Pronunciamentos

SR. JOÃO BAPTISTA GALHARDO JÚNIOR, Juiz de Direito auxiliar da Presidência do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP)

Discurso

Comenta o tema: "O processo judicial: análise crítica".
Reunião 27ª reunião ESPECIAL
Legislatura 18ª legislatura, 1ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 03/10/2015
Página 25, Coluna 1
Evento Ciclo de Debates: Judicialização da Saúde.
Assunto SAÚDE PÚBLICA.

27ª REUNIÃO ESPECIAL DA 1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 18ª LEGISLATURA, EM 14/9/2015

Palavras do Sr. João Baptista Galhardo Júnior


O Sr. João Baptista Galhardo Júnior - Boa tarde a todos. Quero agradecer o convite honroso que me foi formulado e cumprimentar todas as autoridades da Mesa, na pessoa da S. Exa., o deputado Antônio Jorge. Para mim é uma grande alegria estar aqui, na Casa do povo do Estado de Minas Gerais, rever grandes amigos e conhecer outros novos. Na verdade, longe de querer fazer uma palestra, uma fala de ensinamento, a ideia é trocar experiências e ideias nesse tão tormentoso tema “judicialização da saúde”. Quero dividir a minha fala, no começo um pouco mais teórica, mas acho que a contribuição que posso dar é trazer minha experiência prática na minha comarca e, agora, na assessoria da presidência do Tribunal de Justiça de São Paulo, em relação ao fomento da criação das chamadas câmaras técnicas ou dos núcleos de apoio técnico, e o quanto isso tem contribuído no Estado de São Paulo para ajudar na solução da questão da judicialização. Então começo com a parte brevemente teórica, sendo que muito do que vou dizer já foi até falado aqui, nos painéis da manhã. Mas a nossa grande discussão é como harmonizar a relação entre cidadãos e SUS, e consumidores e operadoras de planos de saúde, e reduzir as demandas judiciais relacionadas com a área de saúde.

O primeiro problema que surge e que foi até mencionado pelo Prof. Fernando, pela manhã, é: afinal de contas o que é saúde? Conhecemos o texto constitucional, que determina que o Estado dê a todos os cidadãos saúde, mas conceituar saúde não é algo muito fácil. Há o conceito da Organização Mundial da Saúde, que diz que a saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não meramente a ausência de doença ou enfermidade. E há um conceito tirado da doutrina: a saúde é um estado de bem-estar físico, mental e social, com capacidade de funcionamento, e não apenas a ausência de enfermidade ou de doença.

Começarei pelo conceito de saúde ou pela controvérsia do que é saúde, porque não é incomum verificarmos no Judiciário ações pedindo alimentos, suplementos vitamínicos, até mesmo protetor solar para as pessoas que têm algum tipo de alergia ou problemas de pele. Afinal de contas, até onde isso é saúde ou uma questão social? A legislação brasileira até tentou limitar um pouco isso, mas o fato é que o Judiciário tem adotado o conceito mais amplo, vamos dizer assim, de que saúde não é só ausência de doença, mas também um estado completo de bem-estar físico, mental e social. Isso tem um reflexo prático na medida em que, se adotarmos esse conceito mais abrangente, podemos caminhar até mesmo para algumas distorções. Como também foi falado hoje de manhã, eu, morador de uma favela, posso buscar, numa ação judicial, que o Estado equipe a minha casa com todo o saneamento básico necessário, porque isso está efetivamente ligado à saúde; quero uma alimentação adequada, porque isso está ligado à saúde. Enfim, uma série de fatores que se desdobram a partir desse conceito. Mas esse é o conceito que a Organização Mundial da Saúde e a literatura trazem, e que me parece ser o mais adequado para se adotar quando se tem um processo na mesa para se decidir a respeito da questão de saúde.

Tenho certeza de que todos já sabem, mas quero trazer aqui os sistemas de saúde existentes no mundo hoje. Há o sistema da assistência, que é um sistema residual, que disponibiliza apenas alguns remédios e tratamentos específicos para as pessoas carentes. Esse era o caso dos Estados Unidos, onde praticamente todas as ações de serviço de saúde pertencem à iniciativa privada. Paga-se por eles, particularmente ou por planos de saúde, deixando grande parte da população descoberta. Lembrando que os Estados Unidos estão passando por uma alteração: o ObamaCare, uma discussão tão polêmica nos Estados Unidos, pretende dar saúde pública a toda a população. Mas o sistema lá é chamado de assistência, é o sistema residual.

