PL PROJETO DE LEI 3601/2016

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 3.601/2016

Comissão de Agropecuária e Agroindústria

Relatório

De autoria do deputado Tadeu Martins Leite, a proposição “dispõe sobre terras devolutas estaduais e dá outras providências”.

Publicada no Diário do Legislativo de 14/6/2016, a matéria foi distribuída às Comissões de Constituição e Justiça, Agropecuária e Agroindústria e Administração Pública.

Em análise preliminar, a Comissão de Constituição e Justiça concluiu pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade do projeto de lei, com a Emenda nº 1, que apresentou.

Cabe a esta Comissão opinar sobre o mérito, nos termos do art. 188, combinado com o art. 102, IX, “c” e “e”, do Regimento Interno.

Fundamentação

A proposição em análise visa a tratar da temática das terras devolutas estaduais. Seu objetivo precípuo é organizar o tratamento jurídico dado ao tema, por meio da consolidação da esparsa legislação estadual existente, de forma a racionalizar a interpretação das matérias afetas às políticas agrária e fundiária, incrementando a sua eficiência na implantação e execução destas. Para tanto reúne, aprimora, acrescenta matéria aos conteúdos e, por fim, propõe a revogação da Lei nº 7.373, de 3 de outubro de 1978, da Lei nº 11.020, de 8 de janeiro de 1993, da Lei nº 14.313, de 19 de junho de 2002, e de parte da Lei nº 9.681, de 12 de outubro de 1988, que tratam respectivamente das terras públicas e devolutas estaduais, da legitimação e da doação dessas terras em zona urbana ou de expansão urbana, da isenção do pagamento de emolumentos por beneficiários de terras rurais e da concessão de terra devoluta.

A comissão que nos antecedeu contextualizou clara e objetivamente o arcabouço constitucional que conforma a temática das terras públicas brasileiras e mineiras:

“As terras devolutas são glebas que não se encontram no domínio particular por título legítimo e nem constituem próprios da União, dos estados ou dos municípios.

A Constituição da República estabelece, no inciso II de seu art. 20, que pertencem à União as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei. Segundo o inciso IV do art. 26, as demais pertencem aos estados em que se encontram.

A [Constituição Federal] impõe que a destinação de terras públicas e devolutas deve ser compatibilizada com a política agrícola e com o plano nacional de reforma agrária e exige que a alienação ou concessão de área superior a 2.500ha, a qualquer título, a pessoa física ou jurídica, ainda que por interposta pessoa, dependerá de prévia aprovação do Congresso Nacional, com exceção dos casos de destinação à reforma agrária. Ressalva, ainda, no § 5º do art. 225, como indisponíveis, as terras devolutas ou arrecadadas pelos estados por ações discriminatórias necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.

Na Constituição Mineira, as disposições específicas sobre terras devolutas estão previstas em diversos dispositivos.

Segundo o inciso XI do art. 10, compete ao Estado ‘instituir plano de aproveitamento e destinação de terra pública e devoluta, compatibilizando-o com a política agrícola e com o plano nacional de reforma agrária’ inseridos nos arts. 246 (relacionados ao direito a moradia nas áreas urbanas) e 247 (voltados à política rural).

No primeiro caso, o § 2º do art. 246 estabelece que podem ser legitimadas as terras devolutas de até 500m², quando situadas no perímetro urbano, ou de até 2.000m², quando situadas na zona de expansão urbana, assim considerada a faixa externa contígua ao perímetro urbano, de até 2km de largura, compatibilizada com o plano urbanístico municipal ou metropolitano. Esse dispositivo permite, ainda, ao ocupante, nas duas situações, a legitimação da área remanescente quando esta for insuficiente à constituição de um novo lote.

O § 3º do mesmo artigo determina que será onerosa a legitimação de terreno ocupado por proprietário de outro imóvel urbano ou rural no mesmo município de área superior a 1.000m² em zona de expansão urbana e da área remanescente. E o § 4º faculta ao Poder Executivo delegar aos municípios, nos termos da lei, a discriminação e a legitimação das terras devolutas situadas no perímetro urbano e na zona de expansão urbana.

No [que se refere à política rural], o art. 247 fixa como atribuição do Estado a adoção de programas de desenvolvimento rural destinados a fomentar a produção agropecuária, organizar o abastecimento alimentar, promover o bem-estar do homem que vive do trabalho da terra e fixá-lo no campo, compatibilizados com a política agrícola e com o plano de reforma agrária estabelecidos pela União.

Para a efetivação desses objetivos, o inciso IX do § 1º do citado artigo prevê a possibilidade de alienação ou concessão de terra pública para assentamento de trabalhador ou produtor rural, pessoa física ou jurídica, compatibilizada com os objetivos da reforma agrária e limitada a 100ha. O § 2º permite que isso ocorra uma única vez a cada beneficiário, que, de acordo com o § 4º, deve comprovar exploração efetiva da terra e vinculação pessoal a ela. Nesse caso, é outorgado título inegociável pelo prazo de 10 anos.

Segundo o § 6º do mesmo artigo, para a aquisição do domínio de terra devoluta estadual de área de até 250ha, contra pagamento de seu valor, acrescido dos emolumentos, é dada preferência a quem a tenha tornado economicamente produtiva e comprove sua vinculação pessoal a ela.

O § 7º, por seu turno, estabelece a quem são vedadas a alienação e a concessão de terras públicas, e o § 8º determina que, na ação judicial discriminatória, o estado poderá firmar acordo para a legitimação de terra devoluta rural, também com área de até 250ha, visando ao cumprimento da função social da propriedade e com a devolução, pelo ocupante, da área remanescente.

Nesse ponto, cabe lembrar que o inciso XXXIV do art. 62 da Constituição Mineira fixa como competência privativa da Assembleia Legislativa aprovar previamente a alienação ou a concessão de terra pública, com exceção daquelas localizadas no perímetro urbano, com área de até 500m², ou em zona de expansão urbana, com área de até 2.000m²; das que estiverem previstas no plano de reforma agrária estadual; daquelas constituídas por área rural não superior a 50ha a quem, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, a possua como sua por 5 anos ininterruptos, tenha nela sua moradia e a tenha tornado produtiva; daquelas decorrentes de ação judicial; e das com área de até 100ha”.

