PL PROJETO DE LEI 3032/2021

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 3.032/2021

Comissão de Agropecuária e Agroindústria

Relatório

A proposição em análise, de autoria do deputado Antônio Carlos Arantes, “institui a Política Estadual de Bioinsumos”.

Distribuída às Comissões de Constituição e Justiça, de Agropecuária e Agroindústria, e de Fiscalização Financeira e Orçamentária, a matéria foi apreciada, preliminarmente, pela Comissão de Constituição e Justiça, que concluiu por sua juridicidade, constitucionalidade e legalidade na forma do Substitutivo nº 1, que apresentou.

Vem agora o projeto a esta comissão para que sobre ela seja emitido parecer quanto ao mérito, nos termos do art. 188, combinado com o art. 102, IX, do Regimento Interno.

Fundamentação

O projeto em tela pretende instituir a Política Estadual de Bioinsumos. Para tanto, estabelece conceitos, diretrizes e objetivos dessa política, buscando incentivar a adoção de sistemas de produção agropecuários mais sustentáveis a partir do uso adequado desse tipo de insumo, no âmbito do Estado de Minas Gerais.

Em sua análise, a Comissão de Constituição e Justiça considerou algumas das medidas propostas pelo projeto incompatíveis com o princípio de reserva de administração, decorrente do pressuposto constitucional da separação de Poderes. Por essa razão, apresentou o Substitutivo nº 1, que suprimiu seus arts. 5º e 6º, uma vez que eles estabeleciam competências administrativas para órgão do Poder Executivo.

No que é próprio desta comissão, cumpre-nos primeiramente esclarecer que bioinsumo é definido como produto, processo ou tecnologia de origem vegetal, animal ou microbiana, destinado ao uso na produção, no armazenamento e no beneficiamento de itens agropecuários que interfiram positivamente no crescimento, no desenvolvimento e no mecanismo de resposta de animais, de plantas e de microrganismos. Do conceito se depreende a grande amplitude de utilização dos bioinsumos para a agropecuária e a relevância que a temática assume ao possibilitar uma substituição gradual de produtos de base química por outros de origem biológica.

É importante também ressaltar que o agronegócio enfrenta hoje um sério dilema: como produzir mais, de forma economicamente viável, para alimentar mais pessoas, sem descuidar de aspectos de sustentabilidade. O uso de agrotóxicos, de fertilizantes e de outros produtos químicos – insumos largamente utilizados na agropecuária convencional – em grande parte importados, de custo elevado e em alguns casos, danosos ao ambiente e a saúde das pessoas, ainda que para garantir a sanidade das lavouras e rebanhos, tem se tornado um problema recorrente.

Considerados os eventos geopolíticos e as tendências do comércio internacional da atualidade, tais práticas representam um desafio aos agricultores do País, devido à dependência externa de suprimentos e à escalada de preços internacionais, que ameaçam a economia agrícola. Além desses aspectos, é crescente o anseio da sociedade por alimentos mais saudáveis e seguros, o que pressiona o setor produtivo para o emprego de produtos, processos e tecnologias mais sustentáveis.

Coerente com essas demandas, a agricultura alternativa de base agroecológica e orgânica já vem se utilizando dos insumos biológicos, por serem fundamentais para o manejo desses sistemas. Nesse modo de produção, o respeito dedicado à vida desperta para a importância dos microorganismos do solo na liberação de nutrientes para as plantas cultivadas; da pureza das águas e da ausência de agrotóxicos para a preservação dos insetos polinizadores, cujo trabalho aumenta a produção; e da preservação de vegetação nativa no entorno das lavouras, que abriga inimigos naturais das pragas. Nesse campo, os agricultores agroecológicos desenvolveram técnicas que usam patógenos para o controle biológico de pragas.

Atento à necessidade de conservação dos recursos naturais, o setor do agronegócio vem buscando assimilar conhecimentos e técnicas de menor impacto e custo como é o caso dos bioinsumos, que vêm desempenhando um papel cada vez mais importante na agricultura convencional. Eles tem sido empregados, em especial, no controle de pragas e doenças, na nutrição de plantas e na conservação e melhoria das condições de solo, dentre outras finalidades. Um dos melhores exemplos desse uso é o desenvolvimento e a aplicação em larga escala de inoculantes bacterianos para a fixação biológica de nitrogênio, principalmente para o cultivo da soja.