O sistema do seguro social, em que a saúde é direito apenas para aqueles que contribuem para a previdência social, é um sistema meritocrático, em que, em regra, as pessoas pagam pelo serviço e recebem reembolso, existindo para a população carente apenas alguns serviços assistenciais, como ocorre na Alemanha, França e Suíça.

E o sistema da seguridade social é o que define que a saúde é direito social que integra a cidadania, devendo ser garantida pelo Estado a todas as pessoas em uma espécie de solidariedade social, mantida por impostos e recursos financeiros. É o sistema da Inglaterra, do Canadá, de Cuba, da Suécia e também o nosso sistema brasileiro, o sistema universal adotado pela nossa Constituição de 1988. Copiamos esse sistema do sistema da seguridade social, especialmente da Inglaterra, com a observação de que somos um país territorialmente muito maior, com diferenças regionais também maiores e com mais de duzentos milhões de habitantes. Aliás, esse é o único sistema de seguridade social do mundo que enfrenta o desafio de dar saúde pública para mais de duzentos milhões de pessoas.

Também é de conhecimento de todos, mas faço aqui apenas uma breve alusão para que a nossa fala tenha uma sequência prática: a nossa Constituição Federal define em seu art. 196 que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

O art. 197 diz que são de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao poder público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e também por pessoa física ou jurídica de direito privado. Faço menção ao art. 197 para, mais à frente, falar da saúde suplementar.

O art. 199 diz que a assistência à saúde é livre à iniciativa privada. Deixo muito claro que aqui, em nosso país, podemos ter empresas que prestam serviços de saúde ligados à iniciativa privada, chamados planos de saúde.

O art. 170 da nossa Constituição define que a livre concorrência é garantida, assegurada. O lucro também é assegurado, observado alguns limites constitucionais, como a função social da empresa, defesa do consumidor, trabalho digno, remunerado e assim por diante.

Então o nosso país tem a saúde pública e a saúde suplementar. O que verificamos, hoje, é uma grande demanda de ações envolvendo os dois sistemas, tanto a saúde pública quanto a suplementar. Temos 200 milhões de habitantes e 100 milhões de processos em andamento no Judiciário, segundo dados do CNJ. Isso significa dizer que está todo mundo brigando. Se cada processo tem um autor e um réu, são, portanto, no mínimo duas pessoas em cada processo. Somos 200 milhões de habitantes e, de acordo com o CNJ, 100 milhões de processos. Isso quer dizer que o País inteiro está dentro do Judiciário. É um sistema que não pode funcionar, porque, afinal de contas, a sociedade não pode ter perdido a sua capacidade de resolver por conta própria os seus problemas.

Também dados do CNJ indicam que mais de quatrocentos mil processos envolvem questões de saúde. São 200 milhões de habitantes, 100 milhões de processos e mais de quatrocentos mil processos envolvendo questões de saúde.

Ainda dentro dessa fala mais teórica, o juiz, o operador de direito, o advogado, o Ministério Público e a defensoria já têm algumas premissas prontas para enfrentar um processo de saúde. Na saúde suplementar, não há dúvida de que a base legal da interpretação do litígio é a aplicação do Código de Defesa do Consumidor – CDC. Apenas na omissão do CDC é que vamos aplicar o Código Civil. Por exemplo, na questão da prescrição da ação para discutir a abusividade em cláusula contratual, não há uma regra específica no CDC. Então vamos usar o Código Civil, que trata que o prazo é de 10 anos. Isso já traz uma ideia bastante clara de que o direito do consumidor deve ser visto sempre em primeira mão, antes do direito da operadora. Porque o nosso CDC – que, aliás, na minha opinião, deveria chamar-se Código de Defesa das Relações de Consumo porque nem sempre o consumidor está certo – tem como princípio a posição pró-consumidor. Quando há dúvida na interpretação de uma contratação, deve-se decidir em favor do consumidor.