No que diz respeito ao mérito da proposição, cabe-nos destacar que, no contexto do ambiente rural, a terra é fator produtivo necessário e essencial à produção agropecuária, e a forma como ela é distribuída e apropriada determina as relações que compõem a questão agrária de uma região, seja ela um País, um estado federado ou um espaço geoeconômico e social. A condição de ser ou não proprietário da terra influencia nos resultados obtidos por quem produz por meio dela. A determinação da renda da terra, amplamente analisada por diversos estudiosos da questão agrária, explicita as consequências da concentração da propriedade privada desse fator produtivo, ao mesmo tempo que expõe a questão crítica do acesso ao direito de se produzir por meio dela.

Ao mesmo tempo, a questão agrária no Brasil e, por extensão, em Minas Gerais expõe o ponto crítico do estoque (muitas vezes indeterminado) de terras públicas devolutas sem destinação, e portanto, ociosas. A ociosidade desse estoque de fator produtivo em poder do Estado torna a terra um fator escasso, o que se contrapõe a uma população de trabalhadores rurais que demanda, por meio de movimentos sociais consolidados, o acesso à terra como meio de produção, fonte de renda, trabalho, dignidade e cidadania.

A análise de mérito, em termos do espaço urbano, busca refletir o esforço pela fruição do direito à moradia adequada, oficialmente reconhecido a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos, publicada em 1948. Mais do que reconhecer o direito do homem a possuir uma construção física na qual possa habitar, o conceito contemporâneo de moradia adequada é integrado por uma série de pressupostos: segurança de posse; disponibilidade de serviços, infraestrutura e equipamentos públicos; custo acessível; habitabilidade, ou seja, adequada provisão de condições de proteção contra riscos e de bem-estar; não discriminação e priorização de grupos vulneráveis; localização adequada, sob a ótica do desenvolvimento econômico, cultural e social; e adequação cultural, isto é, garantia de identidade cultural entre morador e moradia.

Os governos federais priorizaram, a partir de 2004, uma política nacional de habitação cujo objetivo principal foi conduzir o planejamento do setor habitacional, garantindo condições institucionais para a promoção do acesso à moradia digna a todos os segmentos da população. Essa estratégia originou-se de um arcabouço institucional que considera a habitação um direito do cidadão, conforme ordenado na Constituição Federal vigente, e que estabelece a função social da propriedade, de acordo com o Estatuto da Cidade (Lei Federal nº 10.257, de 2001).

A partir dessas premissas de mérito, entendemos ser importante a contribuição pretendida pelo projeto de lei em análise pois visa, por meio da consolidação da legislação referente às políticas agrária (meio rural) e fundiária (meio urbano), a dar maior aderência à sua execução no Estado. Como forma de aprimorar o trabalho do autor, entendemos que o texto merece ser adaptado para melhor ordenar os dispositivos de aplicação geral e os específicos para as políticas rural e urbana, de forma de ampliar os potenciais impactos positivos da norma, motivo pelo qual apresentamos o Substitutivo nº 1.

Além disso, recepcionamos, no substitutivo mencionado, os objetos apresentados pelo Projeto de Lei nº 758/2015, que regulamenta o § 7º do art. 246 e o § 9º do art. 247 da Constituição do Estado, que autorizam o Poder Executivo a promover a alienação e a concessão administrativa de terras públicas e devolutas sem prévia autorização legislativa, e o Projeto de Lei nº 1.778/2015, que autoriza o Poder Executivo a delegar aos municípios a discriminação e a legitimação das terras devolutas situadas no perímetro urbano e na zona de expansão urbana, por tratarem de matéria suplementar àquela sobre a qual versa a proposição em análise, ambos de iniciativa parlamentar.

Conclusão

Diante do exposto, somos pela aprovação do Projeto de Lei nº 3.601/2016, na forma do Substitutivo nº 1, a seguir apresentado.

SUBSTITUTIVO Nº 1

Dispõe sobre as terras devolutas de domínio do Estado, regulamenta os arts. 246 e 247 da Constituição do Estado e dá outras providências.

CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES INICIAIS

Art. 1º – Esta lei dispõe sobre as terras devolutas de domínio do Estado e sua destinação, bem como sobre as políticas rural e urbana de que tratam os arts. 246 e 247 da Constituição do Estado.

Parágrafo único – Para os efeitos desta lei, consideram-se terras devolutas de domínio do Estado as assim definidas pela Lei nº 601, de 18 de setembro de 1850, que lhe foram transferidas pela Constituição da República de 1891 e que não se compreendam entre as do domínio da União por força da Constituição da República de 1988.

Art. 2º – Para os efeitos desta lei, entende-se por:

I – zona urbana a parcela do território, contínua ou não, incluída no perímetro urbano pelo plano diretor ou por lei municipal específica;

II – zona de expansão urbana a faixa externa contígua ao perímetro urbano de até 2km (dois quilômetros) de largura ou aquelas assim definidas pela legislação municipal, compatibilizada com o plano urbanístico municipal ou metropolitano;

III – núcleo urbano o assentamento humano, com uso e características urbanas, constituído por unidades imobiliárias de área inferior à fração mínima de parcelamento, prevista na Lei Federal nº 5.868, de 12 de dezembro de 1972, independentemente da propriedade do solo, ainda que situado em área qualificada ou inscrita como rural;

IV – núcleo urbano informal o núcleo urbano clandestino, irregular ou no qual não foi possível realizar, por qualquer modo, a titulação de seus ocupantes, ainda que atendida a legislação vigente à época de sua implantação ou regularização;

V – regularização fundiária o conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais que visam à regularização de terras devolutas urbanas ou rurais e à titulação de seus ocupantes, de modo a garantir o direito social à moradia, o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado;

VI – Regularização Fundiária Urbana – Reurb –, a regularização fundiária destinada à incorporação dos núcleos urbanos informais ao ordenamento territorial urbano e à titulação de seus ocupantes.

