PL PROJETO DE LEI 5194/2018

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 5.194/2018

Comissão de Constituição e Justiça

Relatório

De autoria do deputado Felipe Attiê, o projeto de lei em epígrafe “acrescenta o art. 13-A à Lei nº 6.763, de 26 de dezembro de 1975.”. A proposição foi desarquivada nesta legislatura, a requerimento do deputado Sargento Rodrigues, nos termos do art. 180-A do Regimento Interno, mantendo-se sua autoria original.

Publicada no Diário do Legislativo de 19/5/2018, a proposição foi distribuída às Comissões de Constituição e Justiça e de Fiscalização Financeira e Orçamentária, nos termos do art. 188 do Regimento Interno.

Cumpre-nos, preliminarmente, examinar a proposição nos seus aspectos de juridicidade, constitucionalidade e legalidade, nos termos do art. 102, III, “a”, do mencionado regimento.

Fundamentação

A proposição em tela pretende acrescentar o art. 13-A à Lei nº 6.763, de 26 de dezembro de 1975, que consolida a legislação tributária do Estado e dá outras providências, a fim de que o Poder Executivo disponibilize mensalmente na internet informações que demonstrem a forma de apuração da base de cálculo a que se refere o §19 do art. 13 da mesma lei.

O referido §19 do art. 13 da Lei nº 6.763, de 1975, dispõe sobre a base de cálculo do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual, Intermunicipal e de Comunicação – ICMS – para fins de substituição tributária. Segundo tal artigo, a citada base de cálculo será:

“Art. 13 – (…)

§19 – A base de cálculo, para fins de substituição tributária, será:

1) em relação a operação ou prestação antecedentes ou concomitantes, o valor da operação ou da prestação praticado pelo contribuinte substituído;

2) em relação a operação ou prestação subsequentes, obtida pelo somatório das parcelas seguintes:

a – o valor da operação ou da prestação própria realizada pelo substituto tributário ou pelo substituído intermediário;

b – o montante dos valores de seguro, de frete e de outros encargos cobrados ou transferíveis ao adquirente ou ao tomador de serviço;

c – a margem de valor agregado, nela incluída a parcela referente ao lucro e o montante do próprio imposto, relativa a operação ou prestação subsequentes, que será estabelecida em regulamento, com base em preço usualmente praticado no mercado considerado, obtido por levantamento, ainda que por amostragem, ou através de informações e outros elementos fornecidos por entidade representativa do respectivo setor, adotando-se a média ponderada dos preços coletados.”.

De acordo com a justificação do autor, “… a eminente autora Misabel Abreu Machado Derzi, destaca que ‘a base de cálculo é a ordem de grandeza que, posta na consequência da norma criadora do tributo, presta-se a mensurar o fato descrito na hipótese, possibilitando a quantificação do dever tributário, sua graduação proporcional à capacidade contributiva do sujeito passivo e a definição da espécie tributária.’.”

O autor ainda destaca que “… há questionamentos feitos por contribuintes no sentido de eventual violação pelo Estado dos princípios constitucionais da legalidade e da seletividade, na medida em que, entre outros argumentos, o PMPF [Preço Médio Ponderado ao Consumidor Final] praticado em Minas não retrataria a realidade dos preços praticados no território mineiro.”.

A medida contida na proposição é relevante, especialmente se considerarmos a alta carga tributária no Estado, em especial aquela incidente nas operações com combustíveis e, mais ainda, nas operações com gasolina.

Destacamos que a competência para legislar sobre direito tributário, nos termos do art. 24, I, da Constituição Federal, é concorrente entre união, estados e Distrito Federal. Assim, o Estado está autorizado a legislar sobre o tema. Além disso, no que se refere à iniciativa para deflagar o processo legislativo, inexiste norma instituidora de iniciativa privativa do governador nesse sentido. O art. 66, III, da Constituição Estadual, estabelece as matérias de competência privativa do governador do Estado, entre as quais não se insere a matéria tributária.

O projeto em questão disciplina tema que pode ser considerado também afeto à comercialização e ao consumo, matéria de competência concorrente entre os estados, o Distrito Federal e a União, nos termos do art. 24, inciso V, da Constituição da República.

É importante registrar que, neste caso, a atuação legislativa do estado está condicionada aos limites estabelecidos pelos §§ 1º e 2º do art. 24 da Constituição da República, cabendo à União instituir normas gerais e aos demais entes federados exercer a competência complementar.

