Pronunciamentos

DEPUTADO CRISTIANO SILVEIRA (PT)

Discurso

Presta solidariedade ao Colégio Santo Agostinho em relação à ação de dois promotores da infância e da adolescência que receberam denúncias de alguns pais relativas ao suposto ensino de ideologia de gênero. Comenta o uso de "fake news" pelo candidato à Presidência eleito, Jair Bolsonaro, por membros da sua campanha e seus apoiadores, que teriam transformado o esforço de uma política do Ministério da Educação para combater a homofobia, o "bullying" e uma série de preconceitos nas escolas numa farsa de ataque à candidatura adversária. Destaca que a escola tem que ser um espaço do livre pensamento e que professores e educadores não podem ser tratados como criminosos. Comenta que o Brasil ocupa a 9ª colocação no mundo em desigualdade, que teria crescido nos dois últimos anos. Critica a carga tributária no Brasil, que pesa mais sobre os pobres, e a não cobrança do imposto sobre grandes fortunas. Lamenta a saída dos médicos cubanos do Mais Médicos do Brasil, destacando que as vagas preenchidas pelos estrangeiros são primeiramente ofertadas a brasileiros.
Reunião 82ª reunião ORDINÁRIA
Legislatura 18ª legislatura, 4ª seção legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 04/12/2018
Página 24, Coluna 1
Assunto EDUCAÇÃO. ELEIÇÃO. PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. SAÚDE PÚBLICA. TRIBUTO.

82ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 18ª LEGISLATURA, EM 28/11/2018

Palavras do deputado Cristiano Silveira

O deputado Cristiano Silveira* – Presidente, queria iniciar a minha fala fazendo coro com o deputado Rogério Correia, que prestou aqui solidariedade ao Colégio Santo Agostinho. É uma escola tradicional de Belo Horizonte, pautada por fundamentos cristãos, católicos; uma escola que tem o seu nome e a sua imagem reconhecidos em todo o nosso estado.

Essa onda que surge no Brasil, de autoritarismo, de fascismo, num esforço para tentar retirar das escolas o espaço, o ambiente favorável à construção de uma consciência crítica, cidadã, ocorre porque não querem que o povo tenha memória, não querem que o povo tenha senso crítico, não querem que o povo questione.

Através dessa agenda criam subterfúgios, a ideologia de gênero, para atacar as instituições e os professores que prezam pelo desenvolvimento do senso crítico e cidadão da nossa sociedade. Ainda no período das eleições, vimos as chamadas fake news, as mentiras construídas pelo candidato eleito Jair Bolsonaro e membros da sua campanha, seus apoiadores, que falavam em kit gay, mamadeira erótica e uma série de absurdos, que de fato nunca existiram. Transformaram o esforço de uma política do Ministério da Educação para combater a homofobia nas escolas, que é real, assim como o bullying e uma série de preconceitos, numa farsa de ataque à candidatura adversária. E muita gente comprou esse produto. Ora, as escolas precisam discutir, conversar e ensinar, sem substituir o papel das famílias, dos pais. Não é isso o que se propõe. A escola tem de ser um espaço do livre pensamento, e não podemos tratar professores e educadores como criminosos, pelo esforço de fazer com que nossas crianças estejam bem ensinadas no caminho correto.

Tenho a certeza de que o Colégio Santo Agostinho não faltou à sua responsabilidade, que conhecemos há décadas, com os jovens que ali estudam. Ele tem o nosso apoio e a nossa solidariedade. Estou dizendo isso porque essa situação vai se repetir, tentarão fazer o cerceamento da liberdade de expressão em outras escolas. Deputado Rogério, não se trata de escola sem partido, eles querem escola de partido único. Hoje não há partido nas escolas, há debate de convicções, de pensamento, de ideias, o que deve existir em todas as vertentes e variáveis do pensamento político no nosso país. Nunca vi isso! Queremos formar um sujeito para o mercado de trabalho, como diz esse futuro novo ministro da Educação, formar um menino para ir para a academia, para a ciência, para ser um bom médico, um bom engenheiro, um bom advogado, mas que tipo de cidadão nós teremos? É por isso que parte da sociedade não gosta de política, não gosta de eleição, não gosta de participar, não gosta de conselho, não gosta de mecanismo de controle social. É por isso que a maior parte da sociedade, infelizmente, não tem consciência inclusive para lutar por seus direitos. Nós vivemos numa sociedade que deseduca do ponto de vista da consciência crítica, cidadã e política. E eles querem piorar isso, até mesmo porque não haverá no futuro memória histórica do que foi feito nos dias de hoje. Às vezes, não conseguimos ter a compreensão exata do que vivemos enquanto a história não depura isso diante de determinado processo, para que lá na frente você olhe para trás e veja o que aconteceu. Isso é preocupante. Teremos de combater esse tipo de postura. Ainda bem que Minas tem legislação, mas poderíamos aprofundá-la.