VII – Reurb de Interesse Social – Reurb-S – a Reurb aplicável aos núcleos urbanos informais ocupados predominantemente por população de baixa renda, assim declarados em ato do Poder Executivo municipal;

VIII – demarcação urbanística o procedimento destinado a identificar os imóveis públicos e privados abrangidos pelo núcleo urbano informal e a obter a anuência dos respectivos titulares de direitos inscritos na matrícula dos imóveis ocupados, culminando com a averbação na matrícula desses imóveis da viabilidade da regularização fundiária, a ser promovida a critério do Município;

IX – legitimação fundiária o mecanismo de reconhecimento da aquisição originária do direito real de propriedade sobre unidade imobiliária objeto de Reurb, inclusive para as terras devolutas;

X – legitimação de domínio o mecanismo de reconhecimento da aquisição originária do direito real de propriedade sobre unidade imobiliária objeto ou não de Reurb, utilizada exclusivamente no âmbito das terras devolutas estaduais;

XI – zona rural a parcela de território localizada no campo, em região não urbanizada, destinada a atividades de agricultura e pecuária, extrativismo, turismo rural, silvicultura ou conservação ambiental;

XII – posse mansa e pacífica a posse exercida sem oposição;

XIII – reforma agrária o conjunto de medidas para promover a melhor distribuição da terra pública ou privada mediante modificações no regime de posse e uso e implantação de assentamentos rurais, a fim de atender aos princípios de justiça social, desenvolvimento rural sustentável e aumento de produção.

XV – vinculação pessoal à terra a residência em localidade que permita ao ocupante ou a seus familiares assistência permanente à área e sua efetiva utilização econômica.

Art. 3º – O Estado promoverá a preservação do patrimônio natural e cultural e a utilização racional das terras devolutas de seu domínio, com o objetivo de fomentar a produção agropecuária, de organizar o abastecimento alimentar, de promover o bem-estar do homem que vive do trabalho da terra e fixá-lo no campo e de colaborar para o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e o bem-estar de seus habitantes.

Art. 4º – A destinação de terras devolutas será compatibilizada com a política agrícola e com o plano nacional de reforma agrária, nos termos do inciso XI do art. 10 da Constituição do Estado, e com o Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado, os planos diretores e os objetivos de preservação e proteção dos patrimônios natural e cultural do Estado.

Parágrafo único – O órgão responsável pelo planejamento estadual promoverá a compatibilização de que trata o caput, em articulação, pelo menos, com os órgãos ou as entidades que atuem nas áreas de administração de patrimônio, de desenvolvimento rural, de desenvolvimento urbano, de trabalho, de recursos hídricos, de meio ambiente e de preservação do patrimônio histórico, paisagístico e cultural do Estado.

Art. 5º – A destinação das terras devolutas rurais respeitará, em consonância com a função social da propriedade, as seguintes prioridades:

I – regularização fundiária, em especial a relativa aos povos e comunidades tradicionais, nos termos da Lei nº 21.147, de 14 de janeiro de 2014;

II – assentamento de trabalhadores rurais e urbanos e produtores rurais;

III – reassentamento dos atingidos por grandes empreendimentos;

IV – proteção dos ecossistemas naturais e preservação de sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, espeleológico, paleontológico, ecológico e científico;

V – colonização.

Art. 6º – A destinação das terras devolutas urbanas, observados a função social da propriedade e o disposto na legislação municipal e o interesse público ou social, respeitará as seguintes prioridades:

I – regularização fundiária;

II – construção de habitações populares;

III – execução de obras públicas;

IV – implantação de núcleos industriais;

V – realização de serviços públicos;

VI – preservação de recursos naturais e culturais, principalmente águas, florestas, biomas, vegetação de preservação permanente e sítios de interesse paisagístico, histórico e cultural;

VII – utilização por entidades e órgãos públicos federais, estaduais e municipais.

Art. 7º – As terras devolutas indisponíveis e as terras devolutas reservadas não serão objeto de alienação nem de concessão.

Art. 8º – Terras devolutas indisponíveis são aquelas necessárias:

I – à instituição de unidades de conservação ambiental;

II – à preservação de sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, espeleológico, paleontológico, ecológico e científico;

III – à proteção de mananciais indispensáveis ao abastecimento público.

Parágrafo único – Será permitida, na forma de regulamento, a regularização fundiária de área devoluta cuja posse for comprovada em data anterior à declaração da área como unidade de conservação de uso sustentável, desde que preenchidos todos os requisitos desta lei à época.

Art. 9º– São terras devolutas reservadas:

I – as necessárias à fundação de povoado ou de núcleo colonial e à construção de equipamento público federal, estadual ou municipal;

II – as adjacentes às quedas d'água passíveis de aproveitamento industrial em instalações hidráulicas;

III – as que contenham minas e fontes de águas minerais e termais passíveis de utilização industrial, terapêutica ou higiênica, bem como os terrenos adjacentes necessários a sua exploração;

IV – as necessárias à construção de estradas de rodagem, ferrovias, campos de pouso, aeroportos e barragens públicos.

§ 1º – As terras devolutas reservadas serão assim declaradas a requerimento do órgão ou da entidade interessados, com a interveniência do órgão do Poder Executivo estadual responsável pela gestão das terras devolutas, por decreto do Poder Executivo, que mencionará a localização, a dimensão, a natureza, as confrontações, os objetivos e as demais especificações da área reservada.

§ 2º – Não poderão ter destinação diversa as terras devolutas reservadas na forma do § 1º, salvo para atender a outro fim de interesse público ou social.

Art. 10 – As terras devolutas rurais não indisponíveis nem reservadas serão objeto de alienação ou de concessão para fins de regularização fundiária.

Art. 11 – O Estado reconhecerá como legítima a propriedade:

I – que não for considerada devoluta nos termos do § 1º do art. 1º;

II – ocupada pelos remanescentes das comunidades dos quilombos, nos termos do art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição da República;

III – demarcada como área dos povos e comunidades tradicionais, assim autorreconhecidos, nos termos da Lei nº 21.147, de 2014.

CAPÍTULO II

DA IDENTIFICAÇÃO E DISCRIMINAÇÃO DAS TERRAS DEVOLUTAS

Art. 12 – O Poder Executivo do Estado, por meio de seus órgãos ou entidades responsáveis pela gestão das terras devolutas, promoverá:

I – a identificação técnica e o cadastramento das terras devolutas de domínio estadual, conforme estabelecido no § 3º do art. 18 da Constituição do Estado;

II – a alienação e a concessão de terras devolutas estaduais.