Além da experiência acumulada pelo segmento da agroecologia e dos conhecimentos de populações tradicionais sobre plantas, variedades crioulas e raças locais de animais domésticos, soma-se como vantagem competitiva o fato de o Brasil abrigar uma das maiores biodiversidades do mundo, além de dispor de variada reserva mineral de rochas detentoras de nutrientes e de um setor de pesquisa agropecuária público e privado bastante ativo. Ou seja, o País reúne condições para se tornar um grande protagonista na área de ciência, tecnologia e inovação em bioinsumos.

Segundo informações da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa –, na última safra de verão, mais de 40 milhões de hectares de diversas culturas, a maioria grãos, usaram fixadores biológicos de nitrogênio. Paralelamente, nos últimos três anos, houve um aumento no registro de produtos biológicos e o ingresso de novos produtos nacionais e importados no mercado, com o surgimento de novas empresas produtoras de insumos biológicos.

Atenta a essa nova fronteira tecnológica, esta comissão realizou em dezembro de 2021 audiência pública para debater a produção de fertilizantes no Brasil, com ênfase nos fertilizantes orgânicos, minerais – ou organominerais – e outros bioinsumos. Com a presença virtual do ex-ministro da Agricultura, Alisson Paulinelli, e de pesquisadores da Embrapa, da Universidade Federal de Lavras – Ufla – e de empresas privadas, além de extensionistas da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado Minas Gerais – Emater-MG –, a introdução dos bioinsumos na agricultura brasileira foi tratada como uma “nova revolução no campo”, em referência ao desenvolvimento da agricultura tropical iniciada na década de 1970 e que revolucionou o setor no Brasil nos últimos 50 anos.

A utilização de insumos biológicos ganhou um novo impulso a partir do Programa Nacional de Bioinsumos, instituído pelo Decreto Federal nº 10.375, de 2020, que visa ampliar e de fortalecer a utilização de bioinsumos no País para beneficiar o setor agropecuário, de forma a reduzir a dependência dos insumos importados, ampliando a oferta de matéria-prima para o setor. A norma dispõe ainda sobre o Conselho Estratégico, órgão responsável por apoiar o planejamento e as ações desenvolvidas para a implementação do referido programa. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – Mapa – é o responsável por coordenar o programa, que busca estimular a pesquisa, a produção e o uso de produtos biológicos, integrando setores públicos e privados da ciência, tecnologia, inovação, além do setor produtivo e o mercado, para assim, consolidar e incrementar a produtividade, fortalecendo a produção e adicionando valor aos produtos agrícolas. Ademais, pretende criar um ambiente favorável para o financiamento de infraestrutura e de custeio, por meio da oferta de crédito e outros instrumentos econômicos que beneficiem a produção e a utilização de bioinsumos.

Já se observa uma franca expansão do mercado de bioinsumos. De acordo com informações do Mapa, o mercado nacional movimentou, em 2019, R$675 milhões, o que representa crescimento de 15% em relação a 2018. Há ainda uma expectativa de avanço de mais de 40% até o final deste ano no mercado da América Latina. Empresas de referência, como a Embrapa, estão envolvidas nas pesquisas destinadas ao setor, e o número de registros de produtos que podem ser caracterizados como bioinsumos tem aumentado de forma relevante.

Já existem no Brasil algumas empresas que produzem bioinsumos e os disponibilizam para uso no mercado. Os produtos, que devem ser registrados no Mapa, podem ser consultados no Catálogo Nacional de Bioinsumos. Por sua vez, a Embrapa desenvolveu um aplicativo gratuito denominado Bionsumos, que possibilita aos agricultores consultar pelo celular os produtos cadastrados, a fim de encontrar aqueles que são seguros e com procedência. A ferramenta organiza os bioinsumos em duas partes: inoculantes e pragas. Para cada praga é apresentada sua descrição detalhada e uma lista de produtos biológicos indicados para combatê- -la. No grupo de inoculantes, são listados os que foram testados e aprovados para diversas culturas com indicação de fornecedores credenciados. O mercado, no entanto, trabalha com um espectro bem maior de classes de bioinsumos. Genericamente podem ser citadas as classes dos promotores de crescimento de plantas; biofertilizantes; produtos para nutrição vegetal e animal; fitoterápicos; entre outros.

Em Minas Gerais, o Projeto de Multiplicação Artesanal de Agentes Biológicos, iniciativa da Emater, no Município de Estiva, no Sul de Minas, objetiva divulgar e estimular, por meio da extensão rural, a produção on farm de bioinsumos, ou seja, nos próprios estabelecimentos agrícolas. A ênfase da iniciativa está no controle de pragas, uma vez que o município é referência na horticultura, com destaque para o morango, muito dependente de agrotóxicos.

