PL PROJETO DE LEI 1976/2007

PARECER PARA O 1º TURNO DO PROJETO DE LEI Nº 1.976/2007

Comissão de Política Agropecuária e Agroindustrial Relatório De autoria do Deputado Padre João, o Projeto de Lei nº 1.976/2007 dispõe sobre a Política Estadual de Incentivo à Formação de Banco Comunitário de Sementes de Cultivares Locais, Tradicionais ou Crioulas. A matéria foi analisada pela Comissão de Constituição e Justiça, após atendimento de diligência pela Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais - Epamig -, tendo recebido parecer pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade com a Emenda nº 1, apresentada por aquela Comissão. Cabe agora a esta Comissão analisar o mérito do projeto, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, VIII, do Regimento Interno. Fundamentação O projeto em epígrafe pretende inserir o Estado no esforço nacional pela preservação do patrimônio genético dos cultivares selecionados e adaptados aos nossos solos e clima ao longo de séculos de cultivo agrícola no País, por meio da instituição de uma política de incentivo à formação de bancos de sementes de cultivares locais, tradicionais ou crioulas, às quais passamos a nos referir apenas como “sementes crioulas”. Para tanto, propõe uma definição para sementes crioulas e para banco comunitário de sementes, além de estabelecer objetivos, instrumentos, competências do poder público e possíveis fontes de recursos para a execução da política. A formação de bancos de sementes crioulas com as características de participação de agricultores familiares e mecanismos de renovação via empréstimo e devolução acrescida de percentual tem sua história ligada à atuação de padres católicos no interior do País a partir da década de 1970. Essa prática constituiu o cerne de inúmeros projetos surgidos no seio de comunidades rurais por ação, a princípio, de pastorais católicas, associações de produtores e organizações não governamentais. No âmbito do poder público, além do apoio de técnicos das empresas de assistência técnica e extensão rural oficiais, a identificação de cultivares crioulos e a conservação desse patrimônio genético faz parte dos objetivos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa. Para atender a esse objetivo, a Embrapa mantém o Centro Nacional de Pesquisa de Recursos Genéticos e Biotecnologia - Cenargen -, com sede na unidade Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, em Brasília. A estrutura, criada em 1993, envolve mais de 200 pesquisadores em todo o País e se dedica à gestão das atividades indispensáveis ao manejo, à conservação e ao uso de germoplasma. Hoje a empresa mantém 138 bancos de germoplasma, sendo 111 de vegetais e os demais de genética animal e microbiana, além de outros 25 em entidades do Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária - SNPA -, do qual a Epamig faz parte. Os bancos de germoplasma provêem uma base genética ampla e diversificada que suporta os trabalhos de melhoramento na geração de cultivares mais adaptados, resistentes e produtivos. A utilização direta de sementes crioulas na produção agrícola, porém, foi entendida como irregular até 2003, e a prática impedia o acesso do agricultor ao crédito e ao seguro agrícola oficiais. Essa situação foi alterada a partir da sanção da Lei federal nº 10.711, de 5/8/2003, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Sementes e Mudas. Com base nesse diploma, o Ministério do Desenvolvimento Agrário - MDA - desenvolveu um sistema de registro e certificação de sementes crioulas, abrindo definitivamente o caminho para a inclusão de cultivos com esse tipo de semente nos programas de crédito rural, em especial no Pronaf. O cadastro de entidades e de cultivares crioulos pode ser acessado por qualquer interessado por meio do “site” do MDA, seção Seguro da Agricultura Familiar - Seaf - sob o título de Cadastro de Cultivares Locais, Tradicionais e Crioulas (www.seaf.mda.gov.br). Apesar do ainda baixo número de entidades e cultivares registrados, a iniciativa é concreta e demonstra a importância da questão. São notórias as experiências existentes de bancos coletivos de sementes crioulas espalhados pelas diversas regiões do Brasil e no mundo. Como forma de ilustrar esse