Art. 13 – A identificação técnica de terras devolutas necessária à aplicação do disposto nesta lei será feita consoante o princípio de regionalização da ação administrativa do Estado.

Art. 14 – A identificação técnica das terras devolutas de que trata o inciso I do art. 12 será feita pela discriminação administrativa ou judicial das terras devolutas, a fim de serem descritas, medidas e estremadas do domínio particular, conforme regulamento expedido pelo responsável pelas terras devolutas do Estado.

§ 1º – A discriminação administrativa ou judicial observará o disposto na legislação federal pertinente.

§ 2º – O órgão ou a entidade do Poder Executivo do Estado responsável pela regularização fundiária urbana ou rural poderá, fundamentadamente, dispensar o procedimento discriminatório administrativo para áreas presumivelmente devolutas de até 100ha (cem hectares), quando necessário ao atendimento do interesse público ou social e ao cumprimento da função social da propriedade;

§ 3º – A medição e a demarcação das terras devolutas rurais serão feitas com observância das normas técnicas próprias ou estabelecidas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra –, facultado ao Estado delegar sua execução, no todo ou em parte.

§ 4º – O órgão ou a entidade responsável pela proteção dos patrimônios natural e cultural do Estado, antes de instaurar o procedimento discriminatório, será devidamente cientificado e emitirá parecer, no prazo de trinta dias, que instruirá o processo, sobre a subsunção das terras devolutas indisponíveis ou reservadas, nos termos dos arts. 8º e 9º desta lei.

§ 5º – Compete ao dirigente do órgão ou da entidade da administração pública responsável pela gestão das terras devolutas a revisão, mediante recurso, de ato de comissão especial nos processos discriminatórios administrativos de terras devolutas.

§ 6º – No procedimento discriminatório, o Estado poderá firmar acordo para a legitimação de terra devoluta rural, observado o limite estabelecido no § 8º do art. 247 da Constituição do Estado e atendidos os seguintes requisitos:

I – cumprimento da função social, nos termos do art. 186 da Constituição da República;

II – devolução, pelo ocupante, da área remanescente.

Art. 15 – Haverá a dispensa prevista no § 2º do art. 14 no caso de áreas precedidas de demarcação urbanística, para fins de regularização fundiária urbana, na forma da lei.

§ 1º – O município poderá discriminar e legitimar terras presumivelmente devolutas situadas em zona urbana ou em zona de expansão urbana, desde que haja prévia aprovação do Estado, mediante convênio ou instrumento congênere.

§ 2º – Constatado o caráter devoluto da área objeto da demarcação, o oficial de registro de imóveis abrirá matrícula em nome do Estado, sem prejuízo da elaboração do projeto de regularização fundiária pelo ente promotor da regularização.

Art. 16 – Tratando-se de áreas devolutas urbanas, o Estado poderá solicitar ao registro de imóveis competente a abertura de matrícula de parte ou da totalidade dos imóveis, independentemente da realização do processo discriminatório, na forma do art. 195-B da Lei Federal nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, por meio de requerimento acompanhado dos seguintes documentos:

I – planta e memorial descritivo do imóvel público a ser matriculado, dos quais constem a sua descrição, com medidas perimetrais, área total, localização, confrontantes e coordenadas preferencialmente georreferenciadas dos vértices definidores de seus limites;

II – comprovação de intimação dos confrontantes para que informem, no prazo de quinze dias, se os limites definidos na planta e no memorial descritivo do imóvel público a ser matriculado se sobrepõem a suas respectivas áreas, se for o caso;

III – as respostas à intimação prevista no inciso II, quando houver.

Parágrafo único – Recebido o requerimento na forma prevista no caput, o oficial de registro de imóveis abrirá a matrícula em nome do Estado, independentemente do regime jurídico do bem público.

Art. 17 – Sempre que apurada a inexistência de domínio privado ou devoluto da União sobre determinada terra, mediante procedimento discriminatório ou dispensa deste, nos termos do art. 14, o Estado a arrecadará, por meio de ato do dirigente do órgão ou entidade competente, do qual constarão a situação do imóvel, suas características, confrontações e denominação.

§ 1º – Expedido o ato a que se refere o caput, será encaminhado ofício ao cartório de registro de imóveis competente, instruído com cópia de sua publicação e demais documentos necessários ao processo de registro, para a abertura de matrícula do imóvel.

§ 2º – Aberta a matrícula a que se refere o § 1º, o órgão ou a entidade responsável pela arrecadação comunicará o órgão ou a entidade responsável pela administração de imóveis do Estado, para fins do disposto nos §§ 3º e 4º do art. 18 da Constituição do Estado.

§ 3º – A dispensa de que trata o § 2º do art. 14 poderá ser utilizada para fins de arrecadação de terras rurais acima de 100ha (cem hectares) pelo órgão competente, desde que, além da fundamentação prevista, sejam declaradas devolutas por contratos de arrendamentos firmados pelo Estado e seja manifestado por escrito, pelo arrendatário ou seu sucessor, interesse na devolução.

CAPÍTULO III

DA ALIENAÇÃO E DA CONCESSÃO DE TERRAS PÚBLICAS ESTADUAIS

Seção I

Disposições Gerais

Art. 18 – Dependem de prévia autorização da Assembleia Legislativa a alienação ou a concessão, a qualquer título, de terra pública, ressalvadas:

I – a alienação ou a concessão prevista no plano de reforma agrária estadual, aprovada em lei;

II – a concessão gratuita de domínio de que trata o art. 24 desta lei;

III – a legitimação de domínio de terras devolutas urbanas;

IV – alienações ou concessões decorrentes de projetos de regularização fundiária urbana, assim definidos na forma da lei.

§ 1º – Cumpridos os requisitos dos arts. 14, 15 ou 16, a alienação ou a concessão de que trata este artigo poderá ser autorizada, independentemente da instauração de processo discriminatório administrativo ou judicial, mediante motivação demonstrada nos autos do processo.

§ 2º – As alienações ou concessões previstas nesta lei dependerão de avaliação prévia, ainda que procedidas sem ônus aos beneficiários.

