PL PROJETO DE LEI 99/2019

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 99/2019

Comissão de Constituição e Justiça

Relatório

De autoria da deputada Ana Paula Siqueira, o projeto de lei em epígrafe “dispõe sobre o ensino de noções básicas sobre a Lei Maria da Penha nas escolas da rede pública do Estado”.

Publicada no Diário do Legislativo de 28/2/2019, a proposição foi distribuída às Comissões de Constituição e Justiça, de Educação, Ciência e Tecnologia e de Defesa dos Direitos da Mulher.

Em cumprimento ao disposto no art. 173, § 2º, do Regimento Interno, a esta proposição foi anexado o Projeto de Lei nº 763/2019, do deputado Doutor Jean Freire e o Projeto de Lei nº 2.146/2020, da deputada Ione Pinheiro, que contêm objeto semelhante ao propugnado pela proposição em estudo.

Cabe a esta comissão, nos termos do art. 188, combinado com o art. 102, III, “a”, do Regimento Interno, analisar a juridicidade, constitucionalidade e legalidade da matéria.

Fundamentação

O projeto de lei em análise dispõe, no art. 1º, que “fica obrigatório, nos estabelecimentos de ensino médio da rede pública estadual, o ensino de noções básicas sobre a Lei Maria da Penha, que será desenvolvido sob a denominação Programa Lei Maria da Penha Vai à Escola”.

A União, no uso de suas atribuições constitucionais, editou a Lei Federal nº 9.394, de 1996, denominada Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB –, que define as diretrizes e bases da educação nacional. Tal lei estabelece, em seu art. 26, que os currículos da educação infantil, do ensino fundamental e do ensino médio devem ter base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e em cada estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e dos educandos. Dessa flexibilidade, resultaria a possibilidade de haver legislação suplementar por parte dos estados federados, desde que respeitado, frise-se, o caráter regional.

Ocorre, porém, que muitos projetos de lei que tratam de inclusão de temas curriculares não apresentam caráter regional ou local; ao contrário, tratam de temas gerais, próprios à base nacional comum. Por exemplo, se concluíssemos (erroneamente) que as disciplinas “cidadania e ética” e “ética social e política” não estão previstas nas normas nacionais de educação, ainda assim, a inclusão só seria justificável se a abordagem proposta tratasse de peculiaridades locais ou regionais do sistema de ensino instituinte. O mesmo ocorre quanto ao ensino de noções básicas sobre a Lei Maria da Penha. Trata-se de lei federal, que se refere ao tema da violência doméstica, e que não possui, numa primeira abordagem, um caráter regional ou local. Ao contrário, trata-se de tema comum nacional.

Saliente-se que, na jurisprudência, especialmente do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, também são encontrados precedentes que abonam a tese contrária à interferência legislativa no currículo escolar. Foi apontada como causa de inconstitucionalidade da norma o vício de iniciativa. Segundo a corte estadual, a inclusão de disciplina constitui atividade tipicamente administrativa e, portanto, de competência privativa do Poder Executivo. Em algumas hipóteses, além do citado argumento, foi também utilizado como fundamento para a declaração de inconstitucionalidade da norma o fato de que a inclusão de disciplina implica aumento de despesas, violando o princípio da prévia dotação orçamentária.

Por outro lado, o art. 226, § 8º, da Constituição Federal, assim dispõe:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

(…)

§ 8º – O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.

Dado que cabe ao Estado – aqui entendido em todas as suas esferas federativas (União, estados-membros, municípios e Distrito Federal) – promover a proteção dos direitos humanos e que a violência contra a mulher constitui uma das formas de violação desses direitos, a Lei Federal nº 11.340, de 2006, dispôs acertadamente em seu art. 35, IV, que a União, o Distrito Federal, os estados e os municípios poderão criar e promover, no limite das respectivas competências, programas e campanhas de enfrentamento da violência doméstica e familiar. Nesse contexto normativo, conclui-se que compete ao Estado legislar sobre ações de proteção e amparo à mulher vítima de violência doméstica e familiar.

Assim sendo, apresentamos ao final do parecer substitutivo com o fito de estabelecer princípios e diretrizes para as ações do Estado voltadas para a conscientização dos alunos sobre a importância da Lei Maria da Penha no combate e na prevenção da violência doméstica e familiar nas escolas da rede pública de ensino do Estado.

Por fim, ressaltamos que a argumentação aduzida neste parecer se aplica aos projetos anexados, uma vez que estes tratam da Lei Maria da Penha e da violência contra a mulher.

Conclusão

Em face do exposto, concluímos pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade do Projeto de Lei nº 99/2019 na forma do Substitutivo nº 1, a seguir apresentado.

SUBSTITUTIVO Nº 1

Estabelece princípios e diretrizes para as ações do Estado voltadas para a conscientização dos alunos sobre a importância da Lei Maria da Penha no combate e na prevenção da violência doméstica e familiar nas escolas da rede pública de ensino do Estado.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:

Art. 1º – As ações do Estado voltadas para a conscientização dos alunos sobre a importância da lei Maria da Penha no combate e na prevenção da violência doméstica e familiar nas escolas da rede pública de ensino do Estado atenderão ao disposto nesta lei.

Art. 2º – A implementação das ações a que se refere o art. 1º observará os seguintes princípios e diretrizes:

I – o incentivo à realização de palestras ou de debates para divulgar informações a respeito da lei Maria da Penha;

II – a participação dos alunos e profissionais das áreas de educação na formulação e na implementação das ações governamentais a que se refere o art. 1º;

III – a prioridade no desenvolvimento e distribuição de material informativo sobre a lei Maria da Penha;

IV – a promoção da continuidade das ações de conscientização dos alunos sobre a importância da lei Maria da Penha no combate e na prevenção da violência doméstica e familiar.

Art. 3º – As ações do Estado a que se refere o art. 1º terão os seguintes objetivos:

I – capacitar profissionais da área da educação para ministrar palestras sobre a Lei Maria da Penha;

II – incentivar as reflexões sobre o combate à violência contra a mulher.

Art. 4º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Sala das Comissões, 24 de agosto de 2021.

Sávio Souza Cruz, presidente – Charles Santos, relator – Cristiano Silveira – Zé Reis – Guilherme da Cunha – Bruno Engler.