PL PROJETO DE LEI 3318/2016

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 3.318/2016

Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher

Relatório

De autoria da deputada Ione Pinheiro, o Projeto de Lei nº 3.318/2016 “autoriza o Poder Executivo a instituir a Caderneta da Mulher e dá outras providências” e foi distribuído às Comissões de Constituição e Justiça, de Saúde, de Defesa dos Direitos da Mulher e de Fiscalização Financeira e Orçamentária.

Em análise preliminar, a Comissão de Constituição e Justiça concluiu pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade do projeto. Por sua vez, a Comissão de Saúde opinou pela aprovação da proposta na forma do Substitutivo nº 1, que apresentou.

Cabe agora a esta comissão emitir parecer quanto ao mérito da proposição, nos termos do art. 188, combinado com o art. 102, XXII, do Regimento Interno.

Fundamentação

O projeto em exame autoriza o Poder Executivo a instituir a Caderneta da Mulher, a ser adotada obrigatoriamente no sistema de saúde do Estado, com o objetivo de servir de instrumento de controle e acompanhamento de exames de prevenção ao câncer e a doenças sexualmente transmissíveis e de planejamento familiar, entre outros. O art. 2º estabelece que a unidade de saúde que tenha preparado e distribuído a caderneta deverá manter, em sua posse, uma ficha de acompanhamento com os mesmos dados dela constantes, que servirá para a formação de um banco de dados destinado a gerenciar e planejar os programas de saúde voltados para o atendimento da mulher. O art. 3° fixa a adoção de procedimento eletrônico para facilitar o arquivamento e o manuseio dos dados, dispondo, em seu parágrafo único, que o poder público poderá ampliar esse modelo, implantando caderneta específica para a saúde do homem.

A Comissão de Constituição e Justiça asseverou que a proposição traz medidas importantes para a saúde e o tratamento da mulher. Citou a aplicabilidade de dispositivos da Constituição da República ao tema, a exemplo do art. 24, XII, da Constituição a República, que estabelece a competência concorrente da União, dos estados e do Distrito Federal de legislar sobre previdência social, proteção e defesa da saúde; do art. 196, que firma ser a saúde direito de todos e dever do Estado, “garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”; bem como do art. 5º, XXXIII, que preceitua o direito ao acesso, por todos os cidadãos, a informação a ser prestada pelos órgãos públicos. Considerou, então, que a matéria insere-se entre as competências legiferantes dos estados-membros, não circunscrita entre as privativas dos chefes do Executivo, Legislativo e Judiciário, restando permitida a iniciativa parlamentar. Concluiu, ao fim, pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade do projeto.

A Comissão de Saúde, em seu parecer, destacou a existência de particularidades que justificam a atenção especial à saúde das mulheres, citando a maior expectativa de vida em relação aos homens; a ocorrência de situações próprias desse público, como a gravidez e o parto; a maior vitimização nos casos de violência sexual, física e psicológica; além de outros aspectos decorrentes da desigualdade de tratamento de gênero, que acarretam para as mulheres piores condições nas áreas da educação e do emprego e renda, por exemplo, incluindo as jornadas ampliadas de trabalho. Considerou relevantes, no âmbito da saúde das mulheres, as questões relacionadas a sexualidade e reprodução, mas também a doenças crônicas e transtornos mentais. Discorreu sobre a Política Nacional de Atenção à Saúde da Mulher, tratada no Sistema Único de Saúde – SUS – desde 2004, descrevendo as ações implementadas no âmbito da atenção básica e da atenção de média e alta complexidade. Lembrou, também, o desenvolvimento, pelo SUS, de ações e serviços de saúde por meio da chamada Rede Cegonha, visando assegurar às mulheres, entre outros direitos, o planejamento reprodutivo; a gravidez, o parto e o puerpério seguros e humanizados; e às crianças, o direito ao nascimento e desenvolvimento saudáveis; em articulação, inclusive, com serviços de assistência social. A comissão mencionou a publicação, pelo Ministério da Saúde, de documentos semelhantes, como as cadernetas da Gestante, de Saúde da Criança, da Pessoa Idosa, e do Adolescente, considerando a Caderneta da Mulher – objeto da proposição – como uma ferramenta que contribuirá tanto para o acesso às informações sobre os cuidados com a saúde e os serviços disponíveis no SUS, quanto para a prevenção de doenças e a promoção da saúde da mulher. Entendeu, por fim, necessárias algumas alterações na proposta inicial, como forma de melhor atender aos seus objetivos, o que fez por meio do Substitutivo nº 1, que apresentou.