§ 3º – Serão encaminhados à Assembleia Legislativa, com cópia para o Ministério Público Estadual e o Tribunal de Contas do Estado:

I – a relação das terras públicas, inclusive as devolutas, situadas no perímetro urbano, na zona de expansão urbana e na zona rural a serem alienadas ou concedidas administrativamente sem prévia autorização legislativa, com antecedência mínima de noventa dias em relação à expedição do título ou à celebração do contrato;

II – o relatório anual das atividades relacionadas com a alienação e a concessão administrativa, sem prévia autorização legislativa, de terras públicas, inclusive as devolutas. situadas no perímetro urbano, na zona de expansão urbana e na zona rural.

§ 4º – A relação e os relatórios a que se refere o § 3º serão subscritos pelo dirigente do órgão ou da entidade responsável pela gestão das terras públicas do Estado, inclusive as devolutas.

§ 5º – A relação de que trata o inciso I do § 3º será feita discriminando-se as terras de acordo com a zona em que estiverem situadas, caracterizando-a como urbana, de expansão urbana ou rural, e conterá, no mínimo, as seguintes informações:

I – quanto ao beneficiário:

a) nome completo;

b) identificação pelo número do Cadastro de Pessoas Físicas – CPF – e da Carteira de Identidade;

c) domicílio;

d) profissão;

II – quanto ao imóvel:

a) localização;

b) local de origem, se houver);

c) dimensão;

d) propósito para o qual é utilizado;

e) nome dos confrontantes;

III – quanto aos fins almejados, a especificação do procedimento como sendo de regularização fundiária, assentamento urbano ou rural, transformação em perímetro público de irrigação ou outro;

IV – quanto ao instrumento jurídico utilizado, a especificação do procedimento como sendo de concessão gratuita de domínio, alienação por preferência, alienação onerosa, concessão de direito real de uso, doação, concessão ou alienação realizada por município ou outro.

§ 6º – O relatório de que trata o inciso II do § 3º será feito discriminando-se as terras de acordo com a zona em que estiverem situadas, caracterizando-a como urbana, de expansão urbana ou rural, e conterá, no mínimo, as seguintes informações:

I – nome completo e número do CPF e da Carteira de Identidade do beneficiário;

II – dimensão e localização da área;

III – breve relato das ações empreendidas pelo órgão ou pela entidade responsável pela gestão das terras públicas, inclusive as devolutas, para a consecução da política agrária e fundiária do Estado.

Art. 19 – A cessão de posse de terra devoluta somente poderá ser feita antes de iniciado o procedimento administrativo e desde que não objetive frustrar a observância dos limites e das vedações previstos nesta lei.

Art. 20 – Os processos de alienação ou concessão de terras devolutas serão instruídos, no mínimo, por:

I – certidão de nascimento, certidão de casamento, declaração de união estável ou, tratando-se de pessoa jurídica, registro civil ou comercial, acompanhado de cópia do contrato ou do estatuto social;

II – declaração dos confrontantes, por eles assinada, de concordância com a medição e com a demarcação da área, quando não precedidas de ação discriminatória;

III – cadastro do beneficiário, em formulário próprio, por ele assinado;

IV – documento comprobatório de direito sobre a área e da origem desse direito;

V – certidão de registro da área em nome do beneficiário ou de seus antecessores;

VI – declaração do beneficiário, por ele assinada, de que não é proprietário de área que exceda o limite estabelecido no § 8º do art. 247 da Constituição do Estado;

VII – planta e memorial descritivo da área;

VIII – parecer do órgão ou entidade responsável favorável à alienação ou à concessão da área, acompanhado de relatório do processo;

IX – declaração do beneficiário, por ele assinada, de que não se encontra em nenhuma das situações previstas nos incisos I a IX do art. 41 desta lei;

X – laudo de identificação fundiária rural, preenchido e assinado por servidores do órgão da administração direta ou indireta responsável pelas terras devolutas estaduais.

§ 1º – O requerimento de legitimação de domínio de terras devolutas urbanas, acompanhado dos documentos enumerados nos incisos I a IX do caput, será instruído pelos seguintes documentos:

I – certidão, expedida pelo órgão municipal competente, da existência de edificação, na hipótese da alínea “a” do inciso I do § 1º do art. 35 desta lei;

II – no caso de utilização da área para fins de agricultura urbana, declaração do Poder Executivo municipal de que a atividade exercida não contraria a legislação urbanística do município.

§ 2º – Os processos relativos a alienação ou a concessão de terras devolutas que dependam de autorização legislativa serão encaminhados pelo Governador à Assembleia Legislativa, após parecer do órgão ou da entidade responsável pela gestão das terras devolutas em que tramitar o processo, observado o disposto no § 4º do art. 14 desta lei, e antes de efetuado o pagamento do respectivo preço.

§ 3º – O título resultante do procedimento de alienação ou de concessão será conferido preferencialmente à mulher, independentemente do estado civil, nos termos e nas condições previstos em lei.

§ 4º – O título resultante do procedimento de alienação ou de concessão de terras devolutas, bem como o de reconhecimento de domínio, será assinado pelo Governador do Estado.

Art. 21 – Considera-se originário o título definitivo de propriedade expedido pelo Estado nos termos desta lei.

Seção II

Da Alienação e da Concessão de Terras Devolutas Rurais

Art. 22 – São formas de alienação ou de concessão de terras devolutas rurais:

I – concessão gratuita de domínio;

II – alienação por preferência;

III – legitimação de posse;

IV – concessão de direito real de uso;

V – alienação ou concessão de uso para beneficiário de assentamento.

Art. 23 – Para fins de aplicação do disposto nesta seção, considera-se como exploração econômica:

I – nos terrenos para agricultura, a utilização comprovada de, no mínimo, 30% (trinta por cento) da área aproveitável;

II – nos terrenos para pecuária, a utilização comprovada de, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) da área aproveitável como área de pastagem que comporte três cabeças de gado vacum ou similar por alqueire geométrico;

III – no caso de exploração mista da área, de utilização comprovada de, no mínimo, 40% (quarenta por cento) da área aproveitável.

Subseção I

Da Concessão Gratuita de Domínio

Art. 24 – O título de concessão gratuita de domínio será outorgado a quem, não sendo proprietário de imóvel rural, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra devoluta rural não superior a 50ha (cinquenta hectares), tenha nela sua moradia e a tenha tornado produtiva.