Por outro lado, se estamos falando de relação de consumo, estamos falando de empresa, como eu disse, estamos falando de atividades privadas, e a Constituição permite que a saúde seja prestada pela iniciativa privada. E a iniciativa privada evidentemente vai prestar essa assistência visando a lucro, até porque, se não tiver lucro, ela não vai sobreviver. Mas essa vontade de ganhar lucro tem de, evidentemente, observar a função social do contrato, prevista tanto na Constituição como também no Código Civil, assim como a boa-fé contratual. No momento em que faz aquisição de um plano de saúde, o consumidor tem de conhecer todas as regras e não ser enganado, não deve ser omitida a ele alguma informação que evidentemente, lá na frente, vai dar um problema, vai virar um processo na Justiça e esse processo vai caminhar em favor do consumidor. O próprio Código Civil, nos arts. 421 e 422, enuncia a obrigatoriedade de se observar a função social da empresa e a boa-fé nos contratos privados.

Por fim, na área da saúde suplementar, sabemos que há uma lei específica que trata do regramento dessa prestação de serviço, que é a Lei nº 9.656, de 1998, que traz regras próprias para isso, sempre com a fiscalização da ANS. Então o juiz, o operador de direito, o promotor, o defensor, enfim, o advogado que milita nessa área e vai enfrentar um processo que envolve uma questão de saúde de um plano de saúde tem essas premissas jurídicas a observar.

Em relação à saúde pública, como já informamos, temos um sistema universal, e sabemos disso. E a jurisprudência dominante dos tribunais, do STJ, enfim, dos tribunais superiores é que há uma solidariedade dos entes públicos. Hoje de manhã vimos a desembargadora Vanessa mencionar por que a União não é demandada. Por que ela é a menos demandada? Porque ela tem mais recursos, arrecada mais impostos e, na verdade, sofre menos ações em relação à da judicialização da saúde? Porque, para o cidadão, é mais fácil, mais possível, mais prático demandar contra seu município. Ali o prefeito está mais próximo, o secretário municipal de Saúde está mais próximo, as informações para demanda estão mais próximas, a capilaridade da justiça estadual no País é maior. Então, em regra, demanda-se contra o município, que é a parte mais fraca e quem tem um orçamento sempre mais limitado. No mais das vezes, contra o município e contra o Estado ou somente contra o Estado e, por fim, contra a União. Por que é assim? Porque o nosso sistema define que os entes são solidários.

Essa é uma questão pacificada da jurisprudência dos tribunais. Outra posição também pacificada é que o nosso sistema não faz distinção de classe. Há sempre uma discussão a respeito daquele sujeito que tem o plano de saúde, é tratado por esse plano até um determinado momento, dali para a frente, a doença se agrava, e o plano de saúde diz a ele que, daquele momento em diante, não mais lhe será dada a cobertura. Então esse sujeito vai bater à porta do Judiciário, buscar da saúde pública aquilo que está desejando. Não há como um juiz dizer que ele, como até o momento foi tratado pelo plano de saúde, deve brigar com seu plano de saúde. Ou dizer que ele foi tratado pelo plano de saúde porque tem condições econômicas, e o SUS é só para quem não tem condições econômicas. A jurisprudência dos tribunais é no sentido de que o SUS é universal. Não há essa distinção de classe, ainda que se possa eventualmente dizer que é muito mais justo que o tratamento público seja voltado para quem não tem condições de pagar um plano de saúde do que para todos, até porque os recursos são finitos e não dá para dar atenção a todo mundo. O fato é que, juridicamente falando, o nosso sistema é universal e atende a todos, independentemente de distinção de classe.

Uma outra informação importante, ainda no campo jurídico, é que o sistema privado não é complementar do sistema público, e vice-versa. É uma assistência suplementar, é uma atenção que não vem em complemento àquilo que o sistema público traz. Da mesma forma, o sistema público não vai complementar o sistema privado. Uma coisa é o sistema privado. Quem quer partir para esse sistema e tem condições vai fazê-lo. Outra coisa é o sistema público. Não há na legislação nada que diga que um complemente o outro.

