PL PROJETO DE LEI 459/2019

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 459/2019

Comissão de Constituição e Justiça

Relatório

De autoria do deputado Marquinho Lemos, a proposta em epígrafe “dispõe sobre a isenção do pagamento de pedágio nas rodovias do Estado de Minas Gerais nos termos que especifica e dá outras providências”.

Publicado no Diário do Legislativo de 15/3/2019, foi o projeto distribuído para as Comissões de Constituição e Justiça, de Transporte, Comunicação e Obras Públicas e de Fiscalização Financeira e Orçamentária.

Compete a esta comissão examinar a juridicidade, constitucionalidade e legalidade da matéria, nos termos regimentais.

Fundamentação

A proposta em análise visa, nos termos de seu art. 1º, isentar do pagamento de pedágio, nas vias públicas estaduais, os condutores de veículos automotores, particulares ou de aluguel, independentemente do número de eixos, que, após tarifados, retornarem dentro do prazo de vinte e quatro horas ao seu destino de origem.

Segundo o autor do projeto, “a cobrança dupla de pedágio gera um custo significativo para o usuário da via que se enquadra ao proposto neste projeto e tal gratuidade seria uma questão de justiça e adequação necessária à realidade do trabalhador destes municípios”.

Primeiramente, no que diz respeito à obrigação voltada aos particulares concessionários, importa-nos observar que essa medida implica alteração em contratos administrativos em vigor pela via legislativa. Neste ponto, devemos ressaltar que a edição de lei que proponha tais alterações nos contratos em curso é matéria polêmica tanto na doutrina quanto na jurisprudência. Isso porque o legislador não pode ignorar as relações contratuais travadas com fundamento na lei e em plena vigência, pois, a rigor, constituem atos jurídicos perfeitos e, nessa condição, estariam imunes a modificações legislativas supervenientes.

Quanto ao tema, o STF, em reiteradas decisões, tem entendido que lei estadual não pode afetar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos, por meio da concessão de descontos e isenções sem nenhuma previsão de compensação, uma vez que tal medida caracteriza evidente violação ao princípio da harmonia entre os Poderes, já que o Poder Legislativo pretende substituir o Executivo na gestão dos contratos administrativos celebrados (ADIs n° 2.733 e nº 3.225). Segundo tal entendimento, eventuais alterações nos contratos de concessão de serviço público, como em qualquer contrato administrativo, devem ser efetivadas mediante termo de aditamento e com a devida atualização do equilíbrio financeiro, visto que este é um direito-garantia do concessionário e não é lícito que atos legislativos ulteriores estabeleçam novas obrigações para a empresa privada ou alterem as condições de execução de contratos em vigor.

Observamos que foi adotado entendimento diverso no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.649-6 contra lei que concedia passe livre no sistema de transporte coletivo interestadual às pessoas carentes com deficiência. Na ocasião, a relatora do processo, ministra Cármem Lúcia Antunes Rocha, levando em conta o aspecto social da medida e o princípio da igualdade, entendeu que não haveria que se falar em inconstitucionalidade da lei instituidora do benefício, mas na resolução do contrato com base na cláusula rebus sic stantibus, ou seja, caberia a rescisão do contrato ou acordo para a recomposição de seu equilíbrio.

Sustentou que, “se sobrevier desequilíbrio da equação econômico-financeira do contrato, a matéria será objeto de ilegalidade, a se provar em caso específico, nada tendo a prevalecer em relação à validade ou invalidade constitucional da lei em pauta”. Ademais, esclareceu que é possível a gratuidade e que o Executivo deverá restabelecer esse equilíbrio de acordo com o impacto concreto da medida.

Observe-se, contudo, que esse posicionamento foi adotado em face de circunstâncias especiais, uma vez que o legislador constituinte reservou especial atenção à questão relacionada aos direitos pertinentes às pessoas com deficiência. A esse segmento dispensou um tratamento visivelmente protetivo ao estabelecer normas que não apenas previnem eventuais discriminações como também determinam prestações de caráter positivo a serem realizadas pelo poder público, sempre visando à integração desse segmento à vida social.

Note-se, porém, que a alteração de contratos em curso implica a relativização do ato jurídico perfeito, o qual constitui desdobramento do princípio constitucional da segurança jurídica, prescrito no art. 5º, caput, da Constituição da República. Assim, se, de um lado, temos a proteção, defesa e integração das pessoas com deficiência, de outro, temos o princípio da segurança jurídica, e ambos são valores que o legislador constituinte normatizou no texto constitucional.

Em síntese, parece-nos que essa relativização só pode ocorrer quando o objetivo da lei em questão seja promover outros princípios constitucionais que, no caso concreto, devem prevalecer sobre o princípio da segurança jurídica. Em outras palavras, a alteração de contratos em vigor por meio de ato legislativo só pode ocorrer em situações excepcionais, fundadas, por exemplo, na promoção de direitos fundamentais, o que não verificamos no caso em tela.

Não obstante, entendemos que não há impedimento no que se refere a novos contratos e às futuras licitações. Por isso, entendemos ser necessária a apresentação de emenda para que a lei incida tão-somente sobre os futuros contratos. Além disso, sugerimos o horário de 5 horas até as 22 horas para a concessão do benefício, de forma a tornar a proposta menos onerosa para o poder público e atingir a maior parte dos trabalhadores que precisam transitar pela praça de pedágio, o que também é objeto de emenda apresentada ao final. Além disso, por meio dessa última emenda, promovemos outras alterações, como a adequação da relação do benefício com o veículo e não com o condutor, e a supressão do parágrafo único do art. 1º, em razão de técnica legislativa.

Conclusão

Em face do exposto, concluímos pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade do Projeto de Lei nº 459/2019, com as Emendas nºs 1 e 2, a seguir apresentadas.

EMENDA Nº 1

Dê-se ao art. 1º a seguinte redação:

“Art. 1º – Ficam isentos do pagamento de pedágio, nas vias públicas estaduais, os veículos automotores, particulares ou de aluguel, independente do número de eixos, que, tarifados a partir do horário de 5 horas, retornem à mesma praça de pedágio até as 22 horas do mesmo dia.”

EMENDA Nº 2

Acrescente-se onde convier:

“Art. – O disposto nesta lei não se aplica aos contratos de concessão firmados até a data da publicação desta lei.”

Sala das Comissões, 9 de julho de 2019.

Dalmo Ribeiro Silva, presidente – Charles Santos, relator – Guilherme da Cunha (voto contrário) – Bruno Engler – Celise Laviola – Ana Paula Siqueira.