Art. 25 – Aplica-se a concessão gratuita de domínio ao ocupante de terra devoluta rural cuja área se encontre inserida em unidades de conservação de uso sustentável, desde que seja comprovado o exercício da posse anterior ao ato de criação da unidade.

Parágrafo único – É permitida a concessão gratuita de domínio de terra devoluta rural à população tradicional residente em unidades de conservação de uso sustentável.

Subseção II

Da Alienação por Preferência

Art. 26 – Aquele que tornar economicamente produtiva terra devoluta estadual e comprovar sua vinculação pessoal à terra terá preferência para adquirir-lhe o domínio, observado o limite de área de que trata o § 8º do art. 247 da Constituição do Estado, contra o pagamento do seu valor, acrescido dos emolumentos.

Subseção III

Da Legitimação de Posse

Art. 27 – Tem direito à legitimação de posse quem, não sendo proprietário de imóvel rural, ocupe terra devoluta rural cuja área não exceda o limite de que trata o § 8º do art. 247 da Constituição do Estado, tornando-a produtiva com seu trabalho e o de sua família e tendo-a como principal fonte de renda.

Art. 28 – A legitimação de posse consiste no fornecimento de licença de ocupação, pelo prazo mínimo de quatro e máximo de dez anos, finda a qual o ocupante terá preferência para aquisição do domínio, desde que atendidos os requisitos previstos no art. 27 desta lei.

§ 1º – A licença de ocupação será intransferível inter-vivos e inegociável, não podendo ser objeto de penhora ou de arresto.

§ 2º – A licença de ocupação é documento hábil para obtenção de:

I – licença necessária ao uso da terra;

II – crédito rural.

Subseção IV

Da Concessão de Direito Real de Uso

Art. 29 – A concessão de direito real de uso de terra devoluta estadual, pelo prazo máximo de dez anos, como direito real resolúvel, para fins específicos de uso e cultivo da terra, observado o limite de área de que trata o § 8º do art. 247 da Constituição do Estado, será outorgada a quem comprovar exploração efetiva e vinculação pessoal à terra.

§ 1º – A concessão de direito real de uso será formalizada por meio de instrumento particular de contrato ou de termo administrativo e inscrita em livro especial.

§ 2º – O concessionário, desde a inscrição da concessão de direito real de uso, fruirá plenamente do terreno para os fins estabelecidos no instrumento particular de contrato ou no termo administrativo e responderá por todos os encargos civis, administrativos e tributários que vierem a incidir sobre o imóvel e suas rendas.

§ 3º – Resolver-se-á a concessão de direito real de uso antes do seu termo se o concessionário der ao imóvel destinação diversa da estabelecida no instrumento particular de contrato ou no termo administrativo ou se incidir em cláusula resolutória do ajuste, perdendo, neste último caso, as benfeitorias de qualquer natureza.

§ 4º – Decorrido o prazo de que trata o caput e comprovadas a exploração efetiva e a vinculação pessoal à terra, nas condições estabelecidas no instrumento particular de contrato ou no termo administrativo, será outorgado ao concessionário título de propriedade, após o pagamento do valor da terra, acrescido dos emolumentos.

§ 5º – A concessão de direito real de uso é nominal e intransferível, exceto causa mortis, situação em que o cônjuge supérstite ou os herdeiros, desde que domiciliados no imóvel, poderão assinar termo, tomando a si as obrigações do de cujus.

§ 6º – As terras arrecadas na forma do § 3º do art. 17 só poderão ser destinadas por meio de concessão de direito real de uso.

Subseção V

Da Alienação ou da Concessão de Uso para Beneficiário de Assentamento

Art. 30 – Será outorgado título de domínio ou de concessão de uso, inegociável pelo prazo de dez anos, ao beneficiário da alienação ou da concessão, a qualquer título, de terra pública para assentamento de trabalhador rural ou produtor rural, pessoa física ou jurídica, ainda que por interposta pessoa, que comprovar exploração efetiva e vinculação pessoal à terra, limitado à área de que trata o inciso IX do § 1º do art. 247 da Constituição do Estado.

Seção III

Da Isenção de Custas e Emolumentos e do Preço e do Pagamento da Terra Devoluta Rural

Art. 31 – Os beneficiários de terras rurais de até 50ha (cinquenta hectares) obtidas por meio de programa de reforma agrária ou de regularização fundiária promovida por órgão ou entidade da União ou do Estado ou por meio da alienação ou concessão de terras devolutas a que se refere a Constituição do Estado ficam isentos:

I – dos emolumentos ou de outros valores ou acréscimos cobrados a título de serviços de medição, demarcação, elaboração de planta e memorial descritivo de imóveis rurais, exceto quando se tratar de alienação por preferência;

II – dos emolumentos cartoriais incidentes sobre os atos relativos ao registro de títulos translativos de domínio de imóveis rurais e sobre a certidão, positiva ou negativa, de registro de área em nome do beneficiário ou de seus antecessores, bem como da respectiva Taxa de Fiscalização Judiciária;

III – da Taxa Judiciária e das custas judiciais devidas nas ações em que as terras referidas no caput integrem a causa de pedir, inclusive do pagamento de valores cobrados nos autos a título de prestação dos serviços a que se refere o inciso I.

Parágrafo único – Os beneficiários a que se refere o caput compreendem aqueles atendidos por políticas públicas federais, estaduais e municipais que promovam o acesso à terra para a agricultura familiar rural, urbana e periurbana, incluindo regularização fundiária, ações discriminatórias, crédito fundiário, legitimação de terras quilombolas, perímetros públicos irrigados e demais programas de assentamento e de colonização.

Art. 32 – A terra devoluta rural objeto de alienação ou de concessão será avaliada e terá seu preço fixado por hectare, em ato normativo do órgão ou da entidade responsável pela gestão das terras devolutas do Estado.

§ 1º – A avaliação a que se refere o caput observará, no mínimo, os seguintes critérios:

I – a dimensão e a localização da terra;

II – a capacidade de uso da terra;

III – os recursos naturais intrínsecos;

IV – o preço corrente na localidade.

§ 2º – O ato normativo a que se refere este artigo conterá tabela de preços diferenciados por região geoeconômica e social do Estado, os quais não excederão 70% (setenta por cento) dos valores apurados na forma do § 1º.

