PLC PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR 28/2003

PARECER PARA O 1º TURNO DO PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR Nº 28/2003

Comissão de Administração Pública Relatório De autoria do Governador do Estado, o Projeto de Lei Complementar nº 28/2003 dispõe sobre o regime de emprego público do pessoal da administração direta, autárquica e fundacional do Poder Executivo do Estado de Minas Gerais e dá outras providências. Publicada, foi a proposição encaminhada à Comissão de Constituição e Justiça, que, em exame preliminar, concluiu pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade da matéria na forma original. Agora, vem o projeto a esta Comissão para receber parecer quanto ao mérito, nos termos do art. 102, I, do Regimento Interno. Fundamentação O Projeto de Lei Complementar nº 28/2003 tem por objetivo instituir, na administração direta, nas autarquias e fundações públicas do Poder Executivo, o regime de emprego público para a admissão de pessoal, mediante contrato de trabalho por prazo indeterminado regido pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT. Para sintetizar o conteúdo da proposição, o contrato de que se cogita deverá ser antecedido de aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, em conformidade com a natureza e a complexidade do emprego, de forma semelhante à exigência constitucional para a ocupação de cargo público de provimento efetivo. O regime de emprego público não se aplica aos servidores de carreira que desempenham atividades exclusivas de Estado, nos termos da lei, aos ocupantes de cargos em comissão nem aos servidores titulares de cargos efetivos ou detentores de função pública na data de publicação das leis que venham a instituir tais empregos públicos. O acordo de vontades a que se refere a proposição será passível de rescisão unilateral pela administração nos casos explicitamente arrolados no art. 3º, entre os quais se destacam o cometimento de ato de improbidade; a condenação criminal do empregado mediante sentença transitada em julgado; o abandono do emprego; a acumulação ilegal de cargos, empregos ou funções públicas; e o desempenho insatisfatório, entre outras hipóteses previstas no comando normativo. Acrescente-se que, consoante determina o art. 4º do projeto, o empregado público em referência contribuirá obrigatoriamente com o Instituto de Previdência dos Servidores do Estado - IPSEMG - apenas para fins de assistência médica e hospitalar, em percentual idêntico ao dos ocupantes de cargo público. Tradicionalmente, o regime jurídico estatutário, de origem francesa, é o regime comum na administração pública brasileira, nos três níveis de governo. Mesmo com a promulgação da Emenda à Constituição nº 19, de 1998, que suprimiu do “caput” do art. 39 da Carta Magna a exigência de instituição de regime único na União, nos Estados, no Distrito Federal e nos municípios, bem como nas entidades autárquicas e fundacionais, o regime institucional ou unilateral continua sendo o regime por excelência na administração e abrange a grande massa de profissionais do poder público. Observando a nova moldura constitucional, parece-nos que a intenção dos idealizadores da reforma do Estado foi a de garantir a cada unidade da Federação plena liberdade para a escolha do regime que entender mais vantajoso e conveniente aos interesses de cada ente político, seja o regime estatutário, tradicionalmente relacionado com a pessoa estatal, seja o celetista, normalmente associado às relações de emprego efetivadas entre particulares. Com base na nova redação do citado preceito constitucional, poder-se-ia afirmar que o clássico regime estatutário de direito público deixou de ser a regra na administração brasileira, uma vez que as transformações que esta vem sofrendo têm acarretado procura cada vez maior pelo regime trabalhista comum? Ou esta inovação constitucional apenas estaria legitimando, em alguns casos, a convivência harmoniosa de ambos os regimes jurídicos? Alguns doutrinadores continuam a entender que o regime estatutário deve ser o dominante para os servidores titulares de cargos nas pessoas jurídicas de direito público, embora admitam a utilização do regime celetista em alguns casos, principalmente para as atividades