PL PROJETO DE LEI 125/2023

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 125/2023

Comissão de Constituição e Justiça

Relatório

De autoria do deputado Doutor Jean Freire, o projeto em análise dispõe sobre a prestação de assistência odontológica a pacientes em regime de internação hospitalar na rede pública e privada do Estado e dá outras providências.

Publicada no Diário do Legislativo de 9/3/2023, a proposição foi distribuída às Comissões de Constituição e Justiça, de Saúde e de Fiscalização Financeira e Orçamentária.

Vem a matéria, preliminarmente, a esta comissão para receber parecer sobre a sua juridicidade, constitucionalidade e legalidade, nos termos do art. 188, combinado com o art. 102, III, “a”, do Regimento Interno.

Fundamentação

O projeto de lei em análise visa obrigar os hospitais a prestarem assistência odontológica a pacientes sob regime de internação, no que diz respeito a diagnóstico, tratamento e ações preventivas para eventos adversos. A proposição também exige que essa assistência seja realizada por cirurgiões-dentistas com capacitação na área de odontologia hospitalar.

Para o autor, a assistência odontológica “tem o objetivo de assistir ao paciente internado de forma integral e humanizada” e é indispensável para o cumprimento das normas infralegais vigentes.

Esse é um tema afeto à proteção e defesa da saúde, que, de acordo com o art. 24, inciso XII, da Constituição da República, são matérias de competência legislativa concorrente da União, dos estados e do Distrito Federal. Ademais, o objeto do projeto de lei não se encontra entre aqueles de iniciativa privativa, indicados no art. 66 da Constituição do Estado. Não vislumbramos, portanto, óbices jurídico-constitucionais à deflagração do processo legislativo por iniciativa parlamentar.

Entretanto, em que pese a nobre intenção do autor, observa-se que o projeto em exame busca dar um status legal à matéria, que, por sua natureza, tem caráter eminentemente administrativo, situada no campo de atuação do Poder Executivo. A instituição de ação ou programa de saúde abrange as atividades e as ações desenvolvidas pela administração pública e pelos seus órgãos e é tarefa que não cabe a lei de iniciativa parlamentar.

Com esse entendimento, tem-se pronunciado exaustivamente o Supremo Tribunal Federal – STF – em inúmeros julgados, em especial:

(...) O princípio constitucional da reserva de administração impede a ingerência normativa do Poder Legislativo em matérias sujeitas à exclusiva competência administrativa do Poder Executivo. É que, em tais matérias, o Legislativo não se qualifica como instância de revisão dos atos administrativos emanados do Poder Executivo. Precedentes. Não cabe, desse modo, ao Poder Legislativo, sob pena de grave desrespeito ao postulado da separação de Poderes, desconstituir, por lei, atos de caráter administrativo que tenham sido editados pelo Poder Executivo, no estrito desempenho de suas privativas atribuições institucionais. Essa prática legislativa, quando efetivada, subverte a função primária da lei, transgride o princípio da divisão funcional do poder, representa comportamento heterodoxo da instituição parlamentar e importa em atuação ultra vires do Poder Legislativo, que não pode, em sua atuação político-jurídica, exorbitar dos limites que definem o exercício de suas prerrogativas institucionais. (Medida Cautelar na ADI 2364).

(...) Separação e independência dos Poderes: pesos e contrapesos: imperatividade, no ponto, do modelo federal. 1. Sem embargo de diversidade de modelos concretos, o princípio da divisão dos Poderes, no Estado de Direito, tem sido sempre concebido como instrumento da recíproca limitação deles em favor das liberdades clássicas: daí constituir em traço marcante de todas as suas formulações positivas os “pesos e contrapesos” adotados. 2. A fiscalização legislativa da ação administrativa do Poder Executivo é um dos contrapesos da Constituição Federal à separação e independência dos Poderes: cuida-se, porém, de interferência que só a Constituição da República pode legitimar. 3. Do relevo primacial dos “pesos e contrapesos” no paradigma de divisão dos Poderes, segue-se que à norma infraconstitucional – aí incluída, em relação à Federal, a Constituição dos estados-membros –, não é dado criar novas interferências de um Poder na órbita de outro que não derive explícita ou implicitamente de regra ou princípio da Lei Fundamental da República. 4. O poder de fiscalização legislativa da ação administrativa do Poder Executivo é outorgado aos órgãos coletivos de cada câmara do Congresso Nacional, no plano federal, e da Assembleia Legislativa, no dos estados; nunca, aos seus membros individualmente, salvo, é claro, quando atuem em representação (ou presentação) de sua Casa ou comissão. III. Interpretação conforme a Constituição: técnica de controle de constitucionalidade que encontra o limite de sua utilização no raio das possibilidades hermenêuticas de extrair do texto uma significação normativa harmônica com a Constituição. (ADI 3046/SP).

Por essa razão, ressalta-se que esta Comissão de Constituição e Justiça já se manifestou diversas vezes pela inconstitucionalidade, antijuridicidade e ilegalidade de projetos de lei que visam instituir ações ou programas de natureza administrativa. Contudo, não obstante esse vício formal do projeto em criar ações diretas para a assistência odontológica a pacientes sob regime de internação, seu escopo principal é garantir um direito aos usuários dos serviços de saúde. Por isso, apresentamos ao final deste parecer o Substitutivo nº 1.

Conclusão

Pelas razões expostas, concluímos pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade do Projeto de Lei nº 125/2023 na forma do Substitutivo nº 1, a seguir apresentado.

SUBSTITUTIVO Nº 1

Altera o art. 2º da Lei nº 16.279, de 20 de julho de 2006, que dispõe sobre os direitos dos usuários das ações e dos serviços públicos de saúde no Estado.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:

Art. 1º – Ficam acrescentados ao art. 2º da Lei nº 16.279, de 20 de julho de 2006, o seguinte inciso XXVII e o § 4º a seguir:

“Art. 2º – (…)

XXVII – ter assegurada, durante internação em hospitais de médio e grande porte, assistência odontológica relativa a diagnóstico, tratamento e ações para prevenir eventos adversos, na forma de regulamento.

(…)

§ 4º – Para cumprimento do disposto no inciso XXVII, o poder público poderá aproveitar servidores integrantes de seus quadros, atendidos os requisitos dispostos em regulamento, sem que haja prejuízo ao atendimento de pacientes nos serviços de urgência e emergência das unidades hospitalares a que se refere o mesmo inciso.”.

Sala das Comissões, 5 de setembro de 2023.

Arnaldo Silva, presidente – Lucas Lasmar, relator – Zé Laviola – Celinho Sintrocel.