O direito à saúde e o acesso aos serviços de saúde pelas mulheres integram alguns compromissos assumidos mundialmente ao longo dos anos, a exemplo da Declaração e Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial Sobre a Mulher – Pequim, 1995. O texto, do qual também o Brasil é signatário, já atribuía grande relevância ao tema, firmando, entre outras questões, que:

“A mulher tem o direito de desfrutar do mais elevado nível possível de saúde física e mental. O gozo deste direito é essencial para sua vida e seu bem-estar, e para sua capacidade de participar em todas as esferas da vida pública e privada. A saúde não é só a ausência de enfermidade ou moléstia, mas sim um estado de pleno bem-estar físico, mental e social. A saúde da mulher inclui o seu bem-estar emocional, social e físico, sendo que contribuem para determinar sua saúde tanto fatores biológicos, quanto o contexto social, político e econômico em que vive. Contudo, a maioria das mulheres não goza de saúde nem de bem-estar.

[…]

É preciso lograr que as mulheres possam exercer o direito a usufruir o mais elevado nível possível de saúde durante todo o seu ciclo vital, em igualdade de condições com os homens. As mulheres padecem de muitas das afecções de que padecem os homens, mas de maneira diferente. A incidência da pobreza e da dependência econômica da mulher, sua experiência com a violência, as atitudes negativas para com mulheres e meninas, a discriminação racial e outras formas de discriminação, o controle limitado que muitas mulheres exercem sobre sua vida sexual e reprodutiva, e sua falta de influência na tomada de decisões são realidades sociais que têm efeitos prejudiciais sobre sua saúde.”.¹

A Declaração de Pequim registrou como objetivo estratégico a ser perseguido pelos Estados a promoção do acesso da mulher, durante toda sua vida, a serviços de atendimento à saúde, à informação e a serviços conexos adequados, de baixo custo e boa qualidade, inclusive no que concerne à saúde sexual e reprodutiva e à planificação familiar. Em 2015, passados 20 anos do tratado de Pequim, a Organização das Nações Unidas adotou a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Esse documento, por seu turno, imprimiu e reafirmou a obrigação dos Estados de assegurarem às mulheres o exercício dos direitos reprodutivos e o acesso à saúde.

No que se refere à legislação brasileira sobre a tema, foram adotadas, conforme mencionado pela Comissão de Saúde em seu parecer, a Política Nacional de Atenção à Saúde da Mulher, em 2004, e a Rede Cegonha, a partir de 2011, no âmbito do SUS. Infere-se, então, aderência entre a regulação nacional e diretrizes das principais normas internacionais acerca da saúde da mulher. Porém, é importante atentar que, apesar dos compromissos internacionalmente assumidos e da consonância legislativa interna, o País continua enfrentando, até os dias atuais, entraves na implementação das políticas e na garantia do acesso da população – e das mulheres, em especial – à saúde ampla, integral e inclusiva.

Esse cenário nos aponta a necessidade do incremento cotidiano dos serviços de saúde pública, o que inclui o incentivo à implementação de ferramentas capazes de contribuir para a melhoria dos atendimentos nessa área. E nessa perspectiva, o projeto sob análise nos parece oportuno. Entendemos que a disponibilização às pacientes de documento – ou caderneta –, com informações e orientações relacionadas à sua saúde, favorecerá a disseminação do conhecimento de especificidades e cuidados inerentes à saúde da mulher, podendo também contribuir para a prevenção de doenças, e em última análise, para a potencialização dos atendimentos. Consideramos, portanto, que a proposição é meritosa e deve avançar nesta Casa, com os aperfeiçoamentos sugeridos pela Comissão de Saúde por meio de substitutivo.

Conclusão

Em face do exposto, opinamos pela aprovação, no 1º turno, do Projeto de Lei nº 3.318/2016 na forma do Substitutivo nº 1, apresentado pela Comissão de Saúde.

Sala das Comissões, 12 de setembro de 2019.

Marília Campos, presidente – Andréia de Jesus, relatora – Celise Laviola.

¹ Disponível em: <http://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2014/02/declaracao_pequim.pdf>. Consulta em: 19 ago. 2019.