Paralelamente, no Congresso Nacional, tramita projeto de lei que pretende regulamentar a produção on farm de bioinsumos, pois existem riscos biológicos para os manipuladores e o meio ambiente. Ademais, são necessárias a padronização e a verificação de eficácia dos produtos manipulados, sua eficiência e segurança, pontos que merecem atenção de especialistas e pesquisadores.

Não obstante, ainda existem desafios a serem superados. Um deles é a regulação do setor que ainda não está claramente estabelecida, gerando certo nível de insegurança para investidores e agentes integrantes das cadeias produtivas. Discussões importantes, em função da perecibilidade desses produtos, são essenciais para a compreensão de elementos que podem impactar a competitividade das cadeias produtivas. Temáticas relacionadas à adaptação dos processos produtivos, à logística, ao armazenamento e à frequência no fornecimento também precisam ser mais bem entendidos.

Assim, ainda há um longo caminho a ser percorrido para que tenhamos uma disponibilidade efetiva desses produtos, razão pela qual é necessário investimento contínuo em ciências, desenvolvimento e tecnologia. Trata-se de um papel que o Estado pode cumprir de forma suplementar à União, pois conta com instrumentos para isso, a exemplo da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais – Epamig – e de diversas entidades de ensino público.

Por fim, consideramos positiva a aprovação da proposição em análise e acreditamos que Minas Gerais tem condições de participar ativamente desse processo e contribuir para a evolução dessa “nova fronteira dos biológicos”, também chamada a terceira onda da agricultura brasileira, que se baseia na utilização de produtos, processos e tecnologias mais sustentáveis. Não obstante, apresentamos um substitutivo ao final deste parecer, a fim de aprimorar a proposição e alinhá-la às normas legais vigentes.

Conclusão

Diante do exposto, somos pela aprovação do Projeto de Lei nº 3.032/2021, em 1º turno, na forma do Substitutivo nº 2, a seguir redigido.

SUBSTITUTIVO Nº 2

Institui a política estadual de bioinsumos.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:

Art. 1º – Fica instituída a política estadual de bioinsumos, que obedecerá ao disposto nesta lei.

Art. 2º – Para os efeitos desta lei, entende-se por bioinsumo o produto, o processo ou a tecnologia de origem vegetal, animal ou microbiana destinados ao uso na produção, no armazenamento e no beneficiamento de produtos agropecuários e nos sistemas de produção aquáticos ou de florestas plantadas, que interfiram positivamente no crescimento, no desenvolvimento e no mecanismo de resposta de animais, de plantas, de microrganismos e de substâncias derivadas e que interajam com os produtos e os processos físico-químicos e biológicos.

Art. 3º – São diretrizes da política estadual de bioinsumos:

I – utilização estratégica de bioinsumos como alternativa tecnológica para a segurança alimentar e a sustentabilidade econômica e ambiental na agropecuária mineira;

II – valorização e conservação da biodiversidade nas regiões do Estado, como fonte de recursos genéticos para o desenvolvimento de bioinsumos;

III – valorização e conservação de raças de animais domésticos e de cultivares locais, tradicionais ou crioulos e do conhecimento sobre eles acumulado pelas comunidades;

IV – desenvolvimento de instrumentos eficazes de comunicação e educação com foco no potencial de uso e nos benefícios dos bioinsumos para a produção agropecuária;

V – estímulo à bioeconomia e às diferentes formas organizativas de produtores rurais e agricultores familiares, no desenvolvimento de cadeias produtivas regionais.

Art. 4º – São objetivos da política de que trata esta lei:

I – incentivar a produção, o processamento, a distribuição, a comercialização e o consumo de bioinsumos;

II – estimular a oferta de insumos agrícolas e pecuários de baixo impacto sobre o meio ambiente e a saúde humana;

III – promover campanhas educativas e de capacitação técnica sobre boas práticas de produção e de uso de bioinsumos, valorizando-os como alternativa sustentável aos insumos agropecuários convencionais;

IV– estimular a instalação de unidades produtoras de bioinsumos, consideradas biofábricas, em diferentes regiões do Estado, com prioridade para as de pequeno e médio porte;

V – fomentar a pesquisa, o desenvolvimento e a inovação em bioinsumos;

VI – apoiar a divulgação de bioinsumos de eficácia e segurança reconhecidas, nas diversas classes de aplicação.

Art. 5º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Sala das Comissões, 8 de junho de 2022.

Delegado Heli Grilo, relator.