A União, no uso de sua competência constitucional, editou o Código de Defesa do Consumidor – CDC –, consubstanciado na Lei nº 8.078, de 1990, que contém as normas gerais sobre a matéria. O referido código dispõe no art. 6º, III, que é direito básico do consumidor a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.

Como se vê, o CDC contém normas que objetivam assegurar ao consumidor o direito à informação adequada e clara sobre os produtos comercializados no mercado de consumo. Todavia, a norma federal não minudencia a situação posta em apreciação pelo autor da proposição, de forma que cabe ao estado, no uso de sua competência legiferante suplementar, a instituição de obrigação que objetivará dar maior concreção e efetividade aos comandos já insertos na legislação consumerista federal.

Retomando a questão específica sobre tributos, esclarecemos que o Preço Médio Ponderado ao Consumidor Final – PMPF – compõe uma metodologia utilizada pelo estado para apuração da base de cálculo nas operações com combustíveis. Entretanto, essa metodologia não é de livre escolha pelos estados. Isso porque se relaciona a um imposto que tem regramento próprio no arcabouço normativo federal, a saber, o ICMS.

Em suma, o ICMS tem seu regramento disposto no art. 155 da Constituição Federal, na Lei Complementar nº 87, de 1996, conhecida como Lei Kandir, bem como em convênios do Conselho Nacional de Política Fazendária – Confaz. No tocante a este último, é conveniente ressaltar que os estados, com base na Lei Kandir e no Código Tributário Nacional, celebraram convênio com o intuito de disciplinar o procedimento para a fixação da margem de valor agregado na determinação da base de cálculo do ICMS incidente nas operações subsequentes com mercadorias sujeitas ao regime de substituição tributária. Esses são os contornos gerais seguidos por todos entes federados estaduais. Além disso, cada estado, no exercício de sua competência tributária, institui o ICMS e prevê suas regras específicas. Em Minas Gerais, temos a Lei nº 6.763, de 1975, e o respectivo regulamento. E, conforme já decidiu o STF, lei complementar federal, e não estadual, é a exigida pela Constituição Federal como elo indispensável entre os princípios nela contidos e as normas de direito local. Dessa feita, Minas necessariamente deve obediência ao disposto na legislação federal que define a base de cálculo do ICMS para fins de substituição tributária, que é a hipótese relativa às operações com combustíveis.

A referida legislação federal define também que a base de cálculo, para fins de substituição tributária, será, em relação às operações ou prestações subsequentes, obtida pelo somatório de inúmeras parcelas, entre as quais a margem de valor agregado, a qual será estabelecida com base em preços usualmente praticados no mercado considerado, obtidos por levantamento, ainda que por amostragem ou mediante informações e outros elementos fornecidos por entidades representativas dos respectivos setores, adotando-se a média ponderada dos preços coletados, devendo os critérios para sua fixação ser previstos em lei. Em substituição a esse critério, a base de cálculo em relação às operações ou prestações subsequentes poderá ser o preço a consumidor final usualmente praticado no mercado considerado, relativamente ao serviço, à mercadoria ou sua similar, em condições de livre concorrência.

Destacamos, na esteira do que já foi explanado e a título exemplificativo do PMPF, que o Convênio do Confaz ICMS nº 110, de 2007, estabelece as diretrizes para a definição da base de cálculo nas operações com combustíveis. Nos termos da cláusula sétima, a base de cálculo do imposto a ser retido é o preço máximo ou único de venda a consumidor fixado por autoridade competente.

Na falta desse preço, conforme a cláusula oitava, a base de cálculo será o montante formado pelo preço estabelecido por autoridade competente para o sujeito passivo por substituição tributária, ou, em caso de inexistência deste, pelo valor da operação acrescido dos valores correspondentes a frete, seguro, tributos, contribuições e outros encargos transferíveis ou cobrados do destinatário, adicionados, ainda, em ambos os casos, do valor resultante da aplicação dos percentuais de margem de valor agregado divulgados mediante Ato Cotepe publicado no Diário Oficial da União. O § 1º da cláusula oitava dispõe que, na hipótese em que o sujeito passivo por substituição tributária seja o importador, na falta do preço a que se refere a cláusula sétima, a base de cálculo será o montante formado pelo valor da mercadoria constante no documento de importação, que não poderá ser inferior ao valor que serviu de base de cálculo para o Imposto de Importação, acrescido dos valores correspondentes a tributos, inclusive o ICMS devido pela importação, contribuições, frete, seguro e outros encargos devidos pelo importador, adicionado, ainda, do valor resultante da aplicação dos percentuais de margem de valor agregado também previstos em Ato Cotepe.

