DEPUTADA MACAÉ EVARISTO (PT)
Discurso
Legislatura 20ª legislatura, 2ª seção legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 20/06/2024
Página 158, Coluna 1
Indexação
27ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 2ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 20ª LEGISLATURA, EM 18/6/2024
Palavras da deputada Macaé Evaristo
A deputada Macaé Evaristo – Boa tarde, presidenta! Eu quero também me solidarizar com o deputado Cristiano Silveira, que me antecedeu, e com todas as famílias de pessoas com transtorno do espectro autista. Quero também reafirmar a necessidade de que, cada vez mais, tenhamos políticas intersetoriais que pensem o desenvolvimento integral das pessoas. Se não houver uma disposição efetiva dos governos para garantir a plena inclusão e o pleno desenvolvimento integral das pessoas, será pouco provável que uma instituição isolada consiga fazê-lo. Especialmente, eu quero chamar a atenção das escolas, que, muitas vezes, são a primeira e a única instituição que acolhem essas crianças e esses adolescentes. Elas não têm, em contrapartida, o apoio de outras instituições e de outras políticas públicas que são fundamentas e muito importantes para garantir que essas crianças e adolescentes – e mesmo adultos, porque nós temos muitas pessoas que só vão fazer esse diagnóstico na fase adulta – tenham a possibilidade de ter garantida uma vida digna, a possibilidade de ter dignidade na sua vida e um desenvolvimento pleno.
Mas o que me traz a este Plenário é o debate, é uma posição, é um posicionamento público que eu gostaria de trazer aqui sobre um projeto de lei que trata da gravidez na infância e criminaliza, mais uma vez, meninas, meninas que foram vítimas de abuso sexual. Deputada Leninha, já falei desse tema aqui, em Plenário. O Brasil tem indicadores horrorosos de exploração e de abuso sexual contra crianças e adolescentes, contra meninas e meninos. Meninas de 12 anos brincam de bonecas, ainda são crianças e deveriam viver a plenitude da infância. Meninos de 12 anos brincam de carrinho, andam de bicicleta, brincam de videogame. São crianças e deveriam viver a plenitude da infância. No entanto, o direito de ser criança é ameaçado pelo abuso sexual, um ato hediondo, com consequências para toda a vida. Meninas abusadas são arrancadas de forma brusca da infância. Elas são privadas do direito de brincar, de sonhar, de estudar e de ter planos futuros. É inaceitável o argumento de que uma criança pode ser mãe, numa defesa baseada numa moral hipócrita de que mulheres devem levar a gravidez até o fim, independentemente da própria vontade. Muitas pessoas, setores, querem impor seus dogmas, retirando o direito de cada mulher e de cada menina sobre o próprio corpo.
O Projeto de Lei nº 1.904/2024 equipara o aborto realizado após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio simples, mesmo em caso de gravidez resultante de estupro. A legislação determina o que é estupro de vulnerável, mas um número muito grande de meninas ainda se tornam mãe. Mais de 12,5 mil meninas, entre 8 e 14 anos, foram mães em 2023 no Brasil. É uma estatística muito triste que evidencia a violência sofrida. A Lei nº 12.015, de 2009, no art. 217-A, determina ser estupro de vulnerável ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos. Os abusos costumam acontecer dentro de casa, realizados por pais e familiares, por pessoas próximas, com quem a criança acredita estar segura, pessoas que deveriam zelar pela integridade física, mental e psicológica dela. No entanto, os abusadores tentam transferir a culpa à criança, eximindo-se da responsabilidade de seus atos.
Não podemos deixar de dizer que, de forma muito triste, crianças são abusadas até mesmo em ambientes religiosos. O Movimento de Defesa da Criança trabalha com a data de 18 de maio como Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual. São realizadas campanhas de conscientização e mobilização. No entanto, alguns grupos caminham na direção contrária e querem, mais uma vez, culpabilizar as meninas quando querem retirar delas o direito ao aborto legal em casos de estupro.
O PL da Gravidez Infantil propõe uma alteração na lei penal sobre o aborto, que atualmente permite que qualquer pessoa que engravide depois de um estupro, que corra risco de vida ou tenha um diagnóstico de anencefalia fetal aborte sem limite de idade gestacional. A proposta está sendo analisada na Câmara dos Deputados e, se aprovada, alterará o Código Penal, que não pune o aborto em caso de estupro e não prevê restrição de tempo para o procedimento nesse caso. O aborto também é previsto no código quando não há outro meio de salvar a vida da gestante.
O PL nº 1.904/2024, que ainda não passou pelas comissões da Câmara mas poderá ser votado diretamente pelo Plenário, caso o requerimento de urgência do deputado Eli Borges, do PL de Tocantins e outros, seja aprovado, é um PL de fundo moralista que ataca o direito das mulheres e desconsidera os dados efetivos e a situação de milhares de meninas abusadas sexualmente na infância. Trata-se de um PL que tem sido chamado, pelo movimento de mulheres, de PL da Gravidez Infantil. E o movimento de mulheres pede ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, do PP de Alagoas, para não prosseguir com a votação do projeto em regime de urgência.
Organizações que compõem a Frente do Distrito Federal pela Legalização do Aborto, em ato simbólico realizado na terça-feira, 11 de junho, entregaram uma coroa de flores, durante a reunião do Colégio de Líderes, com os seguintes dizeres: “Deputados, estamos em luto pelas crianças brasileiras estupradas que perdem sua infância por falta de acesso ao aborto legal. Não ao PL nº 1.904/2024”. No Comitê sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher, o Brasil foi instado a dar resposta à capacidade do Estado de garantir o acesso ao aborto legal no País. A lei brasileira garante o aborto legal quando ocorre estupro, e o atendimento deve ser oferecido no Sistema Único de Saúde. E aí, deputado Cristiano, como o senhor mesmo apresentou aqui a questão do autismo, a gente sabe que, muitas vezes, as meninas nessa situação demoram a fazer o seu diagnóstico, demoram por morosidade e por incapacidade da política pública de garantir a elas o pronto atendimento no tempo devido.
Uma mobilização nas redes sociais procura conscientizar os parlamentares sobre a gravidade do PL da Gravidez Infantil. Os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública são assustadores: 74.930 pessoas foram estupradas no Brasil em 2022, sendo que 8,7% dessas vítimas eram mulheres. O dado mais alarmante é que 6 em cada 10 eram meninas e tinham menos de 13 anos de idade. Portanto, gente, é importantíssimo a gente garantir a proteção integral dessas meninas, o que significa que nós devemos atuar numa frente para eliminar a exploração sexual e também possibilitar que, em casos de estupro, elas tenham o direito de interromper a gravidez. Menina não é mãe! Estuprador não é pai!