O governador Flávio Dino foi muito corajoso nesse sentido, emitiu um decreto proibindo qualquer tipo de cerceamento, defendendo a liberdade de pensamento, a pluralidade dentro das escolas. É isso o que temos de fazer. O governador Pimentel, dando o mesmo exemplo, deve publicar um decreto no mesmo sentido. Ou poderíamos, no limite, aprovar uma lei aqui na Assembleia. O conjunto de deputados pode subscrever uma proposta para proteger os professores do ataque fascista em curso no Brasil. Fica aqui esta minha defesa.

Complementando as informações da visita que fizemos à Ariadnópolis, uma das ocupações mais importantes do Estado de Minas Gerais, senão do Brasil: são 20 anos de trabalho e mais de 450 famílias. No local mais de 80% dos comerciantes assinaram um abaixo-assinado em defesa da permanência das famílias, confirmando a sua importância para a economia do município, para a geração de emprego e recolhimento de imposto. Eles assinaram o documento não com o CPF, mas com o CNPJ de suas empresas. Na audiência pública aqui ouvimos o depoimento de representante da Universidade Federal de Alfenas, que acompanha, através de suas pró-reitorias, o que é feito ali há anos; ouvimos depoimento do representante do Ministério Público agrário, que tem acompanhado essa ação e de membros dos movimentos sociais e não nos restou dúvidas da importância e da função social daquela terra, daquela massa falida. A terra tem de cumprir a sua função social, como consta na Constituição.

Depois da informação de que o meritíssimo juiz havia visitado a área e não havia encontrado produção e sequer esse número de famílias, fizemos o mesmo percurso, juntos à Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, ao 1º-secretário da Assembleia, à Comissão de Direitos Humanos desta Casa e ao Ministério Público Agrário. O que nós vimos lá? Não foi pouca coisa: mais de 1.800.000 pés de café, produção de café orgânico certificado, de milho, feijão, frutas. Vimos pés de café de sete, oito anos. Isso não ocorre de uma hora para outra. Não ocorreu do dia da visita do juiz até o dia da visita, no intervalo de pouco mais de um mês.

Então é uma terra produtiva, sim, e isso tem que ser levado em consideração pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais ao analisar o agravo que será apresentado pelo Ministério Público, pela assessoria jurídica das famílias e pela Defensoria.

Deputado Rogério, quero fazer um esforço e pedir aos colegas da Assembleia que, daqui a pouco, na reunião da Comissão de Direitos Humanos, garantam quórum para a aprovação do relatório da visita que fizemos, pois ele traz todas as informações. Esse relatório terá de ser enviado ao Tribunal Justiça, ao Ministério Público e a todos os órgãos que estão envolvidos nessa matéria para que consigamos reverter isso, pois são 20 anos. Há um investimento muito grande ali: suor, sacrifício e trabalho, além de investimento financeiro das famílias que nunca receberam um centavo de financiamento de qualquer instituição pública ou financeira.

Então quero corroborar a fala do deputado Rogério Correia em defesa daquela área tão importante, que foi reconhecida pelo próprio governo do Estado, que chegou ao ponto de editar um decreto para que fizéssemos ali a reforma agrária e o assentamento definitivo, deputado Jean, daquelas famílias. Estranhamente, uma liminar suspendeu os efeitos do decreto; o Estado recorre e poderá reverter a questão do interesse social daquela área. O próprio governo do Estado poderá fazer isso. Estou dizendo que os Poderes Legislativo e Executivo reconhecem, e não é possível que o nosso Poder Judiciário também não vai reconhecer a importância daquela área para as famílias que ali estão.