Nos termos da cláusula 14ª, na hipótese em que a base de cálculo do imposto a ser retido por substituição tributária seja obtida mediante pesquisa realizada pela unidade federada, poderá, a critério desta, ser utilizado levantamento de preços efetuado por instituto de pesquisa de reconhecida idoneidade, inclusive sob a responsabilidade da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP – ou outro órgão governamental.

A cláusula 15ª do Convênio ICMS nº 110, de 2007, estabelece que o valor do imposto a ser retido por substituição tributária será calculado mediante a aplicação da alíquota interna prevista na legislação da unidade federada de destino sobre a base de cálculo obtida da forma anteriormente referida, deduzindo-se, quando houver, o valor do imposto incidente na operação própria. De acordo com o § 3º da cláusula 17ª, o valor do imposto cobrado em favor da unidade federada de origem da mercadoria abrangerá os valores do imposto efetivamente retido anteriormente e do relativo à operação própria.

O Ato Cotepe/ICMS 42/13 divulga as margens de valor agregado a que se refere a cláusula oitava do Convênio ICMS 110/07. São apresentados pelo referido ato os percentuais que as unidades federadas adotam como margem de valor agregado, quanto a combustíveis derivados ou não de petróleo, na hipótese em que o sujeito passivo por substituição seja distribuidora de combustíveis e demais remetentes de outras unidades da Federação, produtor nacional ou importador de combustíveis.

Com relação ao PMPF, Atos Cotepe/PMPF são editados quinzenalmente para divulgar o preço a ser adotado pelas unidades federadas para os seguintes combustíveis: gasolina comum, gasolina premium, diesel S10, óleo diesel, GLP (P13), querosene de aviação, etanol combustível (AEHC), GNV, GNI e óleo combustível.

Na esteira da lei federal, a lei mineira dispõe que a base de cálculo do ICMS na substituição tributária será o valor da operação, nele incluídos demais valores cobrados do destinatário, acrescido da Margem de Valor Agregado – MVA. Como alternativa a essa forma de apuração, a lei do Estado permite a utilização do PMPF. Por sua vez, o Regulamento do ICMS dispõe que o PMPF e a MVA serão fixados com base em preços usualmente praticados no mercado, obtidos por levantamento, ainda que por amostragem ou por dados fornecidos por entidades representativas dos respectivos setores, adotando-se a média ponderada dos preços coletados.

Destacamos que o regime de substituição tributária de combustíveis encontra-se detalhado na legislação estadual no Capítulo XIV do Anexo XV do Regulamento do ICMS – RICMS –, aprovado pelo Decreto nº 43.080, de 13 de dezembro de 2002. Em seu art. 76, é estabelecida a base de cálculo do imposto para fins de substituição tributária em relação às operações subsequentes nas operações com combustíveis.

O referido art. 76 apresenta ainda inúmeras hipóteses em que, em vez de se aplicar MVA obtida por meio de fórmula, são fixados percentuais variados, dependendo do tipo de operação e do combustível, elencados em seus dispositivos.

O Regulamento do ICMS estabelece ainda que a Diretoria de Informações Econômico-Fiscais da Superintendência de Arrecadação e Informações Fiscais – Dief/Saif –, após a realização da pesquisa relativa à apuração da MVA e do PMPF, cientificará as entidades representativas do setor envolvido na produção e na comercialização da mercadoria do resultado encontrado, caso em que estabelecerá prazo de 10 dias para que as entidades representativas se manifestem com a devida fundamentação. Decorrido esse período sem que tenha havido manifestação das entidades representativas do setor, considera-se validado o resultado da pesquisa, e a Secretaria de Estado de Fazenda procederá à implantação das medidas necessárias à fixação da MVA ou do PMPF apurado. Havendo manifestação, a Dief/Saif analisará os fundamentos apresentados e dará conhecimento às entidades envolvidas sobre a decisão, com a devida fundamentação.

Entretanto, o ponto nodal objeto do projeto de lei em análise é o de que sejam esclarecidos quais os critérios adotados pelo Fisco mineiro para apurar o PMPF, dentre aqueles possíveis, de acordo com a legislação já posta. Isso significaria uma densificação do princípio da transparência e estaria de acordo com a competência legislativa estadual.

Resta claro, desse modo, que o procedimento fiscal de apuração da base de cálculo presumida para efeito do ICMS na substituição tributária é devidamente regulada.

Note-se que se o PMPF não retratar a dinâmica de preços de mercado, acabará por constituir modo indireto de aumento de tributo e, consequentemente, estaremos diante de afronta ao princípio da legalidade, previsto no art. 150, I, da Constituição Federal, segundo o qual é vedado ao Estado aumentar tributo sem lei que o estabeleça.