§ 3º – A tabela a que se refere o § 2º será revista a cada período de doze meses, sem prejuízo da atualização monetária de seus valores pelo índice oficial de inflação.

Art. 32 – Serão estabelecidos em ato normativo do órgão ou da entidade responsável o valor e a forma de pagamento, pelo beneficiário da alienação ou da concessão, dos emolumentos correspondentes aos serviços de medição, de demarcação e de elaboração de planta e memorial descritivo da terra pública rural.

Art. 33 – Na alienação ou na concessão, a qualquer título, de terra devoluta rural de até 50ha (cinquenta hectares), é facultado ao beneficiário optar pelo pagamento à vista ou a prazo, o qual não poderá ultrapassar dez parcelas anuais e sucessivas, a juros de 6% (seis por cento) ao ano, corrigidas monetariamente, de acordo com os índices oficiais de inflação.

§ 1º – Na forma de pagamento a prazo, será concedido ao beneficiário título provisório, no qual constarão as obrigações assumidas pelos contratantes.

§ 2º – Enquanto não for integralizado o pagamento, que poderá ser feito antecipadamente a qualquer tempo, é defesa a transferência do título provisório a terceiros sem prévia anuência do órgão da administração pública direta ou indireta.

§ 3º – Sobrevindo o óbito do contratante, será considerado quitado o débito, expedindo-se o título definitivo de propriedade ao cônjuge supérstite, aos herdeiros e aos sucessores legais.

Seção IV

Da Alienação e da Concessão de Terras Devolutas Urbanas

Art. 34 – A alienação e a concessão de terras devolutas urbanas se dará por legitimação de domínio, que deverá ser conciliada, sempre que possível, com a regularização urbanística, ambiental e social.

Art. 35 – A legitimação de terras devolutas situadas no perímetro urbano ou na zona de expansão urbana, observada a legislação municipal, é limitada, respectivamente, a 500 m² (quinhentos metros quadrados) e a 2.000 m² (dois mil metros quadrados), permitida ao ocupante a legitimação da área remanescente se esta for insuficiente à constituição de um novo lote.

§ 1º – Poderá obter a legitimação de domínio em terras devolutas, observadas as condições estabelecidas no caput, aquele que, comprovada a posse mansa e pacífica, venha possuindo:

I – em área inserida em núcleo urbano informal:

a) há no mínimo um ano, terra devoluta edificada;

b) há no mínimo dois anos, terra devoluta não edificada;

II – em área situada em zona urbana, há no mínimo um ano, terra devoluta edificada;

III – em área inserida em zona de expansão urbana, há no mínimo dois anos, terra devoluta edificada.

§ 2º – O disposto no caput aplica-se também às terras devolutas situadas em parcelamentos irregulares ou clandestinos.

§ 3º – A legitimação de domínio utilizada para fins de Reurb obedecerá aos parâmetros urbanísticos nela previstos, respeitado o limite de área estabelecido no caput.

§ 4º – O órgão responsável pela gestão das terras devolutas urbanas poderá, na forma de regulamento, negar a concessão da legitimação de domínio de que trata esta lei, na hipótese de a outorga impedir ou dificultar a realização de plano urbanístico, a regularização fundiária ou outro plano de comprovado interesse público ou social.

§ 5º – O requerimento da legitimação a que se refere o caput será apresentado pelo ocupante ou seus herdeiros ou sucessores, perante o órgão estadual competente, na forma de regulamento.

Art. 36 – Será onerosa a legitimação:

I – de terreno ocupado por proprietário de outro imóvel urbano ou rural no mesmo município;

II – de área superior a 1.000m2 (mil metros quadrados), situada em zona de expansão urbana, assim definida pela legislação municipal;

III – da área remanescente;

IV – da área ou lote urbano usado exclusivamente para fins comerciais ou industriais.

Art. 37 – O título de legitimação de domínio será registrado no cartório de registro de imóveis e ensejará a abertura da competente matrícula, acaso inexistente.

Art. 38 – As terras devolutas situadas em núcleos urbanos informais, utilizadas para fins de produção rural, nos termos da Lei nº 15.973, de 12 de janeiro de 2006, serão regularizadas de acordo com as formas de alienação ou concessão rural.

Seção V

Da Isenção de Custas e Emolumentos e do Preço e do Pagamento da Terra Devoluta Urbana

Art. 39 – Nas legitimações de domínio concedidas no âmbito da Reurb-S aplicam-se as isenções previstas na legislação federal pertinente, sendo dispensada a cobrança de custas, emolumentos e taxas relativas aos atos notariais e de registro de imóveis, quando constatado o interesse social da ocupação.

Parágrafo único – As isenções a que se refere o caput também se aplicam às legitimações de terras devolutas quando a ocupação for de interesse social e a área regularizada não exceder o limite de 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados).

Art. 40 – O preço da terra nua devoluta urbana, nos casos em que a alienação for onerosa, será fixado com base em avaliação do preço de mercado da terra nua.

§ 1º – Os valores a serem pagos pelo beneficiário não ultrapassarão 70% (setenta por cento) do valor de mercado.

§ 2º – Será observada a renda familiar para a fixação do percentual referenciado no § 1º.

§ 3º – Serão estabelecidos, por meio de ato normativo de órgão ou entidade responsável, a relação entre a renda familiar e o percentual da terra nua a ser pago pelo beneficiário, a forma de pagamento e, quando couber, os valores dos serviços técnicos.

Seção VI

Das Vedações

Art. 41 – É vedada a alienação e a concessão de terra pública prevista nesta lei, ainda que por interposta pessoa:

I – ao Governador e ao Vice-Governador do Estado;

II – a Secretário e a Secretário Adjunto de Estado;

III – a Prefeito e a Vice-Prefeito de município;

IV – a dirigente de órgão ou entidade da administração pública direta e indireta;

V – a membro do Poder Judiciário ou Ministério Público;

VI – a Senador, a Deputado Federal ou Estadual e a Vereador;

VII – a servidor de órgão ou entidade da administração pública vinculado ao sistema de política rural e urbana do Estado;

VIII – a proprietário de mais de 250ha (duzentos e cinquenta hectares);

IX – a pessoa jurídica estrangeira e àquela cuja titularidade do poder decisório seja de estrangeiro.