Estamos falando disso porque, nesta semana, foi publicado, nos grandes veículos de comunicação, que o Brasil ocupa a 9ª colocação no mundo em desigualdade. A desigualdade social no nosso país aumentou. E digo que aumentou acentuadamente em 2016 e em 2017. Sempre que falo que o Brasil tem problemas, dizem que a culpa é do PT, que é herança que o PT deixou. Há quase 13 anos, o PT não está no governo, mas dizem que é culpa do PT. O Temer apronta o que apronta, e a culpa é do PT. Estou dizendo: a Oxfam fez análise e prova que a desigualdade cresceu de maneira acentuada entre 2016 e 2017; aumenta o índice de mortalidade infantil – aliás, voltamos a registrar casos de mortalidade infantil; aumenta a desigualdade entre os salários pagos a mulheres e homens. Estou falando de uma pesquisa feita em 189 países. Entre quase 200 países, vergonhosamente ocupamos o 9º lugar. E não me venham falar que é herança do PT, porque o PT retirou 30 milhões de brasileiros do mapa da fome, gerou 20 milhões de empregos e garantiu ganho real no salário mínimo. Esses são dados da ONU e do IBGE, não são dados da Fundação Perseu Abramo, do PT, não. São dados de organismos oficiais.

Então deixamos o país numa condição, e, quando deram o golpe na Dilma, prometeram melhorá-lo, mas entregam um desastre, com o desemprego lá em cima e, agora, com a desigualdade aumentando. Num cenário de aumento da desigualdade, é preciso haver políticas que incluam as pessoas; é preciso pensar na segurança alimentar, na garantia de renda, de salário para que o cidadão cuide de sua família. Então, estamos caminhando na contramão. O nosso Brasil, que agora ocupa o 9º lugar e onde, nos últimos dois anos, acentua-se a desigualdade social, também tem outra marca vergonhosa. O País tem cinco brasileiros – cinco pessoas, não empresas – que, juntos, têm mais dinheiro que a metade de toda a população. E estou falando de 100 milhões de habitantes. Três são sócios da AmBev – Jorge Paulo Lemann e seus dois sócios: Eduardo Saverin, cofundador do Facebook, e Joseph Safra, do Banco Safra. Cinco pessoas têm mais dinheiro do que a metade de toda a população brasileira. É a desigualdade.

O Brasil é um dos poucos países no mundo, deputado Jean, que não tem, por exemplo, taxação de grandes fortunas e onde a carga tributária para o pobre é praticamente a mesma que recai sobre o rico. No Brasil o cidadão paga o IPVA de seu carro, mas um dono de iate não paga imposto. No Brasil não há taxação sobre grandes heranças. Até a meca do capitalismo, que é idolatrada hoje por este governo que está aí, cujo filho usa bonezinho com o nome de Donald Trump, taxa grandes fortunas e grandes heranças, mas o Brasil, não. A desigualdade continuará sendo acentuada se não houver mudança na lógica orçamentária e tributária do nosso país. Essa é uma medida que deve ser adotada.

Estou falando isso para mostrar como isso tem a ver com o contexto em que vivemos. E essa situação poderá tornar-se ainda mais grave. Fala-se em reforma da previdência. Quem pagará a conta são os trabalhadores, principalmente os assalariados.

Querem votar partes da reforma, as chamadas infraconstitucionais, ainda neste ano. Isso é grave. Querem aprovar uma série de medidas de arrocho, como a cobrança de mensalidade em universidade pública. Estão propondo, entre outras medidas, o fim da expansão das demarcações de terras indígenas e da própria reforma agrária. Então, é o caos que se avizinha. É o caos.

