sem a adoção das cautelas de cruzamento de dados e de coleta e inserção de suas características físicas, inclusive do código genético, contidas no DNA, no sistema integrado de informações referido no inciso II do art. 3º.
§ 4º – Será oportunizado ao familiar responsável pelo registro da ocorrência ou à pessoa por este autorizada mediante registro cartorial, acesso a todas as etapas de investigação e busca, salvo nos casos em que haja suspeita fundamentada ou comprovada de histórico de violência infrafamiliar ou envolvimento destes no desaparecimento.
Art. 6º – Hospitais, clínicas, unidades de saúde, albergues, públicos ou privados, entidades religiosas, comunidades alternativas e demais sociedades que admitam pessoas sob qualquer pretexto são obrigados a informar aos órgãos de segurança pública, sob pena de responsabilização criminal de seus dirigentes, o ingresso ou cadastro de pessoas sem a devida identificação em suas dependências.
Art. 7º – Imediatamente após a ocorrência de localização, serão adotadas as providências necessárias para a divulgação da localização e o fim das buscas pelos mesmos instrumentos previstos para a divulgação da ocorrência de desaparecimento.
§ 1º – A localização da pessoa e o fim da busca não significam o fim da investigação quando houver indícios fundamentados de existência de atividade criminal, sob qualquer tipificação, entre as causas que levaram ao desaparecimento.
§ 2º – Na hipótese de localização da pessoa tida como desaparecida sem a intervenção dos órgãos de segurança pública, fica obrigado o responsável pelo registro da ocorrência de desaparecimento a comunicar o fato às autoridades responsáveis pela busca.
Art. 8º – Para a consecução dos objetivos de implementação da política a que se refere esta lei, o Estado poderá firmar parcerias, convênios e termos de cooperação com a União, outras unidades da Federação, municípios, universidades, laboratórios públicos ou privados, organismos internacionais, países com os quais o Brasil possua relação diplomática, especialmente os que possuem fronteira seca com o País, bem como organizações, entidades e associações da sociedade civil.
Art. 9º – O Poder Executivo poderá regulamentar esta lei.
Art. 10 – Esta lei entra em vigor na data da sua publicação.
Sala das Reuniões, 3 de junho de 2015.
Léo Portela
Justificação: O objetivo deste projeto, ao instituir a Política Estadual sobre Pessoas Desaparecidas, é implementar essa política de maneira permanente pelos poderes do Estado. Trabalhar sobre o tema das pessoas desaparecidas nunca é fácil. Mexe com as estruturas familiares e angustia parentes verificar o desaparecimento de um ente querido. Há as dificuldades de busca e localização e a necessidade de repressão a redes criminosas responsáveis pelo aliciamento e tráfico de pessoas.
Embora reconheçamos os sucessivos avanços das gestões estaduais no enfrentamento do tema, ainda hoje o desaparecimento de pessoas em Minas Gerais é elevado.
Muitos dos casos sequer são registrados nos órgãos de segurança pública. Vários motivos levam a essa falta de registro, entre os quais o aliciamento de crianças e adolescentes oriundos de famílias em situação de vulnerabilidade social; a falta de orientação sobre os procedimentos a serem adotados pelas famílias em caso de desaparecimento; e situações relacionadas à violência doméstica, ao abandono familiar e a problemas de saúde mental. Nem sempre o desaparecimento de alguém configura crime. As já citadas situações relacionadas à saúde mental e à fuga do lar, principalmente protagonizada por adolescentes e adultos jovens, levam a crer na necessidade de estabelecermos ações de inclusão mais eficientes.
Programas sociais em curso no País e em Minas Gerais de transferência de renda, qualificação profissional, acompanhamento de famílias vulneráveis têm auxiliado na diminuição desses casos.
Quando se trata de atuação criminal, as principais causas elucidadas estão relacionadas a redes criminosas que praticam o tráfico de seres humanos com o objetivo de exploração sexual nacional e internacional, trabalho escravo, adoções ilegais, tráfico de drogas e tráfico de órgãos. Não raro, meninas e mulheres jovens são aliciadas e deixam suas famílias e pequenas cidades com a promessa de lucro fácil e uma vida melhor e acabam nas grandes cidades ou em municípios de grande fluxo de obras, vítimas da exploração sexual.
Nesse sentido, este projeto de lei busca estabelecer três objetivos para enfrentarmos os casos de desaparecimento de pessoas em Minas Gerais: a prevenção do desaparecimento, o auxílio nas buscas e a assistência e o apoio aos familiares das vítimas e às próprias vítimas quando localizadas. Para isso, além do esforço protagonizado pelos órgãos de segurança, é necessário estabelecer uma ampla rede entre outros órgãos estaduais, municipais e federais, o Judiciário, o Ministério Público, conselhos tutelares, conselhos de direitos e organizações da sociedade civil. Dessa forma, em rede, é possível fortalecer a luta para que ninguém desapareça e para que aqueles que se encontram desaparecidos tenham o direito de serem encontrados e de viver, após isso, uma outra realidade, com dignidade.
A proposição que ora apresentamos quer contribuir para que esse seja um tema superado em nosso estado. É importante ressaltar que não seremos os únicos a instituir esse tipo de política.
Neste momento em que apresentamos proposição de tamanha envergadura para a apreciação desta Casa, não poderíamos deixar de lembrar e agradecer a participação de agentes públicos que lidam diariamente com o tema, conselhos de direitos, vereadores e comitês municipais sobre pessoas desaparecidas e organizações da sociedade civil na sua elaboração.
Rogamos pela aprovação desta proposição.
– Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça e de Segurança Pública para parecer, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, do Regimento Interno.