fato, podemos listar algumas dessas iniciativas: - Articulação no Semi-Árido Brasileiro - ASA Paraíba - mantém 225 bancos de sementes, envolvendo 8 mil famílias; - Banco Comunitário de Sementes Crioulas e Espécies Florestais Nativas do Cerrado - Distrito Federal e entorno - Instituto Rede Terra -, que atende a 350 agricultores familiares; - Encantos da Natureza de Nova Laranjeiras - Santa Catarina - desenvolvido pela associação de 16 famílias de agricultores; - Banco de Sementes da Reforma Agrária de Tupanciretã - Rio Grande do Sul - Regional Tupanciretã do Movimento dos Sem Terra - MST -, que atende aos assentados da região; – Rede de Sementes Crioulas, Biodiversidade das Sementes e Mudas na Agricultura - Réseau Semences Paysannes, Biodiversité des Semences et Plants dans les Fermes -, com sede na França. Congrega diversas entidades relacionadas com a preservação e divulgação da agrobiodiversidade. Em Minas destacam-se projetos desenvolvidos com participação da Epamig citados em resposta a diligência aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça. Na correspondência, o Diretor-Geral enumera duas ações da empresa relacionadas com as sementes crioulas: a primeira, no Município de Divino, onde foi cultivado um campo comunitário de multiplicação do cultivar de milho “Pedra Dourada”. A semente produzida foi distribuída entre as famílias participantes. A segunda ação, mais elaborada e ampla, resultante do projeto Resgate, avaliação e desenvolvimento de cultivares de café para o sistema orgânico de produção, quando foram resgatados 10 cultivares com participação de agricultores dos Municípios de Araponga, Espera Feliz, Tombos e Manhuaçu. Ainda como resultado do mesmo projeto, foram criados quatro bancos de sementes (ou germoplasma) nos três primeiros Municípios citados e em Oratórios. Entre as variedades resgatadas destacam-se o Coffea arabica var Typica (nomes vulgares: Nacional, Comum, Crioulo ou Brasil), primeiro cultivar utilizado no Brasil, introduzido em 1727; o Coffea arábica var. Bourbon Vermelho (café Java), trazido da Ilha Reunião, Oceano Índico, em 1859. Vale comentar que todas as ações relacionadas com bancos comunitários de sementes têm como foco o atendimento de demandas de nichos de mercado de produtos agroecológicos e de economia solidária, segmentos que oferecem menores custos de produção e melhor remuneração do agricultor na comercialização, o que potencializa a geração de emprego e renda. A título de informação, o PPAG 2008-2011, após a primeira revisão anual, inclui a utilização de sementes crioulas em duas de suas ações e as práticas agroecológicas em outras duas, a saber: - Ação 1399 - Implantação do Programa de Distribuição de Sementes - do Programa 059 - Convivência com a Seca e Inclusão Produtiva (Estruturador) -; - Ação 4227 - Apoio à Implantação de Lavouras -, do Programa 028 - Minas sem Fome (Estruturador) -; Ação 1043 - Qualificação de agricultores familiares para a produção agroecológica/ orgânica, do Programa 028 - Minas sem Fome (Estruturador) -; - Ação 4121 - Incentivo à Adoção do Modo de Produção Orgânico na Cadeia Produtiva do Café -, do Programa 050 - Certifica Minas (Estruturador). Tais previsões de ações programáticas, todas fruto de propostas populares para a modificação do PPAG aprovadas por esta Casa, indicam o interesse do povo mineiro pela questão da preservação do patrimônio genético da agricultura tradicional e abrem mais uma oportunidade para a atuação do poder público estadual. A partir desses exemplos, e considerado o esforço da União para incluir essas iniciativas no âmbito das políticas públicas federais para a agricultura, julgamos adequada a instituição da política pública estadual proposta como parte da política de desenvolvimento agrícola do Estado, já estabelecida pela Lei nº 11.405, de 1994. O projeto em questão vem, portanto, formalizar a adesão de Minas ao esforço nacional de resgate desse patrimônio genético e oferece uma base jurídica para a expansão das ações programáticas do governo do Estado que já incluem, as sementes crioulas e a agroecologia; contudo, em vista da necessidade de adequar a linguagem e o conteúdo de diversos dispositivos do projeto de lei em tela, apresentamos o Substitutivo nº 1. Conclusão Pelo exposto, opinamos pela aprovação do Projeto de Lei nº 1.976/2007, no 1º turno, na forma do Substitutivo nº 1, a seguir redigido. Com a aprovação do Substitutivo nº 1, fica prejudicada a Emenda nº 1, da Comissão de Constituição e Justiça. SUBSTITUTIVO Nº 1