Para concluir, quero, em consonância com o companheiro deputado Doutor Jean Freire, que é médico, falar da lástima que é a saída dos médicos cubanos do Mais Médicos do Brasil. Nós, deputados, convivemos com a população, com as comunidades e com os prefeitos e sabemos da revolução que foi o Mais Médicos na atenção básica e na atenção primária. A lugares onde os os brasileiros não queriam ir, os cubanos foram, porque, para eles, estavam aqui cumprindo uma missão. Argumentam que o Mais Médicos coloca os cubanos em situação análoga a de um escravo. Espere aí! Situação análoga a de um escravo? Como é isso? O médico cubano fica com R$4.000,00 dos R$11.000,00 que são pagos, porque R$7.000,00 voltam para Cuba e são aplicados no Ministério da Educação para a formação dos médicos cubanos, porque lá não tem faculdade particular; lá, são todas públicas. Além disso, lá o médico não atende por plano de saúde nem cobra atendimento particular; ele é um servidor público. Então, o Estado tem de financiar o estudo, e as atividades desses profissionais voltam para o governo cubano. O governo cubano sofre um cerceamento econômico dos Estados Unidos e não tem recursos naturais que permitam exportar commodities. Então, exporta a mão de obra que é a medicina, consonante às missões em países que sofrem com desastres naturais e com a ausência da atenção à saúde. Bem, recebem R$4.000,00. Além disso, a contrapartida do município é dar casa para o médico. Aí, incluindo o aluguel e outras despesas, estamos falando que, no somatório, o médico vai ter, em média, algo em torno de R$8.000,00. Um médico cubano recebendo R$8.000,00, no somatório, é colocado entre os 10% mais ricos do Brasil. Vocês sabiam disso? Que salário de miséria que o põe em situação análoga à de escravo é esse? Salário de miséria é o salário mínimo, que não chega a R$1.000,00, pago ao trabalhador. A gente acha ruim que o cubano receba R$4.000,00, mas o governo não vê problema em que o nosso piso salarial ao trabalhador seja o salário mínimo, que não chega nem a R$1.000,00. Então, é uma hipocrisia, e foi a hipocrisia que tirou o Mais Médicos do Brasil.

O Jean bem lembrou que o Mais Médicos foi feito para médicos brasileiros. A inscrição é aberta para os médicos brasileiros e, se eles não quiserem, é aberta para os estrangeiros. Na sua primeira edição, o Mais Médicos não teve a participação dos brasileiros, que só vieram na segunda e nas outras chamadas. O Mais Médicos inclui no programa a oferta de mais cursos de medicina, porque, se não aumentarmos o número de profissionais, não tiraremos o país desse atoleiro e a medicina continuará sendo uma profissão exercida para que a pessoa fique rica, não para que cuide de outras pessoas. Conheço exceções, é claro, e não estou generalizando, mas tem gente que não faz medicina por vocação, ao contrário do senhor, Doutor Jean Freire, que conheço muito bem e sei que é médico por vocação, porque gosta de gente. Mas tem muita gente que passa num vestibular para medicina como se tivesse ganho na loteria, porque vai ficar rico. Muitos prefeitos me falaram que estavam ofertando salários de até R$30.000,00 e não estavam achando médicos para trabalhar nos seus municípios, que são pequenos. Bem, apesar de terem comemorado que de 95% a 97% das vagas estão preenchidas, os lugares mais ermos não foram preenchidos e hoje alguns sites, como o Terra e o UOL, noticiam que já está havendo desistência dos médicos brasileiros inscritos. Também queriam que os cubanos fizessem o Revalida, mas não pedem o mesmo aos médicos brasileiros. É engraçado, não é? E o CRM está fazendo uma operação incrível para entregar o registro aos médicos, para que eles possam trabalhar. Qual é a segurança que temos? Enfim, queremos é que haja médicos para as pessoas, mas digo a vocês que o que estão fazendo vai agravar a situação da saúde nos lugares mais ermos.

Para concluir, presidente, a Organização Pan-Americana da Saúde – Opas – fez um estudo que atesta que, com o fim do Mais Médicos e com a saída dos cubanos do Brasil, até 37 mil crianças de até 5 anos de idade poderão morrer nos próximos anos, aumentando a mortalidade infantil. É grave o que estamos vivendo. A hipocrisia e a raiva ideológica a Cuba não resolvem o problema de saúde que afeta o País. O programa Mais Médicos é aprovado por mais de 85% da população brasileira, e o capricho do novo presidente fez com que milhões de pessoas ficassem imediatamente desassistidas.

* – Sem revisão do orador.