Por fim, também com base na jurisprudência dominante, as determinações judiciais contra o sistema público não devem se limitar a protocolos ou listas. Ela é universal, é igualitária. Não há na Constituição - foi dito hoje, pela manhã, pelo Prof. Fernando que os juízes, quando decidem, usam a Constituição e às vezes deixam de olhar a legislação ordinária, os regramentos administrativos, etc. - nenhuma limitação, de sorte que, se o médico prescreve e embasa sua prescrição, ainda que se trate de um medicamento que não está em protocolo, em lista, muitos juízes, mutos tribunais, acabam concedendo a determinação para que se entregue aquele medicamento.

Fiz esse breve apanhado jurídico porque foi o exercício mental, o esforço jurídico que tive de fazer quando assumi uma vara de fazenda pública, no Estado de São Paulo, depois de ter judicado, depois de ter exercido a função de juiz, por 16 anos na área da infância e da juventude. Aqui já começo minha fala prática, que é o que posso trazer de contribuição para os colegas.

Quando mudei de área, saí dessa área de infância e juventude, que cuidava basicamente da avaliação de atos infracionais de adolescentes que praticavam crimes, fui trabalhar, por uma remoção na carreira, numa vara de fazenda pública. Logo no primeiro momento, verifiquei ali várias ações envolvendo questões de saúde. Tinha um mandado de segurança, do qual nunca me esqueço, pedindo um medicamento chamado ranibizumabe. Eu que tinha trabalhado por 16 anos com infratores, com o Estatuto da Criança e do Adolescente, pensei: “Jesus, o que é isso. Nunca ouvi falar desse tal de ranibizumabe”. Era para uma senhora de quase 80 anos. O advogado pediu uma liminar e dizia que, caso não fosse concedida a liminar, aquela senhora morreria.

Comecei a ler o processo, tentar estudar o que era o tal do ranibizumabe, e, depois de 10 minutos, veio outro advogado com outro mandado de segurança, pedindo uma câmara hiperbárica de oxigenoterapia. Eu falei: quero voltar para a minha Vara da Infância, André. Meu Deus, o que é isso?”. Aí o advogado disse: “olhe, doutor, o senhor precisa dar a liminar porque o rapaz sofreu um acidente de moto. São 80 sessões, e ele precisa ficar na câmara, senão vai morrer”. Eu lhe disse: a velhinha está na frente – desculpe-me, não é para morrer, mas é porque o processo dela está na frente.

Passado mais um tempo, chega um mandado de segurança de cirurgia bariátrica. Eu disse: Jesus, o que é isso? O que está acontecendo aqui? Isso foi no começo de 2009. Eu já tinha ouvido falar da discussão no Supremo Tribunal Federal sobre aquela audiência pública referente à judicialização da saúde. Comecei a me interessar, a ler um pouco sobre aquilo e a participar de grupos de estudo. Verifiquei que o CNJ também entrou no assunto e lançou duas recomendações, de nº 31 e de nº 36, que é o apoio técnico aos juízes para que eles possam decidir, naquele momento da liminar, com base em maiores informações. Não que o advogado dos processos estivesse induzindo-me a decidir errado. O advogado estava fazendo a defesa do cliente dele, embasado numa prescrição médica, como foi dito aqui pela manhã, porque tudo começa pela prescrição médica.

Fui verificar também se já existiam essas câmaras técnicas em alguns lugares, embora soubesse que, no Estado de São Paulo, elas eram poucas, ficavam em duas ou três cidades, mas já havia algumas experiências em Minas Gerais, no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Sul e no Paraná. Eu disse: vou montar uma câmara técnica aqui para atuar na minha vara. Busquei recomendações e resoluções do CNJ e descobri que o tal do ranibizumabe era um medicamento para degeneração macular, que não ia matar a velhinha. Descobri que 80 sessões de câmara de oxigenoterapia não servem para nada, quando se diz que no máximo são 40 ou 60. O rapaz ia virar o Michael Jackson, moraria dentro de uma câmara hiperbárica, porque o Michael Jackson morava numa câmara de oxigenoterapia.