Dispõe sobre a Política Estadual de Incentivo à Formação de Bancos Comunitários de Sementes de Cultivares Locais, Tradicionais ou Crioulas. A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta: Art. 1º - A Política Estadual de Incentivo à Formação de Banco Comunitário de Sementes de Cultivares Locais, Tradicionais ou Crioulas será executada como parte da política de desenvolvimento agrícola do Estado instituída pela Lei nº 11.405, de 28 de janeiro de 1994, em harmonia com a política ambiental e a legislação federal pertinente, com vistas ao desenvolvimento sustentável e à preservação da agrobiodiversidade. Parágrafo único - Entende-se, para efeito desta lei: I - como semente de cultivar local, tradicional ou crioula, a variedade desenvolvida, adaptada ou produzida por agricultor familiar, assentado da reforma agrária, quilombola ou indígena em condições “in situ”, com características fenotípicas bem- determinadas e reconhecidas pelas respectivas comunidades, e que não se caracterize como substancialmente semelhante aos cultivares comerciais; II - como Banco Comunitário de Sementes a coleção de germoplasma de cultivares locais, tradicionais ou crioulos, mantida e administrada localmente por agricultores familiares responsáveis pela multiplicação das sementes ou mudas para distribuição, troca ou comercialização entre si. Art. 2º - São objetivos gerais da Política Estadual de Incentivo à Formação de Bancos Comunitários de Sementes de Cultivares Locais, Tradicionais ou Crioulas: I - estimular o resgate e a conservação de espécie, variedade e cultivar produzido em unidade familiar ou tradicional; II - estimular a proteção dos recursos genéticos locais, importantes para a sustentabilidade dos agroecossistemas; III - proteger a biodiversidade agrícola, a manutenção de valores culturais e a preservação de patrimônios naturais; IV - estimular a organização comunitária, a capacitação para gerenciamento dos bancos de sementes e a proteção dos conhecimentos tradicionais. Art. 3º - São instrumentos da política de que trata esta lei: I - o crédito rural; II – o incentivo fiscal e tributário; III - a pesquisa agropecuária e tecnológica; IV - a extensão rural e a assistência técnica. Art. 4º - Na implementação da Política Estadual de Incentivo à Formação de Bancos Comunitários de Sementes de Cultivares Locais, Tradicionais ou Crioulas, cabe ao poder público: I - realizar parcerias com entidades que tenham experiência de gestão de Banco Comunitário de Sementes e convivência com os biomas e ecossistemas do Estado para capacitação de agricultores beneficiários desta política; II - estimular a participação e a organização de comunidades rurais nas ações relativas à esta política; III - apoiar processos de diagnóstico participativo relacionados com a sensibilização e o resgate da agrobiodiversidade nas propriedades familiares rurais; IV - acompanhar a execução da política pública; V - apoiar a elaboração de projetos, a instalação e o funcionamento de bancos de sementes crioulas; VI - desenvolver um sistema de reposição das sementes e estimular o uso de variedades locais, tradicionais ou crioulas; VII - implantar cadastro de Bancos Comunitários de Sementes no Estado; VIII - realizar, em parceria com os Municípios e entidades civis, eventos destinados à troca de experiências e intercâmbio de germoplasma, como feiras e outros; IX - identificar demandas de cada Banco Comunitário de Sementes; X - identificar e selecionar imóveis públicos e privados aptos à instalação de Banco Comunitário de Sementes. Art. 5º - A política de que trata esta lei será desenvolvida com a participação dos órgãos do sistema estadual de agricultura e entidades da sociedade que lidam com sementes de cultivares locais, tradicionais ou crioulas. Art. 6º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação. Sala das Comissões, 10 de março de 2009. Vanderlei Jangrossi, Presidente - Chico Uejo, relator - Carlos Gomes - Antônio Carlos Arantes.