Acerca do princípio da transparência, colacionamos jurisprudência do STF, no sentido de possibilidade de lei de iniciativa parlamentar dispor sobre publicidade de atos do Poder Executivo:

“Agravo regimental no recurso extraordinário. Representação

por inconstitucionalidade. Lei 4.718, de 11 de dezembro de 2007, do Município do Rio de Janeiro, que dispõe sobre o cadastro municipal de parceiros do terceiro setor. Lei de iniciativa parlamentar. Ausência de vício de formal de iniciativa. Princípio da publicidade. Precedente. 1. Conquanto seja admissível recurso extraordinário em face de acórdão de tribunal de justiça proferido em ação direta quando o parâmetro da constituição estadual reproduz norma da Constituição Federal de observância obrigatória pelos estados (Rcl nº 383/SP, Rel. Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, DJ 21/5/93), é inviável o conhecimento do recurso pela alínea ‘c’ do inciso III do art. 102 da Constituição Federal quando o acórdão recorrido declarar constitucional lei municipal contestada em face de constituição estadual. Precedentes. 2. Não configura vício formal de inconstitucionalidade o fato de o diploma legislativo questionado ter emanado de proposição de origem parlamentar. A contingência de a regra estar dirigida ao Poder Executivo, por si só, não implica que ela deva ser de iniciativa privativa do Poder Executivo, uma vez que nenhuma das hipóteses contidas no art. 61, § 1º, da Constituição foi objeto de positivação na norma. Esse entendimento está em sintonia com a jurisprudência da Corte no sentido de que não padece de inconstitucionalidade formal a lei resultante de iniciativa parlamentar que disponha sobre publicidade dos atos e contratos realizados pelo Poder Executivo (ADI nº 2.472/RS-MC, Relator Min. Maurício Corrêa, DJ de 3/5/02). A lei questionada enquadra-se no contexto de aprimoramento da necessária transparência das atividades administrativas, reafirmando e cumprindo o princípio constitucional da publicidade da administração pública (art. 37, caput, CF/88), não se tratando de matéria de iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo, mas de iniciativa concorrente. 3. Agravo regimental não provido.”. (recurso extraordinário nº 613.481-agravo regimental, Relator o Ministro Dias Toffoli, Primeira Turma, DJe 9.4.2014 – grifos nossos).

Ainda sob o viés da concreção do princípio da transparência, ressaltamos que a base de cálculo de um tributo é um dos aspectos da norma tributária impositiva. Dessa feita, conforme destacado pelo autor na justificação do projeto, se o contribuinte ou mesmo o cidadão, considerando-se aqui uma abordagem relativa ao Código de Defesa do Consumidor, não recebe do sujeito ativo, o Estado, as informações necessárias para compreender a base de cálculo aplicada, abre-se então uma margem, dentro da competência legislativa estadual, para se densificarem princípios, sejam eles afetos ao Código Tributário Nacional ou ao Código de Defesa do Consumidor, a fim de se dar publicidade a essa questão. E mais, conforme a jurisprudência do STF anteriormente citada, há ainda a questão da publicidade da administração pública a atrair a competência legislativa estadual para a matéria em exame.

E esse assunto assume maior relevância ao pensarmos em base de cálculo relativa à substituição tributária e, ainda mais especificamente, ao considerarmos os combustíveis, em que o Estado se vale do PMPF, o qual, por sua vez, como visto, pode ser obtido, com base na legislação federal e estadual, a partir de uma enumeração de critérios e de levantamento de preços. Assim, o contribuinte ou o cidadão não têm à sua disposição meios para entender quais os critérios eleitos, dentre aqueles previstos em lei, nem mesmo qual o levantamento de preços efetuado pela SEF.

E, ainda, recentemente, com a mobilização e a paralisação de determinadas categorias ocorridas no País, que tiveram como razão os altos preços dos combustíveis, tem-se mais um elemento que denota a relevância da matéria contida na proposição, que poderá ser melhor analisada na comissão de mérito, especialmente quanto, entre outras questões, ao impacto econômico-financeiro de o PMPF retratar adequadamente a dinâmica de preços de mercado.

Conclusão

Pelas razões expostas, concluímos pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade do Projeto de Lei nº 5.194/2018.

Sala das Comissões, 21 de maio de 2019.

Dalmo Ribeiro Silva, presidente – Guilherme da Cunha, relator – Bruno Engler – Zé Reis – Charles Santos – Ana Paula Siqueira – Celise Laviola.