§ 1º – A vedação de que trata este artigo se estende ao cônjuge e aos parentes consanguíneos ou afins, até o terceiro grau, ou por adoção, das pessoas indicadas nos incisos I a VII.

§ 2º – A alienação ou a concessão, a qualquer título, de terra pública para fins de assentamento de produtor rural será permitida uma única vez, observado o limite de que trata o inciso IX do § 1º do art. 247 da Constituição do Estado, e com prévia autorização da Assembleia Legislativa, ainda que a negociação se verifique após o prazo de dez anos a que se refere o art. 30.

§ 3º – Na alienação ou concessão de terra pública rural, ainda que por interposta pessoa, será observado o limite de área de que trata o § 8º do art. 247 da Constituição do Estado.

§ 4º – São nulas de pleno direito a alienação ou a concessão de terras devolutas efetivadas em desacordo com o disposto nesta lei, caso em que estas reverterão ao patrimônio do Estado.

§ 5º – O disposto no § 1º não se aplica ao parente de beneficiário de terra pública que tenha estado na posse de área por mais de um ano, até 8 de julho de 1998, nos termos do art. 95 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT – da Constituição do Estado, acrescentado pela Emenda nº 34.

§ 6º – A legitimação de mais de uma área devoluta no perímetro urbano em nome da mesma pessoa é condicionada à posse mansa e pacífica do terreno edificado por prazo superior a um ano, até 8 de julho de 1998, nos termos do art. 96 do ADCT da Constituição do Estado, acrescentado pela Emenda nº 34.

CAPÍTULO IV

DA REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA URBANA – REURB – EM TERRAS ESTADUAIS

Art. 42 – Os municípios poderão celebrar convênios ou instrumentos congêneres com o Estado, para fins de implantação da Reurb.

Art. 43 – Fica autorizada a doação de terras estaduais aos municípios para a execução de Reurb-S, atendidos os requisitos estabelecidos pelo órgão ou pela entidade estadual responsável pela regularização fundiária urbana.

Art. 44 – O pedido de doação de terras estaduais para regularização fundiária de núcleos urbanos informais será encaminhado:

I – ao órgão ou à entidade responsável pela discriminação e arrecadação de terras devolutas;

II – ao órgão ou à entidade responsável pela gestão patrimonial do Estado, no caso de terras não devolutas.

§ 1º – Os pedidos de doação deverão ser instruídos pelo município com os seguintes documentos:

I – pedido de doação devidamente fundamentado e assinado por seu representante;

II – comprovação das condições de ocupação;

III – planta e memorial descritivo do perímetro da área pretendida, conforme estabelecido pelo órgão ou pela entidade estadual responsável pela regularização fundiária urbana;

IV – cópia do plano diretor ou da lei municipal que disponha sobre o ordenamento territorial urbano;

V – relação de acessões e benfeitorias estaduais existentes na área pretendida e sua respectiva identificação e localização;

VI – indicação da modalidade de Reurb a ser implantada.

§ 2º – Regulamento poderá dispor sobre a exigência de documentação suplementar àquela de que trata o § 1º;

§ 3º – Caberá ao órgão ou à entidade estadual responsável pela regularização fundiária urbana analisar a documentação apresentada pelo município;

§ 4º – Os órgãos ou as entidades responsáveis pela gestão patrimonial do Estado e pela regularização fundiária urbana emitirão parecer conclusivo sobre o pedido de doação.

Art. 45 – Fica autorizada a doação aos municípios de terras devolutas estaduais situadas em zona urbana por eles ocupadas, até a data de publicação desta lei, desde que edificadas e destinadas à prestação de serviço público.

Parágrafo único – É indispensável para a aquisição do imóvel a que se refere o caput a abertura de matrícula por meio de procedimento discriminatório administrativo ou do procedimento previsto no art. 16.

Art. 46 – O órgão responsável pela gestão patrimonial formalizará a doação em favor do município, mediante contrato que será levado a registro, nos termos do inciso I do art. 167 da Lei Federal no 6.015, de 1973.

§ 1º – Na hipótese de estarem abrangidas as terras devolutas de que tratam os arts. 8 e 9, o registro do título será condicionado à sua exclusão, bem como à abertura de nova matrícula para as áreas destacadas objeto de doação no registro imobiliário competente.

§ 2º – A doação será precedida de avaliação da terra nua, a ser realizada pelo órgão competente com base em planilha referencial de preços, sendo dispensada a vistoria da área.

§ 3º – A abertura de matrícula referente à área independerá do georreferenciamento do remanescente da gleba, nos termos da lei, desde que a doação seja precedida do reconhecimento dos limites da gleba pelo órgão responsável, garantindo que a área esteja nela localizada.

CAPÍTULO V

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 47 – A pessoa física estrangeira interessada em adquirir terra de domínio estadual fica sujeita às exigências previstas nesta lei e ao disposto na legislação federal.

Art. 48 – Os beneficiários de alienação ou de concessão de terra devoluta sujeitam-se a:

I – dar gratuitamente servidão de passagem aos vizinhos, quando indispensável para o acesso a estrada pública ou a núcleo habitacional, e, mediante indenização, quando proveitosa para encurtamento de 1/4 (um quarto), pelo menos, do caminho;

II – ceder o terreno necessário à construção de estrada pública, mediante indenização da terra nua, das benfeitorias e do lucro cessante;

III – permitir a drenagem dos brejos existentes em suas glebas, a fim de cooperar com o Estado e com a municipalidade nas obras de saneamento;

IV – não executar obras que prejudiquem as condições sanitárias e ecológicas dos terrenos.

V – registrar o título de concessão de domínio ou de alienação de terra devoluta no prazo de dois anos, contados da data de sua expedição.

Parágrafo único – Sem prejuízo do disposto neste artigo, o título de alienação ou de concessão conterá cláusula de reversão, nos termos do § 4º do art. 41 desta lei.

Art. 49 – Ficam revogadas as Leis nº 7.373, de 3 de outubro de 1978, nº 11.020, de 8 de janeiro de 1993, nº 14.313, de 19 de junho de 2002, e os arts. 27 a 36 da Lei nº 9.681, de 12 de outubro de 1988.

Art. 50 – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Sala das Comissões, 5 de julho de 2017.

Antonio Carlos Arantes, presidente – Emidinho Madeira, relator – Tadeu Martins Leite.