Naquele processo da cirurgia bariátrica, que era um mandado de segurança, em que, por via de regra, o juiz tem de decidir rápido, não cabem provas e audiências, eu marquei uma audiência para aquela pessoa, vindo ela e o advogado. Eu lhe perguntei: não temos outra opção? O advogado respondeu: “Não, é obesidade mórbida, está aqui prescrita pelo médico”. No entanto, eu insisti, fiz um contato na Secretaria de Saúde e indaguei: vamos dar uma alternativa para esse sujeito? Vamos verificar o que podemos fazer, que não seja a cirurgia bariátrica?

Bom, essa câmara técnica acabou sendo criada na minha comarca e espalhada no Estado de São Paulo inteiro. Hoje temos câmaras técnicas, inclusive, nas Varas de Fazenda Pública da capital, que são 14 varas. Como elas funcionam? Vou passar nossos formulários, deixar o material à disposição dos senhores, porque meu tempo está esgotando-se.

O juiz, antes de despachar o processo, a liminar, pede para a parte preencher o formulário - talvez ali não dê para lê-lo por inteiro, mas, repito, o material fica à disposição de todos. Então ele pede para a parte preencher um formulário, ou o próprio cartório o preenche, considerando as seguintes observações: se os medicamentos foram prescritos de acordo com o receituário como manda a lei, que é prescrever o genérico, dizer qual é a necessidade, a periodicidade, etc; se os medicamentos estão registrados no Brasil; para qual doença o medicamento serve ou se o seu uso é off lable; se os medicamentos são fornecidos por programas oficiais; se há urgência no atendimento daquilo que está sendo pedido; e se houve prévia solicitação administrativa.

Com base nessas informações, a câmara técnica responde a algumas indagações para nós, juízes do Estado de São Paulo: se o caso não é urgente, temos mais tempo para pensar se há alternativas para o tratamento, se existem genéricos com a mesma eficácia, se há outra possibilidade de atenção para casos específicos. Tivemos inúmeras ações envolvendo a briga do Avastin com o Lucentis. Falei do ranibizumabe e precisarei falar das marcas, sem denegrir imagem ou mencionar má-fé. Quem militou na área sabe dessa discussão. Conseguimos mostrar aos juízes de São Paulo que aquele, que era infinitamente mais barato, tinha o mesmo efeito do mais caro.

Com a multiplicação das câmaras técnicas, estamos conseguindo reduzir as demandas de saúde nos fóruns do estado como um todo. No último levantamento, houve redução de 80% dos medicamentos com registro na Anvisa, nas varas de fazenda pública, e de 28% dos medicamentos sem registro. O melhor de tudo é que estamos dando ao paciente o direito que ele precisa, sem necessariamente escancarar os cofres públicos.

Volto a falar da cirurgia bariátrica. O mandado de segurança que era para ser resolvido em 15 dias, foi sendo despachado assim: aguarda-se novo relatório. O paciente começou a ser atendido por psicólogo, nutricionista, assistente social, professor de educação física – todos profissionais da rede pública. Dois anos depois, marquei uma audiência, e ele já havia saído da situação de obesidade mórbida. A liminar nem havia sido apreciada, o mandado de segurança nem havia se iniciado. A nossa câmara técnica deu uma alternativa para a pessoa, e eu indaguei ao seu advogado se desistia do processo. A resposta foi sim. Então, dei o caso por encerrado. A pessoa levantou a mão e disse: “Posso falar uma última coisa?”. Respondi: “Pois não”. Então ele disse: “O senhor salvou a minha vida, porque eu ia fazer uma cirurgia muito difícil, com risco enorme de morte, e talvez não ficasse bom. Agora, com essa alternativa, consegui uma qualidade de vida melhor”. Não vejo alternativa. Minas já adota esse sistema, que funciona bem. Precisamos multiplicar isso, ou seja, o Judiciário deve se abrir para as câmaras técnicas, para as notas técnicas, para os núcleos de atendimento técnico ou qualquer outro nome, e multiplicar a ideia no País como um todo. Essa é a minha contribuição. Muito obrigado.

O presidente – Agradecemos ao Dr. João Baptista Galhardo a bela exposição. Temos a certeza de que a sua contribuição será provocada ao longo do debate. Ouviremos agora o Dr. Gilmar de Assis, que falará sobre o papel do Ministério Público nas demandas individuais e coletivas.