consideradas subalternas. Essa posição é sustentada pelo publicista Celso Antônio Bandeira de Mello: “Que atividades seriam estas, passíveis de comportar regime trabalhista, se a lei assim decidir? Só poderiam ser aquelas que - mesmo desempenhadas sem as garantias específicas do regime de cargo - não comprometeriam os objetivos (já referidos) em vista dos quais se impõe o regime de cargo como sendo o normal, o prevalente. Seriam, portanto, as correspondentes à prestação de serviços materiais subalternos, próprios dos serventes, motoristas, artífices, jardineiros ou mesmo de mecanógrafos, digitadores, etc., pois o modesto âmbito da atuação destes agentes não introduz riscos para a impessoalidade da ação do Estado em relação aos administrados caso lhes faltem as garantias inerentes ao regime de cargo” (in “Curso de Direito Administrativo”. 13ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2001, p. 241-242.). Outros juristas defendem a tese segundo a qual é facultada aos entes políticos a instituição de qualquer dos regimes, contanto que o estatutário seja mantido para os servidores que exercem atividade típica de Estado. É o ponto de vista expressado por Maria Sylvia Zanella Di Pietro, cujas lições merecem reprodução: “Com a exclusão da norma constitucional do regime jurídico único, ficará cada esfera de governo com liberdade para adotar regimes jurídicos diversificados, seja o estatutário, seja o contratual, ressalvadas aquelas carreiras institucionalizadas em que a própria Constituição impõe, implicitamente, o regime estatutário, uma vez que exige que seus integrantes ocupem cargos organizados em carreira (Magistratura, Ministério Público, Tribunal de Contas, Advocacia Pública, Defensoria Pública), além de outros cargos efetivos, cujos ocupantes exerçam atribuições que o legislador venha a definir como `atividades exclusivas de Estado´, conforme previsto no artigo 247 da Constituição, acrescido pelo artigo 32 da Emenda Constitucional nº 19/98” (in “Direito Administrativo”. 11ª ed. São Paulo: Atlas, 1999, p. 423). Admitem, ainda, a possibilidade de instituição do regime celetista na administração pública os publicistas Ivan Barbosa Rigolin e Diógenes Gasparini. O primeiro admite até mesmo a instituição de um regime inédito para o seu pessoal, desde que “obedeça rigorosamente aos princípios e aos parâmetros constitucionais mínimos, que constituem, conforme cada caso, direitos e deveres tanto dos servidores quanto da Administração, e, por isso, não podem jamais ser omitidos nem negligenciados” (in “O Servidor Público na Constituição de 1988”. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 120). Como se vê, as opiniões doutrinárias sobre o regime jurídico dos servidores divergem, embora grande parte dos estudiosos da matéria não descartem a adoção do regime contratual celetista pelos entes estatais. O problema principal reside no alcance desse regime, calcado no livre acordo de vontades entre as partes: se deve ser adotado apenas para as atividades subalternas e de caráter temporário ou se pode ser instituído também para a execução de serviços por prazo indeterminado. A esse respeito, é oportuno salientar que já vigora no âmbito federal o regime de emprego público na administração direta, autárquica e fundacional, nos termos da Lei nº 9.962, de 2000, que resultou de iniciativa do Poder Executivo da União. Ressalte-se que a utilização da via contratual na administração, nos moldes do projeto de lei em análise, não afasta a aplicação dos princípios que regem a atividade administrativa consagrados no “caput” do art. 37 da Carta Magna, a saber, os princípios de legalidade, moralidade, publicidade, impessoalidade e eficiência. Esses postulados são de observância obrigatória no serviço público e vinculam tanto os servidores titulares de cargo efetivo quanto os servidores ocupantes de emprego público submetidos à legislação trabalhista. No entanto, os servidores contratados sob as regras da CLT não farão jus à estabilidade no serviço, que é uma prerrogativa atualmente exclusiva dos titulares de cargo efetivo, entre outros benefícios típicos do regime de cargo público. Anote-se, ainda, que o Projeto de Lei Complementar nº 28/2003 não exclui nem modifica o regime estatutário na administração pública, que se encontra em plena vigência e vincula a grande massa de profissionais do Estado e das pessoas jurídicas de direito público por ele criadas. Não há, portanto, a substituição do regime dito “estatutário”, cujo conteúdo se insere no campo do Direito Administrativo, pelo regime contratual celetista, que é celebrado à luz do Direito do Trabalho. Aquele é concebido como um sistema de normas imposto pelo Estado para melhor atender às conveniências e peculiaridades do serviço, de maneira que o servidor, ao tomar posse no cargo, adere ao conjunto de regras que regulam o exercício de suas atividades, as quais são previamente elaboradas pelo Estado legislador e somente por ele alteradas. O regime contratual pressupõe a manifestação de vontade de ambas as partes para a formação do vínculo empregatício, e a igualdade das partes na relação jurídica é da essência desse tipo de ajuste, regulado pela legislação trabalhista. Nesse caso, as cláusulas pactuadas só podem ser modificadas mediante acordo de vontades, uma vez que uma parte não pode impor à outra disposições que não forem fruto de consenso. Há, pois, uma distinção nítida entre ambos os regimes jurídicos. Levando-se em conta que o regime unilateral é o comum no serviço público estadual, deve-se partir da premissa de que o regime de emprego público em referência é uma exceção à regra geral, a ser utilizado de forma criteriosa pela administração pública, em sintonia com o princípio da razoabilidade, que exige bom senso, moderação e relação de adequação entre os meios utilizados e a finalidade a ser alcançada. Assim, a contratação de servidores-empregados com fulcro na CLT poderá trazer benefícios para o Estado, desde que seja realizada segundo critérios aceitáveis e não tenha o escopo de afastar a aplicação do regime estatutário de maneira generalizada. Entretanto o projeto em exame, tal como apresentado a esta Casa pelo Chefe do Poder Executivo, é passível de aperfeiçoamento, seja sob o ângulo de seu conteúdo, seja sob a ótica da técnica legislativa. O ponto principal reside no prazo indeterminado do contrato de trabalho a ser celebrado com o poder público. A nosso ver, esse tipo de contratação deve ser efetivada por prazo certo de, no máximo, 12 meses, sendo admitida a prorrogação por igual período. Ademais, o projeto deve estabelecer explicitamente as situações nas quais poderá ocorrer esse tipo de contratação, bem como a responsabilidade do dirigente responsável pela prorrogação ilícita do contrato de trabalho. Além disso, se a proposição veda a utilização do contrato de trabalho para as atividades consideradas exclusivas de Estado, é conveniente e oportuno estabelecer, de forma explícita na parte dispositiva do projeto, quais são essas atividades típicas de poder público no âmbito do Executivo. Como essas alterações modificam substancialmente o conteúdo da proposta original do Governador do Estado, somos conduzidos a apresentar o Substitutivo nº 1. Conclusão Em face do exposto, opinamos pela aprovação do Projeto de Lei Complementar nº 28/2003 na forma do seguinte Substitutivo nº 1. SUBSTITUTIVO Nº 1 Disciplina o regime de emprego público do pessoal da administração direta, autárquica e fundacional do Poder Executivo do Estado e dá outras providências. A Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta: Art. 1º - A admissão de pessoal em emprego público da administração direta, autárquica e fundacional do Poder Executivo do Estado rege-se pelo Decreto-Lei Federal nº 5.452, de 1º de maio de 1943, que aprova a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT -, pelas normas trabalhistas pertinentes e pelas disposições desta lei. § 1º - A criação de empregos públicos fica restrita a atividades que requeiram força de trabalho temporária, periódica ou sazonal. § 2º - Leis específicas disporão sobre a criação dos empregos públicos de que trata esta lei. Art. 2º - Não poderá ser submetido ao regime de emprego público: I - o servidor que, em decorrência das atribuições de seu cargo efetivo, desenvolva atividade exclusiva de Estado, nos termos do art. 3º desta lei; II - o servidor ocupante de cargo público de provimento em comissão; III - o servidor ocupante de cargo de provimento efetivo ou detentor de função pública na data de publicação das leis a que se refere o § 2º do art. 1º; IV - o agente que exerça atividade permanente da administração pública direta, autárquica e fundacional do Poder Executivo. Art. 3º - Desenvolve atividade exclusiva de Estado, no âmbito da administração direta, autárquica e fundacional do Poder Executivo, o servidor integrante das seguintes carreiras: I - Procurador da Procuradoria-Geral do Estado e Procurador da Procuradoria da Fazenda Estadual; II - Fiscal de Tributos e Receitas Estaduais da Secretaria de Estado da Fazenda; III - Policial Civil; IV - Defensor Público. Parágrafo único - As carreiras de servidores não especificadas neste artigo que caracterizem o exercício exclusivo de funções de fiscalização ou poder de polícia serão, mediante lei específica, consideradas integrantes das carreiras de atividades exclusivas de Estado. Art. 4º - A contratação de pessoal para ocupar emprego público será precedida de concurso público de provas ou de provas e títulos, conforme a natureza e a complexidade das atribuições. Parágrafo único - O edital do concurso público de que trata este artigo será amplamente divulgado e especificará a finalidade e as condições da contratação, o prazo de duração e a hipótese de prorrogação do contrato, quando houver. Art. 5º - O contrato de trabalho de que trata esta lei terá prazo determinado de até 12 meses, prorrogável uma única vez por igual período, e somente será rescindido por ato unilateral da administração pública, nas seguintes hipóteses: I - prática de ato de improbidade; II - incontinência de conduta ou mau procedimento; III - condenação criminal do empregado, transitada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena; IV - negligência no desempenho das respectivas funções; V - embriaguez habitual ou em serviço; VI - violação de segredo do órgão ou entidade públicos; VII - prática de ato de indisciplina ou de insubordinação; VIII - abandono de emprego; IX - prática, no âmbito da instituição, de ato lesivo à honra ou à boa fama ou ofensa física contra qualquer pessoa, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem; X - prática de ato lesivo à honra e à boa fama ou ofensa física contra superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem; XI - prática constante de jogos de azar; XII - acumulação ilegal de cargos, empregos ou funções públicas; XIII - necessidade de redução de quadro de pessoal, por excesso de despesa, nos termos da lei complementar a que se refere o art. 27 da Constituição do Estado; XIV - desempenho insatisfatório. § 1º - Terá desempenho considerado insatisfatório, para fins deste artigo, o empregado que não obtiver pelo menos 50% dos pontos distribuídos em avaliação anual de desempenho, realizada nos termos de regulamento, com base nos critérios de qualidade do trabalho, produtividade, iniciativa, presteza, assiduidade e pontualidade, aproveitamento em programa de capacitação, bem como capacidade para administrar bem o tempo, usar adequadamente os equipamentos e instalações de serviço, contribuir para a redução de despesas e a racionalização dos processos e trabalhar em equipe. § 2º - Na rescisão do contrato de trabalho, fica assegurado ao empregado público o contraditório e a ampla defesa. § 3º - Não se obrigam à observância do disposto neste artigo os contratos de pessoal decorrentes exclusivamente da autonomia de gestão de que trata o § 10 do art. 14 da Constituição do Estado. Art. 6º - O empregado público contribuirá para o Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais - IPSEMG -, para fins exclusivos de assistência médica e hospitalar, em percentual igual ao dos ocupantes de cargo público. Art. 7º - O gerenciamento dos contratos de que trata esta lei é de responsabilidade do dirigente do órgão ou entidade em que foram realizados, cabendo-lhe zelar pelo efetivo cumprimento dos prazos neles previstos. Parágrafo único - Na hipótese de prorrogação ilegal do contrato, o dirigente será responsabilizado civil e criminalmente. Art. 8º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 9º - Revogam-se as disposições em contrário. Sala das Comissões, 4 de julho de 2003. Domingos Sávio, Presidente - Dalmo Ribeiro Silva, relator - Dinis Pinheiro - Leonardo Quintão - Marília Campos.