PL PROJETO DE LEI 1337/2003

PARECER PARA O 1º TURNO DO PROJETO DE LEI Nº 1.337/2003

Comissão de Constituição e Justiça Relatório De autoria do Governador do Estado e encaminhado a esta Casa por meio da Mensagem nº 144/2003, o projeto de lei em epígrafe institui e estrutura as carreiras do Sistema Estadual de Grupo de Atividades de Saúde. Publicada no “Diário do Legislativo” de 31/12/2003, foi a proposição distribuída às Comissões de Constituição e Justiça, de Administração Pública e de Fiscalização Financeira e Orçamentária. Vem agora o projeto a esta Comissão para receber parecer sobre sua juridicidade, constitucionalidade e legalidade, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, III, “a”, do Regimento Interno. Fundamentação No dia 31/12/2003, o Poder Executivo encaminhou a esta Casa Legislativa o Plano de Carreira do Pessoal do Grupo de Atividades de Saúde, integrado pela Secretaria de Estado da Saúde - SES -, a Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais - FHEMIG -, a Fundação Ezequiel Dias – FUNED - e a Fundação Centro de Hematologia e Hemoterapia de Minas Gerais - HEMOMINAS. O Governador do Estado, para o cumprimento do disposto no referido projeto, expediu o Decreto nº 43.576, de 9/9/2003, traçando as diretrizes para a elaboração dos planos de carreira dos servidores civis dos diversos órgãos do Estado, após processo de negociação com representantes dos servidores. A matéria se insere no domínio de competência legislativa estadual, conforme o disposto no art. 25, “caput” e § 1º, da Constituição da República, que dispõe que os Estados se organizam e se regem pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios constitucionais, sendo-lhes reservadas as competências que não lhes sejam vedadas pela Carta Federal. Nada há que impeça a proposição de tramitar nesta Casa no que concerne à iniciativa para deflagrar o processo legislativo, visto que se trata de matéria de iniciativa privativa do Governador do Estado, consoante o disposto no art. 66, III, “b” e “c”, da Carta Estadual. É fundamental lembrar, para efeito da análise que faremos a seguir, que a Lei nº 869, de 5/7/52, que contém o estatuto dos funcionários, foi recepcionada pela Carta mineira, no que não contrariou as normas constitucionais. Além disso, o Estatuto dos Servidores Públicos Civis é lei complementar, consoante o disposto no inciso III do § 2º do art. 65 da Constituição Estadual. Assim, por ser lei complementar, não pode a referida norma ser alterada por meio de lei ordinária. Embora não sejam matéria objeto de lei complementar, os planos de carreira têm pontos de interseção com a norma estatutária. Assim sendo, o projeto em análise deveria respeitar as regras estabelecidas na lei complementar. A proposição em epígrafe apresenta conceitos que estão em confronto com o disposto na mencionada Lei nº 869. Outrossim, há dispositivos no plano de carreira que não se harmonizam com o estabelecido no estatuto; isso ocorre, por exemplo, com relação a conceitos básicos de institutos como os do concurso, do ingresso, da definição de carreira e de cargo público. O Governador do Estado, visando sanar o problema apontado, encaminhou a esta Casa o Projeto de Lei Complementar nº 52/2004, apresentando as alterações necessárias na Lei nº 869, de 1952. Assim, é necessário que tanto o Projeto de Lei Complementar nº 52/2004 quanto o projeto em estudo sejam aprovados e promulgados de forma a garantir a harmonia entre os seus dispositivos, para que o plano de carreira em análise possa vigorar de forma a regular as relações entre os servidores públicos estaduais e os órgãos e entidades nos quais estejam lotados. Verifica-se que o projeto em tela propõe a extinção de 3.163 cargos de nível fundamental e a criação de 2.233 cargos de nível médio e 855 de nível superior, aumentando o nível de escolaridade dos servidores integrantes das carreiras do Grupo de Atividades em comento. Além disso, a proposição reduz o número de carreiras existentes no Grupo de Atividades de Saúde, reunindo servidores com formações profissionais diversas. Assim, as diversas modalidades de classes de cargos serão transformadas em apenas 14, cada uma das quais estruturada em uma carreira específica, criando a possibilidade de haver servidores com formações e níveis de escolaridade diferentes em uma mesma carreira, conforme a exposição de motivos encaminhada pelo Governador do Estado. A constitucionalidade desse procedimento tem sido freqüentemente questionada, uma vez que este pode ser utilizado como forma de acesso ou provimento derivado, ou seja, o servidor ingressa em uma carreira para a qual não prestou concurso, burlando a exigência constante no inciso II do art. 37 da Constituição Federal, segundo a qual a investidura em cargo ou emprego público depende de prévia aprovação em concurso público. Cabe mencionar, como exemplo, que foi julgada improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.335, que questionava a lei catarinense que extinguiu os cargos e as carreiras de Fiscal de Tributos Estaduais, Fiscal de Mercadorias em Trânsito, Exator e Escrivão de Exatoria, e criou, em substituição, o cargo de Auditor Fiscal da Receita Estadual, determinando o aproveitamento dos ocupantes de cargos extintos em classes de nova carreira. Tomou-se como base, para tanto, o voto do Ministro Gilmar Mendes, que vê “correspondência e pertinência” temática entre os cargos extintos e a nova carreira de Auditor Fiscal da Receita Estadual. A posição divergente dos Ministros Carlos Velloso e Maurício Corrêa (relator), vencidos na votação, revela que nem no Supremo Tribunal Federal - STF - há consenso sobre a matéria. Para que se reúnam diversos profissionais numa mesma carreira, é preciso que haja semelhança entre suas atribuições e que estas tenham um grau de complexidade similar. A tendência da organização do trabalho, na atualidade, é a do aumento do número de profissionais que possuam competência para desenvolver um conjunto de atribuições, reduzindo e dissolvendo as fronteiras entre as profissões. O aplicador da norma, ao proceder à interpretação, deve levar em consideração que o contexto social é parâmetro para a adequada compreensão da legislação e das propostas para a sua alteração, conforme ditam as modernas teorias da interpretação. Assim sendo, a atual organização do trabalho, que releva a importância de trabalhadores multifuncionais, deve ser considerada na análise da proposta apresentada. Considerando a posição do STF no caso citado e o contexto social mencionado, pode-se dizer que a redução do número de carreiras não é, em tese, inconstitucional, mas, nas comissões de mérito, é necessária a análise dessa redução, a fim de verificar- se “a natureza e a complexidade do cargo”, nos termos do inciso II do art. 37 da Constituição da República. Além disso, para enquadrar na nova situação os servidores que optarem pela nova carreira, o Poder Executivo deverá, necessariamente, considerar o nível de escolaridade, a formação profissional e as atribuições específicas dos cargos de origem. O art. 115 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição do Estado, acrescido pela Emenda à Constituição nº 57, de 2003, assegura ao servidor o direito de optar pelo sistema de adicional de desempenho ou pelas vantagens por tempo de serviço. Além disso, o projeto em exame possibilita que os servidores ativos e inativos façam a opção por permanecer na carreira em que já se encontram ou mudar para a nova carreira. Essa possibilidade cria uma situação que, teoricamente, poderia ferir os princípios constitucionais da igualdade e da eficiência. É que servidores com idênticas atribuições podem figurar em carreiras diversas e, no futuro, possuir remuneração diferenciada. Assim, além de decidir entre receber o adicional de desempenho ou os qüinqüênios, o servidor deverá optar entre o ingresso na nova carreira ou a permanência na antiga. No nosso entendimento, tais questões podem ser superadas, tendo em vista o procedimento democrático que se propõe adotar, que deixa ao servidor a escolha do melhor regime ao qual irá submeter-se. No que concerne ao § 1º do art.1º, apresentamos a Emenda nº 1, para suprimi-lo. O referido dispositivo trata de definir as entidades e o órgão integrante do Sistema Estadual de Saúde, o que nos parece impróprio, já que as ações e os serviços de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada, definida no art. 198 da Constituição da República como Sistema Único de Saúde - SUS -, descentralizado, com direção única em cada esfera de governo. Como já exposto anteriormente, o plano de carreira em análise possui pontos de interseção com a Lei nº 869, de 1952, recepcionada pela Constituição Estadual como lei complementar. Para efetuar as necessárias alterações conceituais nessa norma estatutária, o Governador do Estado encaminhou a esta Casa, o Projeto de Lei Complementar nº 52/2004. Verificamos que, por uma questão de forma e de técnica legislativa, faz-se necessário adequar alguns conceitos tanto no mencionado projeto de lei complementar quanto na proposição ora analisada. Tal medida visa a garantir a harmonia entre os dispositivos de ambos os projetos, para que o plano de carreira possa vigorar sem problemas. Com esse objetivo, apresentamos a Emenda nº 2, para alterar a redação do art. 3º. Quanto ao art. 5º, apresentamos a Emenda nº 3, para disciplinar, de forma mais clara, as possibilidades de cessão de servidores das carreiras de que trata esta lei. Apresentamos, ainda, a Emenda nº 4, para que se preveja, no dispositivo, a atribuição de vencimentos básicos diferenciados para os servidores que possuam jornadas de trabalho distintas, proporcionais ao número de horas de cada uma das jornadas. Faz-se necessária, também, a alteração do art. 45 do projeto, para que os destinatários da lei compreendam o comando do dispositivo com mais facilidade, reduzindo-se a possibilidade de controvérsia quando da interpretação da norma, no que concerne à aplicação do disposto no art. 118 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição do Estado. Sobre a observância da Lei Complementar Federal nº 101, de 4/5/2000 - Lei de Responsabilidade Fiscal -, que exige seja a criação de cargos públicos acompanhada da estimativa do impacto financeiro-orçamentário da proposta e da demonstração da origem dos recursos, foi encaminhado a esta Casa Legislativa o demonstrativo de que não implicará aumento da despesa pública com pessoal a pretendida criação ou transformação de cargos, uma vez que outros serão extintos. No que concerne às emendas apresentadas pelo Governador do Estado junto ao Plenário e encaminhadas a este relator para conhecimento, cumpre-nos esclarecer que estas não foram incorporadas ao parecer por se tratar, principalmente de emendas relativas ao mérito. Conclusão Com base no exposto, concluímos pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade do Projeto de Lei nº 1.337/2003 com as Emendas nºs 1 a 5, a seguir apresentadas. EMENDA Nº 1 Suprima-se o § 1º do art. 1º, transformando-se o seu § 2º em parágrafo único. EMENDA Nº 2 Dê-se ao art. 3º a seguinte redação: “Art. 3° Para os efeitos desta lei considera-se: I grupo de atividades o conjunto de carreiras agrupadas segundo sua área de atuação; II carreira o conjunto de cargos de provimento efetivo agrupados segundo sua natureza e complexidade e estruturados em níveis e graus, escalonados em função do grau de responsabilidade e das atribuições da carreira; III cargo de provimento efetivo a unidade de ocupação funcional do quadro de pessoal privativa de servidor público efetivo, com criação, remuneração, quantitativo, atribuições e responsabilidades definidos em lei e direitos e deveres de natureza estatutária estabelecidos em lei complementar; IV quadro de pessoal o conjunto de cargos de provimento efetivo e de provimento em comissão de órgão ou entidade; V nível a posição do servidor no escalonamento vertical dentro da mesma carreira, contendo cargos escalonados em graus, com os mesmos requisitos de capacitação e mesma natureza, complexidade, atribuições e responsabilidades; VI grau a posição do servidor no escalonamento horizontal no mesmo nível de determinada carreira.”. EMENDA Nº 3 Dê-se ao art. 5º a seguinte redação: “Art. 5º - Poderá haver cessão de servidor ocupante de cargo de provimento efetivo ou detentor de função pública das carreiras de que trata esta lei para instituições públicas que integram o Sistema Único de Saúde, mediante convênios de cooperação técnica, nos termos de regulamento. § 1º - Os convênios a que se refere o “caput” são dispensáveis quando da movimentação de servidores entre órgãos e entidades estaduais integrantes do Sistema Único de Saúde. § 2º - Poderá haver cessão de servidor público ocupante de cargo de provimento efetivo ou detentor de função pública de que trata o “caput” para órgão ou entidade vinculados a carreiras diversas para exercício de cargo de provimento em comissão ou função gratificada.”. EMENDA Nº 4 Acrescente-se o seguinte § 2º ao art. 6º, transformando-se o parágrafo único em § 1º: “Art. 6º - .............................................. § 2º - O vencimento básico de cada uma das carreiras de que trata o `caput´ deste artigo, fixado em tabelas distintas, será proporcional à jornada de trabalho do servidor.” . EMENDA Nº 5 Dê-se ao art. 45 a seguinte redação: “Art. 45 - O servidor público ocupante de cargo de provimento efetivo do Poder Executivo do Estado de Minas Gerais que, em razão de concurso público posterior à publicação desta lei, ingressar em cargo de carreira do Grupo de Atividades da Saúde, com jornada equivalente à do cargo de origem, cuja remuneração, incluídos adicionais, gratificações e vantagens pessoais, for superior à remuneração do cargo de carreira instituída por esta lei, poderá perceber a diferença a título de vantagem pessoal nominalmente identificada, sujeita exclusivamente à revisão geral da remuneração dos servidores estaduais. Parágrafo único - Para o cálculo da diferença prevista no `caput´ deste artigo, não serão computados os adicionais a que se refere o art. 118 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição do Estado.”. Sala das Comissões, 23 de junho de 2004. Bonifácio Mourão, Presidente - Gustavo Valadares, relator - Gilberto Abramo - Maria Tereza